quarta-feira, 25 de março de 2020

FACULDADE DE TEOLOGIA
TESTEMUNHAS HOJE


CURSO LIVRE
HISTÓRIA DA IGREJA
E  A VIDA
DOS APÓSTOLOS










 PRIMEIRA PARTE

HISTÓRIA DA IGREJA
E  A VIDA DOS APOSTOLOS
INTRODUÇÃO
Começamos este trabalho de pesquisa, para apresentar algo fidedigno e em consonância com as sagradas letras, e mostrar com fundamentação a história do começo da igreja do Senhor Jesus Cristo, e seu desenvolvimento pelos séculos. E de maior importância, como você pode saber no meio de tantas representadas, igrejas e denominações qual será realmente a verdadeira Igreja de Cristo, vou te dar algumas boas dicas e um estudo todo com muitas referências bíblicas e secular a partir de agora, não deixe de ler e pesquisar as referencias. Se você estiver desejoso de buscar as características da verdadeira Igreja de Cristo como era no principio a Igreja Primitiva. Preliminarmente deixo alguns pontos que julgo importantes nesta busca boa pesquisa;
- Em primeiro lugar a Igreja Verdadeira Você Não precisa pagar para receber uma benção.
- Em Segundo Lugar a Igreja tem que dar expansão ao Espírito Santo de Deus, acreditar no seu poder e na sua manifestação e não reprimir os irmãos que Deus quer usar porque Deus usa quem quer na hora que quer e com quem Ele quer.
- Em terceiro lugar  ter como Pastor em sua Igreja aquele que seja realmente um Pastor segundo o coração de Deus, e Não um ditador. Mas que ande guiado, e deixe o Espirito Santo ser o guia da igreja.
- Em quarto lugar ajudar os que necessitam em nosso meio, pois bom exemplo nos deu Jesus que devemos sentir as necessidades dos outros e se colocar em seu lugar.
- Em quinto e último lugar a verdadeira Igreja de Cristo é aquela que não se deixa levar pela posição social ou financeira que o membro possui mais sim se deixa levar pelo mover do Espírito Santo de Deus agindo conforme a sua vontade. (Não se conforma com esse mundo faça a diferença, pois você e um escolhido de Deus para pelejar nesses últimos dias contra as forças do mal, Deus sempre levanta homens e mulheres encorajados para pelejar contra as forças do maligno seja mais um a entrar nessa batalha e você realmente fará parte da verdadeira Igreja de Cristo a coluna e firmeza da verdade.
As obras que foram escritas ao longo do tempo sobre a história da igreja. Aquela que tem sido a morada de Deus nos últimos 2000 anos deve ser objeto do mais profundo interesse de Seus filhos. Não estamos falando, aqui, da igreja como é geralmente representada na história, mas de como ela é definida nas Escrituras. Ali, ela é vista em seu verdadeiro caráter espiritual, como o corpo de Cristo, e como a "morada de Deus em Espírito" (Efésios 2).
Devemos sempre ter em mente, ao ler tudo o que é relacionado à história da igreja, que, dos dias dos apóstolos até os dias de hoje, sempre existiram duas classes distintas e amplamente diferentes na igreja professa: os meramente nominais, e os reais - os verdadeiros e os falsos. Isto havia sido predito. "Porque eu sei isto", disse o apóstolo, "que, depois da minha partida, entrarão no meio de vós lobos cruéis, que não pouparão ao rebanho. E que de entre vós mesmos se levantarão homens que falarão coisas perversas, para atraírem os discípulos após si." (Atos 20:29-30). Sua Segunda Epístola a Timóteo é também cheia de alertas e direções referentes às várias formas de mal que foram, então, claramente manifestas. Uma rápida mudança para pior tomou conta desde a vez que sua primeira epístola tinha sido escrita. Ele exorta aos verdadeiros crentes para andar em separação daqueles que tinham aparência de piedade, mas que negavam a eficácia dela. "Destes", diz ele, "afasta-te". Tais exortações são sempre necessárias, semple aplicáveis - tanto hoje quanto antes. Não podemos nos separar da Cristandade professa sem deixarmos de lado o Cristianismo; mas podemos e devemos nos separar do que o apóstolo chama de "vasos para desonra". A promessa é que, "se alguém se purificar destas coisas, será vaso para honra, santificado e idôneo para uso do Senhor, e preparado para toda a boa obra." (2 Timóteo 2:21).
É interessante - apesar de também doloroso - destacar a diferença, neste ponto, entre a Primeira e a Segunda Epístola a Timóteo. Na primeira, é falado da igreja de acordo com seu verdadeiro caráter e com sua bendita posição na Terra. Lá ela é vista como a casa de Deus - a coluna e a firmeza da verdade para o homem. A Segunda Epístola mostra o que ela se tornou graças às falhas daqueles em cujas mãos ela foi confiada.
Vamos tomar uma passagem de cada Epístola como ilustração: (1) "Escrevo-te estas coisas, esperando ir ver-te bem depressa. Mas, se tardar, para que saibas como convém andar na casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, a coluna e firmeza da verdade." (1 Timóteo 3:14-15)

(2) "Numa grande casa não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de pau e de barro; uns para honra, outros, porém, para desonra." (2 Timóteo 2:20). Aqui tudo mudou - infelizmente mudou. No lugar da ordem divina há uma incorrigível confusão; no lugar da "casa de Deus, a coluna e firmeza da verdade", há uma"  grande casa" - praticamente "o mistério da iniquidade". Em vez da casa ser mantida de acordo com a vontade de Deus, e adequada a Ele, ela é organizada e ordenada de acordo com a vontade do homem, e para sua própria vantagem e exaltação pessoal. Assim, sem muita demora, o mal, que tem sido o pecado e a desgraça da Cristandade até então, fez suas primeiras aparições. Mas isto é posto de lado quando o Espírito de Deus, em grande misericórdia, nos fornece as mais claras direções para o dia mais sombrio da história da igreja, indicando o caminho da verdade para os piores tempos; deste modo, ficamos sem desculpas. Os tempos e circunstâncias mudam, mas nunca a verdade de Deus.
OS ERROS DOS HISTORIADORES EM GERAL
Alguns historiadores, infelizmente, não levaram em consideração esta triste mistura dos vasos bons e ruins - dos verdadeiros e falsos cristãos. Eles mesmos não eram homens com mentes espirituais. Portanto fizeram, e ainda fazem, de seu objetivo principal, registrar os vários caminhos anticristãos e perversos dos meros professos. Eles se delongam minuciosamente nas heresias que perturbaram a igreja, nos abusos que a desgraçaram, e nas controvérsias que a distraíram. Nós, pelo contrário, nos esforçaremos para perscrutar pelas longas páginas escuras da história em busca da linha prateada da graça de Deus nos verdadeiros cristãos, embora muitas vezes a liga seja tão predominante que o minério puro é quase imperceptível.
Deus nunca deixou a Si mesmo sem um testemunho. Ele sempre manteve Seus amados e queridos, mesmo que ocultos, em todas as eras e em todos os lugares. Nenhum olho a não ser o dEle poderia enxergar os sete mil em Israel que não tinham se curvado à imagem de Baal, nos dias de Acabe e Jezabel. E não há dúvida que dezenas de milhares, mesmo nas épocas mais sombrias do Cristianismo, serão encontrados, afinal, na "gloriosa igreja", que Cristo apresentará a Si mesmo, no tão esperado dia de Sua alegria nupcial. Muitas pedras preciosas encontradas em meio ao lixo da "idade média" refletirão Sua graça e glória naquele dia sem par.
Que bendito pensamento! Mesmo agora enche a alma de júbilo e deleite. Senhor, apresse aquele dia tão feliz por amor de Teu próprio nome!
Diferente de muitos falsos, os verdadeiros crentes são humildes por instinto. Eles são geralmente reservados, e a maioria são pouco conhecidos. Não há humilhação tão profunda e real como aquela que o conhecimento da graça produz. Tais pessoas modestas e ocultas encontram pouco espaço nas páginas históricas. Mas o convincente e zeloso herege, e o barulhento e visionário fanático, são barulhentos demais para escapar à vista. Por isso, também, que os historiadores vêm recordando tão cuidadosamente os tolos e insensatos princípios e as más práticas de tais homens.
Vamos agora mudar um pouco de assunto, e tomar uma visão geral da primeira parte de nosso assunto: as sete cartas às igrejas da Ásia.
AS SETE IGREJAS DA ÁSIA
Estas sete cartas às igrejas das Ásia servirão de base para nossos futuros estudos. Cremos que elas não sejam apenas históricas, mas também proféticas. Sem dúvida, elas são terminantemente históricas, e este fato deve pesar no que diz respeito ao estudo de seu caráter profético. As sete igrejas realmente existiram nas sete cidades aqui citadas, e nas condições aqui descritas. Porém, é igualmente claro que elas foram destinadas, por aquEle que sabe tudo do início ao fim, a ter um significado profético, assim como sua aplicação histórica. Estas igrejas locais foram selecionados em meio a muitas, e assim dispostas e descritas de modo a prenunciar o que havia de vir. Limitar sua aplicação apenas às sete igrejas literais que se encontravam na Ásia seria estragar a unidade do livro de Apocalipse, e perder de vista as bênçãos prometidas. "Bem-aventurado aquele que lê, e os que ouvem as palavras desta profecia"(Apocalipse 1:3). O caráter de todo o livro é profético e simbólico. O segundo e oterceiro capítulo não são exceções. Eles são introduzidos pelo próprio Senhor em seu caráter místico: "O mistério das sete estrelas, que viste na minha destra, e dos sete castiçais de ouro. As sete estrelas são os anjos das sete igrejas, e os sete castiçais, que viste, são as sete igrejas." (Apocalipse 1:20)
O número sete é característico. Ele marca um círculo completo dos pensamentos e modos de Deus quanto ao tempo. Daí vêm os sete dias da semana, as sete festas de Israel e as sete parábolas do reino dos céus em mistério. Este número é frequentemente usado no decorrer do livro de Apocalipse ao tratar de judeus, gentios e a igreja de Deus como responsáveis diante de Deus sobre a Terra. Por isso vemos sete igrejas, sete estrelas, sete castiçais, sete anjos, sete selos, sete trombetas, sete taças e as sete últimas pragas. Apenas nos capítulos 2 e 3 vemos a igreja como responsável diante de Deus sobre a Terra, e como objeto do governo divino. Nos capítulos 4-19 a igreja está no Céu, {*portanto não sendo mencionada nesses capítulos}. Então ela aparece novamente em plena glória manifesta com seu Senhor apenas no capítulo 19: "E seguiam-no os exércitos no céu em cavalos brancos, e vestidos de linho fino, branco e puro." (Apocalipse 19:14). {*E aparece no mesmo capítulo também como a esposa já pronta para o casamento: "Regozijemo-nos, e alegremo-nos, e demos-lhe glória; porque vindas são as bodas do Cordeiro, e já a sua esposa se aprontou." (Apocalipse 19:7)}

No corpo do livro, especialmente a partir do capítulo 6, é feita menção a judeus e gentios, que são tratados judicialmente a partir do trono de Deus no Céu. Porém isto não acontecerá até que a igreja - a verdadeira noiva do Cordeiro - seja arrebatada para o Céu, e as coisas meramente nominais e corruptas sejam finalmente rejeitadas.
Esta divisão do livro em três partes, vinda do próprio Senhor, torna a ordem dos eventos bastante clara, e deve ter um imenso peso como princípio de interpretação no estudo de Apocalipse. No capítulo 1:19 Ele nos fala do conteúdo e plano do livro inteiro: "Escreve as coisas que tens visto, e as que são, e as que depois destas hão de acontecer". "As coisas que tens visto" se referem à revelação de Jesus como vistas por João no capítulo 1; "as coisas que são", como a condição presente do corpo professante como apresentado nos capítulos 2 e 3. "As coisas que depois destas hão de acontecer" são referentes ao capítulo 4 em diante. A terceira divisão começa no capítulo 4. Uma porta no Céu é aberta, e o profeta é chamado para subir até lá. "Sobe aqui, e mostrar-te-ei as coisas que depois destas devem acontecer." É a mesma frase encontrada no capítulo 1:19. As coisas que são, e as coisas que devem acontecer depois destas, não poderiam, de maneira alguma, acontecerem ao mesmo tempo. Uma deve terminar antes que a outra comece.
Quando o número sete é usado, não em sentido literal, mas simbolicamente, sempre tem o significado de completude. É evidente, portanto, que seja utilizado nos capítulos 2 e 3. Como sabemos, havia outras igrejas além daquelas mencionadas, mas sete são selecionadas e associadas a fim de apresentar um quadro completo do que se desenvolveria posteriormente na história da igreja sobre a Terra. Os mais importantes elementos morais que existiam naquelas igrejas naquele momento, o Senhor previu que reapareceriam no decorrer do tempo. Assim temos uma figura sete vezes perfeita - isto é, divinamente perfeita - dos sucessivos estados pela qual passaria a igreja professa durante todo o período de sua responsabilidade sobre a Terra.
Vamos agora resumir rapidamente o que é apresentado sobre essas sete igrejas, e dar uma ideia geral dos diferentes períodos da história aos quais elas se aplicam.
UM RESUMO DAS SETE IGREJAS
•     Éfeso: Em Éfeso o Senhor detecta a raiz de todo o declínio. "Deixaste teu primeiro amor". Ela é ameaçada a ter seu castiçal removido a menos que se arrependa. Período: da era apostólica até o final do segundo século.
•     Esmirna: A mensagem a Éfeso é geral, mas para Esmirna é específica. E, apesar de aplicada àquela assembleia naquele tempo, ela prefigura, de forma muito marcante, as repetidas perseguições pela qual a igreja passou sob os imperadores pagãos. No entanto, Deus pode ter usado o poder do mundo para deter o progresso do mal dentro da igreja. Período: do segundo século até Constantino.
•     Pérgamo: Aqui temos o estabelecimento do Cristianismo por Constantino como a religião do Estado. Em vez de perseguir os cristãos, ele os patrocina. A partir daí a queda da igreja avança rapidamente. Sua aliança profana com o mundo resultou em sua mais triste e profunda queda. Foi então que ela perdeu o verdadeiro sentido de sua relação com Cristo no Céu, e de seu caráter como peregrina e estrangeira na Terra. Período: do começo do quarto século até o sétimo século, quando o papado foi estabelecido*.
•     Tiatira: Em Tiatira vemos o papado da idade média, em semelhança à Jezabel, praticando todo o tipo de maldade, e perseguindo os santos de Deus, sob o disfarce de zelo religioso. No entanto, havia um remanescente temente a Deus em Tiatira, a quem o Senhor conforta com a brilhante esperança de Sua vinda, e com a promessa de poder sobre as ações, quando o próprio Senhor reinará. Mas a palavra de exortação ao remanescente é: "Mas o que tendes, retende-o até que eu venha"(Apocalipse 2:25). Período: do estabelecimento do papado até a vinda do Senhor. Este período vai até o fim, mas é caracterizado pela idade das trevas (idade média).
•     Sardes: Aqui vemos a parte Protestante da Cristandade que surgiu após a grande Reforma. As características falhas do papado desaparecem, mas o novo sistema não tem vida em si mesmo. "Tens nome de que vives, e estás morto" (Apocalipse 3:1). Mas há, ainda, verdadeiros santosdentro desses sistemas sem vida, e Cristo conhece a todos. "Mas também tens em Sardes algumas pessoas que não contaminaram suas vestes, e comigo andarão de branco; porquanto são dignas disso" (Apocalipse 3:4). Período: do século XVI até hoje. Período marcado pelo início do Protestantismo após a Reforma.
•     Filadélfia: A igreja da Filadélfia apresenta um remanescente fraco, porém fiel à palavra e ao nome do Senhor Jesus. O que os caracterizava era o fato de guardarem a palavra da paciência de Cristo, e de não negarem Seu nome. A condição deles não era marcada por qualquer exibição de poder, nem de coisa alguma grande externamente, mas de uma próxima, íntima e pessoal comunhão com o Senhor. Ele está no meio deles como o Santo e o Verdadeiro, e é representado como sendo o dono da casa. Ele possui "a chave de Davi". Os tesouros da palavra profética estão disponíveis para aqueles que estão dentro. Eles estão também desfrutando de Sua paciência, e na expectativa de Sua vinda. "Como guardaste a palavra da minha paciência, também eu te guardarei da hora da tentação que há de vir sobre todo o mundo, para tentar os que habitam na terra." Período: especialmente a partir da primeira parte do século XIX.
•     Laodiceia: Em Laodiceia temos mornidão - indiferença, latitudinarismo** ou ecumenismo - mas com altas pretensões, um espírito arrogante, e grande auto-suficiência. Este é o último estado daquela que leva o nome de Cristo sobre a Terra. Mas, que lástima! Isso é intolerável para Ele. Sua condenação final é chegada. Tendo separado, para Si mesmo, cada verdadeiro crente das corrupções da Cristantade, o Senhor os vomita de Sua boca. Aquilo que deveria ter sido doce a Seu paladar se tornou enjoativo, e é lançado fora para sempre. Período: começando quase em paralelo ao período de Filadélfia, mas especialmente próximo à cena final. Está ativa no período em que vivemos agora.
Tendo assim tomado uma visão geral das sete igrejas, devemos agora nos esforçar, com a ajuda do Senhor, a traçar brevemente estes diferentes períodos da história da igreja. Nosso propósito é examinar mais detalhadamente cada uma das sete epístolas enquanto avançamos com nosso estudo para que possamos verificar, à luz da Palavra, os diferentes períodos por elas referidos, e o quanto os fatos da história da igreja ilustram a história apresentada nas Escrituras nesses dois capítulos. Que o Senhor possa nos guiar, para o refrigério e bênção de Seus queridos.

(* O título "Papa" foi primeiramente adotado por Higino no ano de 139, e o Papa Bonifácio III induziu Focas, Imperador do Leste, a concedê-lo ao prelado de Roma em 606. Ainda com a conivência de Focas, a supremacia do papa sobre a igreja cristã foi estabelecida - Dicionário de Dados de Haydn)
Nota: latitudinarismo é uma seita inglesa que sustenta a máxima tolerância religiosa e a doutrina de que todos os homens se salvarão. Similar ao universalismo.
A PEDRA DO FUNDAMENTO
Ao iniciar o estudo de qualquer assunto, é bom que se conheça seus princípios - a intenção ou plano original, e o primeiro passo em sua história. Temos tais princípios da maneira mais clara e completa, em relação à igreja, nas Sagradas Escrituras. Lá temos, não somente a intenção original, mas os planos e especificações do grande Construtor, e o início da história do trabalho de Suas próprias mãos. O fundamento foi colocado, e o trabalho estava em andamento, mas o próprio Senhor era ainda o único Construtor: portanto, a este tempo, tudo era real e perfeito.
No final da dispensação dos judeus, o Senhor acrescentou o remanescente salvo de Israel à recém-formada igreja. No entanto, no final da presente dispensação - a dispensação da graça, ou dos cristãos - Ele levará todos os que creem em Seu nome para o Céu em corpos glorificados. Nenhum dos que pertencem à igreja serão agregados à congregação dos santos do milênio. "Porque o mesmo Senhor descerá do céu com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta de Deus; e os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro. Depois nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados juntamente com eles nas nuvens, a encontrar o Senhor nos ares, e assim estaremos sempre com o Senhor." (1 Tessalonicenses 4:16-17).
Este será o feliz fechamento da história da igreja na Terra - a verdadeira esposa de Cristo: os mortos ressuscitarão, os vivos serão transformados, e todos, em corpos glorificados, arrebatados juntamente nas nuvens para se encontrarem com o Senhor nos ares. Assim temos todo o limite da igreja definido, e todo o período de sua história diante de nós. Retornemos, porém, ao alvorecer de seu dia na Terra.
Sob a figura de um edifício, o Senhor introduz, pela primeira vez, o assunto acerca da igreja. E tão infinitamente precisas são Suas palavras, que podemos adotá-las como o texto, ou lema, de toda sua história. Elas têm sustentado os corações e esperanças de Seu povo em todas as eras, e em todas as circunstâncias, e serão sempre o baluarte da fé. O que pode ser mais bendito, mais tranquilizador, mais apascentador, que estas palavras? "SOBRE ESTA PEDRA EDIFICAREI A MINHA IGREJA, E AS PORTAS DO INFERNO NÃO PREVALECERÃO CONTRA ELA."
 Em Mateus 16, o Senhor questiona Seus discípulos acerca do que andavam dizendo os homens sobre Ele. Isto leva à confissão de Pedro, e também à graciosa revelação do Senhor referente à Sua igreja. Pode ser interessante transcrever toda a conversa para nossas páginas, pois nos leva diretamente ao nosso assunto.
"E, chegando Jesus às partes de Cesaréia de Filipe, interrogou os seus discípulos, dizendo: Quem dizem os homens ser o Filho do homem? E eles disseram: Uns, João o Batista; outros, Elias; e outros, Jeremias, ou um dos profetas. Disse-lhes ele: E vós, quem dizeis que eu sou? E Simão Pedro, respondendo, disse: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo. E Jesus, respondendo, disse-lhe: Bem-aventurado és tu, Simão Barjonas, porque to não revelou a carne e o sangue, mas meu Pai, que está nos céus. Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela." (Mateus 16:13-18)
Aqui temos as duas principais coisas que estão conectadas ao edifício proposto - a Pedra do Fundamento* e o divino Construtor. "Sobre esta pedra edificarei a Minha igreja". "Mas, quem é, ou o que é, 'a pedra'?", alguns poderiam questionar. Claramente, a resposta é: a confissão de Pedro; não o próprio Pedro, como ensina a apostasia. Verdadeiramente, ele era uma pedra - uma pedra viva no novo templo; "Tu és Pedro" - tu és uma pedra. Mas a revelação do Pai, por Pedro, da glória da Pessoa de Seu Filho, é o fundamento sobre a qual a igreja é edificada - "Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo". A glória e a Pessoa do Filho ressurreto é a verdade revelada aqui. "To não revelou a carne e o sangue, mas meu Pai, que está nos céus". Imediatamente após a confissão de Pedro, o Senhor dá a entender Sua intenção em edificar Sua igreja, e afirma sua segurança eterna. "Sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela."
Ele mesmo, a fonte da vida, não podia ser vencido pela morte. Mas, ao morrer como o grande Substituto pelos pecadores, Ele triunfou sobre a morte e a sepultura, e está vivo para sempre, como disse ao apóstolo João após Sua ressurreição: "E [sou] o que vivo e fui morto, mas eis aqui estou vivo para todo o sempre. Amém. E tenho as chaves da morte e do inferno."(Apocalipse 1:18). Quão majestosas e triunfantes são estas palavras! São palavras de um conquistador - de Alguém que tem poder, mas um poder sobre as portas do hades- o lugar dos espíritos separados de seus corpos. As chaves - símbolo de autoridade e poder - estão penduradas em Seu cinto. O golpe da morte pode cair sobre um cristão, mas o aguilhão dela se foi. Ela, agora, vem como uma mensageira de paz para conduzir o cansado peregrino para o descanso eterno da casa celestial. A morte não é mais mestre, mas sim serva do cristão. "Portanto, ninguém se glorie nos homens; porque tudo é vosso; seja Paulo, seja Apolo, seja Cefas, seja o mundo, seja a vida, seja a morte, seja o presente, seja o futuro; tudo é vosso, e vós de Cristo, e Cristo de Deus" (1 Coríntios 3:21-23)
A Pessoa de Cristo, então, o Filho do Deus vivo - em Sua ressurreição e glória - é o fundamento, o sólido e imperecível fundamento, sobre a qual a igreja é edificada. Como vivo dentre os mortos, Ele comunica vida em ressurreição a todos que são edificados nEle como a verdadeira pedra do fundamento. Pedro deixa isto claro em sua primeira Epístola: "E, chegando-vos para ele, pedra viva... sois vós também quais pedras vivas, edificados como casa espiritual" (1 Pedro 2:4-5). E mais adiante, no mesmo capítulo ele diz: "E assim para vós, os que credes, é preciosa", ou "uma honra", em outras versões (1 Pedro 2:7). Que possamos entender essas duas preciosas verdades em conexão com nossa "Pedra do Fundamento" - a vida divina e a preciosidade divina. Ambas são dadas e se tornam posse de todos os que colocam sua confiança em Cristo. "Chegando-vos a Ele", não a qualquer outra coisa; é à Pessoa de Cristo que devemos ir, e com a qual devemos estar ligados. Sua vida - vida em ressurreição - se torna nossa. A partir desse momento, Ele é nossa vida. "Chegando-vos para ele, pedra viva... sois vós também quais pedras vivas, edificados como casa espiritual". A própria vida de Cristo, como o Homem ressuscitado, e tudo o que é Sua herança é também nossa. Oh, que surpreendente, maravilhosa e bendita verdade! Quem não desejaria, acima de todas as coisas, essa vida, e essa vida além do poder da morte - além das portas do hades? Uma vitória eterna está gravada na vida ressurreta de Cristo, que não pode nunca mais ser testada; esta é a vida do crente.
Porém, há mais que vida para cada pedra viva no templo espiritual. Há também a preciosidade de Cristo. "E assim para vós, os que credes, é preciosa". Portanto, do mesmo modo como a vida de Cristo se torna nossa quando cremos nEle, assim também é Sua preciosidade. O princípio é o mesmo para ambos. A vida pode ser vista como nossa capacidade de desfrutar, e a preciosidade, como nosso título de possessão e herança nas alturas. Suas honras, tútilos, dignidades, privilégios, possessões, glórias, são nossas - tudo é nosso nEle. "Para aqueles que creem Ele é a preciosidade". Que pensamento maravilhoso! "Ele amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela" (Efésios 5:25). Tal é nossa Pedra do Fundamento, e tal a bem-aventurança de todos os que estão sobre a Rocha. Assim como Jacó, sendo peregrino e estrangeiro, descansou sobre a pedra no deserto, e todo o panorama das riquezas celestiais em graça e glória passaram diante dele (Gênesis 28).
PEDRA PRINCIPAL DA ESQUINA
(Ef.2:20 e 1Pe 2:6)
Pedra principal da esquina, ou pedra do fundamento. Do grego lithos akrogoniaios: pedra pertencente à esquina (extremo canto), ou pedra principal (aparece em Efésios 2.20 e 1 Pedro 2.6). Do hebraico eben pinnah: pedra angular, ou principal da esquina (aparece em Isaías 28:16 e Salmo 118:22). (Dicionário Strong de Grego e Hebraico)  )
CRISTO, O ÚNICO CONSTRUTOR DE SUA IGREJA
Cristo, porém, é também o Construtor de Sua igreja. O edifício contra o qual nenhuma artimanha ou poder do inimigo poderia jamais prevalecer é a própria obra de Cristo, embora muitas vezes lemos sobre outros edificadores que participaram dela. "Sobre esta pedra edificarei a Minha igreja". É bom ser claro nesse ponto para que não confundamos o que o homem edifica com o que Cristo edifica. Isto pode trazer uma imensa confusão para a mente, tanto em relação à verdade de Deus quanto ao presente estado da Cristandade, a menos que a distinção entre elas seja claramente entendida. Não há a nada mais importante do que notar que aqui é Cristo o único Construtor de Sua igreja, apesar de Paulo, Apolo e todos os verdadeiros evangelistas terem sido pregadores que levaram pecadores a crer. A obra do Senhor nas almas dos crentes é perfeita. É uma obra real, espiritual e pessoal. Por meio de Sua graça em seus corações eles vão até Ele, como a uma pedra viva, e são edificados sobre Ele que está ressurreto dentre os mortos. Eles provaram que o Senhor é gracioso. Assim são as pedras vivas com as quais o Senhor edifica Seu templo santo, e as portas do inferno nunca poderão prevalecer contra isto. Assim, o próprio Pedro, e todos os apóstolos, e todos os crentes são edificados como uma casa espiritual. Quando Pedro fala desse edifício em sua primeira epístola, ele não diz nada sobre ele mesmo ser um construtor. Aqui Cristo é o Construtor. É a obra dEle, e dEle somente. "Edificarei a Minha igreja", disse Ele.
Vejamos agora, a partir da Palavra de Deus, o que o homem edifica, que materiais usa, e o modo como trabalha. Em 1 Coríntios 3 e 2 Timóteo 2 temos isto diante de nós. "Uma grande casa" é levantada pela instrumentalidade humana: que, de certo modo, é também a igreja, e a casa de Deus, como lemos em 1 Timóteo 3:15da "casa de Deus, a igreja do Deus vivo". É também chamada de casa de Cristo em Hebreus 3, "a qual casa somos nós". Mas a casa em breve se tornou tristemente corrompida pela fraqueza e maldade humana.
A autoridade da Palavra de Deus foi deixada de lado por muitos, e a vontade do homem se tornou de máxima importância. O efeito da filosofia humana nas simples instituições de Cristo foi rápida e dolorosamente manifesta. Porém madeira, feno e palha nunca poderiam ser "bem ajustados" com o ouro, a prata e as pedras preciosas. A casa se tornou grandiosa no mundo, assim como a árvore de mostarda, em cujos galhos se encontra uma inconveniente morada para toda "ave imunda e odiável". A conexão com a "grande casa" dá ao homem um status no mundo, muito diferente do Mestre, que foi desprezado e rejeitado. O arquebispo está ao lado da realeza. Mas a igreja professa não é apenas exteriormente grande, sendo ainda mais pretensiosa ao tentar colocar o selo de Deus sobre sua própria obra ímpia. Essa é sua maior perversidade, e a fonte de sua cegueira, confusão e mundanismo.
