sábado, 28 de janeiro de 2012



SOMOS SALVOS PARA PRESTAR CULTO AO SENHOR JESUS CRISTO

                   Muitas vezes, as pessoas se perguntam por quê existem. Para quê fomos criados? A Bíblia nos mostra que existimos para o louvor e glória do Deus único e Senhor Jesus Cristo. Sendo este um fato espiritual, é natural concluirmos que o culto está vinculado à nossa natureza. Nascemos com um “instinto cultual”. Tal afirmativa é endossada pelos historiadores, antropólogos e arqueólogos. Em todas as civilizações de todos os tempos, encontra-se presente o fenômeno chamado “culto”. O culto é a expressão da fé. É o tributo de honra, louvor e serviço àquele que se venera. Quem é “aquele”? Bem... nesse ponto as civilizações não se entendem. Os alvos do culto humano têm sido os mais diversos possíveis. Há quem adore o sol, a lua, as estrelas, os rios, os animais. Outros veneram o seu semelhante, vivo ou morto, ou imagens de sua própria criação. Mais longe vão os que espiritualizam o culto: adoram espíritos que são identificados por centenas ou milhares de nomes. Em muitos povos foi constatada também a adoração a um “ser supremo”, criador de todas as coisas. Provavelmente, tais pessoas tiveram algum tipo de experiência espiritual genuína. Entretanto, é através do povo de Israel que o criador se apresentou à humanidade. Jesus disse: “Vós adorais o que não sabeis. Nós adoramos o que sabemos, porque a salvação vem dos judeus”. (João 4:22). Somente o único Deus deve ser o alvo de culto de todo ser humano: o Deus de Abraão, de Isaque e de Jacó. Os judeus são o nosso ponto de referência religiosa na história. Portanto, convém que nos dediquemos a conhecer aspectos do seu culto que nos serão de grande utilidade no entendimento de nossas práticas e fé.

                   Enquanto muitos se perdem em cultos vãos, adorando ao que não se deve, a Bíblia nos mostra que Deus está à procura de verdadeiros adoradores. Antes de buscar pregadores, intercessores, evangelistas, etc, o Senhor procura pessoas que se dediquem a cultuá-lo. O culto a Deus está fundamentado no conhecimento que se tem dele. À medida em que o conhecemos, o adoramos. (Os.6:1-3,6;Is.1:3;5:13;Prov.11:9;Jo.8:32)O verdadeiro culto é um relacionamento purificador e transformador com o Deus Pai, Filho e Espírito Santo. Ao Único Deus o Senhor Jesus Cristo, seja a honra a glória, o louvor para todo sempre. Amém
                  
           A Igreja Evangélica de hoje se encontra na delicada situação de estar errada ao mesmo tempo em que está certa; uma simples preposição nesse caso faz a diferença.

Penso que não há dúvida, mas se deixarmos a Bíblia decidir o que está certo e o que está errado, os evangélicos estão certos em sua posição doutrinária. Se a Bíblia é verdadeira, os fundamentalistas estão certos.

Um ponto em que estamos errados e, ao mesmo tempo certos, está na ênfase relativa que damos às preposições para e de quando estas acompanham a palavra salvos. Por uma longa geração, defendemos a palavra da verdade ao mesmo tempo em que nos afastávamos dela em espírito porque estávamos preocupados com a questão do que fomos salvos em vez da questão para que fomos salvos.

A importância correta referente a estes dois conceitos é apresentada por Paulo em sua primeira epístola aos Tessalonicences: “(…) e como, deixando os ídolos, vos convertestes a Deus, para servirdes o Deus vivo e verdadeiro e para aguardardes dos céus o Seu Filho” (Ts.1:10).

O cristão é salvo dos seus pecados do passado. Ele não tem mais nada a ver com eles; esses pecados estão entre as coisas que devem ser esquecidas assim como o é a noite ao romper do dia. Ele também é salvo da ira vindoura. Também nada tem a ver com isso. Ela existe, mas não para ele. O pecado e a ira tem uma relação de causa e efeito, e uma vez que o pecado do cristão é anulado, a ira também é revogada. As preposições de da vida cristã dizem respeito a preposições negativas, e interessar-se profundamente por elas é viver em um estado de negação. Contudo, esta é a situação vivida por muitos cristãos sérios na maior parte do tempo.

Não fomos chamados para ter comunhão com a inexistência. Fomos chamados às coisas que existem na verdade, às coisas positivas, e é quando nos ocupamos com essas coisas que nossa alma é curada. A vida espiritual não pode se satisfazer com situações negativas. O homem que constantemente relembra as maldades dos dias em que não era convertido está olhando para a direção errada. É como um homem que tenta vencer uma corrida olhando pra trás por sobre os ombros.

O que o cristão costuma ser é a questão menos importante a seu respeito. O que deveria ser é tudo o que deveria lhe importar. Ele pode, de vez em quando, como fez Paulo, lembrar-se da vida que outrora levava para sua própria vergonha; mas isto não deve passar de um rápido retrospecto; nunca deve ser um olhar fixo. Nosso olhar permanente e prolongado está em Cristo e na glória que será revelada.(Cl.3:1-11;ITm.6:14-16)

Para que fomos salvos têm a mesma relação entre si como uma doença grave e a saúde recuperada. Curada a terrível doença, sua lembrança deve ser banida da mente a fim de que fique mais vaga e mais fraca uma vez que se trata de um fato muito distante; e o ditoso homem, cuja saúde foi restabelecida, deve continuar a usar sua nova força para realizar algo útil para a humanidade.

Contudo, muitas pessoas permitem que o estado debilitado de seu corpo limite sua capacidade mental de modo que, após o restabelecimento do corpo, elas ainda guardam o velho sentimento de invalidez crônica que sentiam antes. Estão restabelecidas, é verdade, mas não para alguma coisa. Basta imaginarmos um grupo de pessoas testemunhando todos os domingos sobre suas últimas enfermidades e entoando cânticos tristes sobre elas e teremos um quadro perfeito de muitas reuniões cristãs de hoje.

Há uma arte por trás do esquecer, e todo cristão deve tornar-se um mestre nela. Esquecer as coisas que ficaram para trás é uma necessidade positiva para que nos tornemos simples crianças em Cristo. Se não podemos confiar em Deus para lidar com eficiência com nosso passado, podemos pegar uma esponja e começar a apagá-lo. Cinqüenta anos sofrendo por nossos pecados não podem apagar a nossa culpa. No entanto, se Deus, de fato, nos perdoou e nos purificou, então, devemos dar a questão por encerrada e não perder mais tempo com lamentações que para nada mais servem.(ICO.5:17;Hb.10:14-23)

E, graças a Deus, o esquecimento súbito de nosso conhecido passado não nos deixa com um vazio. Longe disso. O bendito Espírito Santo de Deus corre para ocupar o lugar vazio deixado por nossos pecados e falhas, trazendo consigo toda novidade de vida. Uma nova vida, uma nova esperança, novas alegrias, novos interesses, uma nova obra significativa e, o melhor de todas as coisas, um novo e suficiente objeto para o qual voltar o olhar arrebatador de nossa alma. Deus agora enche o jardim restaurado, e não há razão para termos medo de caminhar e comungar com Ele no frescor do dia.

Bem aqui está o ponto de fraqueza de muitos cristãos atualmente. Não aprendemos o que devemos enfatizar. Em particular, não entendemos que fomos salvos para conhecer Deus, entrar em Sua presença repleta de milagres pelo novo e vivo caminho e permanecer nela eternamente. Fomos chamados para uma eterna preocupação em relação a Deus. O Deus Trino, com todo o Seu mistério e majestade, é nosso e somos dEle,e a eternidade não será longa o suficiente para experimentarmos tudo o que Ele é em termos de bondade, santidade e verdade.

Nos céus, a adoração extasiada da Divindade não cessa nem de dia nem de noite. Professamos estar a caminho deste lugar; não devemos começar agora a adorar na terra como adoraremos no céu?
        
A ESSÊNCIA DO CULTO BÍBLICO
         Haverá, em meio às múltiplas maneiras de cultuar, um sine qua non na adoração, um elemento que seja imprescindível? Cremos firmemente que há. Jesus reafirmou o que Moisés, no Antigo Testamento, deixou claro: o primeiro mandamento exige um amor a Deus, sem limites (Dt.6:4,5). Séculos depois que Deuteronômio foi escrito, um intérprete da lei levantou esta pergunta para Jesus: “Qual é o grande mandamento da lei?”   Respondeu o Mestre: “Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento”(Mt. 22:36-37). No texto original de Deuteronômio, encontramos a palavra “força” em lugar de “entendimento”. O texto de Marcos (12:30) transcreve ambos, “entendimento” e “força”, na resposta de Jesus. O cristão, cuja mente e coração estão voltados para o Criador e Pai Eterno, percebe nestas palavras de Jesus um verdadeiro desafio, pois nelas estão a raiz, o tronco e o fruto da adoração.

                   Sem o incentivo do amor por Deus, o culto não passa de palha, pura “casca”, isento de qualquer valor. Pode até se tornar em culto a Satanás. Uma adoração que se realiza sem o objetivo de expressar e aumentar nosso amor por aquele “de quem, e por meio de quem e para quem, são todas  as coisas” (Rm.11:36), falha completamente. Deixa de ser culto a Deus, pois carece da essência, que é o amor.
                   Ora, quando se trata de amor por pessoas amigas ou entes queridos da família, não encontramos dificuldades em atender o sentido de amar. Mas, como se há de amar a Deus, a quem “ninguém jamais viu”? (Jo.1:18) Como havemos de colocar o Senhor no centro de nossas ambições? Ou, como nutriremos a amizade que venhamos a oferecer a Deus, sendo nós pecadores, enquanto Ele é Espírito infinito e mora em luz inacessível? Como faremos de Deus o “Senhor absoluto” de nossa existência? Os cristãos, reunidos em adoração a Deus, devem ter este objetivo como prioritário.

Culto verdadeiro requer amor de todo o coração
                   Para o hebreu, o coração, no sentido metafórico, representava o centro da vida intelectual e espiritual. Associando-se de perto com a alma, o leitor original de Deuteronômio teria pensado em seus sentimentos, suas avaliações, sua vontade, todos emanando do coração. Esta realidade pessoal emite emoções tais como alegria, pesar, tranqüilidade e ansiedade. Igualmente alcança as áreas intelectuais tais como compreensão e conhecimento, e exerce o poder de raciocinar ou lembrar. Diríamos, enfim, que coração e alma representam o homem interior como um todo. Em seu coração o homem é responsável diante de Deus, em todos os seus atos e palavras. Somente um coração inclinado para Deus é capaz de adorá-lo, agradá-lo e amá-lo.
                   Tanto no Antigo Testamento como no Novo Testamento, o amor que há no coração é o alvo da busca de Deus. Ele se dirige ao coração porque ali está a sede do amor. Prof. Bruce Waltke, do Regent College, no Canadá, lembra-nos que antes de o Senhor mandar seu povo buscá-lo unicamente no lugar onde Ele estabeleceria seu nome (Dt.12), Deus, em seis capítulos antecedentes (Dt. 6-11), exorta os israelitas a darem-se a si mesmos inteiramente ao Senhor. “Circuncidai, pois, o vosso coração”  (Dt. 10:16). Pois é no coração que o Todo-poderoso toca, ao fazer contato conosco, “... aquela parte do homem ... onde, em primeira instância, se decide a questão pró ou contra Deus” (Gutbrod).

                   Por ser o coração essencialmente espiritual, mantendo o que resta da imagem de Deus no homem caído, é possível amar àquele que não tem corpo físico e nem existe ao alcance dos nossos cinco sentidos? Evidentemente, para amarmos a Deus, precisamos crer que Ele se revelou através de palavras por Ele inspiradas (II Tim. 3:16), e uma vez recebidas pelos profetas, homens por Ele escolhidos, estes fizeram seus devidos registros. Contudo, sua revelação não se limita à transmissão de conceitos comunicáveis por linguagem humana. Inclui atos que claramente evidenciam seu amor e paciência para com seres que têm negligenciado e ignorado as evidências do seu profundo interesse por eles. Inclui convicção criada por Deus no coração que ele decide abrir (At.16:14), para fazer brilhar a luz de sua personalidade (II Cor. 4:4,6). Resulta no reconhecimento do testemunho do Espírito Santo de Deus “com o nosso espírito que somos filhos de Deus” (Rm.8:16).

                   Enquanto Deus revela a si mesmo no íntimo do coração pela Palavra lida e recebida, pelo reconhecimento de sua ação no mundo e pela comunicação pessoal do Espírito residente, nós devemos responder em adoração a ele que declara e aprofunda nosso amor.

                   Uma moça presa numa casa em chamas foi resgatada por um jovem bombeiro que pôs sua própria vida em risco para retirá-la do incêndio. Ela sentiu profunda responsabilidade de agradecer-lhe o ato sacrificial. Poucos dias depois, a jovem, que foi resgatada, procurou o bombeiro para externar sua gratidão. Eles conversaram, passearam, e, finalmente, acabaram se casando. Ela, que devia a vida ao jovem bombeiro, passou a namorá-lo e, lentamente, um mero sentimento de gratidão transformou-se num amor profundo. Pagou uma dívida de vida com a oferta permanente do seu amor e mostrou sua alegria em conviver com aquele que arriscou sua vida para lhe resgatar.

                   Assim Deus procura uma comunhão por meio da experiência verdadeira com cada pessoa que experimentou passar da morte para a vida (Jo.5:24), pelo sacrifício de Jesus Cristo. O novo adorador começa com um sentimento de obrigação de servir a Deus no culto; vai aprendendo a amá-lo e progride até que todo o seu coração se concentre na beleza da pessoa do Senhor: “Eis que Deus é a minha salvação; confiarei e não temerei, porque o Senhor Deus é a minha força e o meu cântico... vós com alegria tirareis água das fontes da salvação” (Is.12:2,3). Davi, no deserto de Judá, disse: “Ó Deus, tu és meu Deus forte, eu te busco ansiosamente; a minha alma tem sede de ti” (Sl. 63:1). Desse modo se expressaram os que, na Antiga aliança, amavam a Deus.

                   É natural, para quem experimentou a “graça melhor do que a vida” (Sl. 63:3), descobrir um eco semelhante no seu coração. Agostinho afirmou, acertadamente, nas linhas bem conhecidas que deixou para a posteridade: “O homem mantém-se agitado até encontrar seu descanso em Deus”.

                   O evangelho é deveras uma posição doutrinária, mas antes é um relacionamento do cristão com Deus. “Se alguém me ama, guardará a minha palavra; e meu Pai o amará, e viremos para ele e faremos nele morada” (Jo. 14:23). “E nós o amamos porque ele nos amou primeiro”  (I Jo.4:19). Porque na realidade, “cada indivíduo dá seu coração àquilo que considera de máxima importância, e esta lealdade determina a direção e o conteúdo da sua vida”.

                   O general William Booth, fundador do Exército da Salvação, foi indagado acerca do segredo do seu sucesso. Hesitou um instante e, com os olhos cheios de lágrimas, respondeu: “Eu compartilharei o segredo. Deus tem se apoderado de tudo que há em mim. Podem ter havido homens com maiores oportunidades, mas desde o dia em que os pobres de Londres dominaram meu coração e ganhei uma visão daquilo que Jesus Cristo podia fazer, determinei que Deus teria tudo do que houvesse em William Booth. Se há algum poder no Exército da Salvação, hoje, é porque Deus tem recebido toda a adoração do meu coração, todo o poder da minha vontade e toda a influência da minha vida.

                   Concluímos que Deus nos quer como seus verdadeiros adoradores, por nos amar profundamente ( I Jo. 4:8,16) . Seu mandamento singular requer que nós o amemos de todo o coração e alma. Participar em todo e qualquer culto requer primeiramente uma melhor aproximação dele em amor. Assim, a adoração da igreja cumprirá seu objetivo se :

-        O louvor focalizar sua dignidade, a beleza da sua pessoa e a perfeição do seus caráter. Deve, ainda, convidar todo homem a atribuir glória ao Pai maravilhoso (Sl. 46:10);

-        A confissão do pecado que cometemos externar o reconhecimento da nossa indignidade e declarar nosso arrependimento pela rebelião contra a expressa vontade de Deus. Também, não deixa de ser um estímulo forte de amor, confiar no seu imediato e imerecido perdão (I Jo.1:9);

-        Nossa oração procurar assimilar seus pensamentos; expressar petições de acordo com seus conhecidos desejos. Amor genuíno funde os desejos dos que buscam o Reino e a vontade única de Deus;

-        A mensagem, ouvido ou lida, suscitar pensamentos de gratidão e encorajamento. Serão veículos de transformação de inimigos em amigos que a ele buscarão agradar (Jo.15:14,15);

-        A música atrair o coração para a beleza de Deus revelada na criação, na redenção e na regeneração, refletindo assim a harmonia do universo, por ele criado.

                   Enfim, quando adoramos, só devemos ficar satisfeitos se expressarmos o verdadeiro amor ou se nosso culto revelar toda a preciosidade do Senhor, infundindo-a nos participantes.

                   Certamente, reconhecemos que nunca alcançaremos um amor perfeito por Deus, à altura do amor que ele tem por nós, seus filhos. Se, como a Pedro, ele nos perguntasse: “Amas-me mais do que estes?”  (Jo.21:15), estaríamos prontos a responder-lhe: “Sim, Senhor, tu sabes que te amo”, mesmo sabendo que o vocábulo da pergunta de Jesus seja agape ( amor sacrificial decidido), em contraste com a resposta philos (amor de amizade e afeição). Amamos, mas não podemos confiar muito em nosso amor, nem nos orgulhar por declarações petrinas. Há o risco de uma lealdade falha.

O CULTO NO VELHO TESTAMENTO
                   A lei judaica determinava que os israelitas servissem a Deus na vida de cada dia, observando os preceitos e as instruções; ou então , mediante o culto celebrado em lugar sagrado e em hora regulamentada. Esta segunda forma, na BÍblia e em muitos idiomas, é denominada “serviço divino”. Não apenas uma instituição humana, mas antes uma expressão institucional do relacionamento recíproco entre Deus e o homem. Tanto do lado de Deus como do homem opera-se um agir e um falar. O lugar especial e o tempo certo separam o culto do dia a dia, bem como a presença do sacerdote como intermediário.

                   O serviço divino assim concebido foi introduzido como fruto maduro da teofania sinaítica; ao pé do monte sagrado, o grupo, transfuga do Egito e em caminho pelo deserto, experimentava pela primeira vez a sacralidade de um lugar a par com a palavra de Javé precedente da aparição de Deus, funcionando Moisés como medianeiro (Êx.19).
O CULTO PRÉ-MOSAICO
                   O culto é patrimônio comum do gênero humano. Em Gênesis 1 a 11 encontramos por duas vezes uma ação litúrgica: os sacrifícios de Caim e Abel, e a  oferta de Noé depois do dilúvio. Conclui-se daí com direito ser o culto fenômeno essencialmente humano de acordo também com as pesquisas da História das Religiões. Os sacrifícios descritos em Gênesis 1 a 11 representam dois tipos diferentes quanto à sua motivação. Caim e Abel ofereceram as primícias da lavoura e do rebanho, em ação de graças e para impetrar a bênção para o futuro. Já o sacrifício de Noé teve como fundo a salvação de perigo mortal. Os sobreviventes recomeçam sua vida olhando para o Salvador a quem pertence a vida recém doada. Ambos os motivos conservam seu valor até os tempos atuais. Honra-se ainda tanto o Deus benfeitor como o Deus redentor, no ritmo das solenidades anuais , a par com as ações cultuais motivados por ocasiões peculiares.

                   Os patriarcas celebraram o seu culto no seio da família nômade, em lugares improvisados, no alto de um monte, debaixo de uma árvore frondosa, junto a fonte de água. Alude-se apenas a um santuário a ser fundado futuramente (Gn.28), marcando então a transição para outra forma de vida.

                   Na inexistência de tempos sagrados festejavam-se certas ocasiões importantes, como a mudança das pastagens (antecipações da páscoa), o nascimento de filhos, imposição do nome à criança. O pai funcionava como intermediário, ele ou a mãe recebiam as palavras orientadoras e promissoras de Deus; o pai administrava a bênção. O sacrifício é motivado por objetivo fortuito, não por instituição regulamentada. A prece, igualmente, nasce da situação concreta (Gn.12:15,32). 

O CULTO E O TEMPO  - O SÁBADO E AS FESTAS
                   A adoração, quando expressa em ritual, exige tempo. Sob o antigo pacto, Deus fez provisão para períodos de tempo diários, semanais, anuais e mesmo de gerações, para o cumprimento da obrigação de culto em Israel. O sacrifício diário, o descanso do sábado ou do sétimo dia, os primeiros dias do mês e as cinco festas anuais do período pré-exílico foram divinamente determinados. “Tempos designados” (Num. 29:39) eram considerados centrais na expressão da adoração a Deus em Israel, porque eventos passados, nos quais Deus agira, nunca deveriam ser esquecidos.

                   O sábado, dia semanal de descanso e adoração é um exemplo fundamental do tempo consagrado a Deus. Embora alguém tenha se referido ao sábado como uma criação singular do gênio religioso hebraico e uma das contribuições hebraicas mais valiosas à civilização da humanidade, a Bíblia simplesmente atribui a santidade do sétimo dia à lei de Deus. Ele foi fundamentado no descanso de Deus após a criação (Gn.1:1-2,3). O quarto mandamento impõe rigidamente a sua observância. Ele foi tanto abençoado como santificado por Deus (Ex.20:11). Sendo uma parte integral do pacto, Israel aceitou a observância do sábado como um sinal exigido de submissão nacional a Deus (Ex.31:13). Em resumo, esta festa semanal foi instituída para lembrar ao homem a sua responsabilidade de adorar a Deus em tempos e lugares determinados, bem como para proporcionar ao corpo físico o descanso necessário.
                   Apesar da cessação de toda obra, os sacerdotes continuavam o seu serviço (Lv.24:8); a circuncisão era executada; o sábado, embora sendo apenas uma observância semanal, foi incluído nas “festas fixas do Senhor” (Lv.23:1-3), “uma convocação santa”, não devendo ser profanada. Quer visitando um profeta, quer participando da adoração no templo, os hebreus encarregados de tal serviço o consideravam coincidente com a santidade do sábado. Isaías desafiou os seus leitores a se desviarem dos seus próprios prazeres e “se deleitarem no Senhor” (58:13). Muitos outros textos poderiam ser citados para mostrar qual significado o dia deveria ter para os israelitas (Sal.92).

                   Durante e após o exílio, a proeminência do sábado aumentou. O surgimento da sinagoga aumentou ainda mais a centralidade da adoração no sábado (Lc.4:16).         

                   Por ocasião das festas anuais, em Israel e em muitas outras religiões, as famílias visitavam o templo. Os vários elencos das festas, com ligeiras modificações, são os seguintes : Êx.23:14-19, 34:18-26. Originariamente festas cananéias, os israelitas as assumiram depois da sua imigração para Canaã. De acordo com o ritmo anual celebravam-se as bênçãos divinas da sementeira e da colheita. Somente a festa da Páscoa regride até a época do nomadismo, refletindo as mudanças periódicas das pastagens, embora recebendo novo conteúdo no tempo da saída do Egito (Êx.12).

                   As festas agrícolas de Canaã receberam uma dose de historicidade em combinação com os eventos ocorridos entre Javé e o povo. E foi esta re-interpretação que preservou as solenidades de sua total paganização, posto que também em Israel permanecessem ligadas à lavoura. O caso mais eloqüente de um historicização é a festa da Páscoa que se transformou em memória das origens de Israel.
                   A páscoa lembra ainda outra evolução significativa do culto divino em Israel. Na sua qualidade de festa pastoril, ela foi celebrada na intimidade da família; crescendo, porém, a importância do templo em Jerusalém, todos os festejos foram transferidos para lá, entre eles também a páscoa. Destruído o templo, ou talvez já um pouco antes, a celebração desta festa voltou para a família. Vê-se daí que as festas não dependiam exclusivamente do santuário.

                   Outra faceta da evolução era a coincidência direta com o objetivo agrícola, como, por exemplo, a vindima. Tempos depois, sua data passou a depender de calendário fixo e nem sempre simultâneo com o seu objetivo.

LUGAR SAGRADO - O TEMPLO
         Na adoração do antigo Israel, o espaço sagrado era comparável em importância, aos tempos divinamente designados. Deus escolheu locais especiais para se revelar no decorrer da história vétero-testamentária. Especialmente após o êxodo e a instituição da lei, o levantamento do tabernáculo significava localizar a glória de Deus no Lugar Santo. Deus proibiu Israel de erigir altares sacrificiais em qualquer lugar onde seu nome residisse (Dt.12:5) Nos recessos inacessíveis do Santo dos Santos, aquele aposento santo, respeitável primeiramente no tabernáculo e depois no templo onde Deus “residia”, ficavam o propiciatório e a arca que continha as tábuas da sua lei. Ali, o sangue da expiação pelos pecados da nação era aspergido, no mais solene rito anual de adoração (Lv.16). A adoração é o protocolo pelo qual se pode entrar na presença divina.

         O Santo dos Santos representa o monte Sinai, onde Deus se encontrou com Moisés, dando-lhe sua palavra e mostrando-lhe a sua glória. Assim, o tabernáculo e , posteriormente, o templo se tornaram extensões históricas daquele encontro, o modelo de adoração para o povo eleito. O templo era o único local de sacrifícios, consagrações e entrega de dízimos agradável a Deus. Jesus mostrou grande respeito pelo templo, purificando-o para realçar sua santidade. Contudo, apesar da identificação do templo com a “casa do Pai”, assim mesmo ele foi destinado à destruição. Jesus declarou que um templo “não feito por mãos” estava destinado a tomar o lugar da temível grandiosidade da arquitetura herodiana (Mc.14:58). O término do templo ocorreria na associação da sua morte com a invasão romana. A ressurreição do corpo de Jesus, então , criaria um templo de uma ordem distinta para o substituir, um conceito compreensível aos discípulos depois da ressurreição apenas com a ajuda do Espírito Santo.

O caráter sagrado do templo não era absoluto, isto é, não se impunha a separação do ambiente considerado “profano”, fora do lugar santo; ele era entes funcional, na sua qualidade de fonte de bênçãos para o país, retribuindo o país estas bênçãos em forma de ofertas para o culto do templo. A santidade do templo teve a sua concretização quando os habitantes do país a ele se dirigiram, retornando às suas casas repletos do que lá haviam recebido. Este vaivém das casas para o templo e do templo para as casas perfaz um elemento essencial do culto e da sacralidade. Nas procissões e nas peregrinações, igualmente, revelava-se a consciência da santidade funcional da casa de Deus. Já no templo concebido por Ezequiel, o caráter sacral é diferente: a glória de Javé abandonara a sua habitação no meio do povo, juntamente com a ameaça do juízo definitivo e voltaria somente para residir num templo restaurado e com os ministérios purificados.

O SACRIFÍCIO
         Considerando que o homem é pecador, ele precisa de um sacrifício propiciatório para remover qualquer ofensa que o separe de Deus, de modo que possa ter comunhão com seu Criador. Como “Moisés... se interpôs, impedindo que sua cólera os destruísse” (Sal.106:23); assim o sacerdote e o pecador sob a égide do Antigo Pacto se uniam para oferecerem a Deus uma vítima sacrificial em propiciação. Seguindo as ordens divinas, os pecadores gozavam da bênção de pecados cobertos (Sal.32:1) ou apagados (Is.43:25). Há, contudo, uma verdade básica a ser lembrada. “Deus não é influenciado por meio de sacrifício sacerdotal... É realmente o próprio Deus quem realiza o ato de perdão e expiação, mas o culto sacerdotal é designado como resposta ao seu ato e como testemunho da purificação do pecador.

Quatro tipos distintos de sacrifício eram prescritos:
         1 - A oferta queimada, significando literalmente “aquilo que ascende” (Lv.1:6,8-13). Ela produzia um “sabor de satisfação”  de modo que do altar, no tribunal da casa de Deus, um fogo perpétuo e o sacrifício pudessem, duas vezes por dia, “simbolizar a resposta do homem à promessa de Deus. Apenas o melhor animal, um macho sem mácula, podia ser oferecido, o que sugere a máxima devoção. A imposição de mãos retratava a identificação completa.

         2 - A oferta de manjares era literalmente chamada uma “dádiva”. Oferecida junto com a oferta queimada e a oferta pacífica, ela exigia “o sal da aliança do teu Deus” (2:13). A “porção memorial”, queimada com incenso ao Senhor, tinha como objetivo trazer a aliança à lembrança de Deus. O simbolismo sugeria que Deus era o convidado de honra.

         3 -  A oferta pacífica (Lv.3:7,11-14). Seguindo um ritual preparatório idêntico àquele de quem apresentou a oferta queimada, o ofertante comia o sacrifício com alegria diante do Senhor. Não era permitido que a festa resultante durasse mais que um dia, para garantir que um número de amigos fosse incluído. Ela expressava a plenitude e o bem-estar denotados pela paz de Deus, compartilhada com sacerdotes e amigos.

         4 - As ofertas pelo pecado e pela culpa (Lv.4:1-6,7). Distintas das três festas anteriores que eram voluntárias, estas eram exigidas quando um pecador quebrava a lei de Deus e tinha o seu relacionamento interrompido com o Criador. Nem a congregação nem o Sumo sacerdote estavam sem pecado; conseqüentemente, eles precisavam de sangue para ser aspergido diante do véu e aplicado aos dois altares. Uma vez por ano o sangue expiatório tinha de ser levado para dentro do véu. Os objetivos desse sacrifício eram a restauração da comunhão e o acesso à presença de Deus.
O CULTO CRISTÃO NA IGREJA PRIMITIVA
                   O que sabemos do culto cristão nos dá uma idéia do modo como aqueles cristãos do primeiro século percebiam e experimentavam sua fé. Com efeito, quando estudamos o modo como a igreja antiga adorava, nós nos apercebemos do impacto que sua fé deve ter tido para as massas depojadas que constituíam a maioria dos fiéis.

                   Desde o princípio, a igreja cristã costumava se reunir no primeiro dia da semana para “partir o pão”. A razão pela qual o culto tinha lugar no primeiro dia da semana era que nesse dia se comemorava a ressurreição do Senhor. Logo, o propósito principal do culto não era chamar os fiéis à penitência, nem fazê-los sentir o peso de seus pecados, mas celebrar a ressurreição do Senhor e as promessas das quais essa ressurreição era a garantia. ~E por isso que o livro de Atos descreve aqueles cultos dizendo que “ partindo o pão nas casas comiam juntos com alegria, e singeleza de coração” (Atos 2:46) . A atenção naqueles cultos de comunhão não se centralizava tanto nos acontecimentos de Sexta-feira santa como nos do domingo de ressurreição. Uma nova realidade havia amanhecido, e os cristãos reuniam-se para celebrá-la e fazerem-se participantes dela.

                   A partir de então e através de quase toda a história da igreja, a comunhão tem sido o centro do culto cristão. ~E somente em época relativamente recente que algumas igrejas estabeleceram a prática de se reunir para adorar aos domingos sem celebrar a comunhão.
                   Além dos indícios que nos oferece o Novo Testamento e que são de todos conhecidos , sabemos acerca do modo em que os antigos cristãos celebravam a ceia do Senhor graças a uma série de documentos que perduraram até nossos dias. Mesmo que não possamos entrar em detalhes acerca de cada um destes documentos, e das diferenças entre eles, podemos assinalar algumas das características comuns, que parecem ter formado parte de todas as celebrações da comunhão.
                   A primeira delas, a que já nos aludimos anteriormente, é que a ceia do Senhor era uma celebração. O tom característico do culto era o gozo e a gratidão, e não a dor ou a compunção. No princípio, a comunhão era celebrada em meio de uma refeição. Cada qual trazia o que podia, e depois da comida em comum, celebravam orações sobre o pão e o vinho. Já em princípios do século segundo, entretanto, e possivelmente devido, em parte, às perseguições e às calúnias que circulavam acerca das “festas de amor” dos cristãos, começou a se celebrar a comunhão sem o refeição em comum. Mas sempre se manteve o espírito de celebração dos primeiros anos.
                   Pelo menos a partir do século segundo, o culto de comunhão constava de duas partes. Na primeira liam-se e comentavam-se as Escrituras, faziam-se orações e cantavam-se hinos. A segunda parte do culto começava geralmente com o ósculo da paz. Logo alguém trazia o pão e o vinho para frente e os apresentava a quem presidia. Em seguida, o presidente pronunciava uma oração sobre o pão e o vinho, na qual se recordavam os atos salvíficos de Deus e se invocava a ação do Espírito Santo sobre o pão e o vinho. Depois se partia o pão, os presentes comungavam, e se despediam com a benção. Naturalmente, a esses elementos comuns acrescentavam-se muitos outros em diversos lugares e circunstâncias.

                   Outra característica comum do culto nesta época é que só podia participar dele quem tivesse sido batizado. Os que vinham de outras congregações podiam participar livremente, sempre e quando estivessem batizados. Em alguns casos, era permitido aos convertidos que ainda não tinham recebido o batismo assitir à primeira parte do culto - isto é, as leituras bíblicas, as homilias e as orações - mas tinham que se retirar antes da celebração da ceia do Senhor propriamente dita.
         Outro dos costumes que aparece desde muito cedo era celebrar a ceia do Senhor nos lugares onde estavam sepultados os fiéis já falecidos. Esta era a função das catacumbas. Alguns autores dramatizaram a “igreja das catacumbas”, dando a entender que estas eram lugares secretos em que os cristãos se reuniam para celebrar seus cultos escondidos das autoridades. Isto é um exagero. Na realidade as catacumbas eram cemitérios e sua existência era conhecida pelas autoridades, pois não eram só os cristãos que tinham tais cemitérios subterrâneos. Mesmo que em algumas ocasiões os cristãos tenham utilizado algumas  das catacumbas para se esconder dos seus perseguidores, a razão pela qual se reuniam nelas era que ali estavam enterrados os heróis da fé.

OS BATISMOS
                   Segundo já foi dito anteriormente, só quem havia sido batizado podia estar presente durante a comunhão. No livro de Atos, vemos que tão logo alguém se convertia era batizado. Isto era possível na primitiva comunidade cristão, onde a maioria dos conversos vinha do judaísmo, e tinha, portanto, certo preparo para compreender o alcance do Evangelho. Mas conforme a igreja foi incluindo mais gentios tornou-se cada vez mais necessário um período de preparo e ensino da palavra após a ministração do batismo (Mt.28:19,20 – Batizando-os ...; ensinando –os a guardar...). Este período recebe o nome de “ catecumenato” , e no princípio do século terceiro durava uns três anos. Durante este tempo, o catecúmeno recebia instrução acerca da doutrina cristã, e tratava de dar mostras em sua vida diária da firmeza de sua fé. Por fim, pouco tempo antes de sua consagração ao ministério, era examinado e era admitido e estava prontos para servir  na Igreja e ao ministério.
A PRÁTICA DA ADORAÇÃO
                   Deus mandou que seu povo, sob a Antiga Aliança, cumprisse ao pé da letra todas as suas instruções a respeito da adoração. Ele advertiu Moisés sobre a construção do Tabernáculo. Tinha de ser “segundo a tudo o que eu te mostrar para modelo de todos os seus móveis, assim mesmo o fareis” (Êx.25:9). Os detalhes que Deus comunicou ao chefe da nação foram dados para que o povo não se desviasse em nenhum ponto da vontade estipulada por Deus. O temor de Deus arraigado no coração do piedoso israelita, não permitia que ele desobedecesse conscientemente qualquer regrinha que regulamentava o ritual dos cultos (Dt.6:1,2). Foi Deus quem planejou a participação dos sacerdotes e levitas no culto que Ele mandou que oferecessem (Nm. 8:1  I Cr. 9:33  23:5  II Cr. 29:25, etc.) .

                   Após a leitura do Antigo Testamento, estranhamos o fato de não descobrirmos no Novo Testamento regras explícitas para nos informar que tipo de culto Deus quer. Numerosas pesquisas, feitas com o intuito de descobrir as diretrizes que devem reger a forma de adoração realmente neo-testamentária, criam pouca convicção além daquela formada na cabeça do estudioso. Ele descobre, geralmente, o que procura. Tudo isto poderia levar-nos a desvalorizar a prática nos cultos da igreja primitiva. Mesmo assim, cremos que é válido examinar as indicações sobre as formas de adoração nos escritos dos apóstolos.
        
                   Após o derramamento do Espírito Santo no dia de Pentecoste, a igreja de Jerusalém “ perseverava na doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas orações” (At.2:42). Este verso nos traz um breve esboço dos componentes do culto primitivo. As práticas sob a tutela dos apóstolos fornecem-nos um fundamento geral, mas seguro. Adoração, para manter o padrão apostólico, deve se aprimorar no ensino, comunhão, celebração da ceia e oração.

A DOUTRINA DOS APÓSTOLOS
                   Adoração e doutrina apóiam-se mutuamente, porque um culto oferecido na ignorância evapora (Jo.4:22 At.17:23), carece de substância e de verdade. Doutrina não significa apenas granjear informação. Não foi uma aula bíblica acadêmica que os apóstolos ministraram, mas ensinamentos junto com apelos aos discípulos para que acatassem as diretrizes do Senhor. Quando igrejas do século XX dão uma ênfase exagerada à transmissão da informação e não à sua expressão, elas promovem depressão espiritual.

                   Jesus convocou os seus discípulos a “discipularem todas as nações” (Mt. 28:19). O primeiro passo foi o batismo que representava um compromisso público, total, com o Senhor Jesus Cristo. Em seguida, Jesus ordenou aos apóstolos que ensinassem aos futuros discípulos da segunda geração a “guardar todas as coisas” que Ele ensinara a seus seguidores. Esses ensinos foram exemplos práticos em torno de uma nova compreensão do relacionamento com Deus.
                   Dentro do culto primitivo, os novos discípulos recebiam a orientação sobre a vida consagrada, que glorifica a Deus (I Pd.1:16). Quando os assistentes novatos no culto da igreja de Jerusalém ou Antioquia ouviam pela primeira vez : “ vinde a mim todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para as vossas almas” (Mat.11:28), certamente sentiram o impulso do Espírito para renovarem sua confiança em Jesus, e queriam entender num sentido prático o que significaria levar o “jugo suave” do Senhor.
                   A adoração, na prática, deve dar lugar central à palavra de Deus porque ele assim ordena. “Pregue a Palavra” (II Tm.4:2) representa a preocupação de Paulo com a igreja de Éfeso. Um homem que almeja o pastorado precisa ter uma qualidade que lhe recomende a conduzir os cristãos num culto verdadeiro. Ele deve ser apto para ensinar. Ensino requer entendimento, explicação, relacionamento entre o ouvinte e o Pai.

COMUNHÃO - A CEIA DO SENHOR
                   Junto com o serviço da palavra, a primeira igreja da história perseverava na comunhão (At.2:42). Lucas explica algo mais a respeito desta comunhão nos versos subseqüentes. Os crentes ficavam juntos indica que estavam juntos como família de Deus, isto é, regularmente, e tinham tudo em comum. Marshall sugere que “ não seria surpreendente... que pelo menos um outro grupo contemporâneo judaico, a seita de Cunrã, adotasse este modo de vida.”
                   A adoração genuína conduz-nos à lembrança de que não somos de nós mesmos. Fomos comprados por preço infinitamente alto. Conseqüentemente, somos escravos de Deus e dos membros do Seu Corpo. Ações de graça pelo sacrifício do Filho de Deus incitam os filhos beneficiados a indagar como se  desincumbir da obrigação imposta. Que presente digno devemos trazer para o altar cristão?
                   O pano de fundo da eucaristia cristã descobre-se na refeição da Páscoa. Esta celebração consistia de duas partes : primeira, “enquanto comiam”, e segunda, “depois de cear” (I Cor.11:24). O que Jesus insistiu originalmente era repetido como duas partes de uma refeição maior - ágape ou “ festa de amor”, com a intenção de beneficiar os cristão mais carentes da igreja. Esta refeição, que substituiu a Páscoa dos judeus, era tomada diária ou semanalmente. Percebe-se pela leitura de I Cor. 11:17-22, que esta refeição era a “ Ceia do Senhor”, que reunia todos os membros da família de Deus. além de relembrar a morte de Jesus e a inauguração da Nova aliança, a Ceia confirmava, de maneira inconfundível, que todos os participantes tinham uma vida em comum. Ricos e pobres, livres e escravos, todos se comprometiam diante de Deus a ter e manter uma responsabilidade mútua, uns pêlos outros.
                   O caráter dessa refeição não se evidencia somente numa dramatização do sacrifício único do Filho de Deus pêlos nossos pecados, mas era também uma demonstração da adoração que tem implicações horizontais. Daí, o veemente protesto de Paulo, em Corinto, diante da negação na prática da comunhão que a ceia devia demonstrar. “... não é a ceia do Senhor que comeis. Porque ao comerdes, cada um toma antecipadamente a sua própria ceia”  (I Cor. 11:20). Agindo assim, profanavam o Corpo de Cristo formado pela morte e ressurreição. Comiam e bebiam juízo para si.
                   Os cristãos que comem juntos no culto são integrados num corpo comparável ao corpo humano. Uma vida ou personalidade ocupa a unidade física humana, de tal forma que nenhuma parte pode se desligar sem prejuízo para as outras, nem podem desprezar uma à outra, nem devem ter inveja. 
AS ORAÇÕES
Um dos elementos que têm destaque no culto da igreja primitiva é a oração. O judeu do primeiro século dificilmente podia imaginar um culto sem orações, pelo menos na sinagoga. Conseqüentemente, era natural que os primeiros cristãos continuassem essa prática, ainda que com algumas modificações. A importância básica das orações é notada no nome “lugar de oração” (At.16:13). Em Filipos, uma colônia romana, não havia os dez homens necessários para formar uma sinagoga, mas havia um lugar de orações, onde mulheres se reuniam. Paulo e Silas não sentiram nenhum embaraço ao participarem desse primeiro culto “ecumênico”, transformando o que antes era especificamente judaico em culto cristão. Daquele local foi feito um palco para anunciar o evangelho.

Jesus ensinou que a oração deve ser particular (Mat.6:6) e pessoal. Ele pouco falou sobre oração em comunhão com outros irmãos , com exceção da famosa afirmativa: “Se dois dentre vós, sobre a terra, concordarem a respeito de qualquer coisa que porventura pedirem, ser-lhes-á concedida por meu Pai que está nos céus”(Mat.18:19), relacionada com o contexto de disciplina na igreja. Sua própria prática foi de orar sozinho, num monte ou lugar afastado (Lc.6:12).

Ainda que pensando num sentido mais geral, a oração se distingue da adoração pela preocupação do suplicante com suas necessidades, enquanto a adoração conceitua a alma sobre seu Deus. Um comentário puritano sobre o Salmo 107 dizia: “A miséria instrui maravilhosamente a pessoa na arte de orar”.

Mas as orações bíblicas valorizam a comunhão com Deus. Como aparelhos complicados, projetados para uma função particular, deixamos de alcançar o objetivo de nossa existência fora da comunhão que a oração cria. Egoísmo, soberba e murmuração aniquilam a comunhão. Somos, então como quem tenta martelar um prego com sabonete. Orar de verdade quer dizer abandonar a rebelião e aceitar a reconciliação. Jesus quis ensinar, acerca da oração , a verdade incomparavelmente preciosa de que Deus deseja nossa comunhão. Ele nos ama mais do que um pai humano é capaz (Lc.11:11-13). Ele deseja ouvir as nossas necessidades e supri-las (Mat.7:7-11). Amar a Deus acima de todo objeto por ele criado só pode significar que ele quer ser conhecido e desejado pelas suas criaturas. Por isso, as orações dos santos são qualificadas como o incenso que enche os vasos de ouro nas mãos dos 24 anciãos que rodeiam o trono do Senhor do universo (Apc.5:8). O altar de incenso do propiciatório simbolizava o prazer com que Deus recebia os louvores e petições do seu povo.

O CÂNTICO NO NOVO TESTAMENTO
                   Surpreendentemente encontramos poucas referências ao cântico no Novo Testamento. Os evangelistas relatam que Jesus cantou um hino (Mat.26:30 Mac.14:26) após a celebração da Páscoa. Paulo e Silas “cantavam louvores a Deus” na prisão em Filipos, na contundente ocasião após seu espancamento e antes do terremoto que abriu as portas da prisão. Acreditamos que essa música evangelística concorreu para a conversão do carcereiro (At.16:25). O autor de Hebreus cita Salmo 22:22 : “Cantar-te-ei louvores no meio da congregação” (2:12). Paulo cita o Salmo 18:49: “... cantarei louvores ao teu nome”(Rm.15:9).

                   Mas, ainda que referências à música sejam raras no Novo Testamento, seguramente o soar de vozes em louvor a Deus teve muito destaque nos cultos dos primórdios da igreja. “Cânticos espirituais” (Cl.3:16), surgiram, provavelmente, por inspiração imediata do Espírito Santo. W.Lock identifica tais composições como semelhantes a alguns cânticos preservados no Novo Testamento. No Apocalipse, várias referências aos cânticos dos adoradores celestiais revelam características de exultação e júbilo na contemplação da vitória retumbante de Deus e Seu Filho sobre todas as forças do maligno.

                   Os “salmos” (Cl.3:16) provavelmente são os mesmos do Antigo Testamento, amados por nós e lidos em nossos cultos. Ocasionalmente cantamos porções de alguns salmos. Nas igrejas que se reuniam nas casas, no primeiro século, o entoar de salmos deve ter sido comum, “formando parte do culto religiosos e da fraternidade cristã”. Nas sinagogas, os judeus cantavam salmos, como também os essênios do Mar Morto.

                   Os “hinos” também, provavelmente, referem-se aos hinos de louvor a Deus e a Cristo, compostos espontaneamente por cristãos no momento do culto, ou em outras horas. McDonald escreve: “É de se esperar a priori, que um movimento que suscitou tanta emoção, lealdade e entusiasmo, encontre expressão em cântico”. Avivamentos e despertamentos religiosos, com o passar dos séculos, estimularam o louvor por meio da música; seria estranho se no primeiro século não houvesse aparecido expressões musicais para tornar a adoração mais real e agradável.

                   Estas três palavras, “salmos, hinos e cânticos”(Cl.3:16), tomadas juntas, descrevem de modo global o âmbito da adoração expressa pela música e estimulada pelo Espírito. O termo “espirituais” refere-se a todas as formas de expressão de louvor contidas nos três termos, ainda que não possamos precisar as formas exatas da expressão musical.

O CULTO E OS DONS ESPIRITUAIS
                   Passando a descrição do culto em Atos para Romanos e I Coríntios, descobrimos que o exercício dos dons do Espírito deve ser encarado como uma expressão de culto a Deus. Somente no caso dos dons serem motivados por amor genuíno pelos irmãos e por Deus é que podemos encaixá-los no quadro de um culto genuíno, “em Espírito e em verdade”.

                   Paulo lembra aos romanos que a oferta de seus corpos a Deus é um ato de adoração espiritual, se, contudo, esses mesmos corpos estiverem sujeitos ao Cabeça para servir, profetizar, ensinar, exortar, contribuir, presidir e exercer misericórdia (Rm.12:1-8). Certamente a lista pode ser estendido para incluir todo e qualquer ministério. A vida do cristão, se não se isolar da família de Deus, nem se separar do próprio Senhor, expressará adoração nas reuniões ou nas atividades do dia a dia.
                   A significação dos cultos nos quais a congregação se reunia alcançou relevância particular na concentração de vozes louvando e ensinando juntas, com corações sedentos, aprendendo e aplicando a palavra. Era um ocasião apropriada para o treinamento dos santos para servirem a Deus dentro e fora das reuniões. Os dons de apóstolo, profeta, evangelista, pastor e mestre cooperam e fecundam no centro do culto para encorajar o bom ajustamento, o auxílio de toda junta e a cooperação de cada parte, o que “efetua o seu próprio aumento para a edificação de si mesmo em amor”(Ef.4:16).

O CULTO NA IGREJA COMPARADO
 AO CULTO JUDAICO
                   O cristianismo é bipolar pela sua própria natureza. Esses dois polos são o conteúdo da fé, fundamentado na sua mensagem revelada, e a adoração prática, através da qual o cristão e Deus mantêm comunhão. Ambos os polos não são fortalecidos repelindo-se ou ignorando-se, mas são vitalizados por apoio mútuo. A avaliação de W.Tozer sobre a adoração do cristianismo evangélico como “a jóia perdida” reflete a dicotomia insalubre entre a verdade proclamada e a vitalidade da adoração, hoje. Podemos criticar a observação: “Em toda a parte os cristãos estão perdendo o interesse, passando a simplesmente simular na igreja”, pois milhares de protestante, católicos e cristãos ortodoxos estão satisfeitos em participar de maneiras vazias, porém rígidas, com apenas uma vaga percepção do conceito bíblico de adoração em  Espírito e em verdade.

                   De um modo geral, os cristão não estão consciente de que sua adoração reflete a teologia prática da comunidade onde estão inseridos. O cunho puritano no dito “a finalidade principal do homem é glorificar a Deus e gozá-lo para sempre”  é inequívoco. Os puritanos focalizaram o significado da existência inteira do homem em glorificar a Deus e deleitar-se em sua comunhão , porque este era o único resultado prático de suas crenças. A adoração centralizada no homem tende a negar a realidade do coração que confessamos. De um lado, a lei ameaça deslocar a graça como o motivo fundamental para se adorar a Deus. Tanto o hábito quanto a busca da paz espiritual devem ser suspeitos quando procuramos uma base lógica e bíblica para a adorar a Deus. Em resumo, a liturgia é teologia representada, a resposta humana a Deus e ao seu favor. As formas persistem enquanto o conteúdo evapora ou muda o seu centro de Deus para o homem. Assim, o liberalismo nega realidade de um Deus que está presente. Fazendo assim, não pode evitar de transmutar as verdades religiosas em mitos. O resultado é visto em toda parte na secularização do “pós-cristão que atingiu a maioridade”. A teologia da libertação procura contextualizar a adoração num programa de ação sócio-político. Assim, o despertamento da consciência torna-se identificável com a percepção de Deus no processo da história.

                   Os evangélicos têm tendência de separar a centralidade do senhorio de Cristo, biblicamente fundamentada, do viver cotidiano, de modo que a adoração se torna, com efeito, compartimentada em cápsulas de uma hora de duração, não sendo levado em consideração quão importante pode ser o ato de se “invocar o nome do Senhor juntos”. Mas o Novo Testamento projeta uma visão de adoração que invade toda a vida com a presença e a glória de Deus. O objetivo desse estudo é mostrar, através de um exame dos conceitos de tempo, templo, sacrifício e sacerdócio, como o Novo Testamento refundiu as formas vétero-testamentárias da adoração sem anular a importância da reunião da igreja.

                   A Bíblia apresenta a questão do culto de Gênesis a Apocalipse. Das ofertas de Caim e Abel até a adoração dos seres celestiais. No transcorrer da história bíblica, Deus vem ensinando o seu povo a cultuá-lo. No Velho Testamento, as formas exteriores do culto eram as mais enfatizadas. Percebemos que elas tinham um objetivo didático afim de trazer à percepção humana realidades espirituais. No Novo Testamento, a utilização de tais recursos fica reduzida a um número bem pequeno. Na Nova Aliança, o culto é, antes de tudo, uma forma de vida. Seja o comer, o beber, o falar, tudo deve ser feito para a glória de Deus. Não obstante, as reuniões da igreja, que chamamos de cultos, têm grande importância nesse contexto. Elas constituem o culto coletivo, oportunidade de comunhão e ensino. Sua ênfase é espiritual e não tanto ritual. Assim sendo, dependemos do Espírito Santo para realizarmos um culto aceitável diante de Deus. Em outras palavras, o culto verdadeiro é aquele cuja essência provém do próprio Deus e a ele retorna.

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