sexta-feira, 6 de março de 2020


FACULDADE DE TEOLOGIA TESTEMUNHAS HOJE


CURSO LIVRE
OS EVANGELHOS







CONCEITO GERAL
INTRODUÇÃO
Os quatro Evangelhos compreendem cerca de 46 por cento no Novo Testamento. A igreja primitiva colocou os Evangelhos no início do Cânon do Novo Testamento, não por serem eles os primeiros livros escritos, mas por serem o fundamento sobre o qual Atos e as Epístolas são edificados. Os Evangelhos ao mesmo tempo se originam do Antigo Testamento e o cumprem, bem como fornecem um cenário histórico e teológico para o restante do Novo Testamento.
A palavra grega euaggelion se refere às “boas novas” ou “alegres novas” acerca de Jesus Cristo, que foi oralmente proclamado. Mais tarde veio a ser também sido escrito depois, a igreja primitiva considerou somente os quatro Evangelhos, da forma que os conhecemos, como dotados de autoridade e divinamente inspirados. Foram distinguidos uns dos outros pela preposição grega kata (segundo), acompanhada pelo nome do escritor. A presente ordem dos quatro Evangelhos remonta pelo menos ao final do segundo século, e cria-se ser esta a ordem em que eles foram escritos. Embora haja quem teorize que os Evangelhos foram originalmente escritos em Aramaico, não há evidência real para tal posição. Os habitantes da Palestina eram primariamente bilíngües (aramaico e grego), e muitos eram trilíngües (hebraico ou latim). O grego, porém, era o idioma comum de todo o império, e por isso o mais adequado veículo para as narrativas evangélicas.
A forma literária dos Evangelhos não tinha correlativo na literatura helênica. Embora eles estejam saturados de material biográfico, na realidade são perfis temáticos que omitem quase inteiramente os trinta anos preparatórios para o ministério público relativamente breve de Cristo. Mesmo esta porção de sua vida se apresenta numa forma altamente assimétrica, com ênfase em sua última semana. Enfim, apenas cerca de cinqüenta dias do ministério de Jesus são focalizados nos Evangelhos combinados.
Os quatro relatos complementares fornecem um retrato composto da pessoa do Salvador, operando juntos para fornecer profundidade clareza à nossa compreensão da mais singular figura da história humana. Neles Jesus é visto como divino e humano, o Servo soberano, O Deus-homem. Cada Evangelho tem uma dimensão distintiva a acrescentar, de sorte que o total é maior que a soma das partes.
A Bíblia num relance
O Dr. William H. Griffith Thomas sugere quatro palavras, a fim de ajudar-nos a ligar toda a revelação de Deus:
PREPARAÇÃO...No Antigo Testamento Deus prepara o mundo para a vinda do Messias.
MANIFESTAÇÃO...Nos 4 Evangelhos, Cristo entra no mundo, morre pelo mundo e funda a sua Igreja.
APROPRIAÇÃO... Em Atos e nas Epístolas, são apresentadas maneiras pelas quais o Senhor Jesus foi recebido, apropriado e aplicado à vida das pessoas.
CONSUMAÇÃO... No Apocalipse revela-se o resultado do plano perfeito de Deus.
O que é o Evangelho
Às boas-novas a respeito de Jesus Cristo, o Filho de Deus são-nos apresentadas por quatro autores: Mateus, Marcos, Lucas e João, embora exista só um Evangelho, a bela história da salvação por Jesus Cristo, nosso Senhor.
A palavra “Evangelho” nunca é usada no Novo Testamento para referir-se a um livro. Significa sempre “boas-novas”. Quando falamos do Evangelho de Lucas, devemos compreender que se trata das boas-novas de Jesus Cristo conforme foram registradas por Lucas. Entretanto, desde os tempos antigos o termo, “evangelho,” tem sido usado com referência a cada uma das quatro narrativas da vida de Cristo.
Originalmente essas boas-novas eram transmitidas pela palavra falada. Os homens iam de lugar em lugar, contando a velha história. Depois de algum tempo fez-se necessário um registro escrito. Mais de uma pessoa tentou fazê-lo, mais sem êxito. Veja o que Lucas diz: “Visto que muitos houve que empreenderam uma narração coordenada dos fatos que entre nós se realizaram, conforme nos transmitiram os que desde o principio foram deles testemunhas oculares, e ministros da palavra, igualmente a mim me pareceu bem, depois de a curada investigação de tudo desde a sua origem, dar-te por escrito, excelentíssimo Teófilo, uma exposição em ordem, para que tenhas perfeita certeza das verdades em que foste instruído” (Lc 1.1-4).
“Evangelho” é uma palavra de origem grega que significa “boa notícia”. Do ponto de vista da fé cristã, só há um evangelho: o de Jesus Cristo. Porque ele mesmo, o Filho de Deus encarnado na natureza humana (Jo 1.14) e autor da vida e da salvação (At 3.15; Hb 2.10; 12.2), é a boa notícia que constitui o coração do Novo Testamento o fundamenta a pregação da Igreja desde os tempos apostólicos até os nossos dias.
No entanto, visto que toda notícia supõe a comunicação de uma mensagem, chamamos também de “evangelho” o conjunto dos livros do Novo Testamento, que, sob a inspiração do Espírito Santo, foram escritos para comunicar a boa notícia da vinda de Cristo e, com ele, a do Reino eterno de Deus (Mt 3.2; 4.17; Mc 1.1,14-15; Lc 2.10; Rm 1.1-6,16-17). Nesse mesmo sentido, o apóstolo Paulo gosta de falar do “meu evangelho”, fazendo assim referência ao anúncio da graça divina que ele proclamava (Rm 1.1,9,16; 16.25; 1Co 15.1; Gl 2.7; 2Tm 2.8): uma mensagem que já antes fora escutada em Israel (Is 35; 40.9-11; 52.7; 61.1-2a), mas que agora se estende ao mundo inteiro, a quantos, por meio da fé, aceitam Cristo como Senhor e Salvador (cf., entre outros, Rm 1.5; 5.1; 6.14,22-23).
Num terceiro sentido, o uso tem generalizado a aplicação do termo “evangelho” a cada um dos livros do Novo Testamento (Mateus, Marcos, Lucas e João) que nos têm transmitido praticamente a totalidade do que sabemos acerca de Jesus: da sua vida e atividade, da sua paixão e morte, da sua ressurreição e glorificação.
Da perspectiva da fé cristã, a palavra “evangelho” contém, pois, uma tríplice referência: em primeiro lugar, a Jesus Cristo, cuja vinda é o acontecimento definitivo da revelação de Deus ao ser humano; em segundo lugar, à pregação oral e à comunicação escrita da boa notícia da salvação pela fé; e, por último, aos quatro livros do Novo Testamento que desde o séc. II se conhecem pela designação genérica de “os Evangelhos”.
EVANGELHOS E EVANGELISTAS
Tradicionalmente, os autores dos quatro primeiros livros do Novo Testamento recebem o nome de “evangelistas”, título que na Igreja primitiva correspondia às pessoas a quem, de modo específico, se confiava a função de anunciar a boa nova de Jesus Cristo (At 21.8; Ef 4.11; 2Tm 4.5. cf. At 8.12,40).
Durante os anos que se seguiram à ascensão do Senhor, a pregação apostólica foi, sobretudo, verbal como vemos na leitura de Atos. Mais tarde, quando começaram a desaparecer aqueles que haviam conhecido Jesus em pessoa, a Igreja sentiu a necessidade de fixar por escrito a memória das palavras que haviam ouvido dele e dos seus atos que haviam presenciado. Durante certo tempo, circularam entre as comunidades cristãs de então numerosos textos referentes a Jesus, que, na maioria dos casos, eram simples apontamentos dispersos e sem conexão. Apesar do seu caráter fragmentário, porém, aqueles breves relatos representaram a passagem da tradição oral à escrita, passagem que presidiu o nascimento dos nossos quatro Evangelhos.
O propósito principal dos evangelistas não foi oferecer uma história detalhada das circunstâncias que rodearam a vida do nosso Senhor e dos eventos que a marcaram; tampouco se propuseram a reproduzir ao pé da letra os seus discursos e ensinamentos, nem as suas discussões com as autoridades religiosas dos judeus. Há, conseqüentemente, muitos dados relativos ao homem Jesus de Nazaré que nunca nos serão conhecidos, embora, por outro lado, não reste dúvida de que Deus já revelou por meio dos evangelistas (cf. Jo 20.30; 21.25) tudo o que não devemos ignorar. Na realidade, eles não escreveram para nos transmitir uma completa informação de gênero biográfico, mas, como disse João, “para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome” (20.31).
Os Evangelhos contêm, pois, um conjunto de narrações centradas na pessoa de Jesus de Nazaré e escritas com um propósito testemunhal, para a edificação da Igreja e para a comunicação da fé. Mas isso não significa que os evangelistas manejaram sem cuidado os dados, as palavras e os fatos que recompilaram e que foram os seus elementos de informação. Pois, se bem que é certo que eles não trataram de escrever nenhuma biografia (ao menos n o sentido específico que hoje damos ao termo), igualmente é que os seus escritos respondem com fidelidade ao discurso histórico tal e como era elaborado então, seja por haverem conhecido pessoalmente a Jesus, ou seja, por terem sido companheiros dos apóstolos que viveram junto dele.
A obra dos evangelistas nutriu-se especialmente das memórias que, em relação ao Senhor, eram guardadas no seio da Igreja como um depósito precioso. Essas memórias transmitiram-se no culto, no ensinamento e na atividade missionária, isto é, na pregação oral, que, durante longos anos e com perspectiva escatológica, foi o meio idôneo para reviver, desde a fé e em benefício da fé, o acontecimento fundamental do Cristo ressuscitado.
OS EVANGELHOS SINÓTICOS
A simples leitura dos Evangelhos conduz logo a uma primeira classificação, que é resultante da constatação, de um lado, de que existe uma ampla coincidência da parte de Mateus, Marcos e Lucas quanto aos temas de que tratam e quanto à disposição dos elementos narrativos que introduzem; e por outro, o Evangelho de João, cuja aparição foi posterior à dos outros três, parece ter sido escrito com o propósito de suplementar os relatos anteriores com uma nova e distinta visão da vida de Jesus. Porque, de fato, com exceção dos acontecimentos que formavam a história da paixão de Jesus, apenas três dos fatos referidos por João (1.19-28; 6.1-13 e 6.16-21) encontram-se também consignados nos outros Evangelhos.
Daí se conclui que, assim como o Evangelho Segundo João requer uma consideração à parte, os de Mateus, Marcos e Lucas estão estreitamente relacionados. Seguindo vias paralelas, oferecem nas suas respectivas narrações três enfoques diferentes da vida do Senhor. Por causa desse paralelismo, pelas muitas analogias que aproximam esses Evangelhos tanto na matéria exposta como na forma de dispô-la, vêm sendo designados desde
o séc. XVIII como “os sinóticos”, palavra tomada do grego e equivalente a “visão simultânea” de alguma coisa.
Os sinóticos começaram a aparecer provavelmente em torno do ano 70. Depois da publicação do Evangelho segundo Marcos, escreveu-se primeiro o de Mateus e depois o de Lucas. Ambos serviram-se, em maior ou menor medida, da quase totalidade dos materiais incorporados em Marcos, relembrando-os e ampliando-os com outros. Por essa razão, Marcos está quase integralmente representado nas páginas de Mateus e de Lucas. Quanto aos novos materiais mencionados, isto é, os que não se encontram em Marcos, uma parte foi aproveitada simultaneamente por Mateus e Lucas, e a outra foi usada por cada um deles de maneira exclusiva.
Apesar de que os autores sinóticos tenham redigido textos paralelos, fizeram­no de pontos de vista diferentes e contribuindo cada qual com a sua própria personalidade, cultura e estilo literário. Por isso, a obra dos evangelistas não surge como o produto de uma elaboração conjunta, mas como um feito singular desde seus delineamentos iniciais até a sua realização definitiva. Quanto aos objetivos, também são diferentes em cada caso: enquanto Mateus contempla a Jesus de Nazaré como o Messias anunciado profeticamente, Marcos o vê como a manifestação do poder de Deus, e Lucas, como o Salvador de um mundo perdido por causa do pecado.
POR QUÊ QUATRO EVANGELHOS?
A pergunta que naturalmente surge é a seguinte: Por que quatro? Não teria bastado uma só narrativa direta e contínua? Não teria sido mais simples e claro? Isso não nos teria poupado algumas das dificuldades surgidas em torno do que alguns têm chamado de narrativas divergentes? A resposta é simples: Uma ou duas pessoas não nos teriam dado um retrato completo da vida de Cristo. O Dr. Van Dyke disse: “Suponhamos que quatro testemunhas comparecessem perante um juiz para depor sobre certo acontecimento e cada uma delas usasse as mesmas palavras. O juiz provavelmente, concluiria, não que o testemunho delas era de valor excepcional, mas que a única coisa certa, sem sombra de dúvida, é que haviam concordado em contar a mesma história. Todavia, se cada uma tivesse contado o que tinha visto e como o tinha visto, aí então a prova seria digna de crédito. E quando
temos os quatro Evangelhos, não é exatamente isso que acontece? Os quatro evangelistas contaram a mesma história, cada qual a seu modo.
Há quatro ofícios distintos de Cristo apresentados nos Evangelhos. Ele é apresentado como: Rei em Mateus, Servo em Marcos, Filho do homem em Lucas e Filho de Deus em João. É verdade que os quatro Evangelhos têm muita coisa em comum. Todos eles tratam do ministério terreno de Jesus, sua morte e ressurreição, seus ensinos e milagres, porém cada Evangelho tem suas diferenças. É fácil ver que cada um dos autores procura apresentar um quadro diferente de nosso único Salvador. Mateus, de propósito, acrescenta à sua narrativa o que Marcos omite. Nenhum dos Evangelhos contém a narração completa da vida de Cristo. João diz em 21.25: “Há, porém, ainda muitas outras coisas que Jesus fez. Se todas elas fossem relatadas uma por uma, creio eu que nem no mundo inteiro caberiam os livros que seriam escritos”. Existem vazios propositados que nenhum dos evangelistas pretendeu preencher. Por exemplo: todos omitem um registro de dezoito anos da vida de Cristo, entre os doze e os trinta anos. Embora sejam completos em si mesmo, cada um registrou aquilo que era relevante ao seu tema.
Na Galeria Nacional de Londres há uma tela com três representações de Carlos I. Numa, ele tem a cabeça voltada para à direita, noutra para a esquerda, e na do centro, ele está olhando para a frente. Van Dick pintou-as para o escultor romano Benini, a fim de que ele pudesse modelar um busto do rei. Combinando as impressões dos três quadros, Benini pôde criar uma imagem real. Cada um deles apresenta um aspecto diferente da vida terrena de nosso Senhor. Juntos dão-nos um retrato completo. Ele era Rei, mas era também o Servo Perfeito. Há quatro Evangelhos, mas um Cristo, quatro narrativas com um propósito e quatro esboços de uma mesma Pessoa.

CAPÍTULO 1
EVANGELHO DE MATEUS
Os profetas do Antigo Testamento predisseram e ansiaram pela vinda do Ungido que entraria na história para trazer redenção e livramento. O primeiro versículo de Mateus anuncia aquele evento há muito esperado: “Livro da genealogia de Jesus Cristo, filho de Davi, filho de Abraão”. Mateus fornece a ponte essencial entre o Antigo e o Novo Testamento. Através de uma série cuidadosamente selecionada de citações do Antigo Testamento, Mateus documenta a reivindicação de Jesus Cristo de ser o Messias, Jesus possui as credenciais do Messias, ministra no modelo predito do Messias, prega mensagens que somente o Messias poderia pregar, e finalmente morre a morte que somente o Messias poderia morrer.
1.1. Autoria
A tradição da Igreja tem atribuído desde o séc. II a composição deste Evangelho a Mateus, o publicano (9.9; 10.3), chamado também de Levi, filho de Alfeu (Mc 2.14; Lc 5.27), o coletor de impostos a quem Jesus chamou e uniu ao grupo dos seus discípulos (10.1-4; Mc 3.13-1 9; Lc 6.13-16). Mateus foi um dos que foram batizados com o Espírito Santo no dia de Pentecostes (At 1.13).
Tem-se afirmado que Mateus (Mt) é por excelência o Evangelho da Igreja. Escrito para instruir acerca de Jesus Cristo o novo povo de Deus, apresenta­se diante do leitor como um texto de estrutura basicamente didática.
1.1.1. Controvérsia sobre o autor
O problema que se coloca acerca deste Evangelho é a sua autenticidade. Discute-se a autoria deste evangelho por parte de Mateus. Contudo, o fato é que nenhum dos evangelistas colocou o seu nome no escrito. Este primeiro evangelho foi atribuído a Mateus por causa de uma notícia veiculada por Eusébio, citando Papias, de que “Levi (Mateus) escreveu as palavras do Senhor na língua dos judeus”, e desde então interpretou-se que este escrito cujo autor não fora identificado poderia ser de sua autoria. Esta tradição foi abandonada posteriormente depois de se descobrir que o original deste evangelho foi escrito em grego e não aramaico.
1.1.2. Perfil do autor
Embora haja controvérsia sobre o autor, verifica-se que este evangelho foi escrito por um cristão vindo do judaísmo, conhecedor da Escritura, fiel à tradição. Sabe-se da sua origem judaica porque este evangelho fala em 'reino dos céus' e não 'reino de Deus', porque os judeus não pronunciavam o nome de Deus. Além disso, dispensa a explicação dos costumes dos judeus, porque era fato corriqueiro para o seu autor, no entanto Marcos explica estes costumes, que para ele eram novidades. Por exemplo, em 24, 20 tem a seguinte passagem: “pedi para que a vossa fuga não seja no inverno nem no sábado. A mesma passagem há em Marcos 13.18, porém sem a parte final ('nem no sábado'), que é um acréscimo de Mateus, por causa do costume judeu.
1.2. Data
O tempo em que foi escrito este evangelho varia entre 80 e 100 d.C. Seguramente foi depois de 70, pois pressupõe que já houve a destruição de Jerusalém, e também é posterior ao evangelho de Marcos, pois demonstra grande evolução teológica em relação a este. Foi escrito na Palestina em grego, em bom estilo literário, para leitores de língua grega.
1.3. Cristo Revelado
Este Evangelho apresenta Jesus como o cumprimento de todas as expectativas e esperanças messiânicas. Mateus estrutura cuidadosamente suas narrativas para revelar Jesus como cumpridor de profecias específicas. Portanto, ele impregna seu Evangelho tanto com citações quanto com alusões ao AT, introduzindo muitas delas com a fórmula “para que se cumprisse”. No Evangelho, Jesus normalmente faz alusão a si mesmo como
o Filho do Homem, uma referência velada ao seu caráter messiânico (Dn 7.13,14). O termo não somente permitiu a Jesus evitar mal-entendidos comuns originados de títulos messiânicos populares, como possibilitou-lhe interpretar tanto sua missão de redenção (como em 17.12,22; 20.28; 26.24) quanto seu retorno na glória (como em 13.41; 16.27; 19.28; 24.30,44; 26.64). O uso do título “Filho de Deus” por Mateus sublinha claramente a divindade de Jesus (1.23; 2.15; 3.17; 16.16). Como o Filho, Jesus tem um relacionamento direto e sem mediação com o Pai (11.27). Mateus apresenta Jesus como o Senhor e Mestre da igreja, a nova comunidade, que é chamada a viver nova ética do Reino dos céus. Jesus declara: “a igreja” como seu instrumento selecionado para cumprir os objetivos de Deus na Terra (16.18; 18.15-20). O Evangelho de Mateus pode ter servido como manual de ensino para a igreja antiga, incluindo a surpreendente Grande Comissão (28.12-20), que é a garantia da presença viva de Jesus.
1.4. O Espírito Santo em ação
A atividade do ES é evidente em cada fase e ministério de Jesus. Foi por meio do poder do Espírito que Jesus foi concebido no ventre de Maria (1.18­20).
Antes de Jesus começar seu ministério público, ele foi tomado pelo Espírito de Deus (3.16) e foi conduzido ao deserto para ser tentado pelo diabo como preparação adicional a seu papel messiânico (4.1). O poder do Espírito habilitou Jesus a curar (12.15-21 e a expulsar demônios (12.28). Da mesma forma que João imergia seus seguidores na água, Jesus imergirá seus seguidores no ES (3.11). Em 7.21-23, encontramos uma advertência dirigida contra os falsos carismáticos, aqueles que na igreja, profetizam, expulsam demônios e fazem milagres, mas não fazem a vontade do Pai. Presumivelmente, o mesmo ES que inspira atividades carismáticas também deve permitir que as pessoas da igreja façam a vontade de Deus (7.21) Jesus declarou que suas obras eram feitas sob o poder do ES, evidenciando que o Reino de Deus havia chegado e que o poder de satanás estava sendo derrotado. Portanto, atribuir o Espírito Santo ao diabo era cometer um pecado imperdoável (12.28-32).
Em 12.28, o ES está ligado ao exorcismo de Jesus e à presente realidade do Reino de Deus, não apenas pelo fato do exorcismo em si, pois os filhos dos fariseus (discípulos) também praticavam exorcismo (12.27). Mas precisamente, o ES está executando um novo acontecimento com o Messias -“é chegado a vós o Reino de Deus” (v.28).
Finalmente, o ES é encontrado na Grande Comissão (28.16-20). Os discípulos são ordenados a ir e a fazer discípulos de todas as nações, “batizando-os em nome do Pai, do Filho e do ES” (v.19). Isto é, eles deveriam batizá-los “no/com referência ao” nome -ou autoridade -do Deus Triúno. Em sua obediência a esta missão, os discípulos de Jesus têm garantida sua constante presença com eles.


1.5. Conteúdo
O objetivo de Mateus é evidente na estrutura deste livro, que agrupa os ensinamentos e atos de Jesus em cinco partes. Este tipo de estrutura, comum ao judaísmo, pode revelar o objetivo de Mateus em mostrar Jesus como o cumprimento da lei. Cada divisão termina com uma fórmula como: “Concluindo Jesus estes discursos...” (7.28; 11.1; 13.53; 19.1; 26.1).
No prólogo (1.1-2.23), Mateus mostra que Jesus é o Messias ao relacioná-lo às promessas feitas a Abraão e Davi. O nascimento de Jesus salienta o tema
do cumprimento, retrata a realeza de Jesus e sublinha a importância dele para os gentios. A primeira parte (caps. 3-7) contém o Sermão da Montanha, no qual Jesus descreve como as pessoas devem viver no Reino de Deus. A Segunda parte (8.1-11.1) reproduz as instruções de Jesus a seus discípulos quando ele os enviou para a viagem missionária.
A Terceira parte (11.2-13.52) registra várias controvérsias nas quais Jesus estava envolvido e sete parábolas descrevendo algum aspecto do Reino dos céus, em conexão com a resposta humana necessária.
A Quarta parte (13.53-18.35) o principal discurso aborda a conduta dos crentes dentro da sociedade cristã (cap 18). A quinta Parte (19.1-25.46) narra a viagem final de Jesus a Jerusalém e revela seu conflito climático com o judaísmo. Os caps. 24-25 contêm os ensinamentos de Jesus relacionados à últimas coisas. O restante do Livro (26.1-28.20) detalha acontecimentos e ensinamentos relacionados à crucificação, à ressurreição e à comissão do Senhor à Igreja. A não ser no início e no final do Evangelho, a disposição de Mateus não é cronológica e não estritamente biográfica, mas foi planejada para mostrar que o Judaísmo encontra o cumprimento de suas esperanças em Jesus.
Um traço característico deste primeiro Evangelho é a sua contínua referência ao Antigo Testamento, com o objetivo de demonstrar que as Escrituras têm
o seu pleno cumprimento em Jesus (1.22-23; 2.15,17-18,23; 4.14-16; 8.17; 12.17-21; 13.35; 21.4-5; 27.9-10).
Mateus, mais do que Marcos e Lucas fazem citações abundantes da lei e dos Profetas (5.17-18; 7.12; 11.13; 22.40) e, com freqüência, da fé em tradições e práticas religiosas dos judeus vigentes na época (cf., entre outras, 15.2; 23.5,16-23).
Mateus também nos apresenta Jesus como o intérprete infalível das Escrituras. Ele é o Mestre sem igual, que a partir da verdade e da autenticidade descobre a falsidade de certas atitudes humanas aparentemente piedosas, mas, na realidade, cheias de avidez para receber o aplauso público (6.1). Recordemos a crítica de Jesus quanto a dar esmolas a toque de trombeta (6.2-4), a respeito da vaidosa ostentação das orações feitas nos cantos das praças (6.5-8; 23.14) e a hipocrisia dos jejuns praticados com o propósito primordial de impressionar o povo (6.16-18).
Especialmente interessante é o tratamento que Mateus dá ao aspecto pedagógico da atividade de Jesus. Enquanto Marcos e Lucas associam as palavras do Senhor à ocasião em que foram pronunciadas, Mateus as dispõe de modo ordenado. Freqüentemente as reúne em amplas unidades
discursivas, compostas com o objetivo de ajudar os crentes a aprendê-las de memória. Cinco delas, muito conhecidas, destacam-se pela sua extensão:
a) O sermão do monte (5.3-7.27);
b) O apostolado cristão (10.5-42);
c) O reino dos céus (13.3-52);
d) A vida da comunidade cristã (18.3-35);
e) O final dos tempos (24.4-25.46).
Estes sermões ou discursos aparecem no Evangelho precedidos e seguidos por determinadas fórmulas literárias que servem de marco dramático a cada composição (5.1-2 e 7.28-29; 10.5 e 11.1; 13.3 e 13.53; 18.1 e 19.1; 24.3 e 26.1). Por outro lado, não são estes os únicos discursos. Mateus contém muitos outros ensinamentos e exortações de Jesus aos seus discípulos (p. ex., 8.20-22; 11.7-19,27-30; 12.48-50; 16.24-28; 22.37-40), assim como admoestações dirigidas a escribas e fariseus (22.18-21; 23.1-36) ou, inclusive, a Jerusalém (23.37-38) e a algumas cidades da Galiléia (11.20-24).
1.6. O tema central
O tema predominante na pregação do Senhor é o Reino de Deus (9.35), geralmente designado neste Evangelho como “reino dos céus” e focalizado na sua dupla realidade presente (4.17; 12.28) e futura (16.28). A proclamação da proximidade do Reino é também o anúncio de que Jesus encarrega aos seus discípulos (10.7), aos quais, depois de ressuscitado, prometeu a sua permanência duradoura no meio deles: “E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século” (28.20).
1.7. Estilo e material literário
Mateus escreve a sua obra seguindo, em linhas gerais, o esquema de Marcos, mesmo quando a cada passo põe o seu selo pessoal nos textos que redige. Quanto aos materiais narrativos utilizados, se bem que muitos sejam comuns a Marcos e Lucas, há cerca de um quarto que Mateus emprega de maneira exclusiva. Os relatos de Mateus, mais concisos que os de Marcos, apresentam um rigoroso e belo estilo.
1.8. Abordagem peculiar
1.8.1. Não é um evangelho cronológico, mas sistemático e topical
Existe uma ordem na disposição das matérias de modo que o resultado definido pode ser produzido. O material é tratado em grupos, como as parábolas do capítulo 13.
1.8.2. É um evangelho de ensino sistemático
O livro é marcado pelos vários discursos de considerável extensão, como o sermão da montanha, caps. 5,7; a denúncia contra os fariseus; a profecia da destruição de Jerusalém e o final do mundo, caps. 24 e 25.
1.8.3. É um evangelho de melancolia e tristeza
Não há cânticos de alegria como os de Zacarias, Isabel, Maria, Simeão, Ana e os Anjos, registrados em Lucas. Em vez disso, vemos a sua mãe quase repudiada e deixada em desgraça pelo seu marido, José, e livrada somente pela intervenção divina. Crianças mortas, mães que choram, esta é a visão transmitida por Mateus. A cruz é desolação sem um ladrão arrependido (apenas mais tarde foi que um deles mudou de idéia, Lc 23.39-43).
1.8.4. É um evangelho de caráter real
A Genealogia mostra a descendência real (Mt 1.1). Os Magos O buscavam porque era nascido o rei dos judeus (Mt 2.2). João Batista prega o reino dos céus (3.2,11). Em Lucas um certo homem deu um grande banquete, mas em Mateus foi um certo Rei (Mt 22.2-9; Lc 14.16,23).
1.8.5. Mateus é o evangelho da igreja
Evangelho de Mateus é o único que ocorre a palavra “igreja” (16.18; 18.17). Nestes dois lugares são palavras de Cristo, mostrando que Ele tinha uma idéia definida da igreja como instituição futura. Os propósitos que têm estas duas expressões do Senhor podem indicar que este Evangelho foi escrito para uma igreja nova e em luta, com necessidade de estímulo e disciplina.
1.8.5.1. Personagens
Mateus salienta menos as figuras individuais da sua narrativa do que os outros sinotistas, nem apresenta muitas pessoas cujos nomes não aparecessem nos outros lugares. A José (1.8-25), a Herodes o grande (2.1­16), à mãe de Tiago e João (20.20,21), concede-lhes mais espaço do que Marcos e Lucas; mas tanto Marcos como Lucas usaram mais o desenho de caracteres do que Mateus.
1.8.5.2. Objetivos
Mateus escreveu a história da vida terrena de Jesus especialmente para os judeus. O judeu da época recebia treinamento pessoal, estava familiarizado com as Escrituras do Antigo Testamento. Só um judeu seria capaz de
despertar o interesse de outro judeu. Seu mestre deveria ser alguém versado no Antigo Testamento e nos costumes judaicos. Eles precisavam saber que esse Jesus viera cumprir as profecias do Antigo Testamento. Repetidamente lemos em Mateus: “para que se cumprisse...”, “...Como falou Jeremias, o profeta...”. Temos hoje em dia o mesmo tipo de pessoa, que se deleita em profecias cumpridas e por se cumprirem. Procuram saber o que os profetas disseram e como se poderá cumprir. Mateus prova, pela genealogia, que Jesus é o Messias (Mt 1.1-17). Talvez tenha sido escrito em língua aramaica sendo o único livro do Novo Testamento que não foi redigido em grego.
1.8.5.3. O livro se divide em três partes
1) vida e o ministério do Messias;
2) Reivindicações do Messias;
3) Sacrifício e triunfo do Messias.
1.9. Pontos salientes em Mateus
1.9.1. O Nascimento de Jesus (1.18-25)
Somente Mateus e Lucas contam o nascimento e a infância de Jesus, cada qual narrando incidentes diferentes.
Maria passou com Isabel os três primeiros meses seguintes à visita que lhe fez o mensageiro celeste. Quando voltou a Nazaré e José soube do seu estado, este deve tê-lo levado a uma “perplexidade estranha, agônica”. Era, porém, um homem bom e dispôs-se a resguardar a reputação de Maria do que ele supunha ser uma desmoralização pública ou coisa pior. Foi quando o anjo apareceu-lhe e explicou tudo. Teve ainda de guardar o segredo de família, para evitar escândalo, porque ninguém acreditaria na história de Maria. Mais tarde, quando a natureza divina de Jesus foi comprovada por Seus milagres e Sua ressurreição dentre os mortos, Maria podia falar livremente do seu segredo celestial e da concepção sobrenatural de seu filho.
1.9.2. José, pai adotivo de Jesus
Muito pouco se diz de José. Foi com Maria a Belém e estava com ela quando Jesus nasceu, (Lc 2.4,16). Com ela estava quando Jesus foi apresentado no Templo, (Lc 2.33). Guiou-os na fuga para o Egito e na volta para Nazaré, (Mt 2.13,19-23). Levou Jesus a Jerusalém quando Este tinha 12 anos, (Lc 2.43,51). Depois disso o que mais se sabe dele é que era carpinteiro e chefe de família de pelo menos sete filhos, (Mt 13.55,56). Com certeza devia ser um homem exemplarmente bom, para que Deus assim o acolhesse a fim de servir de pai adotivo do Seu Filho. Comumente se pensa que ele faleceu
antes de Jesus entrar em seu ministério público, embora a linguagem de Mateus 13.55 e João 6.42 possa implicar que ainda vivia por essa época. Seja como for, já devia ter morrido antes que Jesus fosse crucificado, de outro modo não haveria razão para Jesus entregar sua mãe aos cuidados de João (Jo 19. 26-27).
1.9.3. Maria, a mãe de Jesus
Depois da história do Nascimento de Jesus e de Sua visita a Jerusalém aos 12 anos, muito pouco se diz de Maria. De acordo com a interpretação corrente de Mt 13.55-56, ela foi mãe de pelo menos seis filhos, além de Jesus. Por sugestão sua, Jesus converteu água em vinho, em Caná, Seu primeiro milagre, Jo 2.1-11. Depois menciona-se que ela procurou entrar em contacto com Ele, no meio de uma multidão, Mt 12.46; Mc 3.31; Lc 8.19; quando Jesus indicou claramente que as relações de família entre Ele e Sua mãe não ofereciam a esta nenhuma vantagem espiritual particular. Ela esteve presente à crucifixão e foi entregue por Jesus aos cuidados de João, Jo 19.25-27. Não há notícia de Jesus haver aparecido a ela após a ressurreição, embora aparecesse a Maria Madalena. A última menção que dela se faz é em At 1.14, quando esteve com os discípulos a orar. Eis tudo quanto a Escritura diz de Maria:
Maria foi uma mulher calma, meditativa, devotada, prudente, a mais honrada das mulheres, rainha das mães, que partilhou dos cuidados próprios da maternidade. Admiramo-la, honramo-la e amamo-la porque foi a mãe do nosso Salvador.
Quem foram os “irmãos” e “irmãs” de Jesus, mencionados em Mt 13.55-56 e Mc 6.3? Filhos da própria Maria?; Ou filhos de José, de um matrimônio anterior? Ou primos? O sentido claro, simples e natural destas passagens é que foram mesmo filhos de Maria. É esta a opinião comum dos comentadores protestantes. E é apoiada pela declaração de Lc 2.7, de que ela “deu à luz seu filho PRIMOGÊNITO”. Por que “primogênito”, se não houve outros filhos?
1.9.4. Os magos, os ilustres visitantes (2.1-12)
Deve ter ocorrido quando Jesus tinha entre 40 dias e 2 anos de idade (Mt 2.16; Lc 2.22,39). Os “2 anos” parecem denotar o tempo quando a estrela primeiro apareceu, (v.7), época em que os magos empreenderam a viagem, que durou muitos meses; não assinalam necessariamente o tempo exato do nascimento do menino. Herodes, porém, como medida de precaução, aceitou
o limite extremo. Pelo menos o menino não estava mais na manjedoura, como tantas vezes se vê em gravuras, mas na “casa” (v.11).
Estes magos vieram da Babilônia, ou de país mais além, região onde a raça humana teve sua origem, terra de Abraão e do cativeiro judaico, onde muitos judeus ainda viviam. Pertenciam à classe de pessoas ilustradas, eram conselheiros de reis. Talvez estivessem familiarizados com as Escrituras judaicas e sabiam da expectação existente pelo rei Messias. Era a terra de Daniel e, sem dúvida, conheciam a profecia das 70 Semanas, e também a de Balaão acerca da “Estrela a proceder de Jacó”, (Nm 24.17). Eram homens de elevada posição social, tanto que tiveram acesso à presença de Herodes. Comumente são mencionados como “Três Magos”, mas as Escrituras não dizem quantos foram. Provavelmente foram mais de três, ou pelo menos vieram com uma comitiva de dezenas ou centenas de pessoas, como medida de segurança, visto que não seria seguro um pequeno grupo viajar milhares de quilômetros, através de desertos infestados de bandidos. A chegada deles a Jerusalém foi bastante espetacular, para alvoroçar a cidade inteira.
1.9.5. A Estrela vista pelos magos
Calcula-se que houve uma conjunção de Júpiter e Saturno, 6 a.C. Mas isto não explica o fato de “a estrela ir adiante deles até que se deteve sobre o lugar onde o menino estava.” Pensam uns que, possivelmente, foi uma ''nova”, isto é, estrela que explode e por um tempo se queima fulgurantemente. Dizem os astrônomos que na Via Láctea umas 30 estrelas explodem cada ano assim de súbito, e se tornam mais de 10.000 vezes mais brilhantes, voltando depois à luminosidade ordinária. Mas como pode esse fato ajustar-se ao caso?
A estrela, vista pelos magos, foi, sem dúvida, um fenômeno distinto, uma luz sobrenatural que, pela direta revelação de Deus, foi adiante deles e indicou­lhes o lugar exato; anúncio sobrenatural de um nascimento sobrenatural.
1.9.6. A tentação dos quarenta dias
Também se narra em Lc 4.1-13, e, muito abreviadamente, em Mc 1.12-13. O Espírito Santo, Satanás e Anjos tiveram sua parte na tentação de Jesus. O Espírito Santo impeliu-O, anjos ajudaram-no, enquanto Satanás procurou várias vezes desviá-Lo de Sua missão de Redentor do gênero humano. O universo inteiro estava interessado. O destino da criação estava em jogo.
Não sabemos por que a tentação de Jesus seguiu-se logo ao Seu batismo. A descida do Espírito Santo sobre Ele nessa ocasião envolvia possivelmente duas coisas novas na Sua experiência humana: uma, o poder ilimitado de operar milagres; a outra, plena restauração de Seu conhecimento de antes da encarnação.
Antes, na eternidade, Jesus sabia que viria ao mundo sofrer como o Cordeiro de Deus pelo pecado humano. Veio, porém, pelo caminho do berço. Devemos supor que Jesus, criancinha, conhecia tudo quanto sabia antes de assumir as limitações da carne humana? Não é mais natural pensar que o conhecimento que tinha antes de encarnar-Se veio-Lhe gradativamente à proporção que crescia, em paralelo com a Sua educação humana? Naturalmente Sua mãe contou-Lhe as circunstâncias do Seu nascimento. Ele sabia que era o Filho de Deus e o Messias. Sem dúvida, Ele e Sua mãe conversaram muitas vezes sobre planos e métodos de realizar Sua obra como Messias no mundo. Quando, porém, o Espírito Santo desceu sobre Ele no batismo, “sem medida”, então Lhe veio plena e claramente, pela primeira vez como homem, a ciência de algumas coisas que Ele conhecera antes de humanizar-Se: entre elas, a CRUZ como o meio pelo qual cumpriria Sua missão. Isto O aturdiu; fê-Lo perder o apetite; afastou-O do convívio dos homens, e por 40 dias Ele não pensou noutra coisa.
Qual foi a natureza de Sua tentação? Esta pode ter incluído as tentações ordinárias dos homens na luta pelo pão e no desejo de fama e poder. Foi, porém, mais. Jesus era muito grande para pensarmos que tais motivos pesassem muito no Seu espírito. A julgar pelos Seus antecedentes e Sua formação, devemos crer que Ele já alimentava uma paixão absorvente de salvar o mundo. Sabia ser esta a Sua missão. A pergunta era, Como realizá­la? Usando os poderes miraculosos que Lhe acabavam de ser concedidos ­poderes que nenhum mortal conhecera antes -para fornecer pão aos homens, sem que estes precisassem trabalhar, e para vencer as forças ordinárias da natureza, Ele podia ter-Se imposto ao domínio do mundo e pela força levar os homens a fazer Sua vontade. Foi essa a sugestão de Satanás. Mas a missão de Jesus foi não compelir os homens à obediência, mas transformar seus corações.
A essência da tentação de Jesus foi fazê-Lo procurar alcançar Seus fins por meios mundanos, antes que pelo sofrimento. Produzir resultados espirituais por métodos mundanos. O que Jesus recusou fazer, a igreja, através dos séculos, tem feito e, em escala, ainda hoje faz, permitindo-se a cobiça do poder do mundo.
O diabo esteve realmente presente? Ou foi só uma luta íntima? Não se diz sob que forma o diabo apareceu a Jesus. Mas evidentemente Jesus reconheceu que as sugestões partiam de Satanás, que ali estava resolvido, seriamente, a frustrar-Lhe a missão.
Pensa-se que o local da tentação de Jesus foram as alturas desoladas e estéreis da região montanhosa que dominava Jericó, acima do ribeiro de Querite, onde os corvos alimentaram Elias, e de onde possivelmente se divisava ao longe o Gólgota, local da última batalha de Cristo.
Jesus jejuou 40 dias. Moisés jejuara 40 dias no Monte Sinai quando os Dez Mandamentos foram dados, (Êx 34.28). Elias jejuara 40 dias, a caminho para o mesmo monte, (1Rs 19.8). Moisés representava a Lei. Elias, os profetas. Jesus era o Messias, para quem a Lei e os profetas apontavam. Os três grandes representantes da revelação divina ao homem. Do alto do monte onde Jesus jejuava, olhando a Leste para o outro lado do Jordão, podia divisar a Cordilheira do Nebo, onde Moisés e Elias, séculos antes, subiram para Deus.
Uns três anos depois, estes três homens tiveram um encontro, em meio às glórias celestes da transfiguração, no Monte Hermom, 160 km ao Norte, cujo pico nevado via-se distintamente do Monte da Tentação: companheiros no sofrimento e agora companheiros na glória.
1.10. O grande discurso sobre o fim. Capítulos (24 e 25)
1.10.1. A queda de Jerusalém, a vinda de Cristo e o fim do mundo
Este discurso foi proferido após Jesus ter deixado o Templo pela última vez. Versou sobre a destruição de Jerusalém, Sua vinda e o fim do mundo. Algumas de Suas palavras se referem a um fato, outras aludem a outro. Algumas estão de tal forma intricadas que é difícil saber a qual dos eventos se referem. Talvez esse estilo pouco claro fosse intencional. Parece claro que Ele tinha em mente dois eventos distintos, separados por um intervalo, indicados por “esta geração” em 24.34, e por “aquele dia” em 24.36. Alguns entendem, por “esta geração” (24.34), “esta nação”, isto é, a raça judaica que não passaria sem que o SENHOR voltasse. A opinião mais comum é que Jesus quis significar o seguinte: Jerusalém seria destruída ainda naquela geração que então vivia. Quem olha para dois cumes de montanhas distantes, estando um atrás do outro, parece vê-los juntos, embora estejam muito afastados um do outro. Assim, na perspectiva de Jesus, esses dois eventos, estavam muito aproximados entre si, apesar de longo intervalo entre os dois. O que disse numa sentença pode referir-se a uma era inteira. O que aconteceu num caso pode ser o “princípio de cumprimento” do que acontecerá no outro.
Suas palavras a respeito de Jerusalém cumpriram-se literalmente dentro de 40 anos. Os edifícios magníficos de mármore e ouro foram tão completamente arrasados pelo exército romano, 70 d.C. que, segundo Josefo, o local parecia que nunca fora antes ocupado.
1.10.2. A Segunda Vinda de Jesus
Grande parte deste grande discurso dedica-se à segunda vinda de Jesus. Vendo que Sua morte ocorreria dentro de três dias e sabendo que os discípulos ficariam assombrados quase a ponto de perder a fé nele e no Seu reino, empreende a difícil tarefa de explicar que eles ainda verão realizadas suas esperanças de um modo muito mais grandioso do que jamais sonharam.
Os pensamentos de Jesus detêm-se largamente em Seu segundo advento:
“Quando vier o Filho do Homem na sua majestade e todos os anjos com Ele”, (Mt 25.31).
“O Filho do Homem há de vir na glória de seu Pai, com os seus anjos e então retribuirá a cada um conforme as suas obras”, (Mt 16.27).
“Assim como o relâmpago sai do oriente e se mostra até no ocidente, assim há de ser a vinda do Filho do Homem” (Mt 24.27).
“Assim como foi nos dias de Noé, também será a vinda do Filho do homem” (Mt 24.37).
“O mesmo aconteceu nos dias de Ló... assim será no dia em que o Filho do homem se manifestar” (Lc 17.28-30).
“Então se verá o Filho do homem vindo numa nuvem, com poder e grande glória” (Lc 21.27).
“Qualquer que (...) se envergonhar de mim também o Filho do homem se envergonhará dele quando vier na glória de seu Pai com os santos anjos” (Mc 8.38).
“Vou preparar-vos lugar voltarei e vos levarei para mim mesmo” (Jo 14.2-3).
Sua vinda será anunciada “com grande clamor de trombeta” (Mt 24.31), como outrora se fez para reunir o povo (Êx 19.13,16,19). O fato de Paulo haver repetido esta expressão “a trombeta soará”, em conexão com a ressurreição, (1Co 15.52), e em (1Ts 4.16) onde diz, “O Senhor mesmo (...) ouvida a voz do arcanjo, e ressoada a trombeta de Deus, descerá dos céus”, indica que pode ser mais do que mera figura de linguagem. Um grandioso acontecimento histórico, real e repentino, quando Ele agregará os Seus a Si, dentre os vivos e os mortos, numa escala vasta e maciça.
Nem Sua vinda a Jerusalém no juízo de 70 d.C., nem a vinda do Espírito Santo no dia de Pentecostes; nem Sua vinda ao Seu povo em novas experiências sempre repetidas; nem nossa ida para Ele na morte; nenhum destes casos pode esgotar o sentido das palavras de Jesus quanto a vir outra Vez.
É melhor que não sejamos por demais dogmáticos a respeito de certos eventos concomitantes, relacionados com a Sua vinda. Mas, se a linguagem é de qualquer modo um veículo de idéias, decerto seria preciso muita explanação e interpretação para se compreender as palavras de Jesus de outro modo, e não perceber que Ele considerava a Sua segunda vinda um evento histórico definido, quando pessoal e literalmente aparecerá a fim de reunir a Si e para a glória eterna aqueles que foram redimidos pelo Seu sangue.
E é melhor não obscurecer a esperança de Sua vinda com uma teoria muito circunstanciada sobre o que irá acontecer quando Ele vier. Muita gente, supomos, vai ficar tremendamente desapontada, se Jesus não proceder de acordo com o programa que ela já traçou para Ele.
Conta-se que a rainha Vitória, profundamente emocionada com um sermão de F. W. Farrar, sobre a segunda vinda do SENHOR, disse-lhe: “Cônego Farrar, gostaria de estar viva quando Jesus viesse, para depositar aos Seus pés a coroa da Inglaterra”.
1.11. Estudando as parábolas de Mateus
O estudo das parábolas de Mateus 13 tem como propósito a análise da mensagem central contida neste capítulo do evangelho de Mateus, tendo em vista também o estudo de qual foi o contexto natural da época do ministério público de Jesus que O levou a anunciar estas chamadas Parábolas do Reino. Visto que também seria muito relevante a pesquisa a respeito da perspectiva judaica a respeito do Reino Messiânico e como foi que Cristo quebrou alguns destes paradigmas estabelecidos pelos judeus na espera do seu Rei.
Há uma grande necessidade em se estudar esta passagem e seu contexto histórico de acordo com o ministério de Jesus aqui na terra, a fim de que não sejamos ignorantes a respeito do que se sucedeu, está acontecendo e irá acontecer futuramente com respeito ao estabelecimento definitivo do Reino Messiânico em nosso meio.
A necessidade pessoal do estudo deste assunto vai além das exigências para o cumprimento dos requisitos parciais desta matéria, pois tenho a intenção de estar criando em mim o hábito de estar analisando e interpretando os textos aos quais me proponho a estudar, sendo esta uma oportunidade grandiosa e também muito valiosa.
Procurarei abranger ao máximo possível a análise deste assunto em questão utilizando-me de diversos livros como comentários bíblicos, apostilas e outras referências bibliográficas concernentes ao tema a ser pesquisado, como dicionários teológicos e até materiais não-publicados oficialmente, expressando estes conceitos de forma clara e sucinta, atingindo assim o propósito deste estudo e pesquisa.
1.12.    Contexto histórico do ministério público de Jesus até Mateus 13
Até o contexto em que Jesus anunciou as parábolas contidas em Mateus 13 ocorreram grandes fatos relevantes em Seu ministério público, que de uma maneira ou de outra contribuíram definitivamente para a predição destas parábolas.
1.12.1. Seu preparo
Antes do início de Seu ministério público, Jesus passou por algumas experiências que lhe foram necessárias passar antes de que Ele iniciasse assim o Seu ministério.
O Seu batismo feito por João Batista (Mt 3.13-17) tinha como objetivo seguir a ordem de Deus e também a tradição de que, “quando um sacerdote começava a oficiar nessa capacidade, com a idade de trinta anos, lavava-se com água”1 (Ex 29.1-4; Lv 8.1-6). E então Jesus através do Seu batismo reivindicou sobre Si o conceito assim de Sacerdote. Foi também uma maneira de se apresentar ao povo (não sendo claro o ato do batismo em si mas o momento experimentado por Ele). Estava também cumprindo com o conceito da Kenosis onde Ele se auto-esvaziou a fim de se fazer igual ao povo.
Em suma através do Seu batismo Jesus estava se consagrando ao ministério que Deus lhe confiara (Lc 3.21,22).
Através da tentação de Jesus, Deus tinha como propósito demonstrar que o Seu Filho possuía as credenciais de impecabilidade e também comunhão direta com o Pai, a fim de demonstrar que os Seus (de Jesus) feitos e também a Sua morte na cruz eram dignas de ser realizadas apenas por
1 RYLE, J.C. Meditações no Evangelho de Mateus. Editora Fiel: São José dos Campos, 1991. p. 18
aquele que foi “tentado em todas as cousas, à nossa semelhança, mas sem pecado” (Hb 4.15b -VRA). A tentação também foi prova de que de fato Jesus se expôs à todas as características espirituais, físicas, emocionais, etc. que os seres humanos possuem, fazendo-se assim homem.
1.12.2. Seu ministério em Jerusalém (Judéia)
Após o Seu preparo, Jesus vai para Jerusalém e permanece cerca de 8 meses nesta cidade desenvolvendo o Seu ministério. Durante este primeiro ministério na Judéia Jesus estava atravessando um período obscuro da Sua popularidade como Rei-Messias, pois pouquíssimas pessoas conheciam o Seu nome, as Suas obras e feitos e também o conteúdo da Sua pregação. “Mas, por causa deste ministério na Judéia ... o Seu ministério começou a ficar [e de fato ficou] relevante” .

1.12.3. Seu ministério na Galiléia
Após os oito meses de ministério que Jesus teve na Judéia e também na Samaria, Ele decidi ir para a Galiléia onde mais especialmente em Cafarnaum Jesus estabeleceria esta cidade como sendo o Seu “quartel general” .
Os motivos que levaram Jesus a ter a cidade de Cafarnaum como o Seu ponto de estadia principal foi de que esta cidade ocupava uma região privilegiada às margens do Mar da Galiléia, o que a tornava quase que a principal via de acesso para Decápolis . A cidade de Cafarnaum foi cenário de uma ocupação militar por parte das tropas romanas, é possível se dizer isso pois em Cafarnaum havia um centurião (Mt 8.5) que era “um oficial do exército romano que comandava 100 homens” , o que para aquela época era um número expressivo.
Todo este peso militar na cidade de Cafarnaum conferiu a ela o status de cidade tranqüila com ar de liberdade. Era lá que moravam os discípulos Pedro e André (Mc 1.29), e o fato de Jesus ter feito desta cidade o Seu quartel general e também local de Sua morada (Mt 4.13) levou o evangelista Mateus a fazer menção em Mateus 9.1 de que Cafarnaum era a cidade de Jesus; sendo que foi usada por Jesus como a cidade inicial e também como ponto terminal de todas as Suas viagens por toda a Galiléia.
Nessa nova fase do ministério público de Jesus na Galiléia é que Ele começa a se tornar popular, pois os galileus estavam informados de que este tal Jesus operava sinais, milagres e maravilhas na Judéia. E então os moradores da Galiléia O recebem de braços abertos quando Ele pisa pela primeira vez no solo galileu (Jo 4.45). 
O ministério de Jesus na Galiléia durou aproximadamente 1 ano e 8 meses e é num período de mais ou menos 10 meses que Jesus “reina” praticamente soberano sobre toda a Galiléia, pois a geografia da Galiléia “tinha no máximo 100 Km de comprimento por 50 Km de largura” , o que favorecia grandemente para que Jesus percorresse toda esta região pregando Sua mensagem, e operando Seus milagres, além de estar conquistando Seus adeptos.
Ainda que a motivação dos galileus não fossem a mais correta possível, pois eles estavam mais interessados nos feitos e realizações de Jesus do que propriamente com Suas palavras, Jesus foi atingindo gradativamente a Sua popularidade ministerial como pessoa e também como um “milagreiro” da época. A estratégia que Jesus utilizou para atingir tal posição foi mediante os Seus feitos: milagres, curas, sinais, prodígios e também o simples fato d'Ele andar no meio do povo.
Após o término da segunda viagem que Jesus fez pela Galiléia, Ele então volta para Sua casa em Cafarnaum (Mt 13.1), como era de costume pois sempre após uma viagem pela Galiléia, Ele logo voltava para Cafarnaum, e entrando num barco que estava às margens do Mar da Galiléia, Ele então pronuncia as parábolas do Reino (Mt 13.1-52) à uma multidão que estava em pé na praia ouvindo Seus ensinamentos.
O propósito e motivo destas parábolas serão tratados num próximo capítulo.

1.12.4. Expectativa judaica pelo reino messiânico
Desde Gênesis 3.15 Deus revelou ao povo hebreu através dos vários escritores vétero-testamentários de que Ele enviaria Aquele que haveria de instituir um reino eterno e sem igual, vindo da parte Deus e que reinaria sobre toda a nação de Israel. A vinda do Messias seria o cumprimento da atividade redentora de Deus ao ser humano. A instituição do Reino de Deus seria a “manifestação perfeita de Deus a Seu povo, e Sua permanência eterna entre os homens.”
Textos como 2Sm 7.12-16; Sl 132.11; Is 9.1,2,6,7; 16.5; 43.1-3; 53.4; Jr 23.5; Dn 2.44; 7.14,27; Mq 4.7; 5.2, sugeriram bases concretas para que este povo hebreu, em toda a sua história, ficassem ansiosos com a vinda deste Messias e Rei e cressem de que Ele seria o libertador eterno da nação de Israel.
A cada novo rei ou profeta que Deus suscitava em Israel no Velho Testamento o povo logo tinha a expectativa de que este seria o tão prometido Rei de Israel. Assim aconteceu com Moisés, Davi, Elias. E através deste pré­suposto os judeus criaram um absoluto em sua crença divina de que o verdadeiro Rei de Israel seria uma junção (em caráter, poder, espiritualidade, etc.) destes grandes líderes políticos e religiosos que Israel já teve, ou a encarnação plena de um deles.
Existia a esperança de um Rei vindo da própria nação israelita que derrotaria eternamente os romanos, livrando-os assim do domínio imperial, sendo que este Rei teria o mesmo sucesso monárquico que o grande rei histórico Davi teve, onde a capital deste grande reino seria a cidade de Jerusalém.
Os judeus tinham o pensamento de que este Rei-Messias “reuniria ... os remanescentes dispersos de Israel, e ocasionaria uma vida infindável de alegria” aos israelitas. Uma outra idéia que predominava na mente dos judeus é de que o Rei-Messias seria alguém sobrenatural, manifestando esta faceta do seu caráter através da ressurreição dos mortos de todas as épocas, julgando e transformando o mundo e seus habitantes.
Em suma, a perspectiva judaica a respeito do Rei-Messias e Seu Reino é de que este teria a sua consumação plena e perfeita aqui na terra, tornando assim o Reino Messiânico algo unicamente físico e de instauração imediata no momento em que o seu Rei viesse. Para Israel este reino significaria bênçãos sem fim manifesta numa vida de paz, alegria, prosperidade e liberdade, instituído tão só pelas mãos do seu Rei esperado.
Porém o que nenhum judeu com certeza esperava é de que o prometido Rei-Messias de Israel teria como paradeiro a cruz, o lugar maldito predito para os reconhecidos malfeitores do povo.
Com Sua vinda Jesus começa então a quebrar alguns paradigmas que os judeus haviam tornado-os em absolutos a respeito do Rei e do Seu Reino. Jesus através das Suas pregações demonstra para o povo de que o Rei que eles estavam esperando já estava ali com eles, porém não para realizar e cumprir com todos os requisitos, exigências e qualificações que eles haviam alistado como uma ordem de serviço a ser apenas executada ou satisfeita pelo Messias.
Uma das maneiras que Jesus Se utilizou para anunciar de que o Reino ainda não estava totalmente instaurado foi através do Sermão do Monte (Mt 5-7), pois este apresenta “os requisitos de Cristo para os que vivem na expectativa da plena manifestação do reino” . O outro discurso que Jesus fala a respeito
do Reino Messiânico são as parábolas em Mateus 13, onde Ele diz que o Reino seria algo a se concretizar plenamente no futuro.
1.13. Parábolas
Antes de propriamente entrarmos na questão das parábolas do reino descritas em Mateus 13, há a grande necessidade de traçarmos uma linha de raciocínio lógica, teológica e também histórica no que diz respeito às parábolas como um todo.

1.13.1. Definição
Parábola segundo a concepção neo-testamentária, portanto também de Jesus, eram histórias e/ou estórias simples, tiradas das experiências e práticas cotidianas daqueles a quem eram proferidas estas parábolas. Embora fossem simples, elas cumpriam cabalmente com o intuito a que eram proferidas, ilustrar “uma verdade ética ou religiosa” tendo como paralelo exatamente as experiências cotidianas.
Definindo parábola unicamente de acordo com o contexto histórico e o conteúdo de Mateus 13 seria ela uma linguagem de alto nível teológico, expressa de maneira profunda e substancial tendo como objetivo forçar uma reação, positiva ou negativa, de crença ou incredulidade, de aceitação ou total reprovação por parte daqueles que a ouviam. Estas parábolas “revelam a natureza do reino de Deus e/ou indicam como um filho do reino deve agir” .

1.13.2. Contexto histórico da utilização de parábolas
A utilização de parábolas como uma linguagem alternativa na comunicação de verdades (de acordo com o padrão daqueles que as pronunciam) étnicas e/ou religiosas vão muito além das utilizações que Jesus fez das mesmas e que são descritas pelos autores dos evangelhos.
Já no Antigo Testamento alguns escritores já se utilizavam de parábolas a fim de comunicarem verdades vindas do Senhor (2Sm 12.1-6; Is 5.1-7; Jr 18.1-4).
Era também costume de muitos rabinos antes e pós-Jesus fazerem a utilização de uma parábola nos momentos de controvérsias com outras seitas judaicas ou com a simples plebe. Eles tinham o intuito de estar camuflando (omitindo) do público suas respostas ríspidas proferidas contra aqueles a quem discutiam. Porém eles explicavam mais tarde o significado e aplicação das suas parábolas apenas para os seus seguidores. Além de utilizar as parábolas como uma forma de comunicação verbal eles também se utilizavam delas na maneira escrita.
As parábolas eram também muito utilizadas no Oriente “porque em todo o Oriente, a idéia de sabedoria era unida a esta forma de ensino” , ou seja, ao método de discurso figurativo tendo portando a sabedoria e filosofia como seus maiores conteúdos.
A utilização do vocábulo (........) na LXX é uma tradução do mashal no hebraico que pode indicar a grande variedade de estilos de comunicação como: “o provérbio, a metáfora, a alegoria, a história ilustrativa, a fábula, o enigma, o símile e as parábolas propriamente dita.”
Jesus na verdade se utilizou das parábolas como já sendo um tipo de comunicação verbal existente na época, portanto, não foi o seu inventor mas sim o seu maior utilizador.
1.13.3. Propósito de Jesus em falar através de parábolas
Até o contexto de Mateus 13 Jesus falava por meio de parábolas apenas com o objetivo de que esta servisse de ilustração aos Seus ensinamentos em questão, onde, se fosse necessário saber sua interpretação o contexto em que foi proclamada cuidaria muito bem de fazê-lo.
Ao anunciar as parábolas de Mateus 13 Jesus começa a falar às multidões apenas por parábolas (Mt 13.34), onde na sua maioria o conteúdo teológico destas parábolas preocupava-se mais em anunciar alguma verdade a respeito de Jesus e Seu reino aos seus discípulos, do que propriamente proclamar uma verdade ou exemplo a ser seguidos pelas multidões a quem Ele estava ensinando.
Estas parábolas de Jesus tinham como público alvo os Seus próprios discípulos, pois até então o povo judeu tinha se mostrado surdo aos apelos de arrependimento e conversão propostas a eles por Jesus (Mt 11.12), dando crédito apenas aos milagres, curas, sinais e prodígios que Jesus fazia. O povo estava interessado tão só e unicamente no lado bom do ministério de Jesus, os poucos que estavam a fim de seguí-Lo recebiam a sua interpretação.
De agora em diante então quando Jesus vai ensinar, proclamar verdades às multidões incrédulas com seus corações endurecidos Ele a faz apenas por meio de parábolas (Mt 13.34). Jesus decidiu ocultar deste povo incrédulo os mistérios do tão sonhado e esperado Reino Messiânico (Mt 13.10-15), sendo que na verdade tudo isso era o cumprimento duma profecia predita pelo profeta Isaías (6.9,10) a respeito da pregação de Jesus nos Seus tempos.
1.13.4. Conceitos escatológicos de Jesus contidos em Mateus 13
Através da parábola do semeador (13.3-8,18-23) Jesus está se referindo às diversas maneiras que os homens poderiam receber a Sua mensagem a respeito do reino. Jesus estava lidando com a tensão da rejeição por parte de alguns grupos judaicos porém ao mesmo tempo com Sua total aceitação por parte da grande maioria dos galileus.
E então Cristo transporta este quadro de aceitação e rejeição para ao longo da história humana, onde estes 2 pólos com certeza haveriam de continuar existindo.
Já nas parábolas do joio e trigo (13.24-30,36-43) e também da rede (13.47­50) Jesus dá um panorama rápido de que a existência conjunta entre o bem e
o mal teria uma “separação escatológica definitiva” predita para a consumação do século.
Outro conceito escatológico que Jesus possuía e estava passando para Seus discípulos através da parábola do grão de mostarda (13.31,32) é que as influências da mensagem do reino englobaria todo tipo de gente, quer judeu quer gentio, sendo que esta mensagem do reino terá um crescimento rápido e repentino.
Ainda que o crescimento da mensagem de Cristo referente ao reino cresça, infelizmente Jesus apresenta que os elementos malignos também crescerão até o final da presente dispensação (13.33). Possivelmente Jesus estava também fazendo uma alusão daquilo que seria a Sua aceitação para com o povo, pois a perversidade destes O colocaram pregado no madeiro.
As parábolas do tesouro escondido (13.44) e da pérola de grande valor (13.45,46) serviram para Jesus mostrar qual deveria ser a atitude daqueles que um dia foram ou ainda seriam impactados pela mensagem do reino, uma alegre abnegação total. Foi exatamente isso que aconteceu com os 12 discípulos escolhidos por Jesus, confiaram na mensagem de Cristo.
De fato Cristo tinha um propósito muito claro ao anunciar as parábolas de Mateus 13 que era de tornar Seus discípulos conhecedores dos mistérios do reino dos céus (13.11).
1.13.5. Reino Messiânico
Com certeza os judeus nunca imaginaram que se sentiriam tão frustrados com o seu tão prometido Rei-Messias de Israel. Porém foi exatamente isso
que aconteceu, pois Jesus não tipificava o manequim de Rei que os judeus estavam a tanto tempo esperando.
Jesus contestou a Sua tão alta posição de Rei instaurando o Seu majestoso Reino no momento da Sua vinda através das parábolas do reino em Mateus
13. Jesus nada mais fez do que explicar aos judeus de que aquele reino que eles tanto esperavam ainda não seria totalmente estabelecido, devido à incredulidade e dureza de seus corações em receberem a mensagem de arrependimento e conversão que Jesus até então pronunciava.
Literalmente os judeus estavam para colocar o pirulito na boca porém, se esqueceram de que este vinha embrulhado em um papel, e por não gostarem do sabor deste pirulito encapado acabaram jogando fora o tão sonhado reino. Mas Deus em Sua soberania pré-determinou de que o total estabelecimento deste Reino Messiânico se daria num futuro escatológico. Na verdade este é o ensinamento central das parábolas em Mateus 13.
“Quem tem ouvidos para ouvir ouça” (Mt 13.9) .




CAPÍTULO 2
EVANGELHO DE MARCOS
Marcos, o mais breve e mais simples dos quatro Evangelhos, apresenta um relato conciso e de cenas rápidas da vida de Cristo. Com pequenos comentários, Marcos deixa a narrativa falar por si só, quando conta a história do servo que está constantemente em movimento, ao pregar, curar, ensinar e, por fim, morrer pelos pecadores. Seu ministério começa com as massas, logo restringindo-se aos doze discípulos, e por fim culmina na cruz. Ali o Servo que “não veio para ser servido, mas para servir” faz o supremo sacrifício de serviçal, dando “sua vida em resgate de muitos” (10.45). E esse padrão de serviço altruísta se torna o modelo para aqueles que seguem os passos do Servo.
2.1. Importância do Evangelho
Este Evangelho, o segundo dos livros do Novo Testamento, contém pouco material que não apareça igualmente em Mateus e Lucas. Apenas cinco passagens de Marcos (3.7-12; 4.26-29; 7.32-37; 8.22-26; 14.51-52) e alguns versículos isolados não foram registrados nos outros dois Evangelhos. Por essa razão, durante muito tempo, não se deu a Marcos a importância teológica e literária que realmente tem. No entanto, desde o séc. XIX começou a firmar-se a idéia de que o “segundo Evangelho” foi básico na preparação de Mateus e Lucas. E, ao considerar-se assim que Marcos é o documento mais antigo que possuímos sobre a vida e a obra de Jesus, foi despertado um grande interesse por estudá-lo.
2.2. Autoria
Mesmo que o Evangelho de Marcos seja anônimo, a antiga tradição é unânime em dizer que o autor foi João Marcos, seguidor próximo de Pedro (1Pe 5.13) e companheiro de Paulo e Barnabé em sua primeira viagem missionária. O mais antigo testemunho da autoria de Marcos tem origem em Papias, bispo da Igreja em Hierápolis (cerca de 135-140 d.C.), testemunho que é preservado na História Eclesiástica de Eusébio. Papias descreve Marcos como “interprete de Pedro”. Embora a igreja antiga tenha tomado cuidado em manter a autoria apostólica direta dos Evangelhos, os pais da igreja atribuíram coerentemente este Evangelho a Marcos, que não era um apóstolo.
João Marcos era filho de certa Maria, cuja casa em Jerusalém era lugar de reunião dos discípulos, (At 12.12). Sendo parente de Barnabé, (Cl 4.10). Conjectura-se que foi ele o moço que “fugiu desnudo”, na noite em que Jesus foi preso, (Mc 14.51,52), quando começou a interessar-se por Jesus. A linguagem de (1Pe 5.13) pode querer dizer ter sido ele um convertido desse apóstolo.
Provavelmente, a mãe de Marcos tinha posição de considerável influência na Igreja em Jerusalém. Foi a casa dela que Pedro procurou logo ao ser libertado da prisão pelo anjo, (At 12.12); 14 anos mais tarde, cerca de 45 d.C., seguiu com Paulo e Barnabé a Antioquia, At 12.25; e esteve com eles no princípio de sua primeira viagem missionária, não prosseguindo. Depois, lá por 50 d.C., quis fazer com Paulo a segunda viagem, porém este recusou­se a levá-lo. Deu isso ocasião a que Paulo e Barnabé se separassem, (At 13.5,13; 15.37-39). Marcos, então, partiu com Barnabé para Chipre.
Uns 12 anos depois, cerca de 62 d.C., acha-se em Roma com Paulo, (Cl 4.10; Fm 24). Quatro ou 5 anos mais adiante, este apóstolo, logo antes do martírio, pede que Marcos vá ter com ele, (2Tm 4.11). Parece, assim que Marcos, nos seus últimos anos, tornou-se um dos auxiliares íntimos e queridos do Apóstolo Paulo.
Esteve com Pedro em Babilônia (Roma?), quando este apóstolo escreveu sua primeira epístola, (1Pe 5.13). Antiga tradição cristã reza que ele, pela maior parte do tempo, foi companheiro de Pedro e escreveu a história de Jesus como a ouviu desse Apóstolo em suas pregações.  Julga-se que este Evangelho foi escrito o divulgado em Roma, entre 60 e 70 d.C.
2.3. Data
Os fundadores da Igreja declaram que o Evangelho de Mc foi escrito depois da morte de Pedro, que aconteceu durante as perseguições do Imperador Nero por volta de 67 d.C. O Evangelho em si, especialmente o cap. 13, indica ter sido escrito antes da destruição do Templo em 70 d.C. A maior parte das evidências sustenta uma data entre 65 e 70 d.C.
2.4. Considerações
Marcos não é um historiador no sentido que hoje damos ao termo. Antes, é um narrador que conta o que chegou ao seu conhecimento. Escreve em grego, com a rusticidade característica de quem está usando um idioma que não lhe é próprio e, contudo, sabe desenvolver um estilo vivo e vigoroso.
Recorre, provavelmente, à memória de coisas ouvidas, mas é capaz de criar no leitor a impressão de encontrar-se ante uma testemunha ocular dos fatos relatados.
2.5. Características teológicas e literárias
Este Evangelho proclama em cada uma das suas páginas que Jesus é a revelação definitiva de Deus, o qual, em seu Filho eterno, se integra na história da humanidade: Jesus, o singelo mestre chegado da Galiléia (1.9), é o Cristo, o Messias a quem desde séculos antigos esperava o povo de Israel (8.29; 9.41; 14.61-62). O evangelista anuncia a presença de Jesus no mundo como o sinal imediato da vinda do reino de Deus (1.14-15; 4.1-34).
A personalidade de Jesus, entretanto, não satisfaz às expectativas judaicas, pois longe de apresentar-se como messias político e militar, o faz como um homem humilde cuja atividade e ensinamentos não correspondiam à imagem triunfante de um libertador nacional.
Jesus de Nazaré, o Filho de Deus, é também o Filho do Homem. Participa dos sentimentos humanos e é sujeito ao sofrimento e à morte (8.31). Com consciência da sua natureza humana, exige freqüentemente que a sua função messiânica se mantenha em segredo (1.43-44; 5.43; 8.29-30; 9.9,30­31), até que chegue o momento de ser acreditada pelos padecimentos morais e físicos que ele deverá enfrentar (14.35-36; 15.39).
Uma característica típica de Marcos é que dedica mais espaço aos atos que aos discursos de Jesus. Na realidade, só dois desses últimos podem ser considerados como tais: a série de parábolas de 4.1-34 e o sermão escatológico de 13.3-37. Tudo mais são breves intervenções de ensinamento, exortação ou controvérsia. Por outro lado, o evangelista concede à descrição dos atos um espaço mais amplo, inclusive, às vezes, superior ao que Mateus e Lucas dedicam a narrativas paralelas (cf. 5.21-43 com Mt 9.18-26 e Lc 8.40-56; 6.14-29 com Mt 14.1-12; 6.30 com Mt 14.13-21 e Lc 9.10-17).
À medida que progride, o desenvolvimento dramático do segundo Evangelho cresce em intensidade, até alcançar o seu ponto culminante no relato da paixão, crucificação e ressurreição de Jesus. O Senhor anuncia três vezes esses acontecimentos aos seus discípulos: “O Filho do homem será entregue aos principais sacerdotes e aos escribas... e o entregarão aos gentios; hão de... matá-lo; mas, depois de três dias, ressuscitará” (10.33-34; ver 8.31 e
9.31. Cf. Mt 16.21; 17.22-23; 20.18-19 e Lc 9.22; 9.44; 18.32-33). Os discípulos não compreenderam até o último momento que o sacrifício de
Jesus Cristo fazia parte do plano de salvação de que Deus o havia incumbido (8.32-38; 16.19-20).
2.6. Cristo revelado
Esse livro não é uma biografia, mas uma história concisa da redenção obtida mediante o trabalho expiatório de Cristo. Marcos demonstra as reivindicações messiânicas de Jesus enfatizando sua autoridade com o Mestre (1.22) e sua autoridade sobre satanás e os espírito malignos (1.27; 3.20-30), o pecado (2.1-12), o sábado (2.27-28; 3.1-6), a natureza (4.35-41; 6.45-52), a doença (5.21-34), a morte (5.35-43), as tradições legalistas (7.1-13,14-20), e o templo (11.15-18).
Título de abertura do trabalho de Marcos, “Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus” (1.1), fornece sua tese central em relação a identidade de Jesus como o filho de Deus. Tanto o batismo quanto a transfiguração testemunham sua qualidade de filho (1.11; 9.7). Em duas ocasiões, os espíritos imundos o reconhecem como Filho de Deus (3.11; 5.7). A parábola dos lavradores malvados (12.6) faz alusão à qualidade de filho divino de Jesus (12.6). Por fim, a narrativa da crucificação termina com a confissão do centurião: “Verdadeiramente, este homem era o Filho de Deus.” (15.39) O título que Jesus usava com mais freqüência para si próprio, num total de catorze vezes em Marcos, é “Filho do Homem”. Como designação para o Messias, este termo (ver Dn 7.13) não era tão popular entre os Judeus como
o título “Filho do Homem” para revelar e para esconder seu messianismo e relacionar-se tanto com Deus quanto com o homem. Marcos, atentando para o discipulado, sugere que os discípulos de Jesus deveriam ter um discernimento amplo ao mistério de sua identidade. Mesmo apesar de muitas pessoas interpretarem mal sua pessoa e missão, enquanto os demônios confessam sua qualidade de filho de Deus, os discípulos de Jesus precisam ver além de sua missão, aceitar sua cruz e segui-lo. A segunda vinda do Filho do Homem revelará totalmente seu poder e glória.
2.7. O Espírito Santo em ação
Junto com os outros escritores do Evangelho, Marcos recorda a profecia de João Batista de que Jesus “vos batizará com o ES” (1.8), Os crentes seriam totalmente imersos no Espírito, como os seguidores de João o eram nas águas. O Espírito Santo desceu sobre Jesus em seu batismo (1.10), habilitando-o para seu trabalho messiânico de cumprimento da profecia de Isaías (Is 42.1; 48.16; 61.1-2). A narrativa do ministério subseqüente de Cristo testemunha o fato de que seus milagres e ensinamentos resultaram da unção do Espírito Santo. Marcos declara graficamente que “o Espírito o impeliu para o deserto” (1.12) para que fosse tentado, sugerindo a urgência
por encontrar e vencer as tentações de Satanás, que queria corrompê-lo antes que ele embarcasse em uma missão de destruir o poder do inimigo nos outros. O pecado contra o Espírito Santo é colocado em contraste com “todos os pecados” (3.28), pois esses pecados e blasfêmias podem ser perdoados. O contexto define o significado dessa verdade assustadora. Os escribas blasfemaram contra o Espírito Santo ao atribuírem a satanás a expulsão dos demônios. Que Jesus realizava pela ação do Espírito Santo (3.22). Sua visão prejudicada tornou-os incapazes do verdadeiro discernimento. A explicação de Marcos confirma o motivo de Jesus ter feito essa grave declaração (3.30).
Jesus também refere à inspiração do AT pelo ES (12.36). Um grande estímulo aos cristãos que enfrentam a hostilidade de autoridades injustas é a garantia do Senhor de que o ES falará através deles quando testemunharem de Cristo (13.11).
Além das referências explícitas ao Espírito Santo, Marcos emprega palavras associadas com o dom do Espírito, como poder, autoridade, profeta, cura, imposição de mãos, Messias e Reino.
2.8. Conteúdo
Marcos fundamenta seu Evangelho em torno de vários movimentos geográficos de Jesus, que chega ao clímax com sua morte e ressurreição subseqüente. Após a introdução (1.1-13), Marcos narra o ministério público de Jesus na Galiléia (1.14-9.50) e Judéia (caps 10-13), culminando na paixão e ressurreição (caps 14-16). O Evangelho pode ser visto como duas metades unidas pela confissão de Pedro de que Jesus era o Messias (8.27-30) e pelo primeiro anúncio de Jesus e sua crucificação (8.31).
Marcos é o menor dos Evangelhos, e não contém nenhuma genealogia e explicação do nascimento e antigo ministério de Jesus na Judéia. É o evangelho da ação, movendo-se rapidamente de uma cena para outra. O Evangelho de João é um retrato estudado do Senhor, Mateus e Lucas apresentam o que poderia ser descrito como uma série de imagens coloridas, enquanto que Marcos é como um filme da vida de Jesus. Ele destaca as atividades dos registros mediante o uso da palavra grega “euteos” que costuma ser traduzida por “imediatamente”. A palavra ocorre quarenta e duas vezes, mais do que em todo o resto do NT. O uso freqüente do imperfeito por Marcos denotando ação contínua, também torna a narrativa rápida.
Marcos também é o Evangelho da vivacidade. Frases gráficas e surpreendentes ocorrem com freqüência para permitir que o leitor reproduza mentalmente a cena descrita. Os olhares e gestos de Jesus recebem atenção
fora do comum. Existem muitos latinismos no Evangelho (4.21; 12.14; 6.27; 15.39). Marcos enfatiza pouco a lei e os costumes judaicos, e sempre os interpreta para o leitor quando os menciona. Essa característica tende a apoiar a tradição de que Marcos escreveu para uma audiência romana e gentílica.
De muitas formas, ele enfatiza a Paixão de Jesus de modo que se torna a escala pela qual todo o ministério pode ser medido: “Porque o Filho do Homem também não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate de muitos”(10.45). Todo o ministério de Jesus (milagres, comunhão com os pecadores, escolha de discípulos, ensinamentos sobre o reino de Deus, etc.) está inserido no contexto do amor oferecido pelo Filho de Deus, que tem seu clímax na cruz e ressurreição.
Os fundadores da Igreja declaram que o Evangelho de Marcos foi escrito depois da morte de Pedro, que aconteceu durante as perseguições do Imperador Nero por volta de 67 d.C. O Evangelho em si, especialmente o cap. 13, indica ter sido escrito antes da destruição do Templo em 70 d.C. A maior parte das evidências sustenta uma data entre 65 e 70 d.C.
Com respeito à composição de Marcos, é provável que teve lugar em Roma ou, talvez, na Antioquia da Síria, antes do ano 70, data em que Jerusalém foi destruída. Não há base cronológica que permita datá-la com exatidão, de forma que alguns historiadores a situam entre 65 e 70, isto é, nos anos que seguiram à perseguição de 64, decretada por Nero; outros situam a data em torno do ano 63; e ainda outros a fazem retroceder até a década de 50.
A antiga tradição eclesiástica viu neste Evangelho a influência dos ensinamentos de Pedro, de quem Marcos teria sido discípulo. Em princípio, foi escrito para leitores de origem gentílica, residentes fora da Palestina. Assim o sugere, entre outras peculiaridades, o fato de que o autor acrescenta à tradução grega expressões cujo original aramaico incorpora ao texto com a maior fidelidade (cf. 5.41, 7.11,34; 14.36; 15.22,34).
2.9. Contexto Histórico
Em 64 d.C., Nero acusou a comunidade cristã de colocar fogo na cidade de Roma, e por esse motivo instigou uma temerosa perseguição na qual Paulo e Pedro morreram. Em meio a uma igreja perseguida, vivendo constantemente sob ameaça de morte, o evangelista Marcos escreveu suas “boas novas”. Está claro que ele quer que seus leitores tomem a vida e exemplo de Jesus como modelo de coragem e força. O que era verdade para Jesus deveria ser para os apóstolos e discípulos de todas as idades. No centro do Evangelho há pronunciamentos explícito de “que importava que o Filho do Homem
padecesse muito, e que fosse rejeitado pelos anciãos, e pelos príncipes dos sacerdotes e pelos escribas, que fosse morto, mas que, depois de três dias, ressuscitaria” (8.31) Esse pronunciamento de sofrimento e morte é repetido (9.31; 10.32-34), mas torna-se uma norma para o comprometimento do discipulado: “Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome a sua cruz e siga-me” (8.34). Marcos guia seus leitores à cruz de Jesus, onde eles podem descobrir o significado e esperança em seu sofrimento.
2.9.1. Estrutura do Evangelho
A estrutura formal de Marcos tem dado lugar a diversas análises e a diferentes possibilidades de dividir o texto. A que mais adiante se oferece toma como base a revelação progressiva que Jesus faz de si mesmo: por um lado, a sua personalidade (cf. 1.7-8, 10-11; 4.41; 8.27-29; 9.7), o seu poder frente à natureza, à dor e à morte (cf. 1.30-31,40-42; 2.3-12; 4.37-39; 5.22-42; 6.45-51) e a sua luta contra as forças do mal (cf. 1.24-27; 3.11; 9.25-27); por outro lado, a índole da sua missão, primeiro como mestre e profeta (cf. 1.37­39; 2.18-28; 3.13-19,23-29; 4.1-34; 9.2-10.45; 13.3-37; 14.61-62) e definitivamente como Senhor e Salvador (16.15-18).
2.9.2. Objetivos
O romano era o povo dominador do mundo daquele tempo. Marcos escreveu especialmente para ele. O romano não sabia nada do Antigo Testamento. O cumprimento de profecias não lhe interessava. Mas estava profundamente interessado em um líder notável que surgira na Palestina. A esse líder se atribuía autoridade fora do comum e possuía poderes extraordinários. Eles queriam ouvir mais a respeito de Jesus -que tipo de pessoa ele realmente era, o que tinha dito e o que tinha feito. Os romanos gostavam da mensagem direta de alguém como Marcos. Mil e tantas vezes Marcos usa a conjunção “e”. É o Evangelho do ministério de Jesus. O romano dos dias de Jesus era um tipo semelhante ao homem de negócios de hoje. Ele não está interessado na genealogia de um rei, mas num Deus capaz de suprir as necessidades diárias do indivíduo. Marcos é o Evangelho do homem de negócios. Nas décadas de 60-70 d.C., os crentes de Roma eram tratados cruelmente pelo povo e muitos foram torturados e mortos pelo Imperador Romano, Nero. Segundo a tradição, entre os mártires cristãos de Roma, nessa década, estão os apóstolos Pedro e Paulo. Como um dos líderes eclesiásticos em Roma, João Marcos foi inspirado pelo Espírito Santo a escrever este Evangelho, como uma antevisão profética desse período da perseguição, ou como uma resposta pastoral à perseguição. Sua intenção era fortalecer os alicerces da fé dos crentes romanos e, se necessário fosse, inspirá-los a sofrer fielmente em prol do evangelho, oferecendo-lhe como modelo a vida, o sofrimento, a
morte e a ressurreição de Jesus, seu Senhor. Podemos dividi-lo em três partes:
a) Súditos para o Seu reino (Mc 1-5);
b) Conquistando o reino pelo Seu poder (Mc 6-10);
c) Reivindicando o Seu direito (Mc 11-16).
d) Pontos salientes em Marcos
e) A Trama para matar a Jesus (Mc 14.1-2).
Foi na tarde da terça-feira. Cerca de um mês antes disto, depois que Jesus ressuscitou a Lázaro, o sinédrio decidira definitivamente matá-Lo, (Jo 11.53). Mas a popularidade dEle tornou-o difícil, (Lc 22.2). Até em Jerusalém as multidões não O deixavam, (Mc 12.37; Lc 19.48). A oportunidade chegou, na segunda noite depois desta, com a traição de Judas que, num movimento de surpresa, entregou-O a eles de noite, enquanto a cidade dormia. Apressaram-se em fazer que fosse condenado antes que clareasse o dia e, de manhã, antes que as multidões na cidade despertassem, já O tinham pregado na cruz.
2.9.3. A traição (Mc 14.10-11)
Cabia-lhe entregar Jesus a eles, na ausência das multidões. Não ousavam prendê-lo abertamente, para não serem apedrejados pelo povo. Judas levou­os a Jesus em um dos Seus lugares secretos de retiro, depois que a cidade se recolheu.
Jesus “sabia desde o princípio” que Judas o trairia. Por que foi escolhido, é um dos mistérios de Deus. Trinta moedas de prata eram equivalentes ao preço de um escravo, (Êx 21.32). Judas pode ter pensado que Jesus usaria Seu poder miraculoso para livrar-Se, ou pode ser que ele procurasse forçar Jesus a revelar-Se. Todavia, aos olhos de Deus foi um ato de perfídia, porque Jesus disse que fora melhor para Judas não ter nascido, (Mt 26.24). Tudo isso foi admiravelmente predito, (Zc 11.12-13). “Jeremias”, (Mt 27.9-10) ou entrou aí por engano do copista, ou porque o grupo inteiro de livros proféticos era algumas vezes chamado pelo nome de Jeremias.
2.9.4. O Julgamento de Jesus (14.53-15.20)
Houve dois julgamentos: diante do sinédrio e diante de Pilatos, o governador romano. A Judéia estava sujeita a Roma. O sinédrio não podia executar sentença de morte sem o consentimento do governador romano. Houve três etapas em cada julgamento, seis ao todo.
1)   Diante de Anás, (Jo 18.12-24). Cerca de meia-noite. Caifás era o sumo sacerdote. Mas seu sogro, Anás, que fora deposto em 16 d.C., ainda retinha, mediante os filhos, a influência e a autoridade do ofício. A família enriquecera imensamente às custas das barracas de negócio no Templo. Sobre o sumo sacerdote da nação judaica recai a primeira responsabilidade da morte de Jesus.
2)   Diante do sinédrio, na casa de Caifás, (Mt 26.57; Mc 14.53; Lc 22.54; Jo 18.24). Deu-se entre a meia-noite e o clarear do dia. Foi este o principal julgamento da parte dos judeus. Incapazes de apresentar alguma acusação baseada em testemunho, condenaram-no sob a acusação de blasfêmia, por Se haver Ele declarado Filho de Deus, (Mc 14.61-62). Depois, enquanto esperavam que o dia clareasse, escarneceram dEle. Foi quando Pedro O negou. Esta sessão deles, processada à noite, era ilegal por força da própria lei que os regia.
3)   O dia já claro, o sinédrio ratifica oficialmente sua decisão de meia­noite, (Mt 27.1; Mc 15.1; Lc 22.66-71), para lhe dar aparência de legalidade. A acusação era de “blasfêmia”. Mas diante de Pilatos isso não valeria muito. De modo que, para ele, excogitaram a acusação de sedição contra o governo romano. A verdadeira razão era a inveja que tinham da popularidade de Jesus, (Mt 27.18).
4)   Diante de Pilatos, (Mt 27.2, 11.14; Mc 15.1-5; Lc 23.1-5; Jo 18.28-38), pouco depois de o dia clarear. Jesus não replicou às acusações deles. Pilatos admirou-se. Depois fê-Lo entrar no palácio para uma entrevista particular, que mais o convenceu da inocência de Jesus. Vindo a saber ser Ele da Galiléia, mandou-O a Herodes, que tinha jurisdição sobre aquela parte do país.
5)   Diante de Herodes, (Lc 23.6-12). Foi este o Herodes que matara João Batista, e cujo pai assassinara os meninos de Belém. Jesus não fez absolutamente caso dele, recusando-se firmemente a responder suas perguntas. Herodes escarneceu dele, vestiu-O de uma roupa aparatosa, e mandou-O de volta a Pilatos.
6)   Diante de Pilatos outra vez, (Mt 27.15-26; Mc 15.6-15; Lc 23.13-25; Jo 18.39-19.16). Pilatos tenta desviar-se das autoridades e dirigir-se ao povo diretamente. Mas o povo no tribunal, em peso, escolhe Barrabás. Depois Pilatos ordena o açoite de Jesus (Mt 27:26), na esperança de que isto satisfaria à turba. Ouve dizer que Jesus Se afirmara Filho de Deus, e fica com mais medo. Outra entrevista particular e nova tentativa de soltá-Lo. Sua esposa manda contar o sonho que tivera. Pilatos pasma diante da calma majestosa de Jesus com Sua coroa de espinhos. Surge, porém, o início de um motim, e o ardil da ameaça de denunciá-lo a César. Lavra a sentença, às 6 horas, (Jo 19.14).


CAPÍTULO 3
EVANGELHO DE LUCAS
Lucas, um médico gentio, elabora sua narrativa evangélica em torno de uma apresentação histórica e cronológica da vida de Jesus. Lucas é o mais extenso e abrangente dos quatro Evangelhos, apresentando Jesus Cristo como o Homem Perfeito que veio buscar e salvar os pecadores. Fé crescente e oposição crescente se desenvolvem lado a lado. Os que crêem em suas reivindicações são desafiados a assumir o preço do discipulado; os que se opõem a ele não ficarão satisfeitos até que o Filho do Homem penda sem vida numa cruz. A Ressurreição, porém, assegura que seu ministério de buscar e salvar os perdidos continue na pessoa de seus discípulos, uma vez que estejam equipados com seu poder.
3.1. Autor
Esse Evangelho foi escrito por Lucas, um médico grego para os seus patrícios que amavam a beleza, a poesia e a cultura. Viviam num mundo de grandes conceitos. Era difícil agradá-los. O Evangelho de Lucas fala do nascimento e da infância de Jesus, dos cânticos inspirados relacionados com a vida de Cristo. Nele encontramos a saudação de Isabel ao receber a visita de Maria (Lc 1.42-45). Também o cântico de Maria (Lc 1.46-55).
O próprio Zacarias rompe em louvor ao recuperar o uso da palavra (Lc 1.68­79). Ao nascer o Salvador, ressoam as vozes de um coro de anjos (Lc 2.13,14), ouvindo-se, a seguir, o cântico de louvor entoado pelos pastores (Lc 2.20). O grego é o tipo do estudante idealista de hoje em busca da verdade, por crer que ela traz a felicidade. Lucas no seu evangelho deixa claro que ele escreveu aos gentios. Por exemplo, ele apresenta a genealogia humana de Jesus, recuando-a até Adão (Lc 3.23-28) e não até Abraão, conforme fez Mateus (Mt 1.1-17). Em Lucas, Jesus é visto claramente como o Salvador divino–humano, que veio como a provisão divina da salvação para todos os descendentes de Adão.
3.2. Autor e objetivo do Evangelho
Entre os quatro evangelistas, é Lucas quem mais se aproxima do conceito atual de historiador. Cuidadoso no seu trabalho, é provável que ao começar a
prepará-lo já teve a previsão da publicação de uma obra em dois volumes. O primeiro é o Evangelho que leva o seu nome; o segundo, Atos dos Apóstolos.
Com a publicação desses livros, o autor quis transmitir uma mensagem de valor universal: que Jesus, o “Filho do Altíssimo” (1.32), representa o último capítulo do desenvolvimento da humanidade; e que a sua existência terrena, manifesta sob a denominação de “Filho do Homem” (6.22), significa que Deus veio estabelecer o seu Reino entre nós e que nos convida a participar dessa realidade nova e definitiva (17.20-21).
Desde o prólogo do Evangelho (1.1-4), Lucas revela uma grande preocupação de referir em detalhes “uma narração coordenada dos fatos que entre nós se realizaram” (1.1). E mesmo que ele não tinha vivido pessoalmente o acontecimento de Cristo, trata de proclamá-lo “conforme nos transmitiram os que desde o princípio foram delas testemunhas oculares” (1.2). Com esse objetivo se havia entregue de antemão a uma “acurada investigação de tudo desde sua origem” (1.3).
Igualmente, como faria mais tarde ao compor o livro dos Atos dos Apóstolos, também agora dedica Lucas o seu “primeiro livro” (At 1.1) a um personagem de destaque chamado Teófilo, acerca de quem não nos chegou maior informação. Apenas o conhecemos por essas dedicatórias, que na moldura dos seus respectivos prólogos (Lc 1.1-4; At 1.1-5), correspondem às formas literárias usuais entre os escritores gregos de então.
Lucas, certamente, preocupou-se em narrar de maneira inteligente e ordenada tudo quanto sabia acerca da pessoa e do ministério de Jesus. Entretanto, não é menos certo que, em sentido estrito, nunca pretendeu escrever uma biografia, senão um Evangelho. A sua intenção não esteve simplesmente orientada para dar a conhecer a vida, as características pessoais e a atividade de Jesus em meio à multiplicidade de situações religiosas, políticas e sociais em que se desenvolve o drama humano. Lucas,
o evangelista, escreve desde a fé e para a fé, oferecendo com isso um testemunho pessoal de que Jesus é o Messias que veio a dar cumprimento perfeito ao plano salvador preparado por Deus antes de todos os tempos.
3.3. Data
Eruditos que admitem que Lucas usou o Evangelho de Marcos como fonte para escrever seu próprio relato datam Lucas por volta do ano 70 d.C. Outros, entretanto, salientam que Lucas o escreveu antes de Atos, que ele escreveu durante o primeiro encarceramento de Paulo pelos romanos, cerca de 63 d.C. Como Lucas estava em Cesaréia de Filipe durante os dois anos em que Paulo ficou preso lá (At 27.1), ele teria uma grande oportunidade
durante aquele tempo para conduzir investigações que ele menciona em 1.1­
4. Se for este o caso, então o Evangelho de Lucas pode ser datado por volta de 59-60 d.C., mas no máximo até 75 d.C.
3.4. Características teológicas e literárias
O Evangelho Segundo Lucas (= Lc) ajusta-se, em termos gerais, aos esquemas de Mateus e de Marcos. Sendo assim, é preciso acrescentar que Lucas trabalhou e poliu o seu texto com especial esmero. Do ponto de vista literário, grande parte dos materiais redacionais comuns aos três Evangelhos sinóticos encontra-se mais depurada no terceiro Evangelho do que nos dois primeiros. Isso é possível graças ao domínio que Lucas possui do idioma e a riqueza do vocabulário que maneja. A amplitude dos seus recursos estilísticos manifesta-se, inclusive, quando, a fim de reproduzir com fidelidade determinadas formas da fala popular aramaica (sobretudo em discursos de Jesus), introduz conscientemente semitismos ou palavras gregas que se distanciam do habitual nível culto dele.
A partir do prólogo, o texto de Lucas pode-se distribuir em cinco seções:
A primeira seção (1.5-2.52), sem paralelo em Mateus e Marcos, contém os relatos entrelaçados do nascimento de João Batista e de Jesus. Ocorrem aqui algumas circunstâncias que os tornam semelhantes: a apresentação de dados históricos (1.5 e 2.1-5); a aparição do anjo Gabriel a Zacarias e Maria
(1.19 e 1.26); as respectivas mensagens de que o anjo é portador (1.11-20 e 1.26-38); os cânticos de Maria e Zacarias em louvor ao Senhor (1.46-55 e 1.67-79); o nascimento de João e o de Jesus e a circuncisão de ambos em cumprimento do que foi estabelecido pela Lei Mosaica (1.57-59 e 2.21-24).
Começa a segunda seção (3.1-4) situando historicamente (3.1-2) um conjunto de fatos: a pregação e o encarceramento de João Batista (3.1-20), o batismo de Jesus (3.21-22) e a tentação no deserto (4.1-13). Lucas, tal qual Mateus (Mt 1.1-17), insere uma genealogia; mas, em lugar de limitá-la à ascendência hebraica de Jesus, a faz remontar até Adão (3.23-38), para dar ênfase ao caráter universal da obra do Senhor.
A terceira seção do Evangelho (4.14-9.50), compreende o ministério público de Jesus na Galiléia, onde ensinou, pregou, reuniu os seus discípulos, curou a enfermos e possessos, fez milagres e anunciou que haveria de sofrer, morrer e ressuscitar. Há aqui textos muito importantes: a parábola do semeador (8.4-15), a ressurreição da filha de Jairo (8.40-56), a confissão de Pedro (9.18-20) e a transfiguração do Senhor (9.28-36). Também temos aqui relatos que Mateus e Marcos não incluem, como a ressurreição do filho da
viúva de Naim (7.11-17) e a visita do Senhor à casa de Simão, o fariseu (7.36-50).
Na quarta seção (9.51-19.27) agrupam-se numerosas passagens exclusivas deste terceiro Evangelho. Entre outras, uma série de parábolas muito conhecidas: o bom samaritano (10.25-37), a figueira estéril (13.6-9), a grande ceia (14.15-24), o filho pródigo (15.11-32), o rico e Lázaro (16.19-31), a viúva e o juiz iníquo (18.1-8), o fariseu e o publicano (18.9-14) e as dez minas (19.11-27).
A quinta seção (19.28-24.53) narra os acontecimentos finais da vida terrena de Jesus. São os seus últimos dias, que têm Jerusalém por cenário único. Todos os fatos ocorrem nessa cidade, desde o dia em que o povo recebe em triunfo o Senhor (19.28-38) até que é preso, processado, crucificado, morto e sepultado.
Os sofrimentos, a morte e a ressurreição do Senhor (22.47-24.49) constituem
o ponto culminante do relato dos quatro Evangelhos, cada um dos quais traz alguma informação exclusiva que não se encontra nos demais.
3.5. Cristo Revelado
Além de apresentar Jesus como o Salvador do mundo, Lucas dá os seguintes testemunhos sobre ele:
Jesus é o profeta cujo papel equipara-se ao Servo e Messias (4.24; 7.16,39; 9.19; 24.19) Jesus é o homem ideal, o perfeito salvador da humanidade. O título “Filho do Homem” é encontrado 26 vezes no evangelho. Jesus é o Messias. Lucas não apenas afirma sua identidade messiânica, mas também tem o cuidado de definir a natureza de seu messianismo. Jesus é, por excelência, o Servo que se dispõe firmemente a ir a Jerusalém cumprir seu papel (9.31,51). Jesus é o filho de Davi (20.41-44), o Filho do Homem (5.24) e o Servo Sofredor (4.17-19, que foi contado com os transgressores (22.37). Jesus é o Senhor exaltado. Lucas refere-se a Jesus como “Senhor” dezoito vezes em seu evangelho. Jesus é o amigo dos proscritos humildes. Ele é constantemente bondoso para com os rejeitados.
3.6. O Espírito Santo em ação
Há dezesseis referências explicitas ao Espírito Santo, ressaltando sua obra tanto na vida de Jesus quanto no ministério continuo da igreja. Em primeiro lugar: a ação do Espírito Santo é vista na vida de várias pessoas fiéis, relacionadas ao nascimento de João Batista e Jesus (1.35,41,67; 2.25-27), bem como no fato de João ter cumprido seu ministério sob a unção do
Espírito Santo (1.15). O mesmo Espírito capacitou Jesus para cumprir seu ministério. Em segundo lugar: O Espírito Santo capacita Jesus para cumprir seu ministério -o Messias ungido pelo Espírito Santo. Nos caps 3 e 4, há cinco referencias ao Espírito, usadas com força progressiva.
1) O Espírito desce sobre Jesus em forma corpórea, como uma pomba
(3.22);
2) Ele leva Jesus ao deserto para ser tentado (4.1);
3) Após sua vitória sobre a tentação, Jesus volta para a Galiléia no poder
do mesmo (4.14);
4) Na sinagoga de Nazaré, Jesus lê a passagem messiânica: “O Espírito
do Senhor está sobre mim...”(4.18; Is 61.1-2), reivindicando o
cumprimento nele (4.21). Então;
5) Evidência seu ministério carismático está repleta (4.31-44) e continua
em todo seu ministério de poder e compaixão.
Em terceiro lugar: O Espírito Santo, através de oração de petição leva a cabo
o ministério messiânico. Em momentos críticos daquele ministério, Jesus ora antes, durante ou depois do acontecimento crucial (3.21; 6.12; 9.18,28; 10.21). O mesmo Espírito Santo que foi eficaz através de orações de Jesus dará poder as orações dos discípulos (18.1-8) e ligará o ministério messiânico de Jesus ao ministério poderoso deles através da igreja (24.48.49).
Em quarto lugar: O Espírito Santo espalha alegria tanto a Jesus como à nova comunidade. Cinco palavras gregas denotando alegria ou exultação são usadas duas vezes com mais freqüência tanto Lucas como Mateus ou Marcos. Quando os discípulos voltam com alegria de sua missão (10.17), “Naquela mesma hora, se alegrou Jesus no Espírito Santo e disse...” (10.21). Enquanto os discípulos estão esperando pelo Espírito prometido (24.49), “adorando-o eles, tornaram com grande júbilo para Jerusalém. E estavam sempre no templo, louvando e bendizendo a DEUS” (24.52-53).
3.7. Pontos salientes em Lucas
3.7.1. João Batista (3.1-20)
A pregação de João é contada nos quatro Evangelhos, (Mt 3.1-12; Mc 1.1-8; Jo 1.6-8,19-28). Lucas é o mais circunstanciado de todos.
A história da infância e mocidade de João é resumida numa única frase: “evitava morar em sociedade e vivia na solidão da região selvagem e descampada ao Oeste do Mar Morto”.
Sabia desde menino que o Evento dos séculos estava próximo, e que nascera para anunciar sua chegada.
Nasceu na cidade de Abraão, fundador da nação cuja finalidade era trazer à luz o Messias; cresceu vendo todos os dias o Monte Nebo, de cujas alturas Moisés divisara, com olhos saudosos, a Terra Prometida, e falara do Messias também prometido; este monte dominava o Jordão, no ponto atravessado por Josué e Jericó, cujos muros ruíram ao buzinar do mesmo; vivia na mesma região onde Amós apascentara seus rebanhos e sonhara com o Rei davídico vindouro que governaria as nações; visitava amiúde o ribeiro de Querite, onde Elias fora alimentado pelos corvos, meditava profundamente na História que estava se encaminhando para o seu clímax, e aguardava a chamada de Deus.
Sabendo que seria o Elias profetizado, (1.17; Mt 11.14; 17.10-13; Ml 4.5 (não Elias em pessoa, Jo 1.21), de propósito, talvez, copiou os hábitos e a maneira de trajar daquele profeta.
Alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre, (Mt 3.4). Aqueles, desde os primitivos tempos que se usam como alimento. Assam-se, ou secam-se ao sol, e se comem com grãos tostados. Dizem que têm o sabor de camarão.
Quando João tinha 30 anos foi chamado. A nação, gemendo sob as crueldades da servidão romana, ficou eletrizada com a voz estentórea desse eremita esquisito, rude e corajoso, a bradar das ribanceiras do Jordão que o Libertador, de há muito vaticinado, estava às portas.
O local de suas pregações era o baixo Jordão, defronte de Jericó, numa das principais encruzilhadas da região e uma das principais vias de acesso a Jerusalém.
A ênfase de seus brados era “arrependei-vos”. Suas pregações obtiveram imenso êxito popular. O país inteiro foi sacudido nos seus alicerces. Grandes multidões vinham ao seu batismo, (Mt 3.5). Até Herodes ouviu-o com alegria, (Mc 6.20). Diz Josefo que João “tinha grande influência sobre o povo, que parecia pronto a fazer o que ele aconselhasse.”
Aos que se confessavam arrependidos, pedia que se submetessem ao batismo, que foi uma introdução à bela cerimônia do batismo cristão.
No auge de sua popularidade, batizou Jesus e proclamou-o Messias. Depois, cumprida a sua missão, com presteza se retirou da cena. Despertara a nação de sua letargia e apresentara-lhe o Filho de Deus. Estava feita a sua obra.
No entanto, continuou pregando e batizando por poucos meses, quando se mudou para Enom, na direção do Norte, (Jo 3.23; Mt 3.13-17).
Cerca de um ano depois que batizou Jesus, Herodes prendeu a João, para satisfazer ao capricho de uma mulher perversa, (Mt 14.1-5). Foi isto ao encerrar-se o primeiro ministério de Jesus na Judéia, dezembro, (Mt 4.12; Jo 3.22; 4.35).
Não se menciona o lugar em que ficou detido, mas supõe-se que foi ou Maquero, a Leste do Mar Morto, ou Tiberias, na praia ocidental do Mar da Galiléia; em ambos os lugares Herodes tinha residência. Foi decapitado mais ou menos pela segunda Páscoa que se seguiu, (Mt 14.12-13; Jo 6.4).
Não atinamos com a razão da dúvida de João, (Mt 11.3). Dera um testemunho positivo e de muita fé acerca de ser Jesus o Cordeiro de Deus e
                o Filho de Deus, (Jo 1.29-34). Mas agora, posto a cismar atrás das paredes do cárcere, estava confuso. Jesus não estava fazendo o que ele julgava que
                o Messias fizesse. Evidentemente, comungava a idéia popular de um reino Messiânico de caráter político. Deus não lhe revelara tudo com relação à natureza do reino. Mesmo os doze demoraram a aprender isso, e não o compreenderam senão depois da ressurreição.

Admitindo que João começou Seu ministério pouco antes de batizar Jesus, provavelmente no verão de 29 d.C., o mesmo durou cerca de um ano e meio, ou menos 30 anos de isolamento. Ano e meio, ou menos, de pregação pública. Um ano e 4 meses na prisão. Depois cerrou-se a cortina. Temos aí breve sumário da vida do homem que introduziu em cena o Salvador do mundo, e de quem Jesus disse ter sido maior que qualquer outro, (Mt 11.11). João não operou milagres, (Jo 10.41).
3.7.2. A mulher pecadora , 7.36-50
Não há a menor base para se identificar esta mulher com Maria Madalena, ou com Maria de Betânia. Esta unção NÃO foi a mesma que houve em Betânia (Jo 12.1-8). Esta mulher, muito conhecida na cidade por sua má reputação, (v.37), era provavelmente uma das meretrizes que se converteram fosse por João Batista, fosse por Jesus, (Mt 21.31-32), e agora, profundamente envergonhada, arrependida e humilhada, vinha protestar francamente sua gratidão a Jesus. Foi na casa de um fariseu. Um banquete no Oriente era mais ou menos aberto ao público. Jesus, meio reclinado num divã, Seu rosto voltado para a mesa, Seus joelhos dobrados, foi acessível à mulher aproximar-se. Chorando, beijando-lhe os pés, banhando-os com o rico perfume e enxugando com os seus cabelos as lágrimas que caíam -a nós, os
respeitáveis que somos, ela faz que nos envergonhemos, assim inclinada, em inteira humildade e adoração reconhecida aos pés do seu Senhor.
Jesus tinha maneiras muito delicadas com mulheres que haviam errado (Jo 4.18; 8.11). Todavia, ninguém nunca Lhe atribuiu motivos duvidosos, (Jo 4.27).
3.7.3. Outras mulheres, 8.1-3
Nomeiam-se três, além de “muitas outras”. Nada mais se sabe de Susana. Joana era a mulher do procurador de Herodes, oficial do palácio real. Ela pertencia ao grupo dos amigos mais íntimos de Jesus. Estava entre aquelas que foram ao túmulo, (Lc 24.10).


3.7.4. Maria Madalena
Maria Madalena era a mais proeminente daquelas mulheres, líder notável entre elas. É mencionada mais do que outra qualquer, e comumente em primeiro lugar: (Mt 27.56,61; 28.1; Mc 15.40,47; 16.1,9; Lc 8.2; 24.10; Jo 19.25; 20.1,18). Foi a que primeiro Jesus apareceu depois de ressurgir. O fato de ser nomeada entre as que “prestavam assistência com os seus bens”, v.3, sugere que era mulher de algumas posses. O ter sido curada de “sete demônios”, v.2, não quer dizer que fosse depravada. Os demônios causavam doenças e mazelas de várias espécies (Mc 5.1-20), mas em parte alguma isso se relaciona com a imoralidade humana. Inquestionavelmente, era uma mulher de caráter inatacável. Ela NÃO foi a pecadora do capítulo precedente.
Pode ser recomendável que nós, humanos, façamos entre nós mesmos distinção entre pecados respeitáveis e pecados grosseiros, e estigmatizemos aquelas pessoas culpadas de certas modalidades de pecados vulgares. Assim procedendo, podemos ajudar a salvar nossa sociedade humana da completa ruína. Mas, para Deus, todo pecado é pecado. E, sem dúvida, a Deus tanto custa “perdoar nossos pecados decentes” como aqueles que atraem sobre o pecado r a maldição da sociedade. Uma prostituta ter seus pecados perdoados, e ser aceita na companhia dos salvos é uma coisa, mas seria outra bem diferente colocar logo tal pessoa à frente de uma obra religiosa.
3.7.5. A pena de crucifixão
Era com a crucifixão que Roma punia escravos, estrangeiros e os mais vis criminosos, que não fossem cidadãos seus. Era a morte mais agoniada e ignominiosa que uma época de crueldade podia inventar. Batiam-se pregos nas mãos e pés e deixava-se a vítima ali suspensa a agonizar, submetida à
fome, à sede intolerável e a convulsões de dores cruciantes. Comumente a morte sobrevinha depois de quatro a seis dias. No caso de Jesus veio depois de seis horas.

3.8. Esboço da história da crucificação
3.8.1. Coordenada à vista das quatro narrativas
Às 9 da manhã chegam ao Gólgota. Quando se preparam para cravar as mãos e os pés de Jesus, oferecem-Lhe vinho misturado com fel, como entorpecente, para Lhe diminuir as dores. Ele, porém, recusa beber. O Mestre bendito suportou as dores todas, por nós; amamo-Lo por isso.
“Pai, perdoa-lhes: porque não sabem o que fazem”, diz quando O pregam à cruz. É difícil para nós conter a indignação, apenas com a leitura do fato. Quanto mais para Ele. Mas Jesus não tem absolutamente qualquer ressentimento. Admirável domínio próprio!
Suas vestes dividem-nas os soldados entre si. Colocam a inscrição “Rei dos Judeus” sobre a Sua cabeça, redigida em três línguas -hebraico, latim e grego -de modo que todos leiam e entendam qual é o crime de que O acusam.
É escarnecido, ouve chacotas, é injuriado, vilipendiado pelos principais sacerdotes, anciãos, escribas e soldados. Que multidão de coração duro, desumana, brutal e vil!
“Hoje estarás comigo no Paraíso”, diz ao ladrão arrependido, possivelmente depois de uma ou duas horas.
“Mulher, eis aí teu filho.” A João, “eis aí tua mãe.” Provavelmente, quando estava perto do meio-dia, após afastar-se a turba dos escarnecedores. Que morte gloriosa! Orou pelos Seus algozes; prometeu o Paraíso ao ladrão; e providenciou um lar para Sua mãe -Seu último ato neste mundo.
Trevas, desde o meio-dia às 3 da tarde. Suas primeiras três horas na cruz foram assinaladas por palavras de misericórdia e ternura. Agora, entra na última fase da expiação pelo pecado humano. Talvez as trevas simbolizem o afastamento de Deus, de modo a ser um ato de completa expiação. O que Jesus sofreu naquelas horrendas três horas jamais saberemos neste mundo.
Suas quatro últimas frases proferiu-as já expirando.
“Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?” Sozinho, sofrendo as dores do inferno, para que não fôssemos parar ali. “Tenho sede.” Febre ardente e sede excruciante acompanhavam a crucifixão.
Pode ter significado mais, ver Lc 16.24. Oferecem-Lhe vinagre, que Ele toma,
já passadas as dores. “Está consumado.” Exclamação de alívio e gozo triunfais. Está por terra o longo reinado do pecado humano e da morte.
“Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito.” Foi para o Paraíso. Treme a terra, rasga-se o véu, os túmulos se abrem. É a salva de Deus. O centurião crê. As multidões ficam compungidas. “Sangue e água” do lado de Jesus. José e Nicodemos pedem o corpo, para sepultá-lo. Cai a noite sobre o mais negro e mais revoltante crime da História.



CAPÍTULO 4
EVANGELHO DE JOÃO
4.1. Introdutório
O Evangelho de João é singular. Mateus, Marcos e Lucas são chamados Evangelhos Sinóticos porque, a despeito de suas ênfases individuais, descrevem muitos dos mesmos eventos da vida de Jesus de Nazaré. João se volta principalmente para eventos e discursos não comuns aos outros evangelhos, com intuito de provar a seus leitores que Jesus é Deus na carne, a eterna Palavra vinda à terra, que nasceu para morrer como sacrifício oferecido a Deus para tirar o pecado humano. Sete sinais miraculosos provam que “Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome” (20.31). Jamais se escreveu um tratado evangélico mais excelente que a narrativa inspirada que João elaborou sobre a vida, morte e ressurreição de Cristo.
4.2. Autoria
A tradição que atribui o Evangelho ao filho de Zebedeu (Mc 3.17), remonta ao séc. II. Detalhes indicados no livro o caracterizam como um autêntico judeu palestínico, profundamente religioso e bom conhecedor das tradições e das expectativas do seu povo, um judeu que encontrou em Jesus de Nazaré o Messias esperado, o Salvador e Senhor, “de quem Moisés escreveu na lei, e a quem se referiram os profetas” (1.45; 12.34,38-40; 15.25). No entanto, não contamos com muito mais informação acerca da pessoa deste evangelista. Dir-se-ia, melhor, que o mesmo deseja ocultar a sua identidade por trás de um anonimato apenas rompido quando se refere àquele discípulo “a quem ele amava” (13.23; 19.26; 20.2; 21.20), de quem em 21.24 se diz que “dá testemunho a respeito destas coisas e que as escreveu”.
João, o apóstolo, era filho de Zebedeu e Salomé e, irmão mais novo de Tiago: Era galileu e aparentemente vinha de uma família abastada (Mc 15.40­41). Era uma pessoa de firme caráter a ponto de ser chamado “filho do t rovão” (Mc 3.17). Teve papel importante na igreja primitiva em Jerusalém (At 3.1; 8.14; Gl 2.9). Mais tarde esteve em Éfeso e, por razões desconhecidas, foi exilado na ilha de Patmos (Ap 1.9).
4.3. O prólogo
Em João tudo também se conforma a um padrão e propósitos especiais.
Não encontramos no prólogo de João genealogia humana, mas em alguns golpes profundo da pena ele nos leva a píncaros mais elevados e sublimes do que qualquer dos outros Evangelhos. Qual a importância da simples antigüidade humana na terra? Para começar, com este Cristo magnífico você deve projetar-se para além da primeira alvorada no tempo, para a eternidade? Antes do mundo ter começado, o Verbo já existia. “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus... Todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e sem Ele nada do que foi feito se fez. A vida estava nele, e a vida era a luz dos homens.”
Ele não é apenas o “filho de Davi”, ou o “filho de Abraão”, ou o “filho de Adão” -Ele é o Filho de Deus. Ele é o Verbo, e portanto co-eterno com a Mente eterna. Mas para que não seja de modo algum considerado como impessoal, Ele é também o Filho, e portanto co-pessoal com o Pai, Ele não é pessoalmente idêntico ao Pai: absolutamente, como Verbo estava “com Deus”, e como Filho está “no seio do Pai”. Isto também não é tudo: pois, a fim de que não seja julgado essencialmente subordinado ao Pai -como uma palavra do pensamento, ou um filho ao pai -Ele é também a Vida e a Luz. Ele não transmite, simplesmente a Vida, e reflete a Luz -mas “é” a Vida, e “é” a Luz. A Vida está “nEle”.
Neste curto preâmbulo, João O descreveu como Verbo, a Luz, a Vida e o Filho. Não é então preciso dizer que é este o aspecto de Cristo que nitidamente se repete através de todo o quarto Evangelho. Tudo é adaptado de modo a salientar a revelação da luz, vida e amor divinos através dEle, que, desde o início, é chamado de Verbo. Como “Luz” Ele revela. Como “Filho” redime. Como “Vida” renova. A humanidade não é obscurecida, mas a ênfase está na Divindade.
4.4. Propósito
João deixa claro o propósito do seu Evangelho, em 20.31, a saber: “para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome”. Alguns manuscritos gregos deste Evangelho apresentam, nesta passagem, formas verbais distintas para “crer”. Uns contêm o aoristo subjuntivo (“para que comecem a crer”); outros contêm o presente do subjuntivo (“para que continuem crendo”), No primeiro caso, João teria escrito para convencer os incrédulos a crer em Jesus Cristo e serem salvos. No segundo caso, João teria escrito para consolidar os fundamentos da fé de modo que os crentes continuassem firmes, apesar dos
falsos ensinos de então, e assim terem plena comunhão com o Pai e o Filho (cf. 17.3). Estes dois propósitos são vistos no Evangelho segundo João.
O autor do quarto Evangelho, como que dialogando figuradamente com os seus futuros leitores, explica-lhes que os sinais milagrosos feitos por Jesus e recolhidos neste livro... foram registrados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus... (20.30-31). Esta é a intenção que guia o evangelista a coligir também o conjunto de ensinamentos e discursos reveladores da natureza e razão de ser da atividade desenvolvida por Jesus, o Messias, o Filho unigênito (1.14), enviado pelo Pai para tirar “o pecado do mundo” (1.29)
o para dar vida eterna a “todo o que nele crê” (3.13-17).
4.5. Perfil teológico do autor
O autor do Evangelho de João (= Jo) apresenta-se, tal qual João Batista, como uma testemunha viva da revelação de Deus. Ninguém jamais viu a Deus (1.18), mas agora deu-se a conhecer por intermédio do seu Filho (19.35; 21.24).
Encarnado na realidade humana, o Cristo preexistente e eterno veio conferir à nossa história um novo sentido, uma categoria que excede a toda a nossa capacidade de compreensão e raciocínio. Disso, João Batista prestou um testemunho precursor no começo do ministério público de Jesus. Agora, o faz João, o evangelista, a partir da perspectiva do Cristo que vive apesar da morte, do Senhor que, com a sua morte, venceu o mundo (16.33) e que é vida para todo aquele que o aceita pela fé (11.25-26).
A lembrança do Ressuscitado está sempre presente no coração do autor deste Evangelho, como, sem dúvida, ela esteve em cada um dos discípulos que acompanharam o Senhor durante os dias da sua existência terrena (cf. 2.17,22; 12.16; 14.26; 15.20; 16.4). E o acontecimento da ressurreição é como uma linha luminosa que percorre o livro de João desde o princípio até o fim e permite contemplar a figura única e irrepetível do Messias Salvador.
Mais que oferecer uma biografia de Jesus no sentido estrito que hoje damos à palavra, João pretende introduzir o leitor numa profunda reflexão acerca da pessoa do Filho de Deus e do mistério da redenção que nele nos tem sido revelado. Em Cristo manifestou-se o amor de Deus, e, por meio dele, o crente tem acesso às moradas eternas (14.2,23), isto é, a uma vida de comunhão com o Pai.
4.6. Particularidades do Evangelho
O ponto de partida do quarto evangelista para as suas considerações sobre o Messias não é o mesmo que o de Mateus, Marcos e Lucas. João busca outros enfoques, de maneira que, freqüentemente, se refere a situações e eventos ou inclui palavras, ensinamentos e discursos de Jesus, não testificados pelos sinóticos. Isso permite supor que, provavelmente, João, contando com alguma fonte de informação própria, tenha podido ampliar determinados dados conhecidos e transmitidos por aqueles, admitindo-se sobretudo, que, de acordo com o critério mais amplamente aceito, a redação do quarto Evangelho teve lugar depois da aparição dos outros três, em datas próximas ao final do séc. I.
Um aspecto singular deste Evangelho é o persistente interesse em fixar os lugares dos acontecimentos. E curiosamente, enquanto Mateus, Marcos e Lucas dão maior atenção às atividades de Jesus na Galiléia, João fixa-se de modo especial nos fatos que têm lugar em Jerusalém (cf. Jo 2.12; 4.43-54; 6.1; 7.9). Ao mesmo tempo enfatiza que determinadas festas do calendário judaico parecem marcar os momentos escolhidos pelo Senhor para entrar na cidade: a Páscoa (2.23; 11.55), a Festa dos Tabernáculos (7.2), a Festa da Dedicação do Templo (10.22) e, inclusive, uma festa não referida com precisão (5.1).
Essa relação simultânea de Jesus com Jerusalém e com as festividades judaicas é um dos elementos de composição que contribuem a dar ao texto deste Evangelho o seu colorido peculiar. Mas não é o único, pois existem outros traços igualmente característicos que é necessário ter presentes. Destacamos entre eles:
A linguagem simbólica (p. ex.: o Verbo Jo 1.1; a água: 7.37; o pão: 6.35; a luz: 8.12). As imagens tiradas do Antigo Testamento (p. ex.: o pastor e as ovelhas: 10.1-1 8; cf. Sl 23; a videira e os ramos: 15.1-6; cf. Is 5.1-7). As referências culturais ou à natureza humana; (p. ex.: as bodas em Caná, a personalidade de Nicodemos, a mulher samaritana, o cego de nascimento).
4.7. Cristo revelado
O livro apresenta Jesus como ó único Filho gerado por Deus que se tornou carne. Para João, a humanidade de Jesus significava essencialmente uma missão dupla: 1) como o”Cordeiro de Deus (1.29), ele procurou a redenção da humanidade; 2) Através de sua vida e ministério, ele revelou o Pai. Cristo colocou-se coerentemente além de si mesmo perante o Pai que o havia enviado e a quem ele buscava glorificar. Na verdade, os próprios milagres
que Jesus realizou como “sinais”, testemunham a missão divina do Filho de Deus.
4.8. O Espírito Santo em ação
A designação do Espírito Santo como “Confortador” ou “Consolador” (14.16) é exclusiva de João e significa literalmente “alguém chamado ao lado”. Ele é “outro consolador”, isto é, alguém como Jesus, o que estendeu o ministério de Jesus até o final desta era. Seria um grave erro, entretanto, compreender o objetivo do Espírito apenas em termos daqueles em situações difíceis. Ao contrário,João demonstra que o papel do Espírito abrange cada faceta da vida. Em relação ao mundo exterior de Cristo, ele trabalha como o agente que convence o mundo do pecado, da justiça e do juízo (16.8-11). A experiência de ser “nascido no Espírito” descreve o Novo Nascimento (3.6). Como, em essência, Deus é o Espírito, aqueles que o adoram devem fazê-lo espiritualmente, isto é, conforme comandado e motivado pelo ES (4.24). Além disso, em antecipação do Pentecostes, o Espírito torna-se o capacitador divino para o ministério autorizado (20.21-23).
João revela a função do ES em continuar a obra de Jesus, guiando os crentes e a um entendimento dos significados, implicações e imperativos do evangelho e capacitando-os a realizar “obras maiores” do que aquelas realizadas por Jesus (14.12). Aqueles que crêem em Cristo hoje podem, assim, enxergá-lo como um contemporâneo, não apenas como uma figura do passado distante.
4.9. Conteúdo
No decorrer dos anos têm sido feitos diversos esforços para estabelecer de algum modo a cronologia dos acontecimentos referidos no quarto Evangelho ou para agrupar logicamente os seus elementos literários. Como é evidente que o propósito de João não foi redigir uma crônica, mas criar uma atmosfera de reflexão que conduza o leitor à fé em Jesus Cristo, o Filho de Deus, a composição do livro também deve ser considerada desse ponto de vista. Por outro lado, aquilo que se torna claro num primeiro contato com o texto é a sua divisão em duas grandes seções. Delas, uma chega até o final do cap. 12 e está centrada no ministério público de Jesus; a outra, que compreende os caps. 13-21, narra o acontecido em Jerusalém durante a última semana da vida terrena de Jesus, incluindo a sua paixão e morte e a sua ressurreição.
O conjunto de caps. que forma a primeira seção do livro abre-se com um Prólogo (1.1-18) que, com ressonâncias de Gn 1.1, exalta a encarnação da Palavra de Deus, eterna e criadora, na pessoa de Jesus, o Cristo. Junto a outros assuntos, o Evangelho se refere aqui a um total de sete milagres ou
sinais realizados pelo Senhor para manifestar a sua glória e para que os seus discípulos cressem nele (2.11; 4.48; 5.18; 6.14,16; 9.35-38; 11.15,40). São os seguintes:
1) A conversão da água em vinho (2.1-11);
2) A cura do filho de um oficial do rei (4.46-54);
3) A cura de um paralítico (5.1-18);
4) A alimentação de uma multidão (6.1-14);
5) Jesus caminha sobre as águas (6.16);
6) A cura de um cego de nascença (9.35-38);
7) A ressurreição de Lázaro (11.1-44).
Com respeito a esses atos milagrosos é importante sublinhar o que também se percebe em primeiro lugar na intenção do evangelista, isto é, o seu propósito em destacar o sentido profundo desses milagres como manifestações da atividade messiânica de Jesus. Para dar realce a esse enfoque contribuem os diálogos e discursos que em diversas ocasiões acompanham o relato dos sinais (assim em 5.17-47; 6.25-70; 9.35-10.42; 11.7-16,21-27).
A segunda parte do livro mostra Jesus no seu confronto com os poderes públicos, representados particularmente pelas autoridades religiosas dos judeus. Encabeça a seção o lavamento dos pés dos discípulos e a predição da traição de Judas (13.1-30); logo depois há um longo discurso dirigido aos discípulos (14.1-16.33), concluído com uma oração conhecida como “sacerdotal” (17.1-26). Os caps. 18 e 19 contêm o relato da prisão, julgamento, morte e sepultamento de Jesus; e os caps. 20 e 21 são o testemunho que João presta da ressurreição de Jesus e das diversas aparições do Ressuscitado.
4.10. Abordagem peculiar
Este é o mais teológico dos quatro Evangelhos. Trata da natureza e da pessoa de Cristo, e do significado da fé nEle. A apresentação que João faz de Cristo como o divino Filho de Deus se vê nos títulos que Jesus recebe no livro: “o Verbo era Deus” (1.1), “o Cordeiro de Deus” (1.29), “o Messias” (1.41), “o Filho de Deus” e “o Rei de Israel” (1.49), “o Salvador do mundo” (4.42), “Senhor”...e Deus” (20.28). Sua divindade também é afirmada na série de pronunciamentos “Eu Sou...” (6.35; 8.12; 10.7,9,11,14; 11.25; 14.6; 15.1,5). Em outros pronunciamentos “Eu Sou”, Cristo deixou implícito e explícita Sua reivindicação de ser o EU SOU -Javé do Antigo Testamento (4.24,26; 8.24,28,58; 13.19). Estas eram as mais fortes reivindicações de divindade que Jesus poderia ter feito.
A estrutura e o estilo deste Evangelho são diferentes daqueles dos outros três (os sinópticos). Menciona apenas sete milagres (cinco dos quais não registrados em nenhum dos sinópticos) e registra várias entrevistas pessoais. O autor enfatiza a realidade física da fome, sede, cansaço, dor e morte de Cristo como uma defesa contra a alegação gnóstica de que Jesus não possuíra verdadeira natureza humana.
4.11. Destaques no Evangelho
a) Jesus como “o Filho de Deus”. Do prólogo do Evangelho, com sua sublime declaração: “vimos a sua glória” (1.14), até a sua conclusão na confissão de Tomé: “Senhor meu, e Deus meu!” (20.28), Jesus é Deus, o Filho encarnado;
b) A palavra “crer” ocorre 98 vezes, equivalente a receber Cristo (1.12). Ao mesmo tempo, esse “crer” requer do crente uma total dedicação a Ele, e não apenas uma atitude mental;
c) “Vida Eterna” em João é um conceito-chave, referindo-se não tanto a uma existência sem fim, mas à nova qualidade de vida que provém da nossa união com Cristo, a qual resulta tanto da libertação da escravidão do pecado e dos demônios, como o nosso crescimento contínuo no conhecimento de Deus e na comunhão com Ele;
d) Encontro de pessoas com Jesus. Temos neste Evangelho 27 desses encontros individuais assinalados;
e)   O ministério do Espírito Santo, pelo qual Ele capacita o crente, comunicando-lhe continuamente a vida e o poder de Jesus após sua morte e ressurreição;
f)    A “verdade”. Jesus é a verdade; o Espírito Santo é o Espírito da verdade, e a Palavra de Deus é a verdade. A verdade liberta (8.32); purifica (15.3). Ela é a antítese da natureza e atividade de Satanás (8.44-47,51);
g) A importância do número sete neste Evangelho: sete sinais, sete sermões e sete declarações “Eu Sou” dão testemunho de quem Jesus é (cf. a proeminência do número “sete” no livro do Apocalipse, do mesmo autor);
h) O emprego doutras palavras de destaque como “luz”, “palavra”, “carne”, “amor”, “testemunho”, “conhecer”, “trevas” e “mundo”.
4.12. Pontos salientes em João
4.12.1. O sepultamento
José e Nicodemos, membros do Sinédrio, discípulos ocultos – ocultos na hora da popularidade de Jesus, -agora, na hora da Sua humilhação, apareceram ousadamente para partilhar com Ele a vergonha da cruz. Salve, José! Salve, Nicodemos!
4.12.2. A Mortalha sagrada
O “Scientific American”, de março 1937, publicou o artigo de um cientista francês a respeito de um lençol de linho que hoje se encontra numa igreja católica de Turim, Itália, que ele acreditava fosse o verdadeiro lençol que envolveu o corpo de Jesus. Deu-o como medindo 4,60 m de comprimento, por 1 m e pouco de largura, contendo imagens negativas da frente e costas do corpo de um homem, indicando que esse homem foi posto numa metade do lençol e que a outra metade foi enrolada no corpo, no sentido do comprimento. As figuras, afirmou ele, não foram pintadas, mas são imagens produzidas por vapores amoniacais resultantes da fermentação da uréia, que se desprende em grande quantidade do suor produzido por sofrimento atroz. Há resíduos de aloés e de partículas de sangue, no lenço. As marcas dos açoites, as feridas das mãos, da cabeça e do lado são perfeitamente visíveis, com evidência de que soro e sangue saíram da lançada. É iniludivelmente a imagem de um homem crucificado, todas as minúcias combinando com o registro bíblico e apresentando o semblante de um homem de nobre aparência. Apareceu primeiro na França, em 1355 d.C., com a notícia de que fora visto em Constantinopla em 1204. Não sabemos com certeza se é uma impostura ou a verdadeira mortalha de Jesus.
4.12.3. O túmulo de Jesus, (19.41-42)
“No lugar onde Jesus fora crucificado, havia um jardim, e neste um sepulcro novo, no qual ninguém tinha sido, ainda, posto” Significa que o sepulcro em que Jesus foi sepultado ficava bem perto do lugar onde foi crucificado.
O General Christian Gordon, 1881, encontrou, no pé ocidental do “Monte da Caveira um jardim”. Pôs uma turma a cavar e, debaixo de 1,60 m de entulho, achou um túmulo do tempo dos romanos, cavado numa parede de rocha sólida, com um sulco na frente, por onde a pedra rolava para a porta.
O túmulo é uma sala de 4,60 m de largura, 3,30 m de fundo, 2,50 m de altura. Ao entrar, vêem-se, à direita, duas sepulturas, uma junto à parede da frente, e outra na do fundo. Ficam um pouco abaixo do nível do piso da sala, separadas por uma parede baixa. A sepultura da frente parece que nunca foi concluída. Tudo indica que só a sepultura do fundo foi alguma vez ocupada, e ainda assim sem indícios de restos mortais. O túmulo é suficientemente grande para acomodar um grupo de mulheres e dois anjos, com espaço à cabeça e aos pés onde um anjo podia sentar-se, (Mc 16.5; Jo 20.12). À direita da porta, vê-se uma janela por onde, ao romper do dia, a luz solar teria penetrado na sepultura ocupada. Cada pormenor destes combina com a narrativa bíblica.
Demais disto, segundo Eusébio, o imperador romano Adriano, na perseguição que moveu aos cristãos em 135 d.C., construiu um templo de Vênus sobre o túmulo onde Jesus fora sepultado. Constantino, primeiro imperador cristão d.C., destruiu esse templo. O General Gordon, no entulho que removeu do túmulo, achou uma pedra sagrada da Vênus. Descobriu vestígios de um edifício que fora levantado sobre o dito túmulo. Acima da entrada deste, duas reentrâncias, características dos templos de Vênus.
Numa cripta funerária, junto ao túmulo, foi achada uma pedra tumular, inscrita: “Enterrado perto do seu Senhor.”
No acúmulo da evidência, parece haver base para a opinião que este túmulo no jardim é o verdadeiro lugar onde Jesus foi sepultado e donde surgiu vivo. Para os cristãos, é o lugar sagrado donde surgiu a garantia da vida eterna.
4.12.4. A ressurreição
4.12.4.1. Jesus aparece a Maria Madalena, (20.11-18)
Foi Sua primeira aparição, (Mc 16.9-11). As outras mulheres tinham ido embora. Pedro e João, também. Maria Madalena lá estava só, chorando como se fosse lhe arrebentar o coração. Nada de pensar que Jesus ressuscitara. Ela não ouvira o anjo anunciar que Jesus estava vivo. O próprio Jesus dissera repetidamente que ressuscitaria ao terceiro dia. Fosse como fosse, ela não O compreendera. Mas, oh! quanto O amava! E agora, eis que estava morto. Até o Seu corpo desaparecera. Nesse momento de aflição, Jesus postou-Se ao lado, e chamou-a pelo nome. Ela reconheceu Sua voz e deu um brado em transportes de alegria. Jesus não estava morto, mas vivo!
a) Um pouco depois apareceu às outras mulheres, (Mt 28.9-10);
b) Naquela tarde apareceu aos dois, (Lc 24.13-32);
c) E a Pedro (Lc 24.33-35);
d) Jesus Aparece aos Dez, (20.19-25).
À tardinha daquele dia, em Jerusalém, Tomé ausente, (v.24). Essa aparição vem registrada três vezes: aqui e em (Mc 16.14 e Lc 24.33-43). Jesus estava no mesmo corpo, ostentando as marcas em suas mãos, pés e lado: e comeu na presença deles. Contudo, podia passar através de paredes, a parecer e desaparecer à vontade.
4.12.4.2. Aparece aos onze, (20.26-29)
Uma semana depois, em Jerusalém, Tomé presente. Nenhum crítico moderno poderia ser mais “científico” do que Tomé.
4.12.4.3. A morosidade em crer que Jesus ressuscitara
Eles não esperavam isso, apesar de Jesus lhes ter dito repetida e claramente que ressuscitaria ao terceiro dia, (Mt 16.21; 17.9,23; 20.19; 26.2; 27.63; Mc 8.31; 9.31; Lc 18.33; 24.7). Devem ter tomado Suas palavras como parábola de algum sentido misterioso. Quando as mulheres foram ao túmulo, não foi para ver se Ele ressuscitara, mas para Lhe prepararem o corpo, com vistas ao sepultamento definitivo.
De todos os discípulos, somente João creu à vista do sepulcro vazio (Jo 20.8).
Maria Madalena só pensava numa coisa: que alguém tinha tirado o corpo (Jo 20.8).
A notícia das mulheres, de haver Jesus ressuscitado, pareceu aos discípulos como “delírio” (Lc 24.11).
Quando os dois, voltando de Emaús, disseram aos onze que Jesus lhes aparecera, “não lhes deram crédito” (Mc 16.13).
Pedro relatou que Jesus lhe aparecera (Lc 24.34). Mas ainda não acreditaram (Mc 16.14).
Assim, Jesus o predissera reiteradamente. Os anjos o anunciaram. O túmulo estava vazio. O corpo saíra. Maria Madalena viu-0. As outras mulheres viram-No. Cleópas e seu companheiro viram-No. Pedro viu-O. E ainda o grupo, de um modo geral, não acreditava. Parecia-lhe uma coisa incrível.
Então, ao aparecer Jesus aos dez naquela noite, lançou-lhes em rosto sua indisposição e dureza de coração para crer naqueles que O haviam visto, Mc
16.14. Ainda pensavam que era apenas um espírito, pelo que os convidou
para olhar de perto Suas mãos, lado e pés, e apalpá-Lo. Em seguida, pediu o que comer, e “comeu diante deles”, (Lc 24.28-43; Jo 20.20).
Depois de tudo isso, Tomé, taciturno, de cabeça dura, duvidador, estava certo de que havia por aí um engano qualquer, e não creu senão quando pessoalmente viu a Jesus uma semana depois, (Jo 20.24-29).
De modo que os que primeiro proclamaram a história da ressurreição de Jesus estavam de todo desprevenidos para crer, determinados a não crer, e chegaram a crer a despeito de si mesmos. Isto torna insustentável qualquer possibilidade de haver essa história surgido de uma imaginação excitada e em expectativa. Não há meio concebível de explicar a origem dessa história, senão que foi um FATO REAL. Também nós um dia, pela graça de Cristo, ressurgiremos.
4.12.4.4. Jesus aparece aos sete
Os discípulos estavam agora, de volta, na Galiléia, segundo Jesus lhes ordenara, (Mt 28.7,10; Mc 16.7), a fim de aguardarem novas instruções. Indicara-lhes um certo monte, (Mt 28.16), e, provavelmente, marcara o tempo. Enquanto esperam, voltam à antiga ocupação. Pode ter sido perto, ou no mesmo local onde dois ou três anos antes Jesus pela primeira vez os chamara para serem pescadores de homens, (Lc 5.1-11). Agora, como antes, dá-lhes uma redada miraculosa de peixes. Pode ter tido a intenção de, com isso, dar-lhes uma idéia simbólica do grande êxito do movimento redentor entre os homens, que em breve iniciariam.
“A terceira vez” (v.14), isto é, aos discípulos reunidos, sendo mencionadas as outras em 20.19,26. Contando os indivíduos a quem já aparecera, Maria Madalena, as outras mulheres, os dois, Pedro, era esta a sétima aparição.
“Mais do que estes” (v.15). Estes objetos? Ou, estes homens?
As formas masculina e neutra do pronome “estes”, no grego, são idênticas. Não há meio de saber-se em que sentido é aí usado. “Amas-me mais do que estes outros discípulos?” Ou, “amas-me mais do que a este negócio de pesca?” Estaria Jesus increpando a Pedro sua tríplice negação? Ou estaria censurando-o, delicadamente, por ter voltado ao negócio da pescaria? Inclinamo-nos a admitir esta segunda hipótese.
“Amas-me?” (vv.15,16,17). Jesus emprega o verbo “agapao”. Pedro usa “phileo”. Dois verbos gregos que significam “amar”. “Agapao” exprime um tipo mais elevado de devotamente. Pedro recusa empregá-lo. Na terceira vez Jesus toma a palavra usada pelo apóstolo.
“Pastoreia as minhas ovelhas” (vv.15,16,17), três vezes variando na forma. A idéia pode ser mais ou menos esta: “Pedro, amas-ME mais do que a esta pescaria? Então, melhor para ti será dedicares o teu tempo ao cuidado de meu rebanho; à minha empresa, Pedro, antes que à tua”.
4.12.4.5. O ministério do Senhor
Pelo fato da população da Palestina nos dias de Cristo ter sido em grande parte Bilingue, segue-se quase necessariamente que o Senhor falava em ambas as línguas. Vemos que ele falava algumas vezes em aramaico pelas suas palavras nessa língua não terem sido retiradas em alguns pontos: “Talita cumi” (Mc 5.41): “Eli, Eli, lemá sabactâni” (Mt 27.46). Na capital, especialmente, ao dirigir-se aos chefes judeus, o Senhor Jesus usaria mais o grego. Que Ele falava é indicado na pergunta que os judeus fizeram entre si depois de Jesus dizer que eles haveriam de procurá-lo, mas não o encontrariam: “Disserem, pois, os judeus uns aos outros: Para onde irá este que não o possamos achar? irá, porventura, para a Dispersão (Judeus) entre os gregos com o fim de os (gregos) ensinar?” (Jo 7.35). Se não estivessem acostumados a ouvir Jesus falar em grego, tal pergunta não seria feita.
4.12.4.6. Finais característicos
É interessante notar também a maneira característica em que cada um dos quatro registros termina, e o progresso do pensamento que eles apresentam quando tomamos em conjunto. Mateus finaliza com a ressurreição do Senhor. Marcos avança e termina com sua ascensão. Lucas se adianta mais e encerra com a promessa do Espírito. João completa os quatro, terminando com a promessa do segundo advento. Quão apropriado é que Mateus, o Evangelho do poderoso Messias-Rei, termine com o ato esplêndido de sua ressurreição, a prova culminante de seu caráter messiânico e poder divino! Quão perfeitamente adequado é que Marcos, o Evangelho do servo humilde, se encerre com o Servo exaltado ao lugar de honra! Como soa belo e harmonioso o final de Lucas, o Evangelho do homem ideal, de coração compassivo, ao lermos sobre a promessa do poder que viria do alto! Que conclusão apropriada vemos no fato de João, o Evangelho do Filho Divino, escrito especialmente para a igreja, terminar com a promessa acerca da sua volta, feita pelo Senhor Ressurreto. Propósito conjunto evidenciado pelos quatro Evangelhos faz deles uma obra prima de variedade na unidade.
Conclusão
Alguns comentários usa muito, por exemplo, o argumento da “redação tardia” dos Evangelhos como uma prova da pouca confiabilidade histórica dos dados neles contidos. Essa é, porém, uma visão muito pobre e incompleta. Para começar, há diversas descobertas recentes que indicam serem os Evangelhos mais antigos do que até há pouco se pensava, já havendo alguns registros escritos desde os primeiros anos após a morte e ressurreição de Jesus. Além disso, é importante lembrar que os textos bíblicos não surgiram do nada, não são textos “originais” do autor, mas são sempre fruto e registro de uma tradição oral já de há muito estabelecida, tendo mesmo sido redigidos com a provável ajuda de escritos avulsos pré-existentes. Portanto, a data de redação de um texto bíblico não significa, em absoluto, que antes daquela data não se falava no assunto.
Os relatos evangélicos não devem ser olhados como se fossem uma notícia de jornal ou uma crônica dos acontecimentos nos moldes de hoje. Eles não foram redigidos com pretensões de exatidão matemática, mas isso não significa que os acontecimentos neles narrados não sejam históricos. Significa, sim, que na Bíblia a história é um instrumento, é um meio e não um fim. O mais importante não é a precisão dos dados ou a sua ordem cronológica, e sim a leitura que se deve fazer dos acontecimentos, o significado teológico e catequético neles contido.
Portanto, os fatos existem. Deus se revela concretamente na história, na vida das pessoas. A Bíblia não é ficção, e os Evangelhos, em especial, falam de fatos muito concretos, ocorridos num determinado momento da história, e registrados para a posteridade.
Só que esses fatos ultrapassam a história, ultrapassam o tempo. Eles revelam uma realidade muito maior do que o conjunto de circunstâncias concretas em que se deram. O evangelista sabe disso, por isso organiza sua narrativa de modo a deixar claro, para o leitor, o papel que aqueles acontecimentos desempenham na vida de todos os homens em todos os tempos.
Os evangelhos não foram escritos com a intenção de apresentar uma biografia de Jesus no sentido moderno, mas sim para dar a conhecer a pessoa de Jesus e sua missão, o lugar essencial e preciso que o Filho de Deus ocupa na história de nossa salvação.
Para Mateus, que se dirigia especialmente a judeus convertidos ao cristianismo, era importante mostrar a ligação entre a Nova Aliança e a Antiga, mostrar que em Jesus se cumpriam, de fato, as profecias messiânicas
do Antigo Testamento, que ele era a continuidade lógica da história de salvação iniciada com Abraão. Era preciso que seus leitores pudessem enxergar que todos os acontecimentos da antiguidade tinham sido uma preparação para o advento de Jesus, que inaugurava um novo tempo e uma nova lei, em substituição à antiga. Em toda a Bíblia está presente essa intenção primordial de ensinar a ouvir a voz de Deus nos acontecimentos e discernir seu significado religioso, mais do que simplesmente relatar fatos. Por isso, os hebreus desenvolveram um gênero literário especialmente propício a isso, chamado midraxe. O midraxe é um relato de fundo histórico, mas que pode ser “enriquecido” com traços fictícios, comentários interpretativos e associações com outros fatos bíblicos, a fim de tornar mais clara a mensagem que o autor deseja apresentar. É uma espécie de comentário teológico sobre os fatos, a fim de se tornem um instrumento catequético. Dentro da maneira de pensar dos judeus antigos, tal recurso literário era lícito e válido, não era visto como “enganação” ou falsificação, como alguns tendem a concluir ao avaliar, anacronicamente, a cultura antiga pelos padrões de hoje. Se os teólogos vêem com clareza essa questão, demonstram às vezes certa falta de cuidado na hora de explicá-la aos fiéis.
O Evangelho de Mateus procura apresentar Jesus como o novo Moisés, o novo libertador e legislador que leva à plenitude a antiga Lei, e forma o novo povo de Deus, que é a Igreja. Para enfatizar esse paralelo com Moisés, Mateus interpreta os fatos da infância de Jesus de forma a evidenciar sua relação com as tradições antigas. Assim, Jesus vai ao Egito e de lá regressa, uma vez afastados os seus perseguidores, num paralelo entre Mt 2, 19-21 e Ex 4,19s.
Há escritos judaicos antigos (não bíblicos) que dizem terem sido os astrólogos que revelaram ao Faraó o futuro nascimento do libertador de Israel, motivo pelo qual o Faraó mandou matar os bebês hebreus do sexo masculino (Ex 1,16). Há aqui um paralelo com Mt 2,16, onde Herodes manda matar os meninos na esperança de, entre eles, matar também Jesus, cujo nascimento lhe fora igualmente anunciado por astrólogos ou magos (Mt 2.1­2). Essa semelhança e outras ainda -como a relação entre a estrela vista pelos magos e a profecia de Balaão em Nm 24.17 -mostram a intenção de Mateus de apresentar Jesus como novo Moisés.
Isso é o que os teólogos geralmente dizem -e não estão errados. Mas eles deveriam enfatizar mais que tal circunstância não significa, absolutamente, uma falsificação da história.
Vários testemunhos de autores pagãos atestam que a expectativa judaica de um Messias encontrava eco também entre povos distantes, tendo sido, sem
dúvida, introduzida no Oriente pelos judeus por ocasião do exílio (séc. VI a.C.), e também depois. Por exemplo, o historiador romano Tácito (+120 d.C) escreveu: “Os homens estavam geralmente persuadidos, à luz da fé de antigas profecias, de que o Oriente ia tomar a vanguarda, e, dentro em breve, se veria sair da Judéia aqueles que governariam o universo” (Hist.V.23). Também Zaratustra (séc. VI/VII a.C.), na Pérsia, falava de uma tradição segundo a qual o Bem triunfaria sobre o Mal graças à “verdade encarnada” que devia nascer de uma “virgem que nenhum homem tivesse tocado”.
Isso mostra que havia, sim, no Oriente, sábios pagãos capacitados para discernir um sinal enviado por Deus sobre o nascimento do Messias judeu. A estrela, além de ser o símbolo da nação judaica, era imagem comum entre os judeus para designar o aparecimento de um grande homem, podendo representar também um anjo, ou qualquer sinal de que se sirva a Providência para guiar os homens.
Sabe-se também que havia, entre os medos e persas, uma casta sacerdotal muito bem conceituada, designada pelo nome de “magos” (o que, em sua língua, significava “sacerdote”), e que se ocupava da adivinhação, astrologia e medicina. Sabe-se, igualmente, que era comum a presença de reis e outras personalidades pagãs em Jerusalém, atraídos -entre outros motivos ­também pela religião aí praticada.
Portanto, a história contada por Mateus não é nenhum absurdo, mas perfeitamente possível, ainda que Mateus possa ter dado forma personalizada a um fato genérico. Não se pode provar que aqueles determinados magos existiram, mas também não se pode provar que não existiram. Na verdade, não há como detectar o limite exato entre os fatos reais e os pormenores que a tradição lhes acrescentou com finalidade catequética, mas é certo que o núcleo essencial é histórico.
Agora, quanto à afirmação de que “não eram três e não eram reis”: de fato, o Evangelho não diz que eles eram reis, nem diz quantos eram; só fala em “magos do Oriente”. Nem por isso se pode afirmar com certeza que não eram três ou não eram reis, pois é perfeitamente possível que o fossem. A abordagem mais razoável seria dizer, simplesmente, que não é possível saber se essa tradição retrata a verdade, e que o Evangelho não traz essa informação (nem a desmente).
A idéia de que eram três surgiu a partir do número de presentes oferecidos: ouro, incenso e mirra (Mt 2.11). Quanto ao status de reis, deriva provavelmente de diversas profecias messiânicas que dizem que “todos os reis da terra se prostrarão diante dele e lhe pagarão tributo”.
A Igreja aplicou, aqui, o mesmo processo catequético usado pelos judeus, permitindo que se formassem e se cultivassem tradições que, sem apresentar pretensões de verdade histórica, ajudam os fiéis a compreender e a celebrar
o mistério da Salvação. Isso deve ser entendido e reconhecido como um recurso pedagógico legítimo e saudável, não condenado como sinal de atraso e ignorância.

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