Paulo, como um homem escolhido pelo Senhor para Sua obra, lançou os alicerces do"edifício de Deus" em Corinto, e outros edificaram sobre ele. Mas nem todos edificaram com material divino. O fundamento correto estava posto, e cada um deveria ver como edificava sobre ele. Em conexão com o verdadeiro fundamento, alguns podiam edificar com ouro, prata e pedras preciosas, e outros com madeira, feno e palha. Isto é, alguns podiam ensinar a sã doutrina e procurar por uma fé viva em todos os que desejassem entrar em comunhão, e outros podiam ensinar doutrinas erradas e receber à comunhão da igreja pessoas nas quais não havia fé verdadeira, mas sim a mera observância externa de ordenanças. Aqui a instrumentalidade, responsabilidade e falha do homem entram. No entanto, o próprio edificador pode ser salvo pela fé em Cristo, todavia sua obra é destruída.
Mas há ainda uma outra e pior classe de edificadores, que corrompe o templo do Senhor, e são eles mesmos destruídos. Citamos aqui, para a conveniência do leitor, a passagem integral. Nada poderia ser mais claro. "Segundo a graça de Deus que me foi dada, pus eu, como sábio arquiteto, o fundamento, e outro edifica sobre ele; mas veja cada um como edifica sobre ele. Porque ninguém pode pôr outro fundamento além do que já está posto, o qual é Jesus Cristo. E, se alguém sobre este fundamento formar um edifício de ouro, prata, pedras preciosas, madeira, feno, palha, a obra de cada um se manifestará; na verdade o dia a declarará, porque pelo fogo será descoberta; e o fogo provará qual seja a obra de cada um. Se a obra que alguém edificou nessa parte permanecer, esse receberá galardão. Se a obra de alguém se queimar, sofrerá detrimento; mas o tal será salvo, todavia como pelo fogo... Se alguém destruir o templo de Deus, Deus o destruirá." (1 Coríntios 3:10-17)
Podemos ainda observar nas palavras do Senhor, "sobre esta pedra edificarei a Minha igreja", que Ele não havia começado a construir ainda: Ele está dizendo aos discípulos o que Ele ainda iria fazer. Ele não diz que já a edificou, ou que a está edificando, mas que irá edificá-la. Isto ele começou a fazer no dia de Pentecostes.
Mas há uma outra verdade ainda mais intimamente conectada com a história da igreja, e ligada à sua condição e caráter na Terra, que devemos observar antes de darmos prosseguimento à sua real história. Referimo-nos à verdade contida na expressão: "As chaves do reino dos céus".
AS CHAVES DO REINO DOS CÉUS
Isso nos leva à já mencionada "grande casa" da profissão de fé cristã meramente externa. No entanto, devemos ter em mente que, apesar de intimamente conectados, o reino dos céus e a grande casa referem-se a coisas um tanto distintas. O mundo pertence ao Rei. "O campo é o mundo". Seus servos devem ir a semear. Como resultado, temos "uma grande casa", ou Cristandade.
Os termos "igreja", "reino dos céus", e "grande casa" são bíblicos, e diferem um pouco em seus significados, como usados pelo Senhor e Seus apóstolos. O termo "minha igreja", como usado pelo Senhor, engloba apenas membros vivos e verdadeiros. O pensamento principal da expressão "reino dos céus" claramente se refere à autoridade do Senhor tendo ascendido às alturas. Todos os que professam sujeição a Ele pertencem a esse reino. Na "grande casa" vemos o mal em atividade, infiltrado no corpo professante por meio das falhas do homem, resultando em sua co-existência com o reino dos céus e com a igreja professante. Mas há ainda outro termo usado constantemente, e que não é encontrado nas Escrituras - a Cristandade. Trata-se de um termo eclesiástico, e originalmente indicava todos os que foram cristianizados, ou aquelas porções do mundo em que o Cristianismo prevalecia, distinguindo-as das terras pagãs ou maometanas. Mas agora, essa palavra tem sido usada como sinônimo dos outros três termos já mencionados. De modo geral, os quatro termos são usados para se referir à mesma coisa, apesar de serem originalmente diferentes em seu significado e aplicação. Mas onde não há confusão hoje em dia?
Porém, quando tudo aquilo que é meramente nominal na Cristandade for varrido pelo juízo de Deus, o reino será estabelecido em poder e glória. Esse será o milênio.
Enquanto ainda falava com Pedro sobre a igreja, o Senhor acrescentou: "E eu te darei as chaves do reino dos céus". A igreja sendo construída por Cristo, e o reino dos céus sendo aberto por Pedro, são coisas muito diferentes. É um dos grandes porém comuns erros da Cristandade usar os termos como sinônimos, como se significassem a mesma coisa. Escritores teológicos de todas as eras, ao assumir que eles são iguais, escreveram sobre a igreja e o reino da maneira mais confusa possível. A menos que tenhamos algum conhecimento dos modos dispensacionais de Deus, não poderíamos jamais manejar, ou dividir, bem Sua palavra (2 Timóteo 2:15). Não podemos confundir aquilo que o próprio Cristo edifica com aquilo que o homem edifica instrumentalmente, por meio de coisas como pregação e batismo. A igreja que é o corpo de Cristo é edificada sobre a confissão de que Ele é o Filho do Deus vivo, glorificado em ressurreição. Cada verdadeira alma convertida deve tratar com o próprio Cristo antes de ter algo a falar à igreja. O reino é algo muito mais amplo, e se aplica a cada pessoa batizada - isto é, todo o cenário da profissão cristã, seja ela verdadeira ou falsa.
Cristo não diz a Pedro que lhe daria as chaves da igreja ou as chaves dos céus. Se o tivesse feito, poderia realmente haver algum motivo para o sistema maligno do papado. Mas Ele simplesmente diz: "Te darei as chaves do reino dos céus" - isto é, de uma nova dispensação. Chaves, como já foi dito, não servem para construir templos, mas para abrirem portas, e o Senhor concedeu a Pedro a honra de abrir a porta do reino, primeiramente aos judeus (Atos 2), e depois aos gentios (Atos 10). Mas a linguagem que Cristo utiliza ao falar de Sua igreja é de uma outra ordem. É simples, bonita, enfática e inconfundível. "Minha igreja". Que profundidade, que plenitude há nessas palavras. "Minha igreja"! Quando o coração encontra-se em comunhão com Cristo em relação à Sua igreja, existe uma compreensão de Suas afeições que palavras não têm o poder de expressar. Mas assim como são, gostamos de ponderar nestas duas palavras, "Minha igreja!", mas quem pode falar do quanto do coração de Cristo que está aí revelada? Novamente, pense nessas outras duas palavras: "Esta pedra", como se Ele tivesse dito: "A glória da Minha Pessoa, e o poder da Minha vida em ressurreição formam o sólido fundamento da 'Minha igreja'". E de novo: "Eu a edificarei". Vemos, assim, nessas sete palavras, que tudo está nas próprias mãos de Cristo, pois Ele é a "cabeça da igreja, que é o seu corpo, a plenitude daquele que cumpre tudo em todos."(Efésios 1:23)
A ABERTURA DO REINO DOS CÉUS
O Senhor, de maneira especial, concedeu a Pedro a administração do reino, como vemos nos primeiros capítulos de Atos. O termo é tirado do Antigo Testamento (vejaDaniel 2 e 7). No capítulo 2, temos o reino; no capítulo 7, temos o Rei. A frase "reino dos céus" aparece apenas no Evangelho de Mateus, no qual o evangelista escreve principalmente para Israel.
A vinda do reino dos céus em poder e glória à Terra, na Pessoa do Messias, era a natural expectativa de todo judeu fiel. João Batista, como precursor do Senhor, apareceu pregando que o reino dos céus estava próximo.
Mas, em vez de receberem o Messias, os judeus O rejeitaram e crucificaram. Consequentemente, o reino, de acordo com as expectativas judaicas, foi deixado de lado. No entanto, ele foi introduzido de uma outra forma. Quando o rejeitado Messias ascendeu ao Céu, e tomou Seu lugar à direita de Deus, triunfante sobre todos os inimigos, o reino dos céus começou. Agora o rei está no Céu, e como Daniel diz, "o Céu reina", embora não abertamente. E, a partir do tempo em que Ele subiu até Seu retorno, este é o reino em mistério (Mateus 13). Quando Ele voltar novamente em poder e grande glória, será o reino manifesto. A Pedro foi dado o privilégio de abrir esse reino para ambos judeus e gentios. Isto foi feito em sua pregação aos judeus, em Atos 2, e em sua pregação aos gentios, em Atos 10. Mas, novamente, devemos prestar atenção ao fato de que a igreja de Deus e o reino dos céus não são a mesma coisa. Sejamos claros, para começar, quanto a este ponto fundamental. A identificação falha das duas coisas têm produzido grande confusão de ideias e pode ser vista como a origem do puseísmo(Movimento ritualista que visava a aproximar do catolicismo a igreja anglicana), do papado, e de todo o sistema humano da Cristandade. Os comentários da próxima seção sobre a parábola do joio tratam diretamente desse assunto, apesar de se referirem a um período posterior ao dos primeiros capítulos de Atos.
A PARÁBOLA DO JOIO
"Mateus 13:24,25. 'Propôs-lhes outra parábola, dizendo: O reino dos céus é semelhante ao homem que semeia a boa semente no seu campo; Mas, dormindo os homens, veio o seu inimigo, e semeou joio no meio do trigo, e retirou-se' - isso é exatamente no que se tornou a profissão cristã. Há duas coisas necessárias para a invasão do mal entre os cristãos. A primeira é falta de vigilância dos próprios cristãos. Eles se tornam descuidados, dormem, e o inimigo vem e semeia joio. Isto começou a acontecer logo no início da história da Cristandade. Encontramos essas sementes mencionadas até no livro de Atos dos Apóstolos, e cada vez mais nas Epístolas. A Primeira Epístola aos Tessalonicenses é a primeira que o apóstolo Paulo escreveu, e a segunda foi escrita pouco tempo depois. E nesta ele já fala que o mistério da iniquidade ja operava, e que se seguiriam outras coisas, como a apostasia e o homem do pecado, e que, quando a impiedade fosse plenamente manifesta (e não como opera agora, em segredo), então o Senhor colocaria um fim no iníquo e em todos os envolvidos com ele. O mistério da iniquidade parece ser semelhante ao joio mencionado aqui. Algum tempo depois, 'quando a erva cresceu e frutificou', quando o cristianismo começou a avançar rapidamente sobre a Terra, 'então apareceu também o joio'. Mas é evidente que o joio foi semeado quase imediatamente depois da boa semente. Sempre que Deus realiza uma obra, Satanás fica no pé. Quando o homem foi feito, ele deu ouvidos à serpente e caiu. Quando Deus deu a lei, ela foi quebrada antes mesmo de ser entregue nas mãos de Israel. Assim é sempre a história da natureza humana. "
"Assim o mal está feito no campo, e nunca reparado. O joio não deve ser retirado do campo no tempo presente: não há juízo para ele por enquanto. Isso significa que deve haver joio na igreja? Se o reino dos céus fosse a mesma coisa que a igreja não deveria haver nenhum tipo de disciplina: deveríamos permitir a imundície da carne ou do espírito ali. Eis a importância de saber distinguir a igreja do reino. O Senhor proíbe que o joio seja tirado do reino dos céus: 'Deixai crescer ambos juntos até à ceifa' (Mateus 13:30), isto é, até que o Senhor venha em juízo. Se o reino dos céus fosse a mesma coisa que a igreja, repito, então implicaria em nada menos que isso: que nenhum mal, seja ele flagrante ou simples, deveria ser colocado para fora da igreja {*no sentido de assembleia local em seu caráter terreno, uma vez que não é possível perder a salvação e ser tirado do corpo de Cristo. Ver http://aguapelapalavra.blogspot.com/2013/01/a-posicao-e-o-estado-do-crente.html} até o dia do juízo. Vemos, então, a importância da fazer essas distinções que tantos desprezam. Elas são totalmente importantes para a verdade e santidade. Não  existe nem mesmo uma única expressão  na Palavra de Deus que possamos ignorar.
"Qual é, então, o significado dessa parábola? Não tem nada a ver com a questão da comunhão da igreja. É do 'reino dos céus' que é falado aqui - o cenário da confissão cristã, seja verdadeira ou falsa. Assim gregos, coptas, nestorianos, católicos romanos, assim como evangélicos protestantes fazem parte do reino dos céus; não apenas os crentes, mas também as más pessoas que professam o nome de Cristo. Um homem que não é judeu nem pagão, e que professa exteriormente o nome de Cristo, está no reino dos céus. Ele pode até ser muito imoral e herege, mas não deve ser tirado do reino dos céus. Mas, seria correto recebê-lo à mesa do Senhor? Deus o proíbe! Se uma pessoa caída em pecado aberto estiver na assembleia, deve ser colocado para fora dela, mas não será colocada para fora do reino dos céus. De fato, isto só poderia ser feito tirando sua vida, arrancando o joio pela raiz. E é nisto que o cristianismo mundano caiu, em um espaço de tempo não muito longo após os apóstolos partirem da Terra. Punições temporais foram introduzidas para disciplina: leis foram criadas com o propósito de entregar o refratário para o poder civil. Se não honrassem a assim chamada igreja, aos desobedientes não seria permitido viver. Deste modo, o mesmo mal contra o qual o Senhor estivera protegendo seus discípulos continuou; o Imperador Constantino usou a espada para reprimir os ofensores da "igreja". Ele e seus sucessores introduziram penas temporais para lidar com o joio, tentando arrancá-los. Tome a "igreja" de Roma, onde vemos tamanha confusão entre a igreja e o reino dos céus: eles clamavam que, se um homem for herege, deveria ser entregue às cortes do mundo para ser queimado. Eles também nunca confessam ou corrigem o erro, pois fingem ser infalíveis. Supondo que as vítimas fossem realmente joio, isto seria tirá-los do reino. Se você arranca o joio do campo, você o mata. Podem haver homens lá fora profanando o nome de Deus, mas devemos deixar que Deus lide com eles."
"Isso não anula a responsabilidade cristã referente àqueles que estão à mesa do Senhor. Você encontrará instruções sobre tudo isso no que foi escrito sobre a igreja. 'O campo é o mundo', a igreja engloba apenas aqueles que acredita-se serem membros do corpo de Cristo. Tomemos 1 Coríntios, onde temos o Espírito Santo mostrando a verdadeira natureza da disciplina eclesiástica. Suponhamos que haja cristão professos vivendo na prática do pecado; tais pessoas não devem ser consideradas, enquanto continuarem no pecado, como membros do corpo de Cristo. Um verdadeiro santo pode cair em pecado aberto, mas a igreja, sabendo disto, é responsável por intervir com o propósito de expressar o juízo de Deus sobre o pecado. Se deliberadamente permitissem tais pessoas a estar à mesa do Senhor, estariam efetivamente fazendo do Senhor cúmplice do pecado. A questão não é se a pessoa é convertida ou não. Se não convertidos, os homens não têm nada a ver com a igreja, e se convertidos, o pecado não deve ser ignorado. O culpado não deve ser tirado do reino dos céus, mas deve ser colocados para fora da assembleia (igreja local). Assim, o ensinamento da palavra de Deus é muito clara sobre essas duas verdades. É errado usar de punições do mundo para lidar com um hipócrita, mesmo que ele seja detectado. Devemos procurar o bem de sua alma, mas isso não é motivo para puni-lo. No entanto, se um cristão está em pecado, a igreja não deve suportá-lo, apesar de ser exortada a ser paciente no juízo. Mas devemos deixar os não convertidos para serem julgados pelo Senhor em sua vinda. "
"Este é o ensinamento da parábola do joio, que fornece uma visão muito solene da Cristandade. Assim como o Filho do homem semeou a boa semente, Seu inimigo semeou a má, que cresceu junto com o resto, e este mal não pode ser arrancado no momento presente. Existe uma solução para o mal que entra na igreja, mas não ainda para o mal no mundo."(Trecho retirado dos Estudos sobre o Evangelho de Mateus, de William Kelly)
É perfeitamente claro, tanto das Escrituras quando da história, que o grande erro no qual caiu o corpo professante é a confusão quanto a essas duas coisas - o joio e o trigo; ou, de maneira prática, aqueles que foram admitidos, pela administração do batismo, a possuir todos os privilégios oficiais e temporais da igreja professa com aqueles que realmente se converteram e foram ensinados por Deus. Mas a vasta diferença entre o que podemos chamar de sistema sacramental e sistema vital deve ser claramente entendida e cuidadosamente distinguida, se quisermos estudar a história da igreja corretamente.
Outro erro, igualmente sério, segue como consequência. O grande e professo corpo se tornou, aos olhos e na linguagem dos homens, a "igreja". Homens piedosos foram atraídos por essa armadilha, de modo que a distinção entre a igreja e o reino foi, muito cedo, perdida de vista. Todos os lugares e privilégios mais sagrados da igreja professa foram, então, compartilhados tanto por pessoas piedosas quanto por ímpios. A Reforma falhou completamente em limpar a igreja dessa triste mistura, que tem sido transmitida a nós por sistemas como os Anglicanos, Luteranos e Presbiterianos, como fica claro pela forma do batismo. Em nossos dias, o sistema sacramental prevalece em um nível alarmante, e cresce rapidamente. O real e o formal, o vivo e o morto, são indistinguíveis nas várias formas do protestantismo. Infelizmente, e como isso é sério, há muitos na igreja professa - no reino dos céus - que nunca entrarão no Céu propriamente dito. Aqui encontramos tanto joio como trigo, servos maus e fiéis, virgens néscias e sábias. Embora todos os que foram batizados são contados no reino dos céus, apenas aqueles que forem vivificados e selados com o Espírito Santo pertencem à igreja de Deus.
Mas há ainda outra coisa ligada à igreja professa que exige um breve estudo aqui. É o princípio divino do governo na igreja, sobre o qual falaremos no próximo capítulo.
O PRINCÍPIO DIVINO DO GOVERNO NA IGREJA
Deus não apenas dá a Pedro as chaves que poderiam abrir as portas da nova dispensação, mas também lhe confia sua administração interna. Esse princípio é totalmente importante  no que tange à igreja de Deus. As palavras da comissão são estas: "E tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus." A questão é, o que estas palavras significam? Claramente cremos que é a autoridade e o poder do Senhor a ser exercitada na igreja, porém limitada, em seu resultado, a este mundo. Não há nas palavras do Senhor pensamentos sobre a igreja decidindo qualquer coisa nos céus. Esta é a falsa interpretação e o poder nefasto da apostasia. A igreja na terra pode não ter nada a dizer ou fazer sobre o que é feito nos céus no que diz respeito a ligar e desligar. A esfera de sua ação está dentro de seus próprios limites e, quando feita de acordo com a comissão de Cristo, há a promessa da ratificação nos céus.
Também não há aqui qualquer pensamento sobre a igreja, ou qualquer de seus oficiais, estando no papel de intermediários entre uma alma e Deus no que diz respeito ao perdão eterno ou juízo eterno. Essa é a ousada blasfêmia de Roma. "Quem pode perdoar pecados, senão Deus?" Ele reserva esse poder somente a Ele mesmo. Além disso, os indivíduos que estão sujeitos ao governo da igreja já são perdoados, ou, ao menos, têm direito ao perdão. "Não julgais vós os que estão dentro?" Isto apenas se aplica àqueles que estão dentro dos limites da igreja. "Mas Deus julga os que estão fora" (1 Coríntios 5:12-13). De cada crente no amplo campo da Cristandade é dito: "Porque com uma só oblação aperfeiçoou para sempre os que são santificados." (Hebreus.10:14). Assim, a retenção ou remissão dos pecados por parte da igreja vale apenas para o tempo presente, e é estritamente administrativa em seu caráter. É o princípio divino de receber pessoas na assembleia de Deus {*aqui no sentido da igreja de Deus, e não de uma denominação que possa levar esse nome}, com base no testemunho adequado de suas conversões, solidez na doutrina e santidade de vida; e também de colocar para fora os ofensores impenitentes até que sejam restaurados pelo verdadeiro arrependimento.
Mas alguns de nossos leitores podem ter a comum impressão de que esse poder foi dado apenas a Pedro e ao resto dos apóstolos, e consequentemente deixou de existir após eles. Isto é um erro. Realmente, isso foi dado a Pedro em primeira instância, como já vimos, e sem dúvida um poder maior foi exercitado durante os dias dos apóstolos como nunca foi visto depois, mas não havia uma autoridade maior. A igreja possui a mesma autoridade agora, em relação à disciplina na assembleia, embora com menos poder. A palavra do Senhor permanece intacta. Apenas um apóstolos, nós cremos, poderia falar como Paulo falou em 1 Coríntios 5: "Em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, juntos vós e o meu espírito, pelo poder de nosso Senhor Jesus Cristo, seja, este tal, entregue a Satanás para destruição da carne, para que o espírito seja salvo no dia do Senhor Jesus."
Isto era poder espiritual em um indivíduo, e não o julgamento da igreja {* ver nota de rodapé}. O mesmo apóstolo, em referência ao mesmo caso, diz à assembleia: "Tirai pois dentre vós a esse iníquo." (1 Coríntios 5:13). O ato de tirar foi o ato, não somente do apóstolo, mas de toda a assembleia. Nesse caso, e dessa maneira, os pecados da pessoa excomungada foram retidos, embora seja, evidentemente, um homem convertido. Na Segunda Epístola, capítulo 2, o encontramos totalmente restaurado. Seu arrependimento é aceito pela assembleia e seus pecados são remidos. O transbordamento do coração do apóstolo nessa ocasião, e suas exortações à igreja, são lições valiosas para todos os que estão envolvidos com o governo da igreja, e se destinam a remover a terrível desconfiança com a qual na maioria das vezes que os irmãos que erraram são recebidos de volta aos privilégios da assembleia. "Basta-lhe ao tal esta repreensão feita por muitos. De maneira que pelo contrário deveis antes perdoar-lhe e consolá-lo, para que o tal não seja de modo algum devorado de demasiada tristeza. Por isso vos rogo que confirmeis para com ele o vosso amor." (2 Coríntios 2:6-8). Aqui temos um caso pontual, ilustrativo do governo da assembleia de acordo com a vontade de Cristo. "Tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que tu desligares na terra será desligado nos céus".
"Entregar a Satanás é um ato de poder; expulsar uma pessoa é um dever ligado à fidelidade da assembleia. Sem dúvida, a exclusão da assembleia de Deus é algo muito sério e nos deixa expostos à tristeza e vários transtornos vindos do inimigo. Mas entregar diretamente a Satanás é um ato de poder positivo. Isso foi feito no caso de Jó para seu bem. Também foi feito por Paulo em 1 Coríntios 5, embora agindo no contexto de uma assembleia estabelecida, e para a destruição da carne. E outra vez, sem referência à assembleia, em 1 Timóteo 1, quanto à Himeneu e Alexandre, para que aprendessem a não blasfemar. Toda a disciplina é para a correção do indivíduo, e também para a manutenção da santidade da casa de Deus, e da pureza da consciência dos próprios santos" - trecho extraído do livro Present Testimony, volume 1
ESSE PRINCÍPIO DO GOVERNO NA IGREJA AINDA É APLICÁVEL
Mas "como esses princípios podem ser realizados em nossos dias?" é ainda a questão e a dificuldade de muitos. Bem, basta voltarmos à palavra de Deus. Devemos ser capazes e dispostos a dizer: "Nada podemos contra a verdade, senão pela verdade." (2 Coríntios.13:8)
A autoridade e poder administrativos da qual falamos não foram dados apenas a Pedro e aos outros apóstolos, mas também à igreja. Em Mateus 18 temos a elaboração do princípio estabelecido no capítulo 16: "... dize-o à igreja; e, se também não escutar a igreja, considera-o como um gentio e publicano. Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes na terra será desligado no céu... Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles." (Mateus 18:17-20)
Assim aprendemos que os atos de dois ou três reunidos ao nome de Cristo têm a mesma aprovação divina que a administração de Pedro. E novamente, em João 20, o Senhor ressurreto apresenta o mesmo princípio do governo aos discípulos, e não apenas aos apóstolos, onde a assembleia está vividamente unida a Cristo como o Homem ressuscitado. Isto é totalmente importante. O espírito da vida de Jesus Cristo torna os discípulos livres - todos eles - da lei do pecado e da morte.
A igreja é construída sobre "esta pedra" - Cristo em ressurreição, e as portas do hades* não podem prevalecer contra ela. "Chegada, pois, a tarde daquele dia, o primeiro da semana, e cerradas as portas onde os discípulos, com medo dos judeus, se tinham ajuntado, chegou Jesus, e pôs-se no meio, e disse-lhes: Paz seja convosco. E, dizendo isto, mostrou-lhes as suas mãos e o lado. De sorte que os discípulos se alegraram, vendo o Senhor. Disse-lhes, pois, Jesus outra vez: Paz seja convosco; assim como o Pai me enviou, também eu vos envio a vós. E, havendo dito isto, assoprou sobre eles e disse-lhes: Recebei o Espírito Santo. Aqueles a quem perdoardes os pecados lhes são perdoados; e àqueles a quem os retiverdes lhes são retidos." (João 20:19-23)
Podemos dizer que aqui o Senhor estabelece e dá início à nova criação. Os discípulos estão cheios e vestidos de paz, e com o Espírito da vida de Cristo Jesus. Eles devem seguir adiante como Seus mensageiros, partindo de Seu túmulo vazio devido à ressurreição, levando a bendita mensagem de paz e vida eterna a um mundo inclinado ao pecado, à tristeza e à morte. O princípio de seu próprio governo interno é também claramente estabelecido, e sua devida administração sempre dará à assembleia cristã um caráter distintivo e celestial, tanto na presença de Deus quanto na presença do homem.
O PRINCÍPIO DE RECEBER PESSOAS NO INÍCIO DA IGREJA
Como o princípio apresentado é a base adequada para todas as reuniões cristãs, pode ser interessante olhar por um momento para sua operação nos dias dos apóstolos. Certamente eles entendiam seu significado e como aplicá-lo.
No dia de Pentecostes, e algum tempo depois, não parecia que os jovens convertidos eram submetidos a qualquer prova quanto à realidade de sua fé. "De sorte que foram batizados os que de bom grado receberam a sua palavra; e naquele dia agregaram-se quase três mil almas" (Atos 2:41). Assim, receber a palavra já os colocavam no terreno do batismo e da comunhão; mas a obra estava, até então, inteiramente nas próprias mãos de Cristo. "E todos os dias acrescentava o Senhor à igreja aqueles que se haviam de salvar." (Atos 2:47). Podemos também mencionar a tentativa de enganar os apóstolos por Ananias e Safira, que foi detectada de imediato. Pedro age em seu lugar de direito, mas o Espírito Santo estava lá em majestade e poder. Por isso ele diz a Ananias: "Ananias, por que encheu Satanás o teu coração, para que mentisses ao Espírito Santo?" (Atos 5:3)
Mas tal estado virgem das coisas logo acabou. A falha se instala - o Espírito Santo foi entristecido, e tornou-se necessário examinar aqueles interessados em estar em comunhão a fim de verificar se seus motivos, objetivos e estado de alma estavam de acordo com a mente de Cristo. Estamos agora na condição das coisas descrita em 2 Timóteo 2. Devemos estar em comunhão apenas com "os que, com um coração puro, invocam o Senhor" (2 Timóteo 2:22).
Depois que a igreja se tornou tão misturada com adeptos meramente nominais, um grande cuidado tornou-se necessário ao receber pessoas à comunhão. Não é suficiente que a pessoa diga que é convertida e exija admissão na assembleia com base em suas próprias declarações: ela deve se submeter ao exame por parte de cristãos experientes. Quando alguém professa ter sido despertado para a consciência do pecado, e ter sido levado ao arrependimento diante de Deus, e fé no Senhor Jesus Cristo, sua confissão deve ser examinada por aqueles que passaram, eles próprios, pelos mesmos tipos de experiência. E mesmo onde a conversão é manifestamente genuína, um cuidado piedoso e gentil deve ser exercido na recepção, pois algo desonroso para Cristo, prejudicial e enfraquecedor para a assembleia, pode acabar entrando, mesmo inconscientemente. É necessário discernimento espiritual aqui. E esta é a mais verdadeira demonstração de bondade para com o requerente, e nada mais do que um cuidado necessário para a honra de Cristo e a pureza da comunhão. A comunhão cristã acabaria se pessoas fossem recebidas com base apenas em suas próprias opiniões sobre elas mesmas.
Em Atos 9 vemos esse princípio na prática no caso do próprio apóstolo Paulo. E, certamente, se ele não podia ser aceito sem testemunho adequado, quem deveria reclamar? É verdade que seu caso foi peculiar, porém ainda assim pode ser tomado como uma ilustração prática do nosso assunto.
Encontramos aqui tanto Ananias em Damasco, quanto a igreja em Jerusalém questionando a realidade da conversão de Saulo, mesmo tendo sido miraculosa. É claro que ele tinha sido um inimigo aberto do nome de Cristo, e isto deve ter tornado os discípulos ainda mais cuidadosos. Ananias hesitou em batizá-lo até que estivesse plenamente convencido de sua conversão. Ele consulta o Senhor sobre o assunto, e depois de ouvir Sua vontade, ele vai diretamente a Saulo, e garante a ele que foi enviado pelo mesmo Jesus que lhe tinha aparecido no caminho para Damasco, confirmando a verdade sobre o que tinha acontecido. Saulo é grandemente confortado, volta a ver, e é batizado.
Então, sobre a ação da igreja em Jerusalém lemos: "E, quando Saulo chegou a Jerusalém, procurava ajuntar-se aos discípulos, mas todos o temiam, não crendo que fosse discípulo. Então Barnabé, tomando-o consigo, o trouxe aos apóstolos, e lhes contou como no caminho ele vira ao Senhor e lhe falara, e como em Damasco falara ousadamente no nome de Jesus."(Atos 9:26-27) Paulo é um modelo de homem para a igreja em muitas coisas, e também nisso. Ele é recebido na assembleia - como todos os requerentes deveriam ser recebidos - com base no testemunho adequado quanto à genuinidade de seu cristianismo. Mas, enquanto todo o cuidado piedoso deve ser tomado para que os "Simãos Magos" {*ver Atos 8} possam ser detectados, toda a ternura e paciência devem ser exercidas com os mais tímidos e hesitantes. De qualquer modo, a vida em Cristo e a consistência com a mesma deve ser sempre procurada (Veja Rom 14, 15;...1 Cor 5 e 2 Cor 2). O caminho da igreja é sempre estreito.
O papado tem demonstrado sua desesperada iniquidade no mau uso que tem feito da prerrogativa da igreja de reter ou remir pecados, resultando em todas as abominações da absolvição sacerdotal. O protestantismo tomou o outro extremo - provavelmente temendo a própria aparência do papado - e tem praticamente posto de lado completamente a disciplina. O caminho da fé, por outro lado, é somente seguir a palavra do Senhor.
Tendo sido, então, apurado o terreno dos grandes princípios fundamentais da igreja e do reino, chegamos ao dia de Pentecostes - o primeiro momento da história da igreja na Terra. A menos que entendamos os princípios do cristianismo, jamais poderemos compreender sua história.
O DIA DE PENTECOSTES
A festa judaica de Pentecostes pode ser chamada de dia do nascimento da igreja cristã. Era também o aniversário da entrega da lei no Monte Sinai, embora aparentemente não havia um dia observado pelos judeus para comemorar o evento. Cinquenta dias depois da ressurreição de nosso Senhor a igreja foi formada - deu-se início à sua história. Os santos do Antigo Testamento não fazem parte da igreja do Novo Testamento. Ela não existia, de fato, até o dia de Pentecostes.
Todos os santos, desde o início, possuem a mesma vida eterna, são filhos do mesmo Deus e Pai, e o mesmo Céu será a casa deles para sempre. No entanto, os santos do Antigo Testamento pertencem a outra dispensação* (isto é, uma maneira de Deus tratar com o homem em uma determinada época), ou a diferentes dispensações que ocorreram antes da vinda de Cristo. Cada dispensação tem sua própria origem, progresso, declínio e queda nas Escrituras, e terá seu próprio reflexo no Céu. Nem as pessoas nem as dispensações serão indistinguíveis lá.
Por isso, o apóstolo em Hebreus 11, ao falar dos antigos santos, diz: "E todos estes, tendo tido testemunho pela fé, não alcançaram a promessa, provendo Deus alguma coisa melhor a nosso respeito, para que eles sem nós não fossem aperfeiçoados." (Hebreus 11:39-40). Certamente, se Deus proveu algo melhor para nós, deve ser também algo diferente. Não vamos nos opor à própria palavra de Deus. Além disso, nosso Senhor, em Mateus 16, diz: "Sobre esta pedra edificarei a Minha igreja". E ao mesmo tempo, Ele deu as chaves para abrir as portas da nova dispensação a Pedro. Até então Ele ainda não tinha começado a edificar Sua igreja, e as portas do reino ainda não estavam abertas. Mas a diferença entre o velho e o novo é vista mais distintamente quando falamos dos grandes eventos do dia de Pentecostes. Vamos começar com os tipos, ou figuras, de Levítico, capítulo 23.
Os filhos de Israel eram ordenados a levar uma porção das primícias de suas colheitas ao sacerdote, que deveria movê-las perante o Senhor, para que o povo fosse aceito por Deus. Cremos que esse rito prefigurava a ressurreição de nosso Senhor na manhã seguinte ao sábado judaico. A base da aceitação dos cristãos diante de Deus é o Cristo ressuscitado. "Fala aos filhos de Israel, e dize-lhes: Quando houverdes entrado na terra, que vos hei de dar, e fizerdes a sua colheita, então trareis um molho das primícias da vossa sega ao sacerdote. E ele moverá o molho perante o SENHOR, para que sejais aceitos; no dia seguinte ao sábado o sacerdote o moverá." (Levítico 23:10-11) (Ver também Mateus 28 e Marcos 16)
Sete semanas completas após o mover das primícias, a festa de Pentecostes era celebrada. O primeiro era reconhecido como o primeiro dia da colheita na Judeia, e no último supostamente o milho estaria completamente colhido. Então eles faziam um festival solene de ações de graça. Dois pães feitos com a farinha da nova colheita caracterizavam os festejos. Eles deviam ser assados com fermento e tirados de suas casas. Alguns pensam que os dois pães prefiguravam o chamado da igreja, sendo composta de judeus e gentios. Seja como for, o número é significante. Duas testemunhas eram necessárias para prestar testemunho em Israel.  O fermento indica, sem dúvidas, o pecado que habita no crente e, é claro, na igreja, vista em sua atual condição terrena.
Como o mover do feixe das primícias - uma bela figura do Cristo ressuscitado puro e santo - sacrifícios de cheiro suave eram oferecidos, mas nenhum sacrifício pelo pecado. Com o mover dos dois pães - figura daqueles que são de Cristo - uma oferta pelo pecado era apresentada. Estando lá o pecado, era necessária uma oferta para cobrí-lo. Embora o perfeito sacrifício de Cristo satisfez a Deus tanto pelo pecado que habita no homem quanto pelos muitos pecados cometidos durante a vida, ainda assim, na prática e na experiência, o pecado habita em nós, e assim será enquanto estivermos neste mundo. Todos reconhecem isso, embora nem todos possam ver a completude, a integridade, da obra de Cristo. O cristão foi, por uma única oferta, feito perfeito para sempre, apesar de poder se humilhar a si mesmo e fazer confissão a Deus por cada falha.
O significado típico do Pentecostes foi notavelmente cumprido na descida do Espírito Santo. Ele veio para reunir os filhos de Deus que andavam dispersos (João 11:52). Por esse grande evento o sistema do judaísmo foi deixado de lado, e um novo vaso de testemunho - a igreja de Deus - foi introduzido. Agora, vamos observar a ordem dos eventos, começando pela ressurreição e ascensão de Cristo.
A RESSURREIÇÃO E ASCENSÃO DE CRISTO
Encarnação, Crucificação, Ressurreição, são os grandes fatos ou verdades fundamentais da igreja - do cristianismo. A encarnação era necessária para a crucificação, e ambos para a ressurreição. É a bendita verdade de que Cristo morreu na cruz pelos nossos pecados, mas é igualmente verdade que o crente morreu em Sua morte (Veja Romanos 8; Colossenses 2). A vida cristã é vida em ressurreição. A igreja é edificada sobre o Cristo ressuscitado. Nenhuma verdade pode ser mais bendita e maravilhosa do que a encarnação e crucificação, mas a igreja está associada com aquEle que está, agora, ressuscitado e glorificado.
Em Atos 1 temos aquilo que está conectado à ressurreição e ascensão do Senhor, e também com as ações dos apóstolos após a descida do Espírito Santo. O bendito Senhor, mesmo em ressurreição, ainda fala e age por meio do Espírito Santo. Foi"através do Espírito Santo" que Ele deu ordens aos apóstolos que Ele escolheu. Isso é digno de nota especial, pois nos ensina duas coisas:
1. O caráter de nossa união com Cristo; o Espírito Santo no cristão, e no Senhor ressurreto, une a ambos. "O que se ajunta com o Senhor é um mesmo espírito." Pelo "mesmo Espírito" eles são unidos.
2. Esse importante fato aponta para a bendita verdade do Espírito Santo habitando e agindo no cristão, até mesmo depois que realmente ocorrer a ressurreição. Então não haverá mais - como há agora - a carne em nós para Ele combater, mas irá, calma e desimpedidamente, nos levar à completa alegria do Céu - a feliz adoração, o bendito serviço, e a completa vontade de Deus.
O Senhor ressurreto, a seguir, exorta os apóstolos, que esperam em Jerusalém pela "promessa do Pai" que, diz Ele, ouviste de Mim. "Porque, na verdade, João batizou com água, mas vós sereis batizados com o Espírito Santo, não muito depois destes dias." (Atos 1:5) Não é mais uma questão de promessas temporais a Israel; estas devem ser deixadas de lado até um dia futuro. A promessa do Pai sobre o Espírito Santo era algo inteiramente distinto, e grandemente diferente em seus resultados.
Muitas coisas "concernentes ao reino de Deus" foram conversadas entre o Senhor e Seus apóstolos, então Ele ascende (sobe) ao Céu, e uma nuvem O recebe, fora da vista dos discípulos. O retorno do Senhor é, então, mais clara e distintamente revelada: "E, quando dizia isto, vendo-o eles, foi elevado às alturas, e uma nuvem o recebeu, ocultando-o a seus olhos. E, estando com os olhos fitos no céu, enquanto ele subia, eis que junto deles se puseram dois homens vestidos de branco. Os quais lhes disseram: Homens galileus, por que estais olhando para o céu? Esse Jesus, que dentre vós foi recebido em cima no céu, há de vir assim como para o céu o vistes ir." (Atos 1:9-11) É bem evidente, a partir dessas palavras, que Ele subiu pessoalmente, visivelmente, corporalmente, e que Ele também virá de novo da mesma maneira - que Ele, novamente, aparecerá entre as nuvens, e será manifesto às pessoas na Terra, pessoalmente, visivelmente e corporalmente; mas, nesse dia, será com poder e grande glória.
OS APÓSTOLOS E DISCÍPULOS AGORA APRENDERAM DUAS COISAS
1. Que Jesus foi tirado deste mundo para o Céu;
2. Que Ele estaria voltando novamente a este mundo.
Com base nesses dois grandes fatos o testemunho deles foi fundamentado. Mas Jerusalém seria o ponto inicial de seu ministério, e eles deveriam esperar pelo poder do alto. Chegamos, agora,  ao segundo grande evento, de extrema importância no que diz respeito à condição do homem neste mundo - o dom (dádiva) do Espírito Santo. Agora seria não apenas Deus por nós, mas Deus em nós. Isto aconteceu no dia de Pentecostes.
A DESCIDA DO ESPÍRITO SANTO
O tempo chegou. A redenção foi consumada, Deus foi glorificado - Cristo está à Sua direita no Céu, e o Espírito Santo desce à Terra. Deus inaugura a igreja, fazendo isto de maneira adequada à Sua própria sabedoria, poder e glória. Um poderoso milagre é operado, um sinal do alto é dado. O grandioso evento é assim registrado:
Atos 2: "E, cumprindo-se o dia de Pentecostes, estavam todos concordemente no mesmo lugar. E de repente veio do céu um som, como de um vento veemente e impetuoso, e encheu toda a casa em que estavam assentados. E foram vistas por eles línguas repartidas, como que de fogo, as quais pousaram sobre cada um deles. E todos foram cheios do Espírito Santo, e começaram a falar noutras línguas, conforme o Espírito Santo lhes concedia que falassem." Talvez seja bom fazer uma pausa por um momento e observar algumas coisas conectadas à descida do Espírito Santo e à demonstração de Seu poder nesse importante dia.
Havia, em primeiro lugar, o cumprimento da promessa do Pai: o próprio Espírito Santo foi enviado do Céu. Esta era a grande verdade do Pentecostes. Ele veio das alturas para habitar na igreja - o lugar preparado para Ele pela aspersão do sangue de Jesus Cristo. Havia também o cumprimento da palavra do Senhor aos apóstolos: "Vós sereis batizados com o Espírito Santo, não muito depois destes dias." (Atos 1:5). Talvez os discípulos não soubessem o significado dessas palavras, mas o fato é que agora estavam cumpridas. A revelação completa da doutrina do "um só corpo" aguardava o ministério de Paulo: "Pois todos nós fomos batizados em um Espírito, formando um corpo, quer judeus, quer gregos, quer servos, quer livres, e todos temos bebido de um Espírito." (1 Coríntios 12:13)
Mas, além disso, além dos vários dons dispensados para a obra do Senhor, temos algo mais benditamente pessoal, e bastante novo na Terra. O próprio Espírito Santo veio habitar, não apenas na igreja coletivamente, mas também em cada indivíduo que crê no Senhor Jesus. E, graças ao Senhor, este tão bendito fato é tão verdadeiro hoje quanto era naqueles dias. Ele habita agora em cada crente que descansa na obra consumada (finalizada) de Cristo. O Senhor tinha dito, predizendo esse dia: "Porque [o Espírito Santo] habita convosco, e estará em vós" (João 14:17). Esses dois grandes aspectos da presença do Espírito foram totalmente alcançados no dia de Pentecostes. Ele veio para habitar em cada cristão e na igreja; e agora - que bendita verdade - sabemos que Deus não é apenas para nós, mas em nós, e conosco.
Quando "Deus ungiu a Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com virtude", Ele apareceu na forma de uma pomba - um belo símbolo da imaculada pureza, da mansidão e da humildade de Jesus. Ele não veio fazer Sua voz ecoar pelas ruas, ou quebrar o caniço rachado, ou apagar o pavio que se queima. Porém, no caso dos discípulos que esperavam em Jerusalém, foi completamente diferente. O Espírito Santo desceu sobre eles como línguas repartidas -línguas como que de fogo que pousaram sobre cada um deles. Isto foi característico. Era o poder de Deus dando testemunho de que aquilo deveria ir além, não apenas para Israel, mas para todas as nações da Terra. A palavra de Deus também julgaria a todos que viriam depois - ela era como línguas de fogo.
O juízo de Deus sobre o homem por causa do pecado tinha sido judicialmente expresso na cruz, e agora tal fato solene deve ser tornado público a todos pelo poder do Espírito Santo. No entanto, a graça reina - reina através da justiça, para a vida eterna, por Cristo Jesus. O perdão é proclamado aos culpados, salvação aos perdidos, paz aos conturbados, e descanso aos cansados. Todos os que creem são, e serão para sempre, abençoados em - e com - um Cristo rescussitado e glorificado.
O espanto e consternação do Sinédrio e do povo judeu deve ter sido realmente grande na reaparição, em tal poder, dos seguidores do Jesus crucificado. Eles tinham, sem dúvida, concluído que, como o Mestre tinha partido, os discípulos não poderiam fazer nada por si mesmos. Para a maioria, os discípulos eram simples homens iletrados. Mas qual deveria ter sido o espanto das pessoas quando ouviram que aqueles homens simples estavam pregando corajosamente nas ruas de Jerusalém, e fazendo convertidos aos milhares para a religião de Jesus! Mesmo vista apenas historicamente, a cena é cheia do mais emocionante interesse, não havendo paralelo nos anais do tempo.
Jesus foi crucificado. Suas alegações de ser o Messias, à vista popular, tinham sido enterradas em Seu túmulo. Os soldados que guardavam Seu sepulcro tinham sido subornados para espalhar um falso relato quando à Sua ressurreição; a excitação popular tinha, sem dúvida, passado, e a cidade e a adoração no templo tinham retornado a seu curso normal, como se nada tivesse acontecido. Mas da parte de Deus as coisas não iriam ser deixadas passar quietamente. Ele estava esperando o tempo certo para reivindicar Seu Filho, e reivindicá-lo no mesmo cenário de Sua humilhação. Isso aconteceu cedo de manhã, no dia de Pentecostes. Repentina e inesperadamente, Seus dispersos seguidores reapareceram em um poder miraculoso. Eles ousadamente acusaram os governantes e as pessoas culpadas de Sua apreensão, julgamento e crucificação - que eles haviam matado seu próprio Messias - mas que Deus O havia ressuscitado para ser Príncipe e Salvador, e para colocá-Lo em Seu lugar de direito no Céu. "Onde o pecado abundou, superabundou a graça" (Romanos 5:20)
A sentença de Babel, podemos também mencionar, foi revertida naquele maravilhoso dia. Nas diferentes línguas, pelas quais o homem tinha sido condenado por ter desobedecido a Deus, a salvação é proclamada. Essa poderosa e maravilhosa obra de Deus atraiu a multidão. Eles são surpreendidos, e especulam sobre o estranho acontecimento. Cada um, em sua própria língua do país de onde vieram, ouve dos lábios dos pobres galileus sobre as maravilhosas obras de Deus. Os judeus que habitavam em Jerusalém, não entendendo essas línguas estrangeiras, zombavam. Então Pedro se pôs de pé, e declarou a eles em sua própria língua, provando pelas suas próprias Escrituras, o verdadeiro caráter do que havia ocorrido.
Nota: fogo, na Bíblia, sempre aparece com a conotação de juízo de Deus. Podemos refletir sobre a diferença na forma como o Espírito Santo pousou sobre o Senhor (pomba, simbolizando paz, pureza, mansidão), e como Ele se manifestou ao descer sobre a igreja (línguas como que de fogo, simbolizando juízo). Os crentes, embora sejam completamente salvos do juízo de Deus e feitos perfeitos - pelo novo nascimento - aos olhos de Deus pela obra consumada de Cristo, ainda possuem em si a velha natureza - a carne - enquanto neste mundo. A semelhança das línguas com fogo, no dia de Pentecostes, provavelmente simboliza que o Espírito Santo, em juízo, luta contra a carne, conforme Gálatas 5:17: "Porque a carne luta contra o Espírito, e o Espírito contra a carne; e estes se opõem um ao outro, para que não façais o que quereis."
O PRIMEIRO APELO DE PEDRO AOS JUDEUS
Então lemos: "E em Jerusalém estavam habitando judeus, homens religiosos, de todas as nações que estão debaixo do céu. E, quando aquele som ocorreu, ajuntou-se uma multidão, e estava confusa, porque cada um os ouvia falar na sua própria língua. E todos pasmavam e se maravilhavam, dizendo uns aos outros: Pois quê! não são galileus todos esses homens que estão falando? Como, pois, os ouvimos, cada um, na nossa própria língua em que somos nascidos? Partos e medos, elamitas e os que habitam na Mesopotâmia, Judéia, Capadócia, Ponto e Ásia, e Frígia e Panfília, Egito e partes da Líbia, junto a Cirene, e forasteiros romanos, tanto judeus como prosélitos, cretenses e árabes, todos nós temos ouvido em nossas próprias línguas falar das grandezas de Deus. E todos se maravilhavam e estavam suspensos, dizendo uns para os outros: Que quer isto dizer? E outros, zombando, diziam: Estão cheios de mosto. Pedro, porém, pondo-se em pé com os onze, levantou a sua voz, e disse-lhes: Homens judeus, e todos os que habitais em Jerusalém, seja-vos isto notório, e escutai as minhas palavras. Estes homens não estão embriagados, como vós pensais, sendo a terceira hora do dia", ou, como devemos considerar, eram nove horas da manhã - a hora da oração no templo. (Atos 2:5-15)
Assim, Pedro toma a dianteira e explica aos judeus que as coisas maravilhosas que eles têm visto e ouvido naquela manhã não eram resultado de emoção, mas sim aquilo que deveria ser procurado segundo as suas próprias profecias das Escrituras. "Isto é o que foi dito pelo profeta Joel" (Atos 2:16). É marcante o motivo pelo qual Pedro se levanta e prega com tal ousadia, que é o terreno da ressurreição e exaltação de Cristo. Isto deve ser cuidadosamente observado, uma vez que mostra o fundamento sobre o qual a igreja descansa, e quando e onde sua história começa. Este foi o primeiro dia de sua existência, a primeira página de sua história, e seus primeiros triunfos do dom (presente) inefável de Deus para o homem.
"Deus ressuscitou a este Jesus, do que todos nós somos testemunhas. De sorte que, exaltado pela destra de Deus, e tendo recebido do Pai a promessa do Espírito Santo, derramou isto que vós agora vedes e ouvis. Porque Davi não subiu aos céus, mas ele próprio diz: Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à minha direita, até que ponha os teus inimigos por escabelo de teus pés. Saiba, pois com certeza toda a casa de Israel que a esse Jesus, a quem vós crucificastes, Deus o fez Senhor e Cristo."(Atos 2:32-36)
Os benditos efeitos do primeiro sermão de Pedro, e da presença do Espírito Santo na Terra:
"Não foi meramente uma mudança moral, mas um poder que pôs de lado todos os motivos que individualizavam aqueles que O tinham recebido, unindo-os em uma só alma, e em uma só mente. Eles perseveravam na doutrina dos apóstolos, eles estavam em comunhão uns com os outros, eles partiam o pão, eles passavam o tempo em oração: a consciência da presença de Deus era poderosa entre eles, e muitos sinais e maravilhas eram operados pelas mãos dos apóstolos. Eles estavam unidos pelos laços mais fortes, onde ninguém dizia que coisa alguma do que possuía era sua própria, mas todos dividiam suas possessões com aqueles que necessitavam. Eles estavam diariamente no templo, o local público de Israel para os exercícios religiosos, ao mesmo tempo em que tinham seu próprio local, fora daquilo, quando partiam o pão nas casas diariamente. Eles comiam com alegria e júbilo de coração, louvando a Deus, e caindo na graça de todo o povo ao seu redor. Assim a assembleia foi formada, e o Senhor acrescentava todos os dias a ela o remanescente de Israel que seria salvo dos juízos que cairiam sobre a nação que havia rejeitado o Filho de Deus, seu próprio Messias. Deus trouxe à assembleia - assim propriedade dEle pela presença do Espírito Santo - aqueles a quem Ele poupou em Israel. Aqui se encontrava a presença e a casa de Deus, apesar da antiga ordem de coisas ainda existir até a execução do juízo sobre Israel
Nota: invasão romana e destruição do templo de Jerusalém no ano 70 d.C.
"A igreja foi formada, portanto, pelo poder do Espírito Santo que desceu do Céu, sobre o testemunho de que Jesus, que tinha sido rejeitado, foi elevado ao Céu, tendo sido feito, de Deus, Senhor e Cristo. Ela foi composta do remanescente judeu que seria poupado, com a reserva de acrescentar também os gentios sempre que Deus fosse chamá-los." Trecho extraído das Sinopses dos Livros da Bíblia, de J. N. Darby, vol. 4, p. 8.
Esta é, então, a igreja de Deus: a união daqueles a quem Deus chamou para o nome do Senhor Jesus, e pelo Espírito Santo. O amor governa e caracteriza a recém-formada assembleia. As poderosas vitórias que a graça alcançou naquele memorável dia comprovou totalmente o poder do exaltado Senhor, e a presença do Espírito Santo na Terra. Três mil almas foram convertidas por meio de um único sermão. Aqueles que haviam sido inimigos declarados do Senhor, e que tinham participação na culpa de Seu assassinato, agora agonizavam sob o poder das palavras de Pedro. Alarmados pelo terrível pensamento de terem matado seu próprio Messias, e que Deus, em cuja presença eles estavam agora, O tinha exaltado à Sua própria destra no Céu, eles clamaram: "Que faremos, homens irmãos?"
Pedro agora procura aprofundar as boas obras em suas almas - Ele [o Senhor], procura humilhar os judeus, uma vez orgulhosos e desdenhosos. "Arrependei-vos", diz Pedro, "e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo, para perdão dos pecados; e recebereis o dom do Espírito Santo". Ele não diz simplesmente "Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo", embora, é claro, a fé e o arrependimento devem andar juntos onde quer que a obra é genuína. Mas Pedro, neste caso, pressiona ao arrependimento. A culpa deles tinha sido grande demais, e uma obra moral profunda em suas consciências era necessária para o arrependimento deles. Eles devem ver sua culpa diante de Deus, e receber a remissão de seus pecados aos pés daquEle que eles tinham rejeitado e crucificado. No entanto, tudo era graça. Seus corações foram tocados. Trocaram de lado, para o lado de Deus, contra eles mesmos - realmente se arrependeram, foram perdoados, e receberam a dádiva do Espírito Santo. Agora eles são filhos de Deus e têm a vida eterna: o Espírito Santo habita neles.
A realidade da mudança foi manifesta por uma completa mudança de caráter. "De sorte que foram batizados os que de bom grado receberam a sua palavra; e naquele dia agregaram-se quase três mil almas, e perseveravam na doutrina dos apóstolos, e na comunhão, e no partir do pão, e nas orações." (Atos 2:41-42)
Batismo, na confissão de fé; recepção na assembleia; a ceia do Senhor, a comunhão dos santos, a oração; estas eram suas observâncias distintivas. Nesse momento, a oração do Senhor, "que todos sejam um", foi respondida, como lemos no capítulo 4. "E era um o coração e a alma da multidão dos que criam, e ninguém dizia que coisa alguma do que possuía era sua própria, mas todas as coisas lhes eram comuns." (Atos 4:32). Vamos pular agora, a fim de continuar nossa linha de raciocínio, para o capítulo 10 de Atos.
O SELO DOS GENTIOS
Observe, então, esse importante fato conectado à introdução dos gentios à igreja - eles recebem o dom/dádiva do Espírito Santo simplesmente por meio da pregação da Palavra. Em Jerusalém, os judeus foram batizados antes de terem recebido o Espírito Santo. Em Samaria, os samaritanos foram não apenas batizados, mas tiveram que passar pela imposição de mãos dos apóstolos com oração, antes de receberem o Espírito Santo. Mas em Cesareia, sem batismo, sem imposição de mãos e sem oração, a mais rica bênção cristã foi dada aos gentios, embora a doutrina da igreja como o corpo de Cristo ainda não ter sido revelada.
A graça de Deus, assim apresentada aos gentios no início da dispensação, a tem caracterizado desde então. Somos gentios: não somos judeus nem samaritanos. Portanto os caminhos de Deus em graça, e Sua ordem de coisas para com os gentios, têm uma aplicação especial para nós. Não há exemplo registrado pelos historiadores inspirados de alguém que tenha sido batizado sem professar fé em Cristo, mas se formos seguir o padrão de coisas em Cesareia, devemos procurar pelo selamento assim como pela vivificação - para a paz com Deus, assim como para a fé em Cristo antes do batismo. O caso de Cornélio se situa justamente no início de nossa dispensação. Foi a primeira expressão de graça endereçada diretamente aos gentios e, certamente, deveria ser um modelo para pregadores e discípulos gentios. Quando a Palavra de Deus que foi, naqueles dias, pregada a Cornélio é, hoje, crida, podemos garantir que teremos os mesmos efeitos, isto é, a paz com Deus..
Pregar, crer, selar, batizar, é a ordem divina das coisas aqui. Deus e Sua Palavra nunca mudam, embora os "tempos mudam", como dizem os homens, assim comoas opiniões humanas mudam, e as observâncias religiosas mudam. Mas a Palavra de Deus - nunca. Judeus, gentios e samaritanos professaram fé em Cristo antes de serem batizados. De fato, o batismo presume vida eterna adquirida pela fé, e não transmitida após o ato de batizar, como ensinam os católicos e anglicanos. "A graça e a vida são comunicadas por meio de sacramentos", dizem eles, "e só podem ser efetuadas por esses meios, independente de qualquer exercício de intelecto da parte da pessoa trazida à união. O santo batismo é o meio pelo qual uma vida nova e espiritual é conferida ao receptor." The Church and the World, páginas 178-188.}
Tais noções - nem precisamos comentar muito - são totalmente contrárias às Escrituras. O batismo não concede nada. A vida é concedida por outros modos, como as Escrituras claramente ensinam. A conversão, ou "nascer de novo", é efetuada, em todos os casos, sem exceção, pelo Espírito Santo. Como lemos em 1 Pedro: "Purificando as vossas almas pelo Espírito na obediência à verdade, para o amor fraternal, não fingido; amai-vos ardentemente uns aos outros com um coração puro. Sendo de novo gerados, não de semente corruptível, mas da incorruptível, pela palavra de Deus, viva, e que permanece para sempre."(1 Pedro 1:22-23). Aqui, a verdade do evangelho é vista como o meio, e o Espírito Santo como o poder, da conversão. Cristo, ou Deus em Cristo, é o novo objetivo da alma. É pelo Espírito e pela verdade de Deus que tal bendita mudança é efetuada. Àqueles que confiam nas águas do batismo como o meio de efetuá-la, sinto-lhes dizer, estão em uma grande e fatal engano.
As seguintes breves declarações dos "pais" do quarto século, sobre o assunto do batismo, mostrará aos leitores as fontes, ou autoridades, de muito do que se dizia e fazia naqueles dias pelos ritualistas. Note que a autoridade das Escrituras é totalmente posta de lado: "Na Páscoa, e no Pentecostes, e em alguns lugares na Epifania, o rito do batismo era administrado publicamente - isto é, na presença dos fiéis - a todos os convertidos naquele ano, com exceção de alguns que tiveram a oportunidade de participar da cerimônia sem atraso, ou quando o cristão deixava para fazê-lo apenas próximo ao final de sua vida, como o exemplo de Constantino: uma prática há muito tempo condenada pelo clero. Mas o fato do atraso demonstra quão profundamente a importância e eficácia do rito era enraizada na mente cristã. Significava uma completa purificação da alma. O neófito (novo convertido) emergia das águas do batismo em um estado de perfeita inocência. A pomba - o Espírito Santo - constantemente pairava sobre a fonte, santificando as águas para a misteriosa lavagem de todos os pecados da vida passada. Se a alma não sofresse nenhuma culpa posterior, ela passaria de uma vez por todas para o reino de pureza e felicidade, isto é, o coração seria purificado, com entendimento iluminado e o espírito revestido de imortalidade.
"Vestido em branco, emblemático da pureza imaculada, o candidato se aproximava do batistério - que em igrejas maiores era um edifício separado. Lá, ele proferia os solenes votos de que se comprometeria com sua religião. O gênio simbolizante do Oriente adicionou algumas cerimônias significativas. O catecúmeno (um dos primeiros estágios da instrução cristã) se virava para o Ocidente, o reino de Satanás, e renunciava três vezes ao seu poder. Então se virava para o Oriente para adorar o Sol da Justiça, e para proclamar seu pacto com o Senhor da vida. O místico número três prevalecia em tudo: o voto era triplo, e três vezes pronunciado. O batismo se dava geralmente por imersão. O despir das roupas era emblemático do 'tirar o velho homem', mas o batismo por aspersão era permitido, de acordo com a exigência do caso. A água em si se tornava, na vívida linguagem da igreja, o sangue de Cristo: era comparada, por uma fantasiosa analogia, com o Mar Vermelho.
A ousada metáfora de alguns dos 'pais' parece afirmar uma transmutação da cor da água. "Quase todos os 'pais' dessa era, como Basílio, os dois Gregórios, Ambrósio, etc., tinham escrito tratados sobre o batismo, e rivalizaram, por assim dizer, uns com os outros em seus louvores sobre a importância e eficácia do batismo. Gregório de Nazianzo quase esgota a copiosidade da língua grega ao falar do batismo." - A História do Cristianismo por Milman, vol. 3}
No caso dos gentios em questão aqui, ainda mais que vida era possuída antes do batismo ser administrado. Eles tinham o selo de Deus. O batismo é o sinal da plena libertação e salvação garantidas ao crente pela morte e ressurreição de Cristo. Cornélio tinha vida, era um homem devoto, mas ele deveria ouvir de Pedro as palavras pelas quais ele seria salvo e totalmente liberto. Tanto o Antigo quanto o Novo Testamento ensinam essa bendita verdade da maneira mais clara possível. Israel, como um povo típico, após ter sido trazido a Deus e protegido pelo sangue do cordeiro no Egito, foi batizado a Moisés na nuvem e no mar. Assim eles foram libertos do Egito e viram a salvação de Jeová. Novamente, Noé e sua família foram salvos através do dilúvio - não por ele. Eles deixaram o velho mundo, passaram através das águas da morte, e pousaram em uma nova condição de coisas. "Como uma verdadeira figura, agora vos salva, o batismo, ... pela ressurreição de Jesus Cristo." (Êxodo 14; 1 Pedro 3:21)
Mas qual era a palavra, alguns poderiam perguntar, que Pedro pregou, e que foi acompanhada de tal notável bênção? Ele pregou paz por Jesus Cristo como o Senhor de tudo. Cristo ressuscitado, exaltado e glorificado foi o grandioso objeto de seu testemunho. Ele o resume com essas palavras: "A este dão testemunho todos os profetas, de que todos os que nele crêem receberão o perdão dos pecados pelo seu nome." (Atos 10:43). Então segue-se a bênção. Os judeus que estavam presentes ficaram atônitos, mas se curvam, e reconhecem a bondade de Deus para com os gentios. "E, dizendo Pedro ainda estas palavras, caiu o Espírito Santo sobre todos os que ouviam a palavra. E os fiéis que eram da circuncisão, todos quantos tinham vindo com Pedro, maravilharam-se de que o dom do Espírito Santo se derramasse também sobre os gentios. Porque os ouviam falar línguas, e magnificar a Deus. Respondeu, então, Pedro: Pode alguém porventura recusar a água, para que não sejam batizados estes, que também receberam como nós o Espírito Santo? E mandou que fossem batizados em nome do Senhor. Então rogaram-lhe que ficasse com eles por alguns dias." (Atos 10:44-48)
Vamos, agora, refazer um pouco nossos passos e observar alguns dos principais eventos que, por ordem, precedem o capítulo 10.
O PRIMEIRO MÁRTIR CRISTÃO
Estêvão, diácono e evangelista, é o primeiro a receber a coroa do martírio pelo nome de Jesus. Ele permanece à frente do "nobre exército dos mártires". Ele é perfeito como uma figura - um protótipo de um verdadeiro mártir. Firme e inabalável em sua fé. Ousado e destemido diante de seus acusadores. Aguçado e fiel em sua defesa diante do Sinédrio. Livre da malícia em suas mais fortes declarações. Cheio de caridade para com todos os homens, ele sela seu testemunho com seu sangue, e então dorme em Jesus.
Em alguns aspectos, Estêvão lembra o próprio bendito Senhor. "Senhor Jesus, recebe o meu espírito" (Atos 7:59), parece com "Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito" (Lucas 23:46); e de novo, "Senhor, não lhes imputes este pecado" (Atos 7:60), lembra "Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem" (Lucas 23:34), apesar de Estêvão não indicar a ignorância deles.
Já podemos ver que problemas, tanto do lado de dentro quanto do lado de fora, atacam a jovem igreja. É verdade que a palavra de Deus aumentou, multidões foram convertidas, e uma grande parte dos sacerdotes eram obedientes à fé. Porém os gregos, ou helenistas (judeus de origem grega), murmuravam contra os hebreus (nativos da Judeia), porque suas viúvas eram negligenciadas na ministração diária. Isto levou à nomeação de sete diáconos (Atos 6). Pelos seus nomes aqui dados, parece que os sete escolhidos eram gregos - todos do lado dos murmuradores. Assim o Espírito de Deus dominou em graça. Estêvão era um deles, e neste caso, a palavra do apóstolo foi exemplificada: aqueles que "servirem bem como diáconos, adquirirão para si uma boa posição e muita confiança na fé que há em Cristo Jesus." (1 Timóteo 3:13). Ele era cheio de fé e poder, e fazia grandes maravilhas e milagres entre o povo. A energia do Espírito Santo se manifestava especialmente em Estêvão.
Havia diferentes sinagogas em Jerusalém apropriadas para diferentes raças de judeus. Foram as sinagogas dos libertinos, dos cireneus, etc., que se opunham a Estêvão. Mas"não podiam resistir à sabedoria, e ao Espírito com que falava". Segue-se, então, o que tem geralmente acontecido com os que confessam a Jesus em todas as eras: incapazes de respondê-lo, eles o acusam perante o conselho. Falsas testemunhas são subornadas para jurar que eles o tinham ouvido falar "palavras blasfemas contra Moisés, e contra Deus", e que Jesus de Nazaré destruiria aquele lugar e mudaria os costumes entregues a eles por Moisés. O caso estava agora diante do Sinédrio - o julgamento começa. Mas o que seus juízes teriam pensado quando viram sua face radiante como a face de um anjo?
Temos o nobre discurso de Estêvão aos chefes da nação diante de nós. Convincente, desconcertante e esmagador. Sem dúvidas, foi um testemunho do Espírito Santo aos judeus, da boca de Estêvão, e ainda mais humilhante para os orgulhosos judeus: ouvirem sua condenação dos lábios de um helenista. Mas o Espírito de Deus, quando sem impedimentos pelos arranjos do homem, opera por quem Ele quer.
Estêvão recapitula, em linguagem ousada, os principais pontos de sua história nacional. Ele fala especialmente das histórias de José e de Moisés. O primeiro, seus pais {*os outros dos doze filhos de Jacó} o haviam vendido aos gentios, e o último desprezaram como príncipe e juiz. Ele também os acusa de sempre resistir ao Espírito Santo - de sempre desobedecerem a lei - e agora por terem sido os traidores e assassinos do Justo. Aqui a testemunha fiel de Cristo foi interrompida. Não lhe foi permitido terminar seu discurso - uma figura, tão verdadeira, do tratamento para com os mártires daqueles dias até hoje. Os murmúrios, a indignação, a fúria do Sinédrio, estavam fora de controle. "E, ouvindo eles isto, enfureciam-se em seus corações, e rangiam os dentes contra ele." (Atos 7:54). Mas, em vez de dar prosseguimento ao discurso, ele entra em êxtase de coração ao Senhor e fixa seus olhos no Céu - o lar e centro de união para todo Seu povo.
"Eis que vejo", diz Estêvão, "os céus abertos" (Atos 7:56). Ele está cheio do Espírito Santo enquanto olha para o alto, e vê o Filho do homem de pé, ali, pronto para receber seu espírito. "Tal é", escreveu alguém, "a posição do verdadeiro crente - ligado ao Céu, bem acima da Terra - na presença do mundo que rejeitou a Cristo, um mundo assassino. O crente, vivo na morte, vê, pelo poder do Espírito, o Céu, e o Filho do homem à direita de Deus. Estêvão não diz 'Jesus'. O Espírito O caracteriza como 'o Filho do homem'. Que precioso testemunho para o homem! Não é sobre a glória que Ele aqui testifica, mas sim sobre o Filho do homem na glória, tendo os céus abertos diante dele... Quanto ao objeto de fé e a posição do crente, essa cena é definitivamente característica."
Eis o proeminente, o mais próximo ao trono Perfeitas vestes triunfais trajando Aí está o que mais ao mestre se assemelha Este santo, este Estêvão que se ajoelha Fixando o olhar enquanto os céus Se abriam aos seus olhos que se fechavam Que, tal como lâmpada quase apagada retoma seu fulgor, E faz vê-lo o que a morte esconde a rigor. Ele, que  parece estar na  terra Há de voar como pomba vera E da amplitude do céu sem nuvens Extrair o mais puro dos ares Para que os homens contemplem sua face angelical Plena do resplendor da graça celestial, Mártir íntegro, apto a se conformar À morte de Jesus, vitória sem par! (tradução livre da poesia constante da edição original em inglês).
Examinamos, com certo cuidado e minúcia, a primeira seção da história da igreja. Temos sido os mais cuidadosos possível, uma vez que as histórias sobre a igreja, em geral, começam em um período posterior. A maioria começa onde as Escrituras terminam, ao menos quanto aos detalhes. Nenhuma das que temos referem-se a Mateus 16, e poucas tentam um exame crítico de Atos dos Apóstolos que, afinal, é a única parte de sua história que comanda nossa fé, e que tem uma reivindicação absoluta de nossa obediência.
No capítulo 8 encontramos o Espírito Santo em Samaria operando por Filipe.
Ele tinha, por assim dizer, deixado Jerusalém. Isso marca uma época distinta na história da igreja, especialmente em sua conexão com Jerusalém. Deixemos, por enquanto, os judeus enfurecidos e perseguidores, e sigamos o caminho do Espírito à cidade de Samaria. Será, no entanto, de proveito olharmos por um momento ao que alguns têm chamado de a terceira perseguição.
A PERSEGUIÇÃO E DISPERSÃO DOS DISCÍPULOS
Após a morte de Estêvão uma grande perseguição começou (Atos 8). Os líderes judeus pareciam ter ganho uma vitória sobre os discípulos, e estavam determinados a prosseguir com seu aparente triunfo com a maior violência. Mas Deus, que está acima de todos, e que sabe como conter as crescentes paixões dos homens, anulou a posição deles para o cumprimento de Sua própria vontade.
O homem ainda não tinha aprendido a verdade do provérbio, que "o sangue dos mártires é a semente da igreja." No caso do primeiro e mais nobre dos mártires, o provérbio foi plenamente verificado. Mas em todas essas vinte centenas de anos os homens têm sido lentos para aprender, ou crer, nesse simples fato histórico. A perseguição, geralmente falando, tinha feito aumentar a causa que procuravam reprimir. Isso tem se provado verdadeiro na maioria dos casos,  em qualquer tipo  de perseguição  ou  de oposição. Resistência, decisão e firmeza são criadas por tal tratamento. Verdadeiramente, mentes tímidas podem ser levadas à apostasia por um tempo sob a perseguição; mas quão comumente tais, com o mais profundo arrependimento, e de modo a recuperar sua antiga posição, suportaram com a maior alegria os mais agudos sofrimentos, e mostraram em seus últimos momentos a maior fortaleza! Mas a perseguição, de uma forma ou de outra, deve ser esperada pelos seguidores de Jesus. Eles são exortados a tomar sua cruz diariamente e segui-Lo. Isto testa a sinceridade de nossa fé, a pureza de nossos motivos, a força de nossa afeição por Cristo, e a medida de nossa confiança nEle.
Aqueles que não são verdadeiros de coração para Cristo com certeza irão cair em tempos de afiada perseguição. Mas o amor pode perdurar até o fim, quando não houver mais nada a fazer. Vemos isso perfeitamente no próprio bendito Senhor. Ele suportou a cruz - que era de Deus: Ele desprezou a vergonha - que foi do homem. Foi em meio à vergonha e sofrimentos da cruz que toda a força do Seu amor apareceu, e na qual Ele triunfou sobre tudo. Nada poderia afastar Seu amor do objeto deste, ou seja, do Pai, pois era mais forte que a morte. Nisso, assim como em todas as coisas, Ele nos deixou um exemplo, de que devemos andar em Seus passos. Que possamos sempre ser encontrados seguindo-O de perto!
Da história da igreja em Atos aprendemos que o efeito do martírio de Estêvão foi a imediata propagação da verdade que seus perseguidores estavam tentando impedir. As impressões produzidas por tal testemunho, e tal morte, devem ter sido avassaladoras para seus inimigos, e convincentes para os imparciais e indecisos. O último recurso da crueldade humana é a morte. No entanto, é maravilhoso dizer que a fé cristã, em sua primeira dificuldade, provou-se mas forte que a morte em sua forma mais assustadora. O inimigo foi testemunha disso, e sempre se lembraria. Estêvão estava sobre a Pedra, e as portas do inferno não podiam prevalecer contra Ela.
Toda a igreja em Jerusalém, na ocasião, foi dispersa; mas eles iam por toda a parte pregando a Palavra. Como a nuvem que voa com o vento, levando sua chuva fresca a terras secas, assim os discípulos foram expulsos de Jerusalém pela tempestade da perseguição, levando as águas da vida às almas sedentes de terras distantes. "E fez-se naquele dia uma grande perseguição contra a igreja que estava em Jerusalém; e todos foram dispersos pelas terras da Judéia e de Samaria, exceto os apóstolos" (Atos 8:1). Alguns historiadores pensam que o fato dos apóstolos permanecerem em Jerusalém quando os discípulos fugiram prova, da parte deles, maior firmeza e fieldade na causa de Cristo, mas estamos dispostos a julgar o fato de modo diferente, e a considerá-lo uma falha em vez de fieldade. A comissão do Senhor a eles era: "Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo"(Mateus 28:19). E eles tinham sido ensinados: "Quando pois vos perseguirem nesta cidade, fugi para outra" (Mateus 10:23). Até onde a história das Escrituras nos informa, a comissão nunca foi realizada pelos doze. No entanto, Deus era poderoso em Paulo, para com os gentios, e em Pedro para com os judeus.
O Espírito Santo agora vai além de Jerusalém, para manifestar poder em terras estrangeiras - que solene verdade! Mas aquela cidade culpada preferia a dominação de Roma à ressurreição em poder de seu próprio Messias. "Que faremos?", diziam os judeus, "porquanto este homem faz muitos sinais. Se o deixamos assim, todos crerão nele, e virão os romanos, e tirar-nos-ão o nosso lugar e a nação." (João 11:47-48). Eles rejeitaram o Messias em Sua humilhação, e agora eles rejeitam o testemunho do Espírito Santo sobre Sua exaltação. A iniquidade deles era completa, e a ira se aproximava deles até o fim. Mas, por ora, nossa tarefa, seguindo o curso da história da igreja, é acompanhar o Espírito Santo em seu caminho a Samaria. Seu caminho é a linha prateada da graça salvadora para almas preciosas.
OS TRIUNFOS DO EVANGELHO EM SAMARIA
Filipe, o diácono, evidentemente próximo a Estêvão em zelo e energia, desce à Samaria. O Espírito Santo opera por meio dele. Na sabedoria dos caminhos do Senhor, a desprezada Samaria é o primeiro lugar, fora da Judeia, onde o Evangelho foi pregado por Suas testemunhas escolhidas. "E, descendo Filipe à cidade de Samaria lhes pregava a Cristo. E as multidões unanimemente prestavam atenção ao que Filipe dizia, porque ouviam e viam os sinais que ele fazia. E havia grande alegria naquela cidade." (Atos 8:5-6,8). Muitos creram e foram batizados, tanto homens quanto mulheres. Até mesmo Simão Mago, o feiticeiro, experimentou a presença de um poder muito acima do seu próprio, e se curvou à força e corrente da obra do Espírito nos outros, embora a verdade não houvesse penetrado em seu próprio coração e consciência. Mas, como agora já viajamos a essa outra parte do país, este pode ser o momento apropriado para dizermos algumas palavras sobre sua história.
A Terra Santa, uma nação interessante, que se destaca entre as outras nações da Terra, tanto moral quanto historicamente, é em tamanho muito pequena. "É como um pedaço de um país, de tamanho próximo ao do País de Gales, com menos de 225 quilômetros de comprimento, e quase 64 quilômetros, em média, de largura"( Dicionário Bíblico de Smith). A parte norte é a Galileia; o centro, Samaria; o sul, a Judeia. Mas embora fisicamente tão pequena, ela foi o teatro dos acontecimentos mais importantes na história do mundo. Lá, o Salvador nasceu, viveu e foi crucificado - e lá Ele foi sepultado e ressuscitado. E lá, também, Seus apóstolos e mártires viveram, testificaram e sofreram. E lá o evangelho foi pregado pela primeira vez, e lá a primeira igreja foi plantada.
 A terra ocupada por Israel se encontra entre os antigos impérios da Assíria e do Egito. Daí a frequente referência no Antigo Testamento ao "rei do Norte" e ao "rei do Sul". Devido a essa posição, Israel foi muitas vezes o campo de batalha desses dois poderosos impérios, e sabemos que ainda será o cenário de seu último e mortal conflito (Daniel 11). Os homens têm sido tão supersticiosos sobre a Terra Santa que ela tem sido objeto de ambição nacional, e quase sempre motivo de guerras religiosas desde os dias dos apóstolos. Quem poderia estimar quanto sangue foi derramado, e o tesouro que foi desperdiçado por essas planícies sagradas? - e tudo, podemos acrescentar, sob o nome do zelo religioso, ou melhor, sob as bandeiras da cruz e da lua crescente. Para ali os peregrinos de todas as eras têm viajado para que pudessem adorar no "santo sepulcro" e cumprir seus votos. Também tem sido a grande atração para viajantes de todo tipo e de todas as nações, e o grande empório de "relíquias milagrosas". O cristão, o historiador e o antiquário têm procurado diligentemente e feito conhecidas suas descobertas. Desde os dias de Abraão, esse tem sido o lugar mais interessante e atraente da face da Terra. E para o estudante da profecia, sua história futura é ainda mais interessante que seu passado. Ele sabe que o dia se aproxima, quando toda aquela terra será povoada pelas doze tribos de Israel, e cheia da glória e majestade de seu Messias. Então eles serão conhecidos como o povo metropolitano da Terra. Retornemos, agora, a Samaria, com sua nova vida e alegria.
Os samaritanos, por meio da bênção de Deus, prontamente creram no Evangelho pregado por Filipe. O efeito da verdade, recebida com simplicidade, foi imediato e do mais bendito caráter. "Havia grande alegria naquela cidade", e muitos foram batizados. Tais devem ser sempre os efeitos do Evangelho, quando crido, a menos que haja algum obstáculo com relação a nós mesmos. Onde há genuína simplicidade de fé, deve haver paz e alegria genuínas, e uma feliz obediência. O poder do Evangelho sobre um povo que tinha, durante séculos, resistido às reivindicações do judaísmo, foi então demonstrado. O que a lei não podia fazer a este respeito, o Evangelho realizou. "Samaria foi uma 'conquista'", disse alguém, "que toda a energia do judaísmo não tinha sido capaz de fazer. Foi um novo e esplêndido triunfo do Evangelho. O domínio espiritual do mundo pertencia à igreja."
JERUSALÉM E SAMARIA
UNIDAS PELO EVANGELHO
O amargo ciúme que existia entre judeus e samaritanos tinha sido, por muito tempo, proverbial; tanto que lemos: "os judeus não se comunicam com os samaritanos". Mas agora, em conexão com o Evangelho da paz, essa raiz de amargura desaparece. No entanto, na sabedoria dos caminhos de Deus, os samaritanos devem esperar pela mais elevada bênção do Evangelho até que os crentes judeus - os apóstolos da igreja em Jerusalém - impusessem suas mãos sobre eles, e oferecessem orações por eles. Nada pode ser mais profundamente interessante do que esse fato, quando tomamos em consideração a rivalidade religiosa que tinha sido, por tanto tempo, manifesta por ambos. Se Samaria não tivesse recebido essa lição oportuna de humildade, ela poderia ter sido descartada, mais uma vez, por manter sua orgulhosa independência de Jerusalém. Mas o Senhor não teria deixado assim. Os samaritanos tinham crido, se regozijado, e foram batizados, mas ainda não tinham recebido o Espírito Santo. "Os apóstolos, pois, que estavam em Jerusalém, ouvindo que Samaria recebera a palavra de Deus, enviaram para lá Pedro e João.
Os quais, tendo descido, oraram por eles para que recebessem o Espírito Santo (porque sobre nenhum deles tinha ainda descido; mas somente eram batizados em nome do Senhor Jesus). Então lhes impuseram as mãos, e receberam o Espírito Santo." (Atos 8:14-17)
Identificação é a grande ideia da imposição de mãos, e unidade é a consequência do dom/dádiva do Espírito Santo. Esses são fatos importantes em conexão com o progresso da igreja. Samaria é, então, trazida à feliz associação com seu antigo rival, e feita uma só com a igreja em Jerusalém. Não há, na mente de Deus, pensamentos sobre uma assembleia ser independente da outra. Se elas tivessem sido abençoadas separada e independentemente, sua rivalidade poderia se tornar maior que nunca. Mas não deveria mais ser assim: "Nem neste monte nem em Jerusalém" (João 4:21), mas uma só Cabeça no Céu, um só corpo na Terra, um só Espírito, uma só família redimida adorando a Deus em espírito e em verdade, porque o Pai procura os que assim O adoram*.
Para saber mais sobre a origem da mistura de povos e sobre a adoração de Samaria, leia 2 Reis 17. Eles eram apenas "metade" judeus, apesar de se gabarem por sua relação com Jacó. Eles consideravam os cinco livros de Moisés sagrados, mas subestimavam o restante da Bíblia. Eles eram circuncidados, guardavam a lei de maneira não muito fiel, e esperavam a vinda de um Messias. A visita pessoal do bendito Senhor a Samaria é do mais profundo e tocante interesse (João 4). Da fonte na qual Ele descansou diz-se que "ficava em um vale entre as duas famosas montanhas Ebal e Gerizim, onde foi lida a lei. Sobre este último estava o templo rival dos samaritanos, que por tanto tempo afligiu os judeus mais zelosos por sua ousada oposição ao único santuário escolhido, no Monte Moriá."
O EUNUCO ETÍOPE RECEBE O EVANGELHO
Filipe é agora chamado a deixar sua feliz e interessante obra em Samaria e descer até Gaza - um deserto - e lá pregar o evangelho a uma única pessoa. Certamente há, nesse fato, uma lição da mais profunda importância para o evangelista, e uma que não podemos deixar passar sem alguma breve observação.
O pregador, em tal cenário de despertar e conversão como houve em Samaria, necessariamente torna-se muito interessado na obra. Deus está colocando seu selo sobre o ministério da Palavra, e sancionando as reuniões em Sua presença. O obra do Senhor prospera. O evangelista é cercado de respeito e afeição, e seus filhos na fé naturalmente procuram por ele para obter mais luz e instrução para seus caminhos."Como poderia ele deixar tal campo de trabalho?", muitos perguntariam, "Seria correto partir?". Apenas, respondemos, se o Senhor chamasse Seu servo a fazer isso, como Ele fez no caso de Filipe. Mas como alguém pode saber hoje em dia, visto que anjos e o Espírito não nos falam como falavam com Filipe? Embora um cristão, hoje em dia, não seja chamado dessa forma, ele deve procurar e esperar pela orientação divina. A fé deve ser seu guia. As circunstâncias não são seguras como guias; elas podem até nos repreender e nos corrigir em nosso andar, mas é o olho de Deus que deve ser nosso guia. "Guiar-te-ei com os meus olhos", essa é a promessa, "instruir-te-ei, e ensinar-te-ei o caminho que deves seguir"(Salmos 32:8).
Somente o Senhor sabe o que é melhor para Seus servos e para Sua obra. O evangelista, em tal cenário, correria o risco de sentir sua própria importância pessoal. Daí o valor, se não a necessidade, da mudança do lugar de serviço.
"Levanta-te", falou o anjo do Senhor a Filipe, "e vai para o lado do sul, ao caminho que desce de Jerusalém para Gaza, que está deserta. E levantou-se, e foi; e eis que um homem etíope, eunuco, mordomo-mor de Candace, rainha dos etíopes, o qual era superintendente de todos os seus tesouros, e tinha ido a Jerusalém para adoração, regressava e, assentado no seu carro, lia o profeta Isaías. E disse o Espírito a Filipe: Chega-te, e ajunta-te a esse carro." (Atos 8:27-29)
É bela a obediência imediata e incondicional de Filipe nesse momento. Ele não faz nenhum questionamento sobre a diferença entre Samaria e Gaza - entre sair de um amplo campo de trabalho e partir para um lugar deserto para falar com uma única pessoa sobre a salvação. Mas o Espírito de Deus estava com Filipe. E o único desejo do evangelista deveria ser de sempre seguir a direção do Espírito. A partir da falta de discernimento espiritual, um pregador poderia permanecer no mesmo lugar após o Espírito ter terminado seu trabalho ali, e assim o serviço é vão.
Deus, em Sua providência, cuida de Seu servo. Ele envia um anjo para direcioná-lo quanto à estrada que ele havia de tomar. Mas quando se trata do evangelho e do lidar com almas, o Espírito toma a direção. "E disse o Espírito a Filipe: Chega-te, e ajunta-te a esse carro." Não sabemos de nada, em toda a história da igreja, mais interessante que essa cena no caminho para Gaza. O anjo e o Espírito de Deus acompanham o evangelista: o primeiro representando a providência de Deus em indicar exatamente a estrada a tomar, e o último representando o poder espiritual direcionando o lidar com as almas. Assim como era, assim é agora, embora tendemos a adotar mais o hábito de pensar na orientação do Espírito do que na direção de providência. Que possamos confiar em Deus para tudo! Ele nunca muda!
O evangelho agora encontra seu caminho, na pessoa do tesoureiro da rainha, para o centro da Abissínia. O eunuco crê, é batizado, e segue seu caminho cheio de alegria. O que ele procurava, em vão, em Jerusalém, tendo seguido uma longa jornada até lá,ele encontra no deserto. Um belo exemplo da graça do evangelho! A ovelha perdida é encontrada no deserto, e águas vivas brotam de lá. O eunuco é também um belo exemplo de uma alma ansiosa. Quando sozinho e ocioso, ele lê o profeta Isaías.  Ele reflete sobre a profecia do sofrimento sem resistência do Cordeiro de Deus. Mas o momento de luz e libertação era chegado. Filipe explica o profeta: o eunuco é ensinado por Deus - ele crê: imediatamente deseja o batismo e retorna para casa, cheio das novas alegrias da salvação. Será que ele ficaria calado sobre o que encontrou quando lá chegasse? Certamente não, um homem de tal caráter e influência teria muitas oportunidades de disseminar a verdade. Mas, como tanto as Escrituras quanto a história são omissas quanto aos resultados de sua missão, não nos aventuremos além.
O Espírito é ainda visto em companhia de Filipe e o leva para longe. Ele se encontra, então, em Azoto, e evangeliza todas as cidades até Cesareia.
Mas uma nova era na história da igreja começa a despontar. Um novo obreiro entra em cena: o mais notável, em muitos aspectos, que já serviu ao Senhor e à Sua igreja.


A CONVERSÃO DE SAULO DE TARSO
Nenhum evento no progresso da história da igreja a afeta tão profundamente, ou tão felizmente, quanto a conversão de Saulo de Tarso. De principal dos pecadores ele se tornou o principal dos santos - do mais violento opositor de Cristo ele se tornou o mais zeloso defensor da fé - como inimigo e perseguidor do nome de Jesus na Terra, ele era o "principal"; todos os outros, em comparação a ele, eram subordinados (Atos 9; 1 Timóteo 1).
É bastante evidente, a partir do que ele fala sobre si mesmo, que ele acreditava que o judaísmo era não só divino, mas a perpétua e imutável religião de Deus para o homem. Seria difícil explicar a força de seus preconceitos judaicos sobre qualquer outro princípio. Portanto, todas as tentativas de pôr de lado a religião dos judeus, e de introduzir outra, ele considerava como sendo algo do inimigo, devendo ser arduamente combatidas. Ele tinha ouvido o nobre discurso de Estêvão - ele tinha testemunhado sua morte triunfante - mas sua subsequente perseguição aos cristãos mostrou que a glória moral daquela cena não o havia impressionado de maneira séria em sua mente. Ele foi cegado pelo zelo; mas o zelo pelo judaísmo agora era um zelo contra o Senhor. Neste exato momento ele estava "respirando ainda ameaças e mortes contra os discípulos do Senhor" (Atos 9:1).
Ouvindo que alguns dos santos perseguidos haviam encontrado um abrigo em Damasco, uma antiga cidade da Síria, ele se convenceu a ir até lá e trazê-los de volta a Jerusalém como criminosos. Para este fim, ele recebeu cartas do sumo sacerdote e do conselho de anciãos, de que ele poderia trazê-los presos a Jerusalém para serem punidos (Atos 22, 26). Ele, então, se torna o próprio apóstolo da malícia judaica contra os discípulos de Jesus - ignorantemente, sem dúvida, mas ele se fez o missionário voluntário deles.
Com sua mente forjada até o tom mais violento do zelo perseguidor, ele segue em sua memorável jornada. Inabalável em seu apego fervoroso pela religião de Moisés, e determinado a punir os convertidos ao cristianismo como apóstatas da fé de seus ancestrais, ele se aproxima de Damasco. Mas lá, na plena energia de sua louca carreira, o Senhor Jesus o detém. Uma luz dos céus, mais forte que a luz do sol, brilha em torno dele, e o subjuga com seu brilho ofuscante. Ele cai por terra - com a vontade quebrada, a mente subjugada, o espírito humilhado, e completamente mudado. Seu coração é agora sujeito à voz que fala com ele. Raciocínio, extenuação e auto-justificação não têm lugar na presença do Senhor.
Uma voz da magnífica glória disse-lhe: "Saulo, Saulo, por que me persegues? E ele disse: Quem és, Senhor? E disse o Senhor: Eu sou Jesus, a quem tu persegues." (Atos 9:4-5). Então o Senhor Jesus, mesmo estando no Céu, declara que Ele próprio é ainda identificado com Seus discípulos na Terra. A unidade da igreja com Cristo, sua Cabeça nos céus, a semente da bendita verdade do "um só corpo", é resumida nessas poucas palavras: "Saulo, Saulo, por que me persegues? ... Eu sou Jesus, a quem tu persegues." Estar em guerra contra os santos é o mesmo que estar em guerra contra o próprio Senhor. Que bendita verdade para o crente, mas quão solene para o perseguidor!
A visão que Saulo tinha visto e a terrível descoberta que ele tinha feito o absorveram completamente. Ele fica cego por três dias, e não pode comer nem beber. Então ele entra em Damasco, cego, quebrantado e humilhado pelo solene juízo do Senhor!
Quão diferente daquilo que ele pretendia! Ele agora se une à companhia daqueles que ele tinha resolvido exterminar. No entanto, ele entra pela porta, e humildemente toma seu lugar entre os discípulos do Senhor. Ananias, um discípulo fiel, é enviado para confortá-lo. Ele recebe sua vista de volta, é cheio do Espírito Santo, é batizado, e então é alimentado e fortalecido.
Alguns pensam que o Senhor dá, na conversão de Paulo, não somente uma amostra de Sua longanimidade, como em todo o pecador que é salvo, mas também um sinal da futura restauração de Israel. Paulo nos conta, ele próprio, ter obtido misericórdia porque ele fez tudo aquilo em ignorante incredulidade - e tal será a mesma situação de Israel nos últimos dias quando receber misericórdia. Como nosso próprio Senhor orou por eles: "Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem" (Lucas 23:34). Pedro também diz: "E agora, irmãos, eu sei que o fizestes por ignorância, como também os vossos príncipes" (Atos 3:17)
Mas, como o apostolado de Paulo difere, em muitos aspectos, do apostolado dos doze, será necessário observá-lo mais um pouco. A menos que essa diferença seja compreendida, o verdadeiro caráter da presente dispensação poderá não ser apreendida de maneira tão consistente.
O APOSTOLADO DE PAULO
A lei e os profetas foram até João; após João o próprio Senhor, em Sua própria Pessoa, oferece o reino à Israel, mas "os Seus não O receberam". Eles crucificaram o Príncipe da vida, mas Deus O ressuscitou dentre os mortos, fazendo-O sentar à Sua direita nos lugares celestiais. Temos então os doze apóstolos. Eles são dotados com o Espírito Santo, e levam o testemunho da ressurreição de Cristo. Mas o testemunho dos doze é desprezado, o Espírito Santo é resistido, Estêvão é martirizado, a oferta final de misericórdia é rejeitada, e agora o tratamento de Deus com Israel como um povo é encerrado por um tempo. As cenas de Siló são encenadas novamente, Icabode é escrito em Jerusalém, e uma nova testemunha é convocada, como nos dias de Samuel. (Leia 1 Samuel 4)
Chegamos agora ao grande apóstolo dos gentios. Ele é como um nascido fora do tempo e fora de seu devido lugar. Seu apostolado não tinha nada a ver com Jerusalém ou com os doze. Era fora de ambos. Seu chamado era extraordinário e vindo direto do Senhor no Céu. Ele tem o privilégio de trazer a novidade: o caráter celestial da igreja - que Cristo e a igreja são um, e que o Céu é seu lar em comum(Efésios 1,2). Enquanto Deus estava tratando com Israel, essas benditas verdades estavam guardadas em segredo em Sua própria mente. "A mim,", diz Paulo, "o mínimo de todos os santos, me foi dada esta graça de anunciar entre os gentios, por meio do evangelho, as riquezas incompreensíveis de Cristo, e demonstrar a todos qual seja a dispensação do mistério, que desde os séculos esteve oculto em Deus, que tudo criou por meio de Jesus Cristo."(Efésios 3:8-9)
Não podia haver dúvidas sobre o caráter do chamado do apóstolo quanto à sua autoridade divina. "Não da parte dos homens, nem por homem algum", como diz ele em sua Epístola aos Gálatas, "mas por Jesus Cristo, e por Deus Pai, que o ressuscitou dentre os mortos" (Gálatas 1:1). Isto é,  não era "da parte dos homens", quanto à sua fonte, nem de qualquer Sínodo* de homens oficiais." Nem por homem algum", foi como veio sua comissão. Ele não era apenas um santo, mas um apóstolo por chamado: e esse chamado era por Jesus Cristo, e por Deus Pai, que O ressuscitou dentre os mortos.
Em alguns aspectos, seu apostolado foi ainda de mais alta ordem do que o dos doze. Estes tinham sido chamados por Jesus quando na Terra; aquele tinha sido chamado pelo Cristo ressuscitado e glorificado no Céu. E, sendo seu chamado vindo do Céu, não necessitava nem da sanção nem do reconhecimento dos outros apóstolos. "Mas, quando aprouve a Deus ... revelar seu Filho em mim, para que o pregasse entre os gentios, não consultei a carne nem o sangue, nem tornei a Jerusalém, a ter com os que já antes de mim eram apóstolos, mas parti para a Arábia, e voltei outra vez a Damasco." (Gálatas 1:15-17)
A forma como Saulo foi chamado para apóstolo é digna de nota especial, pois bate de frente com a raiz do orgulho judaico, e pode também ser vista como o golpe mortal à vã noção de sucessão apostólica. Os apóstolos, a quem o Senhor tinha escolhido e nomeado quando estava na Terra, não eram nem a fonte nem o canal, de maneira alguma, da nomeação de Paulo. Eles não lançaram sortes para ele, como fizeram no caso de Matias (Atos 1). Ali eles estavam apenas em terreno judeu, o que pode explicar sua decisão por sorteio. Era um antigo costume, em Israel, descobrir a vontade divina por esses modos. Mas estas enfáticas palavras: "Paulo, apóstolo, não da parte dos homens, nem por homem algum, mas por Jesus Cristo", excluem completamente a intervenção do homem sob qualquer forma. A sucessão apostólica é descartada. Somos santos por chamado e servos por chamado. E tal chamado deve vir do Céu. Paulo está diante de nós como um verdadeiro padrão para todos os pregadores do evangelho, e para todos os ministros da Palavra.Nada pode ser mais simples que o terreno que ele toma como pregador, sendo o grande apóstolo que era. "E temos, portanto, o mesmo espírito de fé, como está escrito: Cri, por isso falei; nós cremos também, por isso também falamos." (2 Coríntios 4:13)
Imediatamente após ser batizado e fortalecido, ele começou a confessar sua fé no Senhor Jesus e a pregar nas sinagogas de que Ele era o Filho de Deus. Isto é algo novo. Pedro pregava que Ele tinha sido exaltado à destra de Deus - que Ele tinha sido feito tanto Senhor quanto Cristo, mas Paulo prega uma doutrina mais elevada sobre Sua glória pessoal - "que Ele é o Filho de Deus". Em Mateus 16, Cristo é revelado pelo Pai aos discípulos como "o Filho do Deus vivo". Mas agora Ele é revelado, não apenas a Paulo, mas em Paulo. "Aprouve a Deus ... revelar seu Filho em mim"(Gálatas 1:15-16), disse ele. Mas quem é suficiente para falar dos privilégios e bênçãos daqueles a quem o Filho de Deus é, pois, revelado? A dignidade e segurança da igreja descansa sobre essa bendita verdade, e também sobre o evangelho da glória, que foi especialmente confiado a Paulo, e que ele chama de "meu evangelho".
"Sobre o Filho assim revelado", disse alguém docemente, "paira tudo o que é peculiar ao chamado e glória da igreja - suas santas prerrogativas - aceitação no Amado com perdão dos pecados por meio de Seu sangue - entrada para os tesouros da sabedoria e do conhecimento, de modo a tornar conhecido, a nós, o mistério da vontade de Deus - herança futura nEle e com Ele, no qual todas as coisas nos céus e na Terra serão congregadas - e o presente selo e penhor dessa herança, o Espírito Santo. Tal brilhante sequência de privilégios é escrita pelo apóstolo desta maneira: "bênçãos espirituais nos lugares celestiais"; e assim são elas; bênçãos através do Espírito fluindo e nos ligando a Ele, que é o Senhor nos céus."  (Efésios 1:3-14). Mas a doutrina da igreja - o mistério do amor, da graça e do privilégio - não tinha sido revelada até Paulo a ter declarado. O Senhor tinha falado dela quanto ao efeito que teria a presença do Consolador, dizendo: "Naquele dia conhecereis que estou em meu Pai, e vós em mim, e eu em vós." (João 14:20). E novamente, quando Ele diz aos discípulos após a ressurreição: "Eu subo para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus." (João 20:17). Dessa "sequência brilhante" de bênçãos Paulo foi, especial e caracteristicamente, o apóstolo.
Devemos agora deixar um pouco de lado a história de Saulo e voltar a Pedro, que ocupa o campo até que Paulo comece seu ministério público em Atos 13.
OS PRIMEIROS MISSIONÁRIOS DA CRUZ
Em vez de passar por cima dos capítulos restantes de Atos, achamos que pode ser mais interessante e igualmente instrutivo para nossos leitores considerá-los em conexão com a história dos apóstolos, especialmente com a história dos dois grandes apóstolos. O livro de Atos é quase inteiramente ocupado com os atos de Pedro e de Paulo, embora, é claro, sob a direção do Espírito Santo: o primeiro como o grande apóstolo dos judeus, e o segundo como o grande apóstolo dos gentios. Mas seria também de interesse abraçar a presente oportunidade para observar brevemente os primeiros companheiros e missionários pessoalmente escolhidos por nosso bendito Senhor - os doze apóstolos.
Mas, antes de tentarmos um esboço dessas interessantes vidas, parece bem declarar qual objetivo temos em vista ao fazê-lo. Estamos saindo um pouco do curso que estávamos seguindo. Em nenhuma das publicações sobre a história da igreja que conhecemos a vida dos apóstolos é apresentada de forma ordenada, e é estranho que os grandes fundadores da igreja não achem seus lugares em sua história.
Ao mesmo tempo, no que diz respeito aos apóstolos, temos que ter em mente que, além da narrativa sagrada, há bem pouco material sobre o qual possamos nos apoiar. O tradicional e o bíblico, o certo e o incerto, são quase desamparadamente misturados nos escritos dos Pais da Igreja. Cada raio de luz histórico distinto é de grande valor, mas são somente as Escrituras que podemos tomar por totalmente corretas.Ainda assim, as poucas notas que temos ali espalhadas, de alguns dos apóstolos, quando reunidas, podem dar ao leitor uma ideia da pessoa e individualidade de cada um. Outros, também notamos, além dos apóstolos, aparecerão em conexão com eles, especialmente com Paulo. Assim nossos leitores terão, de maneira conveniente, um breve resumo de quase todos os nobres pregadores, professores, confessores e mártires do Senhor Jesus que são mencionados no Novo Testamento.
Os Doze Apóstolos
Eram eles: Simão Pedro, André, Tiago e João (filhos de Zebedeu), Filipe, Tomé, Bartolomeu, Mateus, Tiago (filho de Alfeu), Tadeu, Simão o Zelote, e Matias, que foi escolhido para substituir Judas Iscariotes. Veja Mateus 10, Lucas 6, Marcos 3 e Atos 1.
Paulo também foi um apóstolo por chamado direto do Senhor, no sentido mais elevado, como já vimos. Havia outros que eram chamados de apóstolos, mas eram mais especificamente apóstolos das igrejas. Os doze e Paulo eram proeminentemente os apóstolos do Senhor. Compare 2 Coríntios 8:23, Filipenses 2:25 e Romanos 16:7.
O nome oficial, "apóstolo", significa "enviado". "Jesus enviou estes doze." (Mateus 10:5). Esse nome foi dado aos doze pelo próprio Senhor. "Chamou a si os seus discípulos, e escolheu doze deles, a quem também deu o nome de apóstolos" (Lucas 6:13). Conhecê-Lo pessoalmente e tê-Lo acompanhado por todo o seu ministério era a original e necessária qualificação de um apóstolo. Isso foi afirmado por Pedro antes da eleição de um sucessor para o traidor Judas. "É necessário, pois, que, dos homens que conviveram conosco todo o tempo em que o Senhor Jesus entrou e saiu dentre nós, começando desde o batismo de João até ao dia em que de entre nós foi recebido em cima, um deles se faça conosco testemunha da sua ressurreição." (Atos 1:21-22). Por essa relação pessoal com o Senhor eles foram particularmente indicados para serem as testemunhas de Sua trajetória sobre a Terra. Ele mesmo os descreve como "os que têm permanecido comigo nas minhas tentações" (Lucas 22:28)
Acreditamos que o número doze marca nitidamente sua relação com as doze tribos de Israel. As fantasias dos pais (cristãos proeminentes do início da história da igreja) quanto ao significado do número aqui escolhido mostra o quão pouco suas mentes eram governadas pelo contexto. Santo Agostinho "acha que a menção de nosso Senhor aos quatro cantos do mundo, aos quais os apóstolos foram chamados a pregar o evangelho, e que, ao multiplicar por três, como denotando a Trindade, resulta em doze." Ao não enxergar a distinção entre Israel e a igreja, existe muita confusão por parte de tais escritores.
Cremos que o número doze nas Escrituras significa a completude administrativa no homem. Daí as doze tribos, os doze apóstolos, e a promessa a estes, de que se sentariam em doze tronos para julgar as doze tribos de Israel (Mateus 19:28). Mas aqui, nos termos mais claros possíveis, o Senhor limita a missão dos doze às ovelhas perdidas da casa de Israel. Não era nem mesmo para eles irem visitar os samaritanos, nem os gentios. A missão se restringia aos judeus. "Jesus enviou estes doze, e lhes ordenou, dizendo: Não ireis pelo caminho dos gentios, nem entrareis em cidade de samaritanos; mas ide antes às ovelhas perdidas da casa de Israel" (Mateus 10:5-6). Certamente nada poderia ser mais claro. O chamado da igreja não é mencionado aqui. Isto aconteceu depois, quando um outro extraordinário apóstolo foi escolhido, tendo em vista especialmente os gentios. Depois os doze teriam seu próprio lugar na igreja, mas Paulo foi seu divinamente chamado e qualificado ministro.
Há uma noção geral de que os doze eram completamente analfabetos, com a qual não podemos concordar. A expressão "homens sem letras e indoutos", como usada pelo conselho em Atos 4:13, apenas denotava pessoas que não tinham sido ensinadas na tradição rabínica dos judeus. Seria a mesma ideia do termo "leigo", isto é, homens de educação regular, em contrate com aqueles que foram especialmente treinados nas escolas de eruditos, ou homens que não participam de "ordens sagradas". Assim, Pedro e João podem ter sido completamente familiarizados com as Sagradas Escrituras e com a história de seu país e de seu povo, e ainda assim serem considerados, pelo conselho, como "homens iletrados e indoutos". Tiago e João, pelo menos, tinham todas as vantagens do ensinamento de uma mãe fiel e devota, que muitas vezes fez grandes coisas para a igreja de Deus.
Vamos, agora, passar brevemente as vistas a cada um dos doze.
O APÓSTOLO PEDRO
Vamos, agora, passar brevemente as vistas a cada um dos doze.
O primeiro, em ordem, é o apóstolo Pedro. Não pode haver dúvida de que Pedro esteve em primeiro lugar entre os doze. O Senhor lhe deu tal posição. Ele é o primeiro a ser mencionado em todas as listas dos apóstolos. Essa precedência, como sabemos, não veio por ter conhecido o Senhor primeiro, pois ele não tinha sido nem o primeiro nem o último. André, e provavelmente João, conheceram o Senhor antes de Pedro. Vamos aqui observar, com o mais profundo interesse, o primeiro encontro desses amigos que iriam ser unidos para sempre. Leia João 1:29-51.
João Batista presta testemunho a Jesus como o Cordeiro de Deus que tiraria o pecado do mundo. Dois dos discípulos de João o deixam e seguem Jesus. "Era André, irmão de Simão Pedro, um dos dois que ouviram aquilo de João, e o haviam seguido. Este achou primeiro a seu irmão Simão, e disse-lhe: Achamos o Messias (que, traduzido, é o Cristo). E levou-o a Jesus." (João 1:40-42). Essa foi a primeira introdução de Pedro ao Senhor - àquele que havia de ser a fonte de sua felicidade para sempre. E quão significante foi esse primeiro encontro! "E levou-o a Jesus. E, olhando Jesus para ele, disse: Tu és Simão, filho de Jonas; tu serás chamado Cefas (que quer dizer Pedro)." (João 1:42). Naturalmente impulsivo, rápido em se valer de um objetivo, mas pronto demais para desistir pela força de qualquer pressão, ele tem, pela graça do Senhor, a firmeza que lhe foi dada, embora vez ou outra seu caráter natural aparece.
A primeira coisa que leva Pedro à grande proeminência é sua nobre confissão de Cristo como o Filho do Deus vivo (Mateus 16). O Senhor, então, o honrou com as chaves do reino dos céus, e deu-lhe um lugar de proeminência entre seus irmãos. Mas essa parte da história de Pedro, somados a alguns dos primeiros capítulos de Atos, já consideramos anteriormente. Portanto, nos referiremos somente aos pontos que ainda não tocamos.
Ainda não nos referimos ao quarto capítulo de Atos, embora estejamos dispostos a pensar que ali é apresentado o dia mais brilhante da história do apóstolo, enquanto o batismo de Cornélio apresenta o dia culminante de seu ministério. Como ali é constantemente demonstrado, no grande apóstolo, uma mistura de força e fraqueza, de excelências e defeitos, é profundamente interessante que tracemos seu caminho através dos primeiros temporais que assolaram a recém-nascida igreja. Mas não devemos nos esquecer que o grande segredo da ousadia, sabedoria e poder dos apóstolos não vinham de seu caráter natural, mas sim da presença do Espírito Santo. Ele estava com eles e neles, e trabalhando por eles. O Espírito Santo era a força do testemunho deles.
Observe, em particular, os benditos efeitos da presença do Espírito Santo em quatro aspectos distintos:
1. Na coragem demonstrada por Pedro e pelos outros. "Então Pedro, cheio do Espírito Santo, lhes disse: Principais do povo, e vós, anciãos de Israel, visto que hoje somos interrogados acerca do benefício feito a um homem enfermo, e do modo como foi curado, seja conhecido de vós todos, e de todo o povo de Israel, que em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, aquele a quem vós crucificastes e a quem Deus ressuscitou dentre os mortos, em nome desse é que este está são diante de vós. Ele é a pedra que foi rejeitada por vós, os edificadores, a qual foi posta por cabeça de esquina. E em nenhum outro há salvação, porque também debaixo do céu nenhum outro nome há, dado entre os homens, pelo qual devamos ser salvos." (Atos 4:8-12) A grande e solene questão entre Deus e os governantes de Israel é aqui formalmente declarada. Nada pode ser mais simples. O testemunho de Deus não está mais com os dirigentes do templo, mas com os apóstolos do exaltado Messias.
2. Em Sua presença com os discípulos reunidos (em assembleia). "E, tendo orado, moveu-se o lugar em que estavam reunidos; e todos foram cheios do Espírito Santo, e anunciavam com ousadia a palavra de Deus." (Atos 4:31) Esse versículo claramente ensina o que têm sido tantas vezes falado quanto ao Espírito estar com os discípulos e neles. O lugar onde eles estavam reunidos foi chacoalhado; isto provaSua presença com eles. Mas eles também estavam cheios do Espírito Santo - tão cheios, cremos, que naquele momento não havia espaço para a carne agir.
3. Em grande poder quanto ao serviço. "E os apóstolos davam, com grande poder, testemunho da ressurreição do Senhor Jesus, e em todos eles havia abundante graça." (Atos 4:33) Prontidão e energia agora caracterizam os apóstolos.
4. Dedicação de todo o coração. "Todos os que possuíam herdades ou casas, vendendo-as, traziam o preço do que fora vendido, e o depositavam aos pés dos apóstolos." (Atos 4:34) No capítulo dois, os ricos davam, eles mesmos, aos pobres: algo que dificilmente poderia ser feito sem atribuir importância ao doador. Mas no capítulo quatro, os ricos deixavam o dinheiro aos pés dos apóstolos. Deveríamos aceitar este fato como um claro sinal de aumento de humildade, e de grande devoção.
É também nesse completo e instrutivo capítulo que temos a famosa resposta de Pedro e João ao conselho. "Julgai vós se é justo, diante de Deus, ouvir-vos antes a vós do que a Deus." (Atos 4:19) Daquele dia em diante os verdadeiros confessores do nome de Jesus encontram, nessas palavras, uma resposta adequada a seus inquisidores e opressores. Que diferença, podemos exclamar, entre o homem que sentou ao fogo no pátio do sumo sacerdote (Mateus 26:69-75) e o homem que toma a dianteira em Atos 4 - entre o homem que caiu diante da acusação de uma criada e o homem que faz a nação tremer com seus apelos! "Mas como essa diferença pode ser explicada?", alguns podem perguntar. A explicação completa para isso é a presença e poder de um Espírito Santo não entristecido ou extinto. E a fraqueza ou poder de muitos hoje em dia pode ser explicada pelo mesmo princípio. O Espírito de Deus é o único poder no cristão. Que possamos conhecer a bem-aventurança de viver, andar e trabalhar no poder salvador e santificador do Espírito Santo! "E não entristeçais o Espírito Santo de Deus, no qual estais selados para o dia da redenção."(Efésios 4:30)
AUTORIDADE APOSTOLICA DO APÓSTOLO PEDRO
Chegamos agora à última seção na narrativa sagrada da história de Pedro. Do versículo 32 do capítulo 9 ao versículo 18 do capítulo 11 de Atos temos um relato de suas pregações e milagres. Ali o vemos mais uma vez em plena autoridade apostólica, e o Espírito Santo trabalhando com ele. Sua missão nesse momento foi grandemente abençoada, tanto nas cidades de Israel quanto na Cesareia. Toda a cidade de Lida e o distrito de Sarona parecem ter sido despertados. Os milagres feitos por Pedro, e o evangelho por ele pregado, foram usados por Deus para a conversão de muitos. Assim, lemos: "E viram-no todos os que habitavam em Lida e Sarona, os quais se converteram ao Senhor." (Atos 9:35). A benção era geral. "Se converter ao Senhor" é a ideia de conversão encontrada nas Escrituras. E em Jope também, pela ressurreição de Dorcas, havia grande agitação e benção. "E foi isto notório por toda a Jope, e muitos creram no Senhor." (Atos 9:42)
No capítulo 10 - que já consideramos - os gentios são trazidos à igreja. E agora Pedro, tendo terminado sua missão por essas bandas, retorna a Jerusalém. Após o relato de sua libertação do poder de Herodes no capítulo 12, não temos mais relatos sobre a história do apóstolo da circuncisão em Atos.
Como Herodes Agripa, o rei idumeu, tem papel tão proeminente nessa história, pode ser interessante tomar nota sobre ele. Ele professava grande zelo pela lei de Moisés e mantinha um certo respeito para com sua observância externa. Desse modo, ele ficou do lado dos judeus contra os discípulos de Cristo, sob um fingido zelo religioso. Esta era sua política. Era uma figura do rei adversário.
Foi por volta de 44 d.C. que Herodes buscou se insinuar com seus súditos judeus, perseguindo os inofensivos cristãos. Não que houvesse qualquer amor entre Herodes e os judeus, posto que se odiavam de coração; mas aqui eles se uniram, pois ambos odiavam o testemunho celestial. Herodes matou Tiago com a espada e lançou Pedro na prisão. Era sua intenção perversa mantê-lo lá até depois da Páscoa, e então, quando uma grande quantidade de judeus de todas as partes estivessem em Jerusalém, fariam um espetáculo público de sua execução.  Mas Deus preservou e libertou Seu servo em resposta às orações dos santos. Eles têm armas de guerra que os governantes do mundo não conhecem. Deus permitiu que Tiago selasse seu testemunho com seu sangue, mas preservou Pedro para que pudesse ser testemunha na Terra por mais tempo. Assim nosso Deus governa sobre tudo. Ele é o Governador entre as nações, seja qual for o orgulho e a vontade do homem. O poder pertence a Ele.
Débil, de fato, é o poder de cada inimigo quando Ele interfere. Herodes, tornando-se perplexo e confuso diante das manifestações de um poder que ele não podia entender, condena os guardas da prisão à morte, e deixa Jerusalém. Mas ele nem imaginava que sua própria morte precederia a de seus próprios prisioneiros.
Em Cesareia, a sede gentia de sua autoridade, ele ordenou que se fizesse uma festa magnífica em honra ao Imperador Cláudio. Somos informados de que multidões da mais alta hierarquia, vindas de todos os cantos, foram reunidas. Na segunda manhã de festividades, o rei apareceu em um manto prateado de grande esplendor, que brilhava com os raios do sol, de modo que ofuscava os olhos de toda a assembleia e provocava admiração geral. Ao fazer um discurso ao povo, de seu trono, alguns de seus bajuladores levantaram um grito: "É a voz de um deus!". Herodes, em vez de reprimir tal ímpia adulação, que se espalhou pelo teatro, a aceitou. Mas um senso do julgamento de Deus, naquele momento, atravessou o coração do rei. Em tom de profunda melancolia ele disse: "Seu deus irá, em breve, sofrer da comum sina da mortalidade". Na força da linguagem das Escrituras, está escrito assim: "E no mesmo instante feriu-o o anjo do Senhor, porque não deu glória a Deus e, comido de bichos, expirou." (Atos 12:23). Ele foi, então, tomado de intensas dores violentas, e levado do teatro a seu palácio. Ali ele permaneceu por cinco dias, e morreu na maior agonia, e na mais humilhante e repugnante condição possível.
A LINHAGEM REAL HERODIANA
Não seria fora de propósito ou tedioso para o leitor se observarmos por um momento a linhagem real herodiana. Eles frequentemente aparecem, tanto na vida de nosso Senhor quanto no começo da história da igreja. Os temos associados em nossas mentes, desde cedo, com o massacre das crianças em Belém e Herodes, o rei da Judeia, embora seja de certo modo notável que Josefo, o principal historiador de Herodes, não menciona esse evento. Em geral pensa-se que o assassinato de algumas crianças em uma vila obscura, em comparação com outros atos sanguinários de Herodes, não era muito importante aos olhos de Josefo  para ser registrado. Mas não sucedia o mesmo na mente de Deus: tanto o engano quanto a crueldade do traiçoeiro coração do rei estão registrados na narrativa sagrada. O olho de Deus vigiava o "Menino nascido" a Israel - a única fonte de esperança para todas as nações. O cruel desígnio de Herodes foi, assim, derrotado.
Herodes, o Grande, o primeiro rei idumeu de Israel, recebeu o reino do Senado de Roma através da influência de Marco Antônio. Isto ocorreu cerca de trinta e cinco anos antes do nascimento de Cristo (35 a.C.), e cerca de trinta e sete anos antes de sua própria morte. Esses idumeus eram uma ramificação dos antigos edomitas que, enquanto os judeus estavam no cativeiro babilônico, e sua terra desolada, tomaram posse tanto da parte sul da mesma, que fazia parte de toda a herança da tribo de Simeão, quanto de metade da terra que tinha sido a herança da tribo de Judá; e ali eles permaneceram até então. No decorrer do tempo, os idumeus foram conquistados por João Hircano e levados ao judaísmo. Após sua conversão, eles receberam a circuncisão, se submeteram às leis dos judeus, e se incorporaram à nação judaica. Desse modo, se tornaram judeus, embora não fizessem parte da linhagem original de Israel. Isto aconteceu por volta de 129 a.C.  Eles eram audaciosos, espertos e cruéis como príncipes:
tinham grande visão política, cortejavam a favor de Roma, e se preocupavam apenas com o estabelecimento de sua própria dinastia. Mas, pela vontade de Deus, com a destruição de Jerusalém, a dinastia idumeia acabou, e até mesmo o próprio nome de Herodes parece ter perecido entre as nações.
Além do massacre das crianças em Belém, que aconteceu pouco antes da morte de Herodes, ele também tinha encharcado suas mãos no sangue de sua própria família, e no sangue de muitas pessoas nobres da linhagem asmoneia. Sua cruel inveja em relação àquela família nunca dormia. Mas um de seus últimos atos foi assinar a sentença de morte de seu próprio filho. No leito de morte - o que evidentemente foi um juízo de Deus, tal como aconteceu com seu neto, Herodes Agripa - ele conseguiu se levantar da cama para dar o mandato de execução de Antípatro e nomear Arquelau como seu sucessor no trono. Feito isso, caiu para trás e expirou.
Dessa forma, infelizmente, os monarcas muitas vezes morriam: distribuindo mortes com uma mão e reinos com a outra. Mas, e depois? Na realidade nua a crua de sua própria condição moral, eles devem comparecer ante o tribunal de Deus. O manto púrpura não mais poderá protegê-los. Uma justiça inflexível rege aquele trono. Julgados de acordo com as obras feitas no corpo, eles devem ser banidos eternamente para além do "abismo" que foi "posto" pelo juízo de Deus(Lucas 16:26). Ali lembrarão, em tormentos, cada momento de sua história passada - dos privilégios que abusaram, das oportunidades que perderam, e de todo mal que fizeram. Que o Senhor possa salvar cada alma que olha para estas páginas do terrível peso destas palavras: "lembrar"; "tormento"; "posto". Elas descrevem e caracterizam o futuro estado das almas impenitentes (Lucas 16).
A seita dos herodianos provavelmente era composta dos partidários de Herodes e tinha caráter principalmente político, tendo, como principal objetivo, a manutenção da independência nacional dos judeus em face do poder e ambição romanos. Eles devem ter pensado em usar Herodes para o cumprimento dessa finalidade. Na história narrada nos evangelhos, eles são lembrados por agir com astúcia para com o bendito Senhor, e em conspirar com os fariseus. (Mateus 22:15,16; Marcos 12:12, 14).Agora retornarmos à história de nossos apóstolos.
Em Atos 15, após uma ausência de mais ou menos cinco anos, Pedro aparece novamente. No entanto, durante aquele tempo não sabemos nada sobre sua morada ou trabalho. Ele tem um papel ativo na assembleia em Jerusalém, e parece ter mantido seu antigo lugar entre os apóstolos e anciãos.
PEDRO NA ANTIOQUIA
Pouco tempo depois, como aprendemos em Gálatas 2, Pedro faz uma visita à Antioquia. Mas apesar da decisão dos apóstolos e da igreja em Jerusalém, uma característica fraqueza de Pedro o trai em um ato de dissimulação. Uma coisa é resolver uma questão na teoria, e outra é realizá-la na prática. Pedro tinha, realmente, declarado na assembleia que o evangelho que Paulo pregava, pela revelação dada a ele, não era nada menos do que uma bênção tanto para o judeu quanto para o gentio. E, enquanto sozinho na Antioquia, ele agiu nesse princípio, andando na liberdade da verdade celestial e comendo com os gentios. Mas quando alguns cristãos judeus vieram da parte de Tiago, ele não mais se atreveu a usar de tal liberdade. "Se foi retirando, e se apartou deles, temendo os que eram da circuncisão. E os outros judeus também dissimulavam com ele, de maneira que até Barnabé se deixou levar pela sua dissimulação." (Gálatas 2:12-13).
"Que coisa mais pobre que é o homem!", exclamou alguém. "Somos fracos em relação à nossa importância diante dos homens. Quando não somos nada, podemos fazer tudo, desde que esteja de acordo com a aceitação dos outros... Paulo, energético e fiel, pela graça, permanece sozinho de pé, e repreende Pedro diante de todos."
A partir de então, no ano 49 ou 50 d.C., seu nome não aparece novamente no livro de Atos dos Apóstolos, e não temos certeza da esfera de seu trabalho. No entanto, ele se dirige aos cristãos hebreus em sua primeira carta da seguinte maneira: “Pedro, apóstolo de Jesus Cristo, aos estrangeiros dispersos no Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia”. Disso podemos concluir que ele trabalhou nesses países. Sua segunda Epístola data de muito tempo depois, e deve ter sido escrita pouco tempo antes de sua morte.Vimos isso com o que ele diz no primeiro capítulo: “Sabendo que brevemente hei de deixar este meu tabernáculo, como também nosso Senhor Jesus Cristo já mo tem revelado” (v.14; ver também João 21:18-19).
A data exata da visita de Pedro a Roma tem sido assunto de grande controvérsia entre escritores católicos e protestantes em todas as eras. Mas pode ser considerado um ponto resolvido o fato de ele não ter visitado tal cidade até uma data bem próxima do fim de sua vida. A data de seu martírio é também incerta. Muito provavelmente aconteceu em 67 ou 68 d.C., com mais ou menos setenta anos de idade. O incêndio de Roma causado por Nero é datado por Tácito por volta do mês de julho de 64. A perseguição contra os cristãos eclodiu logo depois, e foi sob tal perseguição que nosso apóstolo foi honrado com a coroa do martírio.
Ele foi sentenciado à crucificação, sendo esta a mais severa e vergonhosa morte. Mas quando ele olhou para a cruz, ele suplicou aos oficiais romanos para não ser crucificado do modo usual, mas que preferiria sofrer de cabeça para baixo, afirmando que ele não era digno de sofrer na mesma posição de seu bendito Senhor e Mestre. Tendo seu pedido concedido, ele foi crucificado de cabeça para baixo. Seja isto um fato ou uma mera lenda, está em conformidade com o temperamento fervente e a profunda humildade do grande apóstolo.
O APÓSTOLO ANDRÉ
Seguindo a vida dos apóstolos, vamos tomar nota sobre o apóstolo André.
Os historiadores sagrados têm sido muito completos e abundantes ao descrever os atos de Pedro, mas bastante frugais nos relatos sobre seu irmão André. Ele foi criado com Pedro no ramo de seu pai, e continuou em sua ocupação até ser chamado pelo Senhor para ser tornar um "pescador de homens".
André, como outros jovens da Galileia, tinha se tornado um discípulo de João Batista. No entanto, ao ouvir seu mestre falar, pela segunda vez, de Jesus como o Cordeiro de Deus, deixou João para seguir a Jesus. Ele foi, imediatamente após isso, o meio pelo qual seu irmão Pedro foi trazido a seu novo Mestre. Até o momento, ele tinha a honra de ser o primeiro dos apóstolos a apontar para Cristo (João 1). Ele aparece ainda noscapítulos seis e doze de João, e no décimo terceiro de Marcos, mas, além desses poucos e espalhados relatos, as Escrituras não relatam mais nada a respeito dele. Seu nome não aparece nos atos dos Apóstolos, com exceção do primeiro capítulo.
Conjecturas e a tradição têm dito muitas coisas sobre ele, mas devemos considerar apenas fatos razoavelmente estabelecidos. Dizem que ele pregou em Cítia, e que viajou pela Trácia, Macedônia, Tessália, e que sofreu o martírio em Petra, na Acaia. Sua cruz, dizem, era formada de dois pedaços de madeira se cruzando no meio, na forma de X, geralmente conhecida pelo nome de cruz de Santo André. Ele morreu orando e exortando as pessoas à constância e perseverância na fé. O ano em que ele sofreu isso é incerto.
Dos dois irmãos Pedro e André, procedemos aos dois irmãos Tiago e João. Os quatro também eram parceiros de negócios. Mas vamos falar primeiro de Tiago.
O APÓSTOLO TIAGO
Zebedeu e seus dois filhos, Tiago e João, estavam seguindo sua ocupação habitual no mar da Galileia quando Jesus passava por ali. Vendo os dois irmãos, "logo os chamou. E eles, deixando o seu pai Zebedeu no barco com os jornaleiros, foram após ele." (Marcos 1:20). Pedro e André também estavam lá. Foi nessa ocasião que o Senhor pediu a Pedro para se lançar às águas profundas e tentar, mais uma vez, pegar peixes. Pedro se inclina à razão: eles tinham sido muito mal sucedidos na noite anterior. Mesmo assim, pela palavra do Senhor, a rede foi lançada. "E, fazendo assim, colheram uma grande quantidade de peixes, e rompia-se-lhes a rede." (Lucas 5:6) Espantado, Pedro acenou a seus parceiros para que fossem e o ajudassem a trazer os peixes à terra.
Uma plena convicção de que Jesus era o verdadeiro Messias foi, então, levada às mentes daqueles quatro jovens. Eles podem ter tido dúvidas antes, mas não têm nenhuma agora. Ao chamado de Jesus eles deixam tudo e se tornam, de uma vez para sempre, Seus discípulos. Daí em diante se tornariam "pescadores de homens". Em toda lista que temos dos apóstolos estes quatro nobres homens são citados primeiro (Mateus 4:17-20; Marcos 1:16-20; Lucas 5:1-11)
Esse é o chamado de Tiago ao discipulado. Mais ou menos um ano depois ele é chamado ao apostolado com seus onze irmãos (Mateus 10, Marcos 3, Lucas 6, Atos 1)
Pedro, Tiago, João e ocasionalmente André sempre foram os companheiros mais íntimos do bendito Senhor. Somente os três primeiros foram convidados a testemunhar da ressurreição da filha de Jairo (Marcos 5; Lucas 8). Os mesmos três apóstolos foram, somente eles, permitidos a estarem presentes na cena da transfiguração (Mateus 17, Marcos 9, Lucas 9). Foram os mesmos três que testemunharam Sua agonia no Getsêmani (Mateus 26, Marcos 14, Lucas 22). Mas os quatro, Pedro, Tiago, João e André, estão juntos quando perguntam ao Senhor em particular sobre a destruição do templo (Marcos 13).
Assim como a mudança - ou acréscimo - ao nome de Pedro, os filhos de Zebedeu são apelidados de Boanerges, ou "filhos do trovão".  Grande ousadia e fidelidade pode ter apontado Tiago para Herodes como o primeiro a ser detido e silenciado. Não é estranho que "o filho do trovão" e o "homem-pedra" sejam os primeiros a serem apreendidos. Mas Tiago tem a honra de ser o primeiro dos apóstolos que receberam a coroa do martírio em 44 d.C., tendo Pedro sido resgatado por um milagre.
A inveja de uma mãe e a ambição de seus filhos levam Salomé a pedir por lugares distintos no reino para seus dois filhos. O Senhor permitiu que o pedido passasse por uma repreensão muito leve, mas disse aos irmãos que eles deveriam tomar de Seu cálice e serem batizados com Seu batismo. Tiago foi chamado bem cedo para cumprir esta predição. Após a ascensão, ele é visto em companhia dos outros apóstolos emAtos 1. Então ele desaparece da narrativa sagrada até sua apreensão e morte em Atos 12. E lá é simplesmente dito, na breve linguagem do historiador inspirado, que o rei Herodes matou Tiago, irmão de João, com a espada.
Clemente de Alexandria relata uma tradição sobre o martírio de Tiago que não é algo improvável de ter realmente ocorrido. Enquanto era levado para o lugar de execução, o soldado ou oficial que o tinha guardado para o tribunal, ou melhor, seu acusador, estava tão comovido pela coragem e ousada confissão de Tiago no momento de seu julgamento que se arrependeu do que tinha feito. Então ele foi e prostrou-se ao pé do apóstolo, pedindo perdão pelo que tinha dito contra ele. Tiago, um pouco surpreso, o levantou, o abraçou e o beijou, e disse: "Paz, meu filho, paz seja contigo, e o perdão de tuas falhas." Antes disso, ele publicamente tinha professado ser um cristão, e assim ambos foram decapitados ao mesmo tempo. Assim caiu Tiago, o proto-mártir apostólico, alegremente tomando o cálice que ele tinha a muito tempo dito ao seu Senhor que estaria pronto para beber.
O APÓSTOLO TIAGO
Zebedeu e seus dois filhos, Tiago e João, estavam seguindo sua ocupação habitual no mar da Galileia quando Jesus passava por ali. Vendo os dois irmãos, "logo os chamou. E eles, deixando o seu pai Zebedeu no barco com os jornaleiros, foram após ele." (Marcos 1:20). Pedro e André também estavam lá. Foi nessa ocasião que o Senhor pediu a Pedro para se lançar às águas profundas e tentar, mais uma vez, pegar peixes. Pedro se inclina à razão: eles tinham sido muito mal sucedidos na noite anterior. Mesmo assim, pela palavra do Senhor, a rede foi lançada. "E, fazendo assim, colheram uma grande quantidade de peixes, e rompia-se-lhes a rede." (Lucas 5:6) Espantado, Pedro acenou a seus parceiros para que fossem e o ajudassem a trazer os peixes à terra.
Uma plena convicção de que Jesus era o verdadeiro Messias foi, então, levada às mentes daqueles quatro jovens. Eles podem ter tido dúvidas antes, mas não têm nenhuma agora. Ao chamado de Jesus eles deixam tudo e se tornam, de uma vez para sempre, Seus discípulos. Daí em diante se tornariam "pescadores de homens". Em toda lista que temos dos apóstolos estes quatro nobres homens são citados primeiro (Mateus 4:17-20; Marcos 1:16-20; Lucas 5:1-11)
Esse é o chamado de Tiago ao discipulado. Mais ou menos um ano depois ele é chamado ao apostolado com seus onze irmãos (Mateus 10, Marcos 3, Lucas 6, Atos 1)
Pedro, Tiago, João e ocasionalmente André sempre foram os companheiros mais íntimos do bendito Senhor. Somente os três primeiros foram convidados a testemunhar da ressurreição da filha de Jairo (Marcos 5; Lucas 8). Os mesmos três apóstolos foram, somente eles, permitidos a estarem presentes na cena da transfiguração (Mateus 17, Marcos 9, Lucas 9). Foram os mesmos três que testemunharam Sua agonia no Getsêmani (Mateus 26, Marcos 14, Lucas 22). Mas os quatro, Pedro, Tiago, João e André, estão juntos quando perguntam ao Senhor em particular sobre a destruição do templo (Marcos 13).
Assim como a mudança - ou acréscimo - ao nome de Pedro, os filhos de Zebedeu são apelidados de Boanerges, ou "filhos do trovão".  Grande ousadia e fidelidade pode ter apontado Tiago para Herodes como o primeiro a ser detido e silenciado. Não é estranho que "o filho do trovão" e o "homem-pedra" sejam os primeiros a serem apreendidos.
Mas Tiago tem a honra de ser o primeiro dos apóstolos que receberam a coroa do martírio em 44 d.C., tendo Pedro sido resgatado por um milagre.
A inveja de uma mãe e a ambição de seus filhos levam Salomé a pedir por lugares distintos no reino para seus dois filhos. O Senhor permitiu que o pedido passasse por uma repreensão muito leve, mas disse aos irmãos que eles deveriam tomar de Seu cálice e serem batizados com Seu batismo. Tiago foi chamado bem cedo para cumprir esta predição. Após a ascensão, ele é visto em companhia dos outros apóstolos em Atos 1. Então ele desaparece da narrativa sagrada até sua apreensão e morte em Atos 12. E lá é simplesmente dito, na breve linguagem do historiador inspirado, que o rei Herodes matou Tiago, irmão de João, com a espada.
Clemente de Alexandria relata uma tradição sobre o martírio de Tiago que não é algo improvável de ter realmente ocorrido. Enquanto era levado para o lugar de execução, o soldado ou oficial que o tinha guardado para o tribunal, ou melhor, seu acusador, estava tão comovido pela coragem e ousada confissão de Tiago no momento de seu julgamento que se arrependeu do que tinha feito. Então ele foi e prostrou-se ao pé do apóstolo, pedindo perdão pelo que tinha dito contra ele. Tiago, um pouco surpreso, o levantou, o abraçou e o beijou, e disse: "Paz, meu filho, paz seja contigo, e o perdão de tuas falhas." Antes disso, ele publicamente tinha professado ser um cristão, e assim ambos foram decapitados ao mesmo tempo. Assim caiu Tiago, o proto-mártir apostólico, alegremente tomando o cálice que ele tinha a muito tempo dito ao seu Senhor que estaria pronto para beber.


O APÓSTOLO JOÃO
João era filho de Zebedeu e Salomé, e irmão mais novo de Tiago. Embora seu pai fosse um pescador, eles aparentemente estavam em boas circunstâncias de acordo com a narrativa do Evangelho. Alguns dos antigos falam da família como sendo rica, e até mesmo de conexão nobre. Porém, tais tradições não são reconciliáveis com os fatos relatados nas Escrituras. Lemos, no entanto, de seus "jornaleiros", e eles podem ter tido mais do que apenas um barco. Quanto a Salomé, sem dúvidas, foi uma daquelas mulheres honradas que serviam ao Senhor com o que tinham. E João tinha sua própria casa (Lucas 8:3; João 19:27). A partir desses fatos, podemos inferir, com segurança, que a situação deles era consideravelmente acima da pobreza. Como muitos têm sido extremos ao falar dos apóstolos como pobres e analfabetos, é interessante observar algumas poucas dicas nas escrituras sobres esses assuntos.
Do caráter de Zebedeu nada sabemos. Ele não fez objeções a seus filhos quando o deixaram ao chamado do Messias. Mas não ouvimos mais sobre ele depois disso. Frequentemente encontramos a mãe em companhia dos seus filhos, mas não há menções ao pai. É provável que ele tenha morrido pouco depois do chamado de seus filhos.
O evangelista Marcos, ao enumerar os doze apóstolos (Marcos 3:17), quando menciona Tiago e João, diz que nosso Senhor "pôs o nome de Boanerges, que significa: Filhos do trovão." O que nosso Senhor particularmente pretendeu, com esse título, não é facilmente determinado. Conjecturas têm havido muitas. Alguns supõem que seria porque esses dois irmãos eram da mais furiosa e resoluta disposição, e de um temperamento mais feroz e ardente do que o resto dos apóstolos. Mas não vemos motivo para tal suposição na história narrada nos Evangelhos. Sem dúvida, em uma ou duas ocasiões o zelo deles era intemperado, mas isso foi antes de entenderem o espírito de seu chamado. É mais provável que nosso Senhor os tenha apelidado em profecia ao zelo ardente deles ao proclamar aberta e corajosamente as grandes verdades do evangelho, após tê-lo conhecido plenamente. Estamos certos de que João, em companhia de Pedro nos primeiros capítulos de Atos, demonstrou uma coragem que não temia ameaças, e não era intimidado por nenhuma oposição.
Supõe-se que João era o mais novo de todos os apóstolos e, a julgar por seus escritos, parece ter sido possuído por uma disposição singularmente carinhosa, suave e amável. Ele foi caracterizado como "o discípulo a quem Jesus amava". Em várias ocasiões, ele foi admitido a uma livre e íntima relação com o Senhor (João 13).
"O que distinguia João", diz Neander, "era a união das mais opostas qualidades, como temos muitas vezes observado em grandes instrumentos do avanço do reino de Deus - a união de uma disposição inclinada à silente e profunda meditação, com um ardente zelo, embora não impulsionado a uma grande e diversificada atividade no mundo exterior; não um zelo apaixonado, como supomos que tenha enchido os peitos de Paulo antes de sua conversão. Mas havia também um amor, não suave e flexível, mas um que se agarrava com tudo o que podia, e firmemente retia o objetivo para o qual se dirigia - vigorosamente repelindo qualquer coisa que desonrasse esse objetivo, ou tentasse arrancá-lo de sua posse; tal era sua principal característica."
E a história de João está tão intimamente conectada com as histórias de Pedro e Tiago, as quais já abordamos, que podemos agora ser bastante breves. Esses três nomes raramente são vistos separados na história dos Evangelhos. Mas há uma cena em que João aparece sozinho e que é digna de nota. Ele era o único apóstolo que seguiu Jesus ao lugar de Sua crucificação. E lá ele foi especialmente honrado com o respeito e confiança de seu Mestre. "Ora Jesus, vendo ali sua mãe, e que o discípulo a quem ele amava estava presente, disse a sua mãe: Mulher, eis aí o teu filho. Depois disse ao discípulo: Eis aí tua mãe. E desde aquela hora o discípulo a recebeu em sua casa." (João 19:26-27)
Após a ascensão de Cristo e a descida do Espírito Santo no dia de Pentecostes, João se tornou um dos principais apóstolos da circuncisão. Mas seu ministério continua até o final do primeiro século. Com sua morte, a era apostólica naturalmente se encerra.
Há uma tradição muito difundida e geralmente aceita de que João permaneceu na Judeia até depois da morte da virgem Maria. A data do evento é incerta. Mas logo depois ele prosseguiu para a Ásia Menor. Lá ele plantou e cuidou de várias igrejas em diferentes cidades, mas fez de Éfeso seu centro. De lá ele foi banido para a Ilha de Patmos, perto do final do reinado de Domiciano. Ali ele escreveu o livro de Apocalipse (ou Revelação) (Apocalipse 1:9). Em sua libertação do exílio, pela ascensão de Nerva ao trono imperial, João retornou a Éfeso, onde escreveu seu Evangelho e suas Epístolas. Ele morreu por volta do ano 100 d.C., no terceiro ano do imperador Trajano, e com mais ou menos cem anos de idade.
Das muitas tradições sobre o próprio João, selecionamos apenas uma, que pensamos ser a mais interessante e a mais provável de que seja verdade. Como um que foi incansável em seu amor e cuidado para com as almas dos homens, ele estava profundamente entristecido pela apostasia de um rapaz pelo qual ele tinha especial interesse. Ao revisitar o lugar onde ele o tinha deixado, ouviu que ele tinha se unido a um bando de ladrões e se tornado o capitão deles. Seu amor por ele era tão grande que se determinou a encontrá-lo. Assim, foi ao encalço dos ladrões e deixou-se capturar, implorando que o levassem à presença do capitão deles. Quando ele viu a venerável  aparência do velho apóstolo, sua consciência foi despertada. A lembrança dos dias passados foi maior do que ele podia suportar, de modo que fugiu, em consternação, de sua presença. Mas João, cheio de amor paternal, foi atrás dele. Ele pediu que o rapaz se arrependesse e retornasse à igreja, e o encorajou pela certeza do perdão de seus pecados no nome do Senhor Jesus. Sua maravilhosa afeição para com o rapaz e sua profunda preocupação pela sua alma o venceram por completo. Ele se arrependeu, retornou, foi restaurado e, posteriormente, se tornou um digno membro da comunidade cristã. Que possamos buscar a fazer o mesmo na restauração de desviados!
Chegamos agora ao que podemos chamar de segundo grupo de quatro apóstolos; e, assim como Pedro encabeçava o primeiro grupo, o segundo é liderado pelo apóstolo Filipe.
O APÓSTOLO FILIPE
Nos três primeiros Evangelhos ele é apresentado nessa ordem. Ele é mencionado como sendo de Betsaida, a cidade de André e Pedro (João 1:44). É mais que provável que ele estivesse entre os galileus daquele distrito que se reuniram para ouvir a pregação de João Batista. Embora nenhuma parte da Palestina tenha sido tão mal falada como a Galileia, foi destes desprezados, mas simples, sinceros e devotos galileus que nosso Senhor escolheu Seus apóstolos. "Examina", disseram os fariseus, "e verás que da Galileia nenhum profeta surgiu" (João 7:52). Mas afirmações muito generalizadas, em geral, costumam ser falsas. "Pode vir alguma coisa boa de Nazaré?" é uma amostra desse caráter.
Nada é dito na história do Evangelho sobre os pais de Filipe ou sua ocupação. O mais provável é que ele tenha sido um pescador, o comércio geral daquele lugar. A partir da similaridade da linguagem utilizada por Filipe e André, e por serem repetidamente mencionados juntos, podemos concluir que nosso apóstolo, assim como os filhos de Jonas e Zebedeu, eram amigos íntimos, e que eles todos estavam procurando e esperando pelo Messias. Mas, de todo o círculo dos discípulos de nosso Senhor, Filipe tem a honra de ser o primeiro a ser chamado. Os três primeiros tinham vindo a Cristo e conversado com Ele antes de Filipe, mas depois disso eles voltaram às suas ocupações e não foram chamados para seguir o Senhor até cerca de um ano mais tarde. Mas Filipe foi chamado de uma vez por todas. "No dia seguinte quis Jesus ir à Galileia, e achou a Filipe, e disse-lhe: Segue-me." (João 1:43). Estas palavras, tão cheias de significado e rica bênção para a alma, "Segue-me", (cremos) que tenham sido as primeiras ditas a Filipe. Quando os doze foram especialmente separados de seus ofícios, Filipe foi contado entre eles.
Imediatamente após seu chamado, ele encontra Natanael e o leva a Jesus. É evidente, pela feliz surpresa que respira em sua informação, que eles já tinham conversado sobre essas coisas antes. Seu coração estava agora seguro de sua verdade, daí a alegria expressa nestas palavras: "Havemos achado aquele de quem Moisés escreveu na lei, e os profetas: Jesus de Nazaré, filho de José." (João 1:45). Há uma evidente sinceridade de coração em Filipe, embora pouco seja dito sobre ele nos Evangelhos.
Nossa última menção a ele, assim como a primeira, é profundamente interessante. Tendo ouvido o Senhor se referir repetidamente ao Seu Pai em João 12,13 e 14, Filipe manifestou um forte desejo de conhecer mais sobre o Pai. As comoventes palavras de nosso Senhor sobre Seu Pai parecem ter causado uma profunda impressão e admiração em seu coração. "Pai, salva-me desta hora"(João 12:27); "Pai, glorifica o teu nome" (João 12:28); "Na casa de meu Pai há muitas moradas" (João 14:2); sem dúvida, tais palavras penetraram profundamente nos corações de todos os discípulos. Mas há uma bela simplicidade sobre Filipe, embora carente de inteligência. "Disse-lhe Filipe: Senhor, mostra-nos o Pai, o que nos basta." (João 14:8). Há uma evidente repreensão, se não uma reprovação, na resposta do Senhor a Filipe: "Disse-lhe Jesus: Estou há tanto tempo convosco, e não me tendes conhecido, Filipe? Quem me vê a mim vê o Pai; e como dizes tu: Mostra-nos o Pai? Não crês tu que eu estou no Pai, e que o Pai está em mim? As palavras que eu vos digo não as digo de mim mesmo, mas o Pai, que está em mim, é quem faz as obras." (João 14:9-10). Ele era a revelação do Pai em Sua própria Pessoa, e Filipe deveria sabê-lo. Ele já estava a muito tempo com Seus discípulos, e eles deveriam ter visto que Ele estava no Pai, e o Pai nEle, e que Ele iria para o Pai. Eles tinham tanto as "palavras" quanto as "obras" do Filho para convencê-los de que o Pai habitava nEle. Eles tinham ouvido Suas palavras, eles tinham visto Suas obras, eles tinham testemunhado Seu caráter, e essas coisas foram ajustadas e destinadas para trazer o Pai diante deles. Sua própria Pessoa era a resposta para qualquer pergunta. "Eu sou o caminho, a verdade e a vida." Ele é o caminho - o único caminho ao Pai. Ele era a verdade: a verdade quanto a tudo e todos, como são, é apenas conhecida por Ele.
Ele é a vida - "aquela vida eterna, que estava com o Pai, e nos foi manifestada". Mas é apenas pelo ensino e poder do Espírito que Ele, que é "o caminho, a verdade e a vida", é conhecido e desfrutado. E deve haver sujeição de coração a Cristo se desejamos conhecer o ensino do Espírito.
Após tal profundamente interessante e instrutiva conversa com o Senhor, tudo é incerto quanto ao resto da história de Filipe - seu nome desaparece da narrativa dos Evangelhos. Ele estava ainda entre os apóstolos em Atos 1:13. A tradição tem confundido, tão frequentemente, o Filipe evangelista com o Filipe apóstolo, que tudo é incerto. Sem dúvidas seus dias restantes foram gastos no serviço devoto ao seu Senhor e Salvador, mas em que lugar é difícil determinar. Alguns pensam que a Ásia foi o cenário de seus primeiros labores, e que no final de sua vida ele esteve em Hierápolis, na Frígia, onde sofreu um cruel martírio.
O APÓSTOLO BARTOLOMEU
Em geral, acredita-se, tanto pelos antigos quanto pelos modernos, que a história de Bartolomeu está oculta sob outro nome. Que ele foi um dos doze apóstolos está perfeitamente claro na narrativa dos Evangelhos, embora nada mais seja dito sobre ele além da mera noção de seu nome. Nos três primeiros Evangelhos, Filipe e Bartolomeu são mencionados juntos; no Evangelho de João, vemos Filipe e Natanael. Tal circunstância tem dado origem a uma suposição muito comum: que na verdade sejam diferentes nomes para a mesma pessoa. Isso era muito comum entre os judeus. Por exemplo, Simão Pedro é chamado de "Bar-jonas", que simplesmente significa: o filho de Jonas. "Bar-timeu", também, significa "filho de Timeu"; e "Bar-tolomeu" parece ser um nome do mesmo tipo. Esses são apenas nomes relativos, e não próprios.
Dada a generalidade desse costume entre os judeus, muitas vezes é extremamente difícil identificar as pessoas na história dos Evangelhos.
Assumindo, então, que Natanael de João é o Bartolomeu dos Evangelhos sínóticos, prosseguimos com o que sabemos de sua história. Como o resto dos apóstolos, ele era um galileu; ele era "de Caná da Galileia". Vimos anteriormente que ele foi primeiramente conduzido a Cristo por meio de Filipe. Ao se aproximar, ele foi saudado pelo Senhor com a mais honrada distinção: "Eis aqui um verdadeiro israelita, em quem não há dolo." (João 1:47). Ele era, sem dúvidas, um homem de verdadeira simplicidade e integridade de caráter, e um que "esperava pela redenção em Israel". Surpreso com tão graciosa saudação de nosso Senhor, e se perguntando como Ele poderia conhecê-lo à primeira vista, "disse-lhe Natanael: De onde me conheces tu? Jesus respondeu, e disse-lhe: Antes que Filipe te chamasse, te vi eu, estando tu debaixo da figueira." (João 1:48). Solene e bendito pensamento! Ele estava diante dAquele - um homem - neste mundo que conhecia os segredos de seu coração e de seus caminhos. Natanael estava agora plenamente convencido da absoluta divindade do Messias, e O reconhece em Sua maior glória como "o Filho de Deus", assim como "o rei de Israel".
O caráter de Natanael e seu chamado são considerados por muitos como uma figura do remanescente de Israel sem dolo nos últimos dias. A alusão à figueira - um conhecido símbolo de Israel - confirma tal visão dessa passagem; e assim declara seu belo testemunho: "Rabi, tu és o Filho de Deus; tu és o Rei de Israel." (João 1:49). O remanescente disperso, visto e conhecido pelo Senhor, irá então confessar sua fé nEle, como os profetas mostraram tão plenamente.
E todos aqueles que então reconhecerem o Messias verão Sua glória universal como o Filho do homem, de acordo com o Salmo 8. Aquele dia vindouro de ampla glória é antecipada por nosso Senhor em Suas conclusivas observações a Natanael: "Na verdade, na verdade vos digo que daqui em diante vereis o céu aberto, e os anjos de Deus subindo e descendo sobre o Filho do homem." (João 1:51). Então os céus e a terra serão unidos, como podemos lembrar da escada de Jacó. Mas devemos agora retornar à história de nosso apóstolo.
A mais distinta e conclusiva passagem quanto ao seu apostolado se encontra em João 21. Ali o encontramos em companhia dos outros apóstolos, a quem nosso Senhor apareceu no Mar da Galileia após Sua ressurreição. "Estavam juntos Simão Pedro, e Tomé, chamado Dídimo, e Natanael, que era de Caná da Galiléia, os filhos de Zebedeu, e outros dois dos seus discípulos" que provavelmente eram André e Filipe.
Há uma tradição geralmente aceita de que Bartolomeu viajou até a Índia pregando o evangelho - provavelmente àquela parte da Índia mais próxima da Ásia. Após ter viajado a diferentes lugares, buscando disseminar o cristianismo, ele finalmente chegou a Albanópolis na Armênia Maior, um lugar infestado pela idolatria. Lá ele foi preso pelo governador do lugar, e condenado à crucificação. A data não é conhecida com exatidão.
O APÓSTOLO MATEUS
Mateus - também chamado Levi, o filho de Alfeu; mas não o mesmo Alfeu, acreditamos, que o Alfeu pai de Tiago (Mateus 10:3; Marcos 2:14; Lucas 5:27-29). Embora fosse um oficial romano, ele era "um hebreu de hebreus", e provavelmente um galileu; mas de qual cidade ou tribo não somos informados. Antes do seu chamado para seguir o Messias, ele era um publicano, ou coletor de impostos, sob o comando romano. Ele parece ter sido alocado em Cafarnaum, uma cidade marítima  no Mar da Galileia. Ali ele era o que podemos chamar de um oficial de alfândega. Era nesta qualidade que Jesus o encontrou. Quando Ele passou, Ele o viu "sentado na alfândega, e disse-lhe: Segue-me. E, levantando-se, o seguiu." (Marcos 2:14) Mas antes de prosseguirmos com a história de Mateus, vamos considerar algumas palavras sobre o caráter de sua ocupação, uma vez que é tão frequentemente mencionada no Novo Testamento, e por ser um termo realmente genérico.
Os publicanos propriamente ditos eram pessoas que coletavam os impostos ou rendimentos públicos para Roma. Eles eram, geralmente, pessoas de riqueza e crédito. Era considerada, ente os romanos, uma posição de honra, e geralmente conferida a cavaleiros romanos. Sabino (segundo a história, o pai do Imperador Vespasiano), era o publicano das províncias asiáticas. Eles tinham sob eles oficiais inferiores, e estes, geralmente, eram nativos das províncias das quais os impostos eram coletados; sem dúvida, Mateus pertencia a esta classe de oficial.
Estes suboficiais eram, por toda a parte, notórios por suas cobranças fraudulentas. Mas para os judeus, eles eram especialmente odiosos. Os judeus olhavam para si mesmos como um povo nascido livre que tinha privilégios concedidos diretamente do Próprio Deus. "Somos descendência de Abraão," diziam eles, "e nunca servimos a ninguém" (João 8:33). Consequentemente, os coletores de impostos romanos eram a prova visível da escravidão deles, e do estado de degradação de sua nação. Esse era o grilhão que os afligia e os incitava a muitos atos de rebelião contra os romanos. Por isso que os publicanos eram abominados pelos judeus. Eles os viam como traidores e apóstatas, e como ferramentas do opressor. Além disso, os publicanos eram, na maioria, injustos em suas cobranças; e tendo a lei do seu lado, eles podiam forçar os pagamentos. Estava sob o poder deles examinar cada caso de bens exportados ou importados, e de avaliar o alegado valor da maneira mais vexatória. Podemos saber, baseado no que João disse a eles, que eles cobravam injustamente sempre que tinham a oportunidade. "E ele lhes disse: Não peçais mais do que o que vos está ordenado." (Lucas 3:13). Veja também o caso de Zaqueu (Lucas 19:9)
Certamente essas coisas eram mais do que suficientes para trazer toda essa classe de oficiais à maior repulsa, em todo lugar. Mas vamos nos limitar ao que aprendemos deles no Novo Testamento. O espírito da verdade nunca exagera. Ali os encontramos associados a pecadores (Mateus 9:11; 11:19), a prostitutas (Mateus 21:31, 32), e a pagãos (Mateus 18:17). Como classe, eles eram considerados como estando fora, não somente dos privilégios do santuário, mas também dos privilégios da sociedade civil. E ainda assim, apesar de todas essas desvantagens, eles são contados entre alguns dos primeiros discípulos tanto de João quanto de nosso Senhor. Eles tinham menos hipocrisia do que aqueles que eram melhor estimados; eles não tinham uma moralidade convencional, e não tinham uma falsa religião para desaprender. Estas coisas podem ser bastante discutidas a partir da parábola do Fariseu e do Publicano (Lucas 18). A bondade convencional é um grande obstáculo à salvação da alma. É difícil, para tais, tomar o lugar de um pecador perdido e arruinado, para que a graça possa ter livre curso para fazer sua bendita, salvífica e graciosa obra. Aquele que seria justificado diante de Deus deveria tomar o lugar de um publicano e fazer a mesma oração do publicano: "Ó Deus, tem misericórdia de mim, um pecador!" (Lucas 18:13). Retornemos agora à história de nosso apóstolo.
Com grande prontidão Mateus obedeceu ao chamado de Jesus. Sua situação lucrativa logo foi deixada para trás, e sua conversão, tão completa e manifesta, foi acompanhada de muita bênção para outros. Havia um grande despertar e interesse entre sua própria classe. "E fez-lhe Levi um grande banquete em sua casa; e havia ali uma multidão de publicanos e outros que estavam com eles à mesa." (Lucas 5:29) Um banquete é o símbolo de alegria e regozijo - o efeito imediato de um coração rendido a Cristo. É digno de nota que em seu próprio Evangelho ele torna seu nome bem conhecido, mas nenhum dos outros evangelistas falam do "Mateus, o publicano". Junto com os outros ele foi escolhido como um dos doze. Daquele tempo em diante ele continuou com o Senhor como o restante dos apóstolos. Que bendito privilégio! - "um acompanhante familiar de Sua pessoa, um espectador de Sua vida pública e privada, um ouvinte de Suas palavras e discursos, um observador de Seus milagres, uma testemunha de Sua ressurreição e ascensão à glória." Isto ele não testifica, embora tenha visto. Mateus estava com os outros apóstolos no dia de Pentecostes e recebeu o dom do Espírito Santo. Quanto tempo ele continuou na Judeia após aquele evento, disto não somos informados. Supõe-se que seu Evangelho seja o primeiro que foi escrito, e contém uma referência especial a Israel.
À Etiópia é geralmente atribuída a cena de seus trabalhos apostólicos. Ali, dizem alguns, pela pregação e milagres, ele triunfou poderosamente sobre o erro e a idolatria, foi o meio de conversão de muitos, nomeou guias e pastores espirituais para os confirmar e edificar, e para levar outros à fé; e ali terminou seu curso. Mas as fontes de informação sobre esses pontos não podem ser confiadas com muita certeza.
O APÓSTOLO TOMÉ
O apóstolo Tomé foi convocado por nosso Senhor para o apostolado, sendo mencionado em várias listas apostólicas. Não somos informados de seu local de nascimento ou sobre seus pais nas Escrituras, mas a tradição diz que ele nasceu na Antioquia. Tudo o que sabemos dele com certeza é relatado por João. Mas embora nosso conhecimento sobre Tomé seja limitado, não há um caráter entre os apóstolos mais distintamente marcante do que o dele. De fato, seu nome se tornou, tanto na igreja quanto no mundo, um sinônimo de dúvida e incredulidade. Um famoso artista, tendo sido designado a produzir um retrato do apóstolo Tomé, o desenhou com uma régua na mão, no sentido de que ele media as evidências e argumentos. Sua mente era pensativa, meditativa, demorada para acreditar. Ele olhava para todas as dificuldades de uma questão e se inclinava a tomar o lado negro das coisas. Mas vamos olhar, por um momento, para o retrato que a pena da inspiração divina desenhou pelas seguintes três passagens:
1. Em João 11, seu verdadeiro caráter aparece distintamente. Ele evidentemente via a viagem proposta por nosso Senhor até a Judeia com os mais sombrios pressentimentos. "Disse, pois, Tomé, chamado Dídimo, aos condiscípulos: Vamos nós também, para morrermos com ele." (João 11:16) Em vez de acreditar que Lázaro seria ressuscitado dos mortos, ele temeu que tanto o Senhor quanto Seus discípulos encontrariam suas próprias mortes na Judeia. Ele não conseguia ver nada em tal viagem além de um completo disastre. Isso também é característico. Ele tinha profunda afeição pelo Senhor, e tal era sua devoção que, embora a viagem pudesse custar a vida de todos eles, ele desejava ir.
2. A segunda vez em que ele é referenciado é após a Última Ceia (João 14). Nosso Senhor falava de sua partida, do lar que Ele iria preparar para eles no Céu, e que Ele viria de novo e os receberia para Ele mesmo, de modo que onde Ele estivesse eles estivessem também. "Mesmo vós sabeis para onde vou", acrescentou Ele, "e conheceis o caminho" (João 14:4). Mas para a mente do nosso apóstolo essas belas promessas apenas despertaram pensamentos sombrios sobre o invisível, o desconhecido e o futuro. "Disse-lhe Tomé: Senhor, nós não sabemos para onde vais; e como podemos saber o caminho?" (João 14:5). Evidentemente, ele estava ansioso para ir, e sincero em seus questionamentos, mas ele desejava ter certeza do caminho antes de dar o primeiro passo. "Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim." (João 14:6). Contanto que o olho esteja fixo em Cristo, é impossível darmos um passo em falso. É apenas o olho que recebe a luz dos céus que lança seu brilho sobre todo o caminho.
3. A terceira vez foi após a ressurreição (João 20). Ele estava ausente quando o Senhor ressurreto apareceu pela primeira vez aos discípulos. Quando contaram a ele que eles tinham visto o Senhor, ele obstinadamente se recusou a acreditar no que eles diziam. Pelo que ele diz, podemos razoavelmente concluir que ele tinha visto o Senhor na cruz, e que tal esmagadora visão havia produzido uma profunda impressão em sua mente. "Se eu não vir o sinal dos cravos em suas mãos, e não puser o meu dedo no lugar dos cravos, e não puser a minha mão no seu lado, de maneira nenhuma o crerei." (João 20:25).
No seguinte dia do Senhor (domingo),quando os discípulos estavam reunidos, Jesus apareceu no meio deles - Seu lugar apropriado como o centro da reunião. Novamente os saudou com as mesmas palavras de paz: "Paz seja convosco" (João 20:26). Mas logo Ele se dirige a Tomé. "Depois disse a Tomé: Põe aqui o teu dedo, e vê as minhas mãos; e chega a tua mão, e põe-na no meu lado; e não sejas incrédulo, mas crente." (João 20:27). O efeito em Tomé foi imediato: todas as suas dúvidas foram removidas, e em verdadeira fé exclamou: "Senhor meu, e Deus meu!" (João 20:28) "Disse-lhe Jesus: Porque me viste, Tomé, creste; bem-aventurados os que não viram e creram." (João 20:29)
Alguns têm pensado que a fé de Tomé, neste caso, se eleva muito acima da fé dos outros discípulos, e que nunca um testemunho tão elevado saiu dos lábios de um apóstolo. Esta opinião, embora seja comum, não pode ser fundada dado o contexto geral. Cristo, em resposta a Tomé, pronuncia que são mais abençoados aqueles que, não tendo visto, ainda assim creram. A fé de Tomé, naquele momento, mal podia ser chamada de fé cristã, como nosso Senhor evidentemente sugere. A fé cristã é crer naquEle que não temos visto - andando pela fé, e não pela vista.
Tomé, sem dúvidas, representa a mente devagar e incrédula dos judeus nos últimos dias, que acreditarão apenas quando verem (Zacarias 12). Ele não estava presente na primeira reunião dos santos após a ressurreição. O motivo nós não sabemos. Mas quem pode estimar a bênção que pode ser perdida pela ausência nas sancionadas reuniões dos santos? Ele perdeu as benditas revelações de Cristo quanto ao relacionamento com o Pai: "Meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus."(João 20:17). Sua fé não está conectada com sua posição de filho. "Ele não tinha ainda apreendido a eficácia da obra do Senhor", disse alguém, "e do relacionamento com Seu Pai ao qual Jesus conduziu a Sua igreja. Talvez Tomé tivesse paz, mas ele perdeu de vista toda a revelação da posição da igreja.Quantas almas - até mesmo almas salvas - se encontram nessas duas condições!"
Os futuros trabalhos apostólicos de Tomé, e o fim de sua vida, são tão cheios de tradições e lendas que não podemos saber nada com certeza. Alguns dizem que ele esteve na Índia e alguns que ele esteve na Pérsia. Seu martírio, dizem, foi ocasionado por uma lança, e até hoje se comemora isto, em 21 de dezembro pela igreja latina, em 6 de outubro pela igreja grega, e em 1º de julho pelos indianos.
O APÓSTOLO TIAGO, FILHO DE ALFEU
A identificação dos Tiagos, das Marias, e dos irmãos do Senhor, tem sido por muito tempo um ponto de discussão pelos críticos, e aqui não haveria lugar para ficar remoendo suas teorias e argumentos. Mas, depois de olhar para diferentes lados da questão, ainda acreditamos que o nosso apóstolo é o mesmo Tiago que foi um homem importante para a igreja de Jerusalém - o mesmo que escreveu "A Epístola Universal de Tiago" - e que também é chamado de irmão do Senhor e apelidado de "o Justo" e "o Menor", provavelmente por causa de sua baixa estatura. A identificação de pessoas em tais histórias costuma ser extremamente difícil, graças ao hábito, tão comum entre os judeus, de se referir às pessoas pelas suas relações - como a relação de irmão e irmã - e pelo fato de que quase todos eles possuíam dois ou mais nomes.
Nas quatro listas dos apóstolos, Tiago sempre se mantém no mesmo lugar. Ele lidera a terceira classe. Pedro parece liderar o primeiro grupo, Filipe o segundo, e Tiago o terceiro. Muito pouco se sabe sobre Tiago até o período posterior à ressurreição. Pelo que Paulo relata em 1 Coríntios 15:7, é evidente que Tiago tinha sido honrado com uma conversa pessoal com o Senhor antes de Sua ascensão. Isto foi antes do dia de Pentecostes, e pode ter ocorrido para incentivo, orientação e fortalecimento especial do apóstolo. Vamos agora observar as principais passagens que nos dão base para adquirirmos nosso conhecimento sobre Tiago.
No primeiro capítulo de Atos o encontramos, junto com os outros, à espera dapromessa do Pai, o dom do Espírito Santo. Depois disso o perdemos de vista, até que ele é visitado por Paulo (Gálatas 1:18,19) por volta do ano 39 d.C. Ali o encontramos na mesma posição de Pedro como um apóstolo. Ele era, nesse tempo, o supervisor (ou bispo) da igreja em Jerusalém, e se encontrava no mesmo nível dos principais apóstolos. O lugar que ele ocupava na estima de Pedro é evidente a partir do fato de que, quando Pedro foi liberto da prisão, ele desejava que a informação sobre sua libertação fosse enviada a "Tiago e aos irmãos." (Atos 12:17)
Em 50 d.C., encontramo-lo no concílio apostólico, onde parece exercer juízo na assembleia. "Por isso julgo que não se deve perturbar aqueles, dentre os gentios, que se convertem a Deus." (Atos 15:19) Não existe nenhum relato de outros apóstolos falando desta maneira. Parece que ele tinha adquirido grande posição e autoridade apostólica. Por volta do ano 51, quando Paulo fez outra visita a Jerusalém, ele reconhece Tiago como um dos "pilares" (ou "colunas") da igreja, e cita seu nome antes do de Cefas (Pedro) e João (Gálatas 2:9). Mais uma vez, por volta do ano 58, Paulo fez uma visita especial a Tiago, na presença de todos os anciãos. "E no dia seguinte, Paulo entrou conosco em casa de Tiago, e todos os anciãos estavam presentes." (Atos 21:18) Vê-se facilmente, a partir destas poucas observações, que Tiago tinha a mais alta estima dos demais apóstolos, e que ocupava uma posição importante na igreja de Jerusalém. Seu apego ao judaísmo era profundo e sério, e seu avanço no cristianismo parece ter sido lento e gradual. Ele era um oposto perfeito de Paulo, e Pedro era o meio-termo entre ambos.
O martírio de Tiago aconteceu por volta do ano 62, mais ou menos trinta anos depois do Pentecostes. O testemunho da antiguidade é universal quanto à sua distinta piedade e santidade. Sua humildade, também, sempre é relatada como sendo grande: embora ele fosse irmão de sangue do Senhor, ou um parente próximo, ele se auto-intitula de servo de Jesus Cristo, e não faz nada além de se chamar pelo título de apóstolo. Por causa de sua reputação por ter uma vida santa e justa, ele foi universalmente denominado "Tiago, o Justo." E, como se conformava aos costumes judaicos em certa medida, ele não era, definitivamente, tão ofensivo aos olhos de seus compatriotas incrédulos como o apóstolo dos gentios (Paulo). Mas, mesmo com a elevada opinião que, acredita-se, as pessoas tinham sobre seu caráter, sua vida foi prematuramente terminada com o martírio.
Temos acesso a um relato da vida, caráter e morte de Tiago graças, principalmente, a Hegésipo, um cristão de origem judaica que viveu em meados do século II. Ele geralmente é recebido como um historiador confiável. Sua narrativa sobre o martírio de Tiago é encontrada na íntegra, e em suas próprias palavras, no "Dicionário Bíblico de Smith". Aqui só podemos apresentá-la em resumo:
Uma vez que muitos dos governantes e do povo dos judeus tornaram-se crentes em Jesus através dos trabalhos de Tiago, os escribas e fariseus estavam muito incitados contra ele. Todo o povo, diziam eles, iriam acreditar em Cristo se continuasse assim. Por isso, foram até Tiago e disseram: "Te pedimos que pare as pessoas, pois se desviaram após Jesus como se Ele fosse o Cristo. Te pedimos para convencer a todos os que vêm para a Páscoa a respeito de Jesus. Persuada o povo para que não se desviem para Jesus; para que todo o povo, e para que todos nós, dê ouvidos a ti. Estejas, portanto, sobre o pináculo do templo para que estejas visível, e para que as tuas palavras possam ser ouvidas por todo o povo; para todas as tribos e até mesmo aos gentios que estiverem reunidos para a Páscoa." Tiago, no entanto, em vez de dizer o que lhe foi pedido, proclamou em alta voz aos ouvidos de todo o povo que Jesus era o verdadeiro Messias, que ele acreditava firmemente nEle, que Jesus estava agora no Céu à mão direita de Deus, e que ele viria outra vez em poder e grande glória. Muitos foram convencidos por meio da pregação de Tiago e deram glória a Deus, clamando: "Hosana ao Filho de Davi".
Quando os escribas e fariseus ouviram isto, disseram entre si: "Nós erramos ao dar crédito a um tal testemunho de Jesus; subamos e joguemos-o para baixo, para que as pessoas fiquem aterrorizadas e não creiam nele." E gritaram, dizendo: "até Tiago, o Justo, se extraviou", e atiraram-no para baixo. Mas, como ele não morreu com a queda, começaram a apedrejá-lo. Então um deles, que era tecelão, tomou um pisão [instrumento usado para dar consistência aos tecidos] e bateu com ele na cabeça de Tiago. Assim, o apóstolo morreu e, como o proto-mártir Estevão, morreu orando por eles, de joelhos. Foi quase que imediatamente depois disso que Vespasiano começou o cerco de Jerusalém, e o exército romano transformou toda a cena em desolação, sangue e ruína.
O APÓSTOLO SIMÃO, O ZELOTE
Simão, o Zelote, também chamado de "Simão, o cananeu", parece não ser a mesma pessoa que Simão, irmão de Tiago. Não temos relatos aprofundados sobre ele na história narrada no Evangelho. Ele sempre é mencionado junto com os outros apóstolos nos Evangelhos e em Atos, e depois disso desaparece da narrativa sagrada.
É geralmente aceito que, antes de ser chamado para ser apóstolo, ele pertencia a uma seita dos judeus chamada de "Os Zelotes." A principal característica deles era a feroz defesa ao ritual mosaico. Eles se consideravam sucessores de Finéias que, em seu zelo pela honra de Deus, matou Zimri e Cosbi (Número 25). Fingindo seguir o zelo dos sacerdotes antigos, eles achavam que tinham o direito de sentenciar à morte um blasfemador, um adúltero, ou qualquer preso notório, sem as formalidades comuns da lei. Eles alegavam que Deus tinha feito uma aliança eterna com Finéias e com a sua descendência, "porque ele foi zeloso pelo seu Deus, e fez expiação por Israel." Estas retumbantes reivindicações e pretensões enganaram tanto os governantes quanto o povo por um bom tempo. Além disso, sua fúria e zelo pela lei de Moisés e pela libertação do povo do jugo romano deu-lhes graça aos olhos de toda a nação. Mas, como sempre parece ser o caso em circunstâncias semelhantes, seu zelo logo se degenerou em todos os tipos de libertinagem e extravagância selvagem. Tornaram-se as pragas de todas as classes da sociedade.
Sob um pretendido zelo pela honra de Deus, eles acusavam quem quisessem de serem culpados de blasfêmia ou de algum outro pecado grave, e imediatamente os matavam e apreendiam suas propriedades. Josefo nos conta que eles falharam em não acusar alguns da "nata da sociedade" e, embora tenham conseguido tornar tudo uma confusão, não deixavam de pescar “em águas turbulentas”. Josefo os classificou como as grandes pragas da nação. Tentativas foram feitas em diferentes épocas para suprimir a sociedade, mas não parece que eles tinham sido muito reduzidos até que, junto com todo o resto da nação incrédula, foram varridos do mapa no fatal cerco dos romanos.
Simão é frequentemente denominado "Simão, o Zelote", portanto supõe-se que tenha pertencido a essa problemática facção. Podem ter havido homens verdadeiros e sinceros entre eles, mas bons e maus passaram sob o odioso nome de "Zelote". Nada é sabido com certeza sobre os futuros trabalhos do nosso apóstolo. Alguns dizem que, após viajar por um tempo para o Oriente, voltou para o Ocidente e chegou até a Grã-Bretanha, onde pregou, fez milagres, suportou muitas provações, e finalmente sofreu o martírio.
O APÓSTOLO JUDAS, IRMÃO DE TIAGO
Este apóstolo também é chamado de Judas Tadeu, ou Lebeu. Estes diferentes nomes têm diferentes nuances quanto ao significado, mas o exame de tais sutilezas está fora do escopo deste livro. Judas era filho de Alfeu, e um dos parentes de nosso Senhor, como lemos em Mateus 13:55: "não se chama sua mãe Maria, e seus irmãos Tiago, e José, e Simão, e Judas?"
Quando, ou como, ele foi chamado para o apostolado, disto não somos informados; e não há praticamente nenhuma menção a ele no Novo Testamento, exceto nas várias vezes em que os doze apóstolos são nomeados. Seu nome só aparece uma vez na narrativa do Evangelho, quando ele faz a seguinte pergunta: "Disse-lhe Judas (não o Iscariotes): Senhor, de onde vem que te hás de manifestar a nós, e não ao mundo?" (João 14:22). É evidente, a partir desta pergunta, que ele ainda imaginava, assim como seus condiscípulos, a ideia de um reino temporal, ou a manifestação do poder de Cristo na terra de modo que o mundo pudesse percebê-lo. Mas eles não entendiam ainda a dignidade de seu próprio Messias. Eles eram estranhos à grandeza do Seu poder, à glória da Sua Pessoa, e à espiritualidade do Seu reino. Seus súditos são libertos, não apenas deste mundo perverso, mas do poder de Satanás e do domínio da morte e da sepultura: "O qual nos tirou da potestade das trevas, e nos transportou para o reino do Filho do seu amor" (Colossenses 1:13). A resposta de Cristo para a questão de Judas é o mais importante. Ele fala das bênçãos da obediência. O discípulo verdadeiramente obediente certamente conhece a doçura da comunhão com o Pai e com o Filho, na luz e no poder do Espírito Santo. Aqui não se trata da questão do amor de Deus em graça soberana para com um pecador, mas das relações do Pai com Seus filhos. Por isso, é no caminho da obediência que a manifestação do amor do Pai e do amor de Cristo são encontrados. (Veja João 14:23-26)
Mas devemos ter em mente, quando comentamos sobre as perguntas ou sobre as palavras dos apóstolos, que o Espírito Santo ainda não tinha sido dado, pois Jesus ainda não tinha sido glorificado. Os pensamentos, sentimentos e expectativas dos apóstolos, depois desse evento, foram completamente alterados. Assim, encontramos nosso apóstolo, assim como seu irmão Tiago, intitulando-se "Judas, servo de Jesus Cristo, e irmão de Tiago" (Judas 1:1). Ele não chama a si mesmo de apóstolo, nem de irmão do Senhor. Isto é humildade verdadeira, fundada em um verdadeiro senso da mudança de relacionamento com o Senhor exaltado. No dia de Pentecostes foi proclamado: "Saiba pois com certeza toda a casa de Israel que a esse Jesus, a quem vós crucificastes, Deus o fez Senhor e Cristo." (Atos 2:36)
Nada é sabido com certeza sobre o restante da história de nosso apóstolo. Alguns dizem que ele pregou primeiramente na Judeia e na Galileia, e depois da Samaria até a Idumeia, e em cidades da Arábia. Mas, próximo ao fim de sua jornada, a Pérsia foi o local de seus labores e o cenário de seu martírio.
Com base em 1 Coríntios 9:5, podemos razoavelmente inferir que ele era um dos apóstolos que eram casados: "Não temos nós direito de levar conosco uma esposa crente, como também os demais apóstolos, e os irmãos do Senhor, e Cefas?"
Existe uma tradição sobre dois de seus netos, que é interessante e aparentemente verdadeira. Tal tradição foi transmitida por Eusébio de Hegésipo, um judeu convertido. Domiciano, o Imperador, tendo ouvido sobre a existência de alguns da linhagem de Davi, e parentes de Cristo ainda vivos, movido pela inveja, ordenou que fossem apreendidos e levados a Roma. Dois netos de Judas foram trazidos diante dele. Eles confessaram francamente que eram da linhagem de Davi, e parentes de Cristo. Ele os questionou sobre suas possessões e propriedades. Eles lhe contaram que não tinham nada além de alguns hectares de terra, cuja produção servia para o pagamento de impostos e para sustento próprio. Suas mãos foram examinadas, sendo encontradas ásperas e cheias de calos por causa do trabalho. Ele, então, perguntou-lhes acerca do reino de Cristo, e quando e onde ele viria. Então eles responderam que se tratava de um reino celestial e espiritual, e não de um reino temporal, e que ele não seria manifesto até que chegasse o fim deste mundo. O Imperador, satisfeito pelo fato de que eles eram homens pobres e inofensivos, os dispensou e cessou sua perseguição geral contra a igreja.
Quando retornaram à Palestina, foram recebidos pela igreja com muito carinho, por serem parentes do Senhor e por terem confessado nobremente Seu nome - Seu reino, poder e glória.
O APÓSTOLO MATIAS
Matias - o apóstolo eleito para ficar no lugar do traidor Judas. Ele não era um apóstolo da primeira eleição - isto é, ele não tinha sido imediatamente chamado e escolhido pelo próprio Senhor. É mais do que provável que ele era um dos setenta discípulos, e que tenha sido um acompanhante constante do Senhor Jesus durante todo o curso de seu ministério. Isto era uma qualificação necessária, conforme declarado por Pedro, para alguém que deveria ser uma testemunha da ressurreição. Até onde sabemos, o nome de Matias não aparece em nenhum outro lugar no Novo Testamento.
De acordo com algumas tradições antigas, ele pregou o evangelho e sofreu o martírio na Etiópia, e outros acreditam que isto ocorreu na Capadócia. Assim permitiu-se que os grandes fundadores da igreja passassem da Terra para o Céu sem que uma caneta confiável narrasse seus trabalhos - seus últimos dias - suas últimas palavras, ou mesmo o lugar de descanso de seus corpos. Mas todos serão narrados no Céu, e serão guardados em uma memória eterna. Quão maravilhosos são os caminhos de Deus, e quão contrários aos caminhos dos homens!
O modo pelo qual este apóstolo foi eleito foi por sorteio - um antigo costume judaico. As sortes foram colocadas em uma urna e o nome de Matias foi retirado e, desse modo, ele foi o apóstolo escolhido por Deus. "E apresentaram dois: José, chamado Barsabás, que tinha por sobrenome o Justo, e Matias. E, orando, disseram: Tu, Senhor, conhecedor dos corações de todos, mostra qual destes dois tens escolhido, para que tome parte neste ministério e apostolado, de que Judas se desviou, para ir para o seu próprio lugar. E, lançando-lhes sortes, caiu a sorte sobre Matias. E por voto comum foi contado com os onze apóstolos." (Atos 1:23-26). O modo solene com o qual o sorteio foi realizado foi considerado como uma forma de se referir à decisão de Deus. "E Arão lançará sortes sobre os dois bodes; uma pelo Senhor, e a outra pelo bode emissário." "A sorte se lança no regaço, mas do Senhor procede toda a determinação." (Levítico 16:8; Provérbios 16:33). Os apóstolos, é bom lembrar,ainda não tinham recebido o dom do Espírito Santo. O sorteio nunca mais foi repetido após o dia de Pentecostes.
A PRIMEIRA VISITA DE SAULO A JERUSALÉM
(POR VOLTA DE 39 D.C.)
O apóstolo está agora em Jerusalém - a cidade santa de seus pais - a metrópole da religião judaica, e o reconhecido centro do cristianismo. Mas quanto mudou sua própria posição desde que ele começou sua memorável jornada a Damasco!
Podemos aqui fazer uma breve pausa e observar, de passagem, a antiga cidade de Damasco. Tal cidade está intimamente conectada à conversão, ministério e história de nosso apóstolo. Além disso, ela é notável no decorrer de toda a Escritura.
Supõe-se que Damasco seja a cidade mais antiga do mundo. De acordo com Josefo (Ant. 1. 6, 4), ela foi fundada por Uz, o filho de Arã, e neto de Sem (Gênesis 10:23). Ela é mencionada pela primeira vez nas Escrituras em conexão a Abraão, cujo mordomo era um nativo do lugar: "o mordomo da minha casa é o damasceno Eliézer" (Gênesis 15:2). A cidade é, portanto, um elo entre a era patriarcal e os tempos modernos. Sua beleza e riqueza têm sido proverbiais por quatro mil anos. Os reis de Nínive, Babilônia, Pérsia, Grécia e Roma a conquistaram, e ela prosperou sob cada dinastia, e sobreviveu a todas elas; mas ela deve seu principal brilho e seu eterno memorial ao nome do Apóstolo Paulo.
DE VOLTA  A JERUSALÉM
Após passar quinze dias com Pedro e Tiago argumentando com os gregos, os irmãos "o acompanharam até Cesaréia, e o enviaram a Tarso. Assim, pois, as igrejas em toda a Judéia, e Galiléia e Samaria tinham paz, e eram edificadas; e se multiplicavam, andando no temor do Senhor e consolação do Espírito Santo." (Atos 9:30-31). Por enquanto o adversário é silenciado. A paz reina por meio da bondade de Deus. A perseguição cumpriu os propósitos de Sua graça. Os dois grandes elementos da bênção - o temor do Senhor e a consolação do Espírito Santo - prevaleciam em todas as assembleias. Andando no temor do Senhor, e no consolo do Espírito Santo, eles são edificados, e seu número aumenta significativamente.
Enquanto Saulo estava em Tarso, sua terra natal, a boa obra do Senhor estava fazendo grande progresso na Antioquia. Dentre aqueles que foram dispersos pela perseguição que se levantou por causa de Estêvão, havia "homens chíprios e cirenenses, os quais entrando em Antioquia falaram aos gregos, anunciando o Senhor Jesus. E a mão do Senhor era com eles; e grande número creu e se converteu ao Senhor." (Atos 11:20-21). Uma nova ordem de coisas começa aqui. Até o momento, o evangelho tinha sido pregado "senão somente aos judeus" (Atos 11:19). Quando a notícia dessa bendita obra de Deus entre os gentios chegou a Jerusalém, Barnabé foi enviado pela igreja em uma missão especial até a Antioquia."
O qual, quando chegou, e viu a graça de Deus, se alegrou, e exortou a todos a que permanecessem no Senhor, com propósito de coração; porque era homem de bem e cheio do Espírito Santo e de fé. E muita gente se uniu ao Senhor." (Atos 11:23-24)
À medida que a obra aumentava, Barnabé - sem dúvida, sentindo a necessidade de ajuda - pensou em Saulo; e, guiado pelo Senhor, partiu à sua procura. Tendo-o encontrado, o trouxe à Antioquia; e ali eles trabalharam juntos por "todo um ano", tanto nas assembleias dos crentes quando entre o povo. Barnabé ainda assume a liderança, pois lemos de "Barnabé e Saulo". Mais tarde, a ordem muda e lemos "Paulo e Barnabé".
Uma oportunidade de mostrar a afeição pelos irmãos de Jerusalém logo apareceu para os jovens convertidos na Antioquia. Um profeta, "por nome Ágabo, dava a entender pelo Espírito, que haveria uma grande fome em todo o mundo, e isso aconteceu no tempo de Cláudio César. E os discípulos determinaram mandar, cada um conforme o que pudesse, socorro aos irmãos que habitavam na Judéia. O que eles com efeito fizeram, enviando-o aos anciãos por mão de Barnabé e de Saulo."(Atos 11:28-30)
A SEGUNDA VISITA DE SAULO A JERUSALÉM
(POR VOLTA DE 44 D.C.)
Encarregado desse serviço (levar provisões para os irmãos de Jerusalém, conforme visto no final da seção anterior), Barnabé e Saulo sobem a Jerusalém. Até agora, Jerusalém é considerada o centro da obra, embora agora estivesse rapidamente se estendendo aos gentios. Mas a união é preservada, e a ligação com a metrópole é fortalecida por meio da ajuda agora enviada. Não obstante, um novo centro, uma nova comissão, um novo caráter de poder, em conexão com a história da igreja, agora nos são apresentados. Barnabé e Saulo, tendo cumprido seu ministério, retornam novamente à Antioquia, trazendo com eles João, cujo sobrenome era Marcos.
Atos 13 abre diante de nós uma ordem de coisas inteiramente nova em conexão à obra apostólica, e faremos bem em assinalar tal grande mudança. O grande fato a ser observado aqui é o lugar que o Espírito Santo toma ao chamar e enviar Barnabé e Saulo. Não se trata mais de Cristo na Terra com Sua autoridade pessoal comissionando apóstolos, mas agora trata-se do Espírito Santo fazendo isso."Apartai-me", disse o Espírito, "a Barnabé e a Saulo para a obra a que os tenho chamado... E assim estes, enviados pelo Espírito Santo, desceram a Selêucia e dali navegaram para Chipre." (Atos 13:2,4) Isto não significa, é claro, que podia haver alguma mudança no que diz respeito à autoridade ou poder, quer do Senhor quer do Espírito, mas seu modo de agir agora mudou. O Espírito Santo na Terra, em conexão a Cristo glorificado no Céu, agora se torna a fonte e poder da obra que se abre diante de nós, e que é atribuída a Barnabé e Saulo. A partir daí chegamos à primeira viagem missionária de Saulo.
A PRIMEIRA VIAGEM MISSIONÁRIA DE SAULO
(POR VOLTA DE 48 D.C.)
Antes de nos ocuparmos com os apóstolos em sua viagem, cabe aqui uma observação sobre como as coisas mudaram. Eles partiram, devemos observar, não do velho centro, Jerusalém, mas da Antioquia, uma cidade de gentios. Isto é significativo. Jerusalém e os doze perderam a posição quanto à autoridade e poder para com o exterior. O Espírito Santo chama a Barnabé e Saulo para a obra, os prepara para isto, e os envia, sem a jurisdição dos doze.
Não será de esperar que em um livro, cujo conteúdo se propõe a ser resumido, possamos tomar nota dos vários eventos ocorridos nas viagens de Paulo. O leitor os encontrará em Atos e nas Epístolas. Propomos meramente traçar um esboço e dar destaque a determinados pontos de referência, pelos quais o leitor será capaz de traçar, por si mesmo, as várias jornadas do maior dos apóstolos - o maior dos missionários - o maior dos obreiros que já viveu, com exceção do bendito Senhor. Mas em primeiro lugar, gostaríamos de observar seus companheiros e seu ponto de partida.
Barnabé foi, por algum tempo, o companheiro mais próximo de Saulo. Ele era um levita da ilha de Chipre. Ele tinha sido chamado logo no início da história da igreja para seguir a Cristo, e "possuindo uma herdade, vendeu-a, e trouxe o preço, e o depositou aos pés dos apóstolos." (Atos 4:37). Comparando sua liberalidade com o belo testemunho que o Espírito Santo dá sobre ele, ele permanece diante de nós com um amável e requintado caráter. E, a partir de seu apego a Paulo desde o início, e de sua cordialidade em apresentá-lo aos outros apóstolos, podemos julgar que ele era mais franco e tinha um coração maior do que aqueles que tinham sido treinados na estreiteza do judaísmo; mas faltava-lhe ainda, quanto ao serviço, o rigor e a determinação de seu companheiro Saulo.
João Marcos era um parente próximo de Barnabé - "o sobrinho de Barnabé"(Colossenses 4:10). Sua mãe era uma certa Maria que morava em Jerusalém, e cuja casa parece ter sido um local de reunião para os apóstolos e primeiros cristãos. Quando Pedro foi liberto da prisão, ele foi direto para "a casa de Maria, mãe de João, que tinha por sobrenome Marcos" (Atos 12:12). Supõe-se que ele tenha sido convertido por meio de Pedro, pois depois Pedro fala dele como "meu filho Marcos" (1 Pedro 5:13)
A partir disso aprendemos que ele não era nem um apóstolo nem um dos setenta - que ele não havia acompanhado o bendito Senhor durante Seu ministério público. Mas podemos supor que ele estava ansioso para servir a Cristo, pois se uniu a Barnabé e Saulo, embora mais tarde pareça que sua fé não era páreo para as dificuldades da vida missionária. "E, partindo de Pafos, Paulo e os que estavam com ele chegaram a Perge, da Panfília. Mas João, apartando-se deles, voltou para Jerusalém." (Atos 13:13). Supõe-se que Marcos tenha escrito seu Evangelho por volta do ano 63 d.C.
A Antioquia, a antiga capital dos selêucidas, foi fundada por Seleuco Nicator por volta de 300 a.C. Foi uma cidade que só ficava atrás de Jerusalém no que diz respeito ao início da história da igreja. O que Jerusalém tinha sido para os judeus, a Antioquia era agora para os gentios. Era um ponto central. Nessa época ocupava um lugar de grande importância na propagação do cristianismo entre os pagãos. Aqui a primeira igreja gentia foi plantada (Atos 11:20,21). Aqui os discípulos de Cristo foram primeiramente chamados de cristãos (Atos 11:26).
TRABALHO MINISTERIAL PÚBLICO
Barnabé e Saulo, com João Marcos como auxiliar no ministério, são então enviados pelo Espírito Santo. Os judeus, em virtude de sua conexão com as promessas, tiveram o evangelho primeiramente pregado a eles; mas a conversão de Sérgio Paulo marca, de maneira especial, o início do trabalho entre os gentios. Também marca uma crise na história do apóstolo. Aqui seu nome é mudado de Saulo para Paulo; e agora - com exceção de Jerusalém (Atos 15:12-22) - não vemos mais "Barnabé e Saulo", mas sim" Paulo e os que estavam com ele" (Atos 13:13).
Ele toma a dianteira; os outros são apenas aqueles que estão com Paulo. Mas o cenário tem ainda um caráter típico.
O procônsul era, evidentemente, um homem prudente e pensativo, e sentiu a necessidade de sua alma. Ele chama a Barnabé e a Saulo, e deseja ouvir a Palavra de Deus. Mas Elimas, o encantador, resiste a eles. Ele sabia bem que, se o governador recebesse a verdade que Paulo pregava, ele perderia sua influência na corte. Ele, portanto, procura afastar o deputado da fé. Mas Paulo, em dignidade consciente e no poder do Espírito Santo, "fixando os olhos nele" (Atos 13:9), e em palavras de mais fulminante indignação, o repreende na presença do governador. "Ó filho do diabo, cheio de todo o engano e de toda a malícia, inimigo de toda a justiça, não cessarás de perturbar os retos caminhos do Senhor? Eis aí, pois, agora contra ti a mão do Senhor, e ficarás cego, sem ver o sol por algum tempo. E no mesmo instante a escuridão e as trevas caíram sobre ele e, andando à roda, buscava a quem o guiasse pela mão. Então o procônsul, vendo o que havia acontecido, creu, maravilhado da doutrina do Senhor." (Atos 13:10-12). O poder de Deus acompanha a palavra de Seu servo, e a sentença pronunciada é executada no mesmo instante. O deputado fica tomado pela glória moral da cena, e se submete ao evangelho.
"Eu não duvido", disse alguém, "que neste miserável Barjesus (Elimas) vemos uma figura dos judeus no tempo presente, acometidos de cegueira por algum tempo, por causa dos ciúmes da influência do evangelho. A fim de preencher a medida de sua iniquidade, eles resistiram à pregação do evangelho aos gentios. A condição deles é julgada; sua história é dada na missão de Paulo. Em oposição à graça e buscando destruir seus efeitos sobre os gentios, eles foram acometidos de cegueira; no entanto, apenas por um tempo."
Durante essa primeira missão entre os gentios, um grande e abençoado trabalho foi feito. Compare Atos 13 e 14. Muitos lugares foram visitados, igrejas foram plantadas, anciãos foram nomeados, a hostilidade dos judeus manifestada, e a energia do Espírito Santo demonstrada no poder e progresso da verdade. Em Listra, o cristianismo foi confrontado, pela primeira vez, com o paganismo; mas em todo lugar o evangelho triunfa, e os vários dons de Paulo como obreiro aparecem de maneira abençoada. Seja ao abordar os judeus, que conheciam as Escrituras, ou bárbaros ignorantes, ou cultos gregos, ou multidões enfurecidas, ele prova ser um vaso divinamente escolhido para sua grande obra.
A Antioquia, na Pisídia, merece atenção especial pelo que aconteceu na sinagoga. Embora haja uma grande semelhança no discurso de Paulo comparado aos de Pedro e Estêvão nos primeiros capítulos de Atos, ainda podemos notar certos toques estritamente paulinos em seu caráter. Seu estilo conciliador de abordagem, o modo como ele apresenta a Cristo, e sua ousada proclamação de justificação pela fé somente, podem ser consideradas como típicas de suas póstumas abordagens e Epístolas. Nenhum dos escritores sagrados fala da justificação pela fé como Paulo fala. Seu apelo final tem sido um texto evangelístico favorito de muitos pregadores em todas as eras. Em poucas palavras, ele afirma a bem-aventurança de todos que recebem a Cristo, e a terrível desgraça daqueles que O rejeitarem, provando assim que não poderia haver um meio-termo ou terreno neutro quando Cristo está em questão. "Seja-vos, pois, notório, homens irmãos, que por este se vos anuncia a remissão dos pecados.
E de tudo o que, pela lei de Moisés, não pudestes ser justificados, por ele é justificado todo aquele que crê. Vede, pois, que não venha sobre vós o que está dito nos profetas: Vede, ó desprezadores, e espantai-vos e desaparecei; porque opero uma obra em vossos dias, obra tal que não crereis, se alguém vo-la contar." (Atos 13:38-41)
Tendo sido cumprida a missão deles, eles retornam à Antioquia na Síria. Quando os discípulos ouviram o que o Senhor tinha feito, e que a porta da fé foi aberta aos gentios, eles deviam apenas louvar e bendizer Seu santo nome. Devemos agora retornar, por um momento, a Jerusalém.
O efeito da primeira missão de Paulo sobre os discípulos em Jerusalém levou a uma grande crise na história da igreja. O ciúme e a mente farisaica estava tão excitada que uma divisão entre Jerusalém e Antioquia foi ameaçada naquele período inicial da história da igreja. Mas Deus governou em graça, e o problema quanto à Antioquia foi felizmente resolvido. Mas o fanatismo dos crentes judeus era insaciável. Na igreja em Jerusalém eles ainda conectavam ao cristianismo os requisitos da lei, e procuravam impor esses requisitos aos crentes gentios.
Alguns dos cristãos judeus de cabeça mais fechada desceram à Antioquia, e asseguraram aos gentios que, a menos que eles fossem circuncidados segundo o costume de Moisés, e que guardassem a lei, eles não poderiam ser salvos. Paulo e Barnabé não tiveram pequena discussão e contenda com eles; mas como era uma questão muito pesada para ser resolvida pela autoridade apostólica de Paulo, ou por uma resolução da igreja em Antioquia, foi decidido que uma delegação deveria subir à Jerusalém e pôr a questão diante dos doze apóstolos e dos anciãos. A escolha de quem deveria levar a questão, naturalmente, caiu sobre Paulo e Barnabé, já que tinham sido os mais ativos na propagação do cristianismo entre os gentios.
A TERCEIRA VISITA DE PAULO A JERUSALÉM
(POR VOLTA DE 50 D.C.)
Quando eles chegaram a Jerusalém, encontraram a mesma coisa [fanatismo dos crentes judeus pela guarda da lei pelos gentios, N. do T.], não apenas nas mentes de alguns poucos irmãos inquietos, mas no próprio seio da igreja. A fonte da confusão estava lá, não entre judeus incrédulos, mas entres aqueles que professavam o nome de Jesus. "Alguns, porém, da seita dos fariseus, que tinham crido, se levantaram, dizendo que era mister circuncidá-los e mandar-lhes que guardassem a lei de Moisés." (Atos 15:5). Esta declaração clara trouxe toda a questão diante da assembleia, e suas importantes deliberações começaram. O Capítulo 15 de Atos contém o relato do que ocorreu e como a questão foi resolvida. Os apóstolos, anciãos, e todo o corpo da igreja em Jerusalém não estavam apenas presentes, mas também tomaram parte na discussão. Os apóstolos nem assumiram nem exercitaram poder exclusivo sobre o assunto. Este é geralmente chamado "O primeiro Concílio da Igreja", mas pode também ser chamada de último concílio da igreja que podia dizer: "Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós" (Atos 15:28).
Muitos, de acordo com noções modernas de "essencial e não-essencial", sem dúvida diriam que a mera cerimônia de circuncidar ou não circuncidar uma criança não tinha muita importância. Mas não é assim de acordo com a mente de Deus. Era uma questão vital. Afetava o próprio fundamento do cristianismo, os profundos princípios da graça, e toda a questão sobre a relação do homem com Deus. A Epístola de Paulo aos Gálatas é um comentário sobre a história dessa questão.
Não havia rito ou cerimônia que o judeu convertido fosse tão averso a deixar para trás como a circuncisão. Era o sinal e o selo do seu próprio relacionamento com Jeová, e das hereditária bênçãos da aliança com seus filhos. É da opinião de alguns em todas as eras que o "batismo de crianças" foi introduzido pela igreja para atender ao forte preconceito judaico. Mas se isto tivesse sido a pretensão do Senhor, o concílio em Jerusalém seria o próprio lugar para anunciá-lo. Isto acabaria com toda a dificuldade, e resolveria a questão diante deles, e restauraria a paz e unidade entre os duas "igrejas-mãe" [a igreja em Jerusalém, sendo a primeira igreja onde predominavam os judeus, e a igreja em Antioquia, sendo a primeira igreja onde predominavam os gentios, N. do T.]. Mas nenhum dos apóstolos ou dos outros aludiram a isto.
Antes de deixarmos essa importante e sugestiva parte da história do nosso apóstolo, pode ser bom observar certos fatos trazidos em Gálatas 2, mas que não são mencionados em Atos. Foi nesta ocasião que Paulo subiu, por revelação, a Jerusalém com Tito. Em Atos temos a história de Paulo vista de fora, cedendo aos motivos, desejos e objetivos do homem; nas Epístolas temos algo mais profundo - aquilo que governava o coração do apóstolo. Mas Deus sabe como combinar essas circunstâncias externas com a direção interna do Espírito. A liberdade cristã ou a servidão da lei estavam em debate: se a lei de Moisés - em particular, o rito da circuncisão - deveria ser imposta aos gentios convertidos. Paulo, guiado por Deus, sobe a Jerusalém, e leva com ele Tito. Perante a face dos doze apóstolos, e de toda a igreja, ele traz a Tito, que era grego, e que não tinha sido circuncidado. Isto foi um passo ousado - introduzir um gentio, e incircunciso, no próprio centro de um judaísmo intolerante! Mas o apóstolo foi lá por revelação. Ele tinha comunicações positivas, vindas de Deus, sobre o assunto. Foi a maneira divina de decidir a questão, de uma vez por todas, entre ele mesmo e os cristãos judaizantes. Este passo era necessário, como ele diz: "E isto por causa dos falsos irmãos que se intrometeram, e secretamente entraram a espiar a nossa liberdade, que temos em Cristo Jesus, para nos porem em servidão; aos quais nem ainda por uma hora cedemos com sujeição, para que a verdade do evangelho permanecesse entre vós." (Gálatas 2:4-5)
O apóstolo, então, tendo atingido seu principal objetivo, e tendo comunicado seu evangelho aos de Jerusalém, vai embora, com Barnabé, e retorna aos cristãos gentios em Antioquia. Os dois representantes, Judas e Silas, carregando os decretos do concílio, os acompanham. Quando a multidão de discípulos se reuniu e ouviu a epístola lida, se alegraram e foram consolados.
Assim termina o primeiro concílio apostólico, e a primeira controvérsia apostólica. E, pelo que aprendemos desses assuntos em Atos, podemos concluir que a divisão entre os cristãos judeus e gentios tinha sido completamente curada pela decisão da assembleia; mas sabemos, pelas Epístolas, que a oposição do partido judaizante contra a liberdade dos cristãos gentios nem sequer cochilava. Logo começava de novo, e Paulo tinha que, constantemente, confrontar e lutar contra a questão.
A SEGUNDA VIAGEM MISSIONÁRIA DE PAULO
(POR VOLTA DE 51 D.C.)
Depois de Paulo e Barnabé terem ficado algum tempo com a igreja em Antioquia, outra viagem missionária foi proposta. "Tornemos", disse Paulo, "a visitar nossos irmãos por todas as cidades em que já anunciamos a palavra do Senhor, para ver como estão. E Barnabé aconselhava que tomassem consigo a João, chamado Marcos. Mas a Paulo parecia razoável que não tomassem consigo aquele que desde a Panfília se tinha apartado deles e não os acompanhou naquela obra. E tal contenda houve entre eles, que se apartaram um do outro. Barnabé, levando consigo a Marcos, navegou para Chipre. E Paulo, tendo escolhido a Silas, partiu, encomendado pelos irmãos à graça de Deus. E passou pela Síria e Cilícia, confirmando as igrejas." (Atos 15:36-41)
Com uma jornada tão importante, tão cheia de provações, que exigia coragem e perseverança - segundo a opinião de Paulo - ele não podia confiar em Marcos como companheiro; ele não podia facilmente desculpar aquele cujos laços familiares o tornaram infiel no serviço ao Senhor. O próprio Paulo deixava de lado todas as considerações e sentimentos pessoais quando a obra de Cristo estava em questão, e ele desejava que os outros fizessem o mesmo. A afeição natural, nesta ocasião, pode ter traído Barnabé a, novamente, pressionar seu sobrinho ao serviço; mas uma severa seriedade caracterizava Paulo. Os laços dos relacionamentos naturais e dos apegos humanos ainda tinham grande influência sobre o caráter cristão ameno de Barnabé. Isto é evidente pela sua conduta em Antioquia na ocasião da fraca complacência de Pedro para com os judaizantes de Jerusalém (Gálatas 2). A disseminação do evangelho no mundo gentio era sagrada demais aos olhos de Paulo para admitir experimentos. Marcos tinha preferido Jerusalém à obra, mas Silas preferiu a obra a Jerusalém. Isto pesou na decisão de Paulo, embora, sem dúvida, ela tenha sido guiado pelo Espírito.
Barnabé leva Marcos, seu parente, e navega para Chipre, sua terra natal. E aqui nos despedimos de Barnabé, aquele amado santo e precioso servo de Cristo! Seu nome não é mais mencionado em Atos. Essas palavras, "parente" e "terra natal" devem ser deixadas a falar por elas mesmas ao coração de cada discípulo que lê estas páginas. Se estivéssemos meditando sobre essa cena dolorosa, em vez de dar um mero esboço de uma grande história, poderíamos ter muito o que dizer sobre o assunto; mas o deixamos com duas felizes reflexões: 1) Isto foi direcionado de modo que redundou em benção para os pagãos; as águas da vida agora fluíam em duas correntes no lugar de uma só. Isso, no entanto, é a bondade de Deus, e não dá sanção à divisão entre cristãos. 2) Paulo, mais tarde, fala de Barnabé com inteira afeição, e deseja que Marcos vá até ele, tendo-o achado útil para o ministério (1 Coríntios 9:6; 2 Timóteo 4:11). Não temos dúvida de que a fidelidade de Paulo se tornou uma benção para ambos. Mas o mel das afeições humanas nunca poderão ser aceitas no altar de Deus.
Tendo sido encomendados pelos irmão à graça de Deus, eles iniciam sua jornada. Tudo é maravilhosamente simples. Nenhum desfile é feito pelos seus amigos ao vê-los partir, e nenhuma grande promessa é feita por eles quanto ao que eles estavam determinados a fazer. "Tornemos a visitar nossos irmãos", são as poucas, simples e despretensiosas palavras que nos levam à segunda grande viagem missionária de Paulo. Mas o Mestre estava pensando em Seus servos e provendo para eles. Eles não precisavam ir longe até encontrar um novo companheiro em Timóteo de Listra, um que havia de suprir o vazio causado pela ausência de Barnabé. Se Paulo perdeu o companheirismo de Barnabé como amigo e irmão, ele encontrou em Timóteo, como seu próprio filho na fé, uma simpatia e um companheirismo que só combinava com a vida do apóstolo. "Paulo quis que este fosse com ele", mas antes de partirem, Paulo "o circuncidou, por causa dos judeus que estavam naqueles lugares;
porque todos sabiam que seu pai era grego." Paulo, nesta ocasião, inclina-se ao preconceito dos judeus, e circuncisa Timóteo por segurança.
Timóteo era filho de um daqueles casamentos mistos que sempre foram fortemente condenados tanto no Antigo quanto no Novo Testamento. Seu pai era um gentio, mas seu nome nunca é mencionado; sua mãe era uma piedosa judia. Dada a ausência de qualquer referência ao pai, tanto em Atos quanto nas Epístolas, supõe-se que ele possa ter morrido pouco tempo depois do filho ter nascido. Timóteo foi, evidentemente, deixado na infância ao único cuidado de sua mãe Eunice e de sua avó Lóide, que o ensinou, desde criança, a conhecer as Sagradas Escrituras. E, das muitas alusões nas Epístolas de Paulo ao carinho, sensibilidade, e às lágrimas de seu amado filho na fé, podemos acreditar que ele manteve por toda a vida as impressões daquele gentil, amável e santo cuidado doméstico. O maravilhoso amor de Paulo por Timóteo, e suas afáveis lembranças de sua casa em Listra, e seu treinamento inicial ali, ditaram  algumas das mais tocantes passagens dos escritos do grande apóstolo. Quando já um homem idoso - na prisão, passando necessidades, e com o martírio diante de si - ele escreve: "A Timóteo, meu amado filho: Graça, misericórdia, e paz da parte de Deus Pai, e da de Cristo Jesus, Senhor nosso. Dou graças a Deus, a quem desde os meus antepassados sirvo com uma consciência pura, de que sem cessar faço memória de ti nas minhas orações noite e dia; desejando muito ver-te, lembrando-me das tuas lágrimas, para me encher de gozo; trazendo à memória a fé não fingida que em ti há, a qual habitou primeiro em tua avó Lóide, e em tua mãe Eunice, e estou certo de que também habita em ti." (2 Timóteo 1:2-5). Ele insiste e repete seu urgente convite a Timóteo para ir e vê-lo.
"Procura vir ter comigo depressa" – "Procura vir antes do inverno" (2 Timóteo 4:9,21). Podemos permitir-nos a crer que um filho tão ternamente amado pôde chegar a tempo de acalmar as últimas horas de seu pai em Cristo, de receber seu último conselho e bênção, e de testemunhá-lo terminando sua carreira com alegria.
Silas, ou Silvano, aparece pela primeira vez como um mestre na igreja em Jerusalém; e provavelmente ele era tanto um helenista quanto um cidadão romano, como o próprio Paulo (Atos 16:37). Ele foi apontado como responsável por acompanhar Paulo e Barnabé em seu retorno a Antioquia com os decretos do concílio. Mas, como muitos detalhes tanto da vida de Timóteo quanto de Silas naturalmente aparecerão ao traçarmos o caminho do apóstolo, não precisamos dizer nada mais sobre eles no presente momento. Procedamos com a viagem.
Paulo e Silas, com seu novo companheiro, percorrem as cidades, ordenando-lhes a manter os decretos ordenados pelos apóstolos e anciãos em Jerusalém. Os decretos foram deixados com as igrejas, de modo que os judeus tinham a própria decisão de Jerusalém de que a lei não era para ser imposta aos gentios. Após visitar e confirmar as igrejas já plantadas na Síria e Cilícia, eles procederam para a Frígia e Galácia. Aqui fazemos uma pausa e nos deteremos nestas palavras: "pela Frígia e pela província da Galácia" (Atos 16:6). A Frígia e a Galácia não eram meras cidades, mas províncias, ou grandes distritos do país. E ainda assim o historiador sagrado usa apenas essas poucas palavras ao recordar a grande obra feita lá. Quão diferente é a energia condensada do Espírito comparada ao estilo inflado do homem!
Aprendemos da história, segundo Neander, que somente na Frígia, no sexto século, havia sessenta e duas cidades. E parece que Paulo e os que estavam com ele tinham percorrido todas as que existiam naquela época.
As mesmas observações quanto ao trabalho se aplica à Galácia. E aprendemos pela Epístola de Paulo aos Gálatas que, nessa época, ele estava sofrendo no corpo. "E vós sabeis que primeiro vos anunciei o evangelho estando em fraqueza da carne" (Gálatas 4:13). Mas o poder da sua pregação contrasta de maneira tão impressionante com a fraqueza da sua carne que os gálatas foram movidos até mesmo a extravasar em simpatia e sentimentos generosos. "E não rejeitastes, nem desprezastes isso que era uma tentação na minha carne, antes me recebestes como um anjo de Deus, como Jesus Cristo mesmo. Qual é, logo, a vossa bem-aventurança? Porque vos dou testemunho de que, se possível fora, arrancaríeis os vossos olhos, e mos daríeis." (Gálatas 4:14-15). Aprendemos pela história que os gálatas eram de origem celta, impulsivos e de caráter instável.* A Epístola inteira é uma triste ilustração da instabilidade deles, e dos tristes efeitos do elemento judaizanteentre eles. "Maravilho-me de", disse Paulo, "que tão depressa passásseis daquele que vos chamou à graça de Cristo para outro evangelho; o qual não é outro, mas há alguns que vos inquietam e querem transtornar o evangelho de Cristo." (Gálatas 1:6-7). Mas retornemos à história narrada em Atos.
O caráter e os efeitos do ministério de Paulo, como relatados nos capítulos 16 a 20, são realmente maravilhosos. Eles deveriam até se destacar nas páginas de toda a história. Todo servo de Cristo, e especialmente o pregador, deveria estudá-los cuidadosamente e lê-los com frequência.
"O vaso do Espírito", disse alguém de maneira tão bela, "brilha com uma luz celestial através de toda a obra do evangelho; ele condescende em Jerusalém; trovoa na Galácia quando almas estão sendo pervertidas, guia os apóstolos a decidirem pela liberdade dos gentios, e usa, ele mesmo, de toda a liberdade de ser um judeu de judeus, e como um sem lei para aqueles que não tinham a lei, como não estando debaixo da lei, mas sempre sujeito a Cristo. Ele também 'procurava sempre ter uma consciência sem ofensa' (Atos 24:16). Nada que havia dentro dele dificultava sua comunhão com Deus, de onde ele tirou suas forças para ser fiel entre os homens. Ele podia dizer, e [talvez, N. do T.] ninguém além dele: 'sede meus imitadores, como também eu de Cristo' (1 Coríntios 11:1). Assim também ele podia dizer: 'Tudo sofro por amor dos escolhidos, para que também eles alcancem a salvação que está em Cristo Jesus com glória eterna.' (2 Timóteo 2:10)"
Os modos do Espírito para com o apóstolo nesses capítulos são também dignos de nota. Ele, e somente Ele, dirige o apóstolo em seu maravilhoso caminho, e o sustêm em meio a muitas provas e circunstâncias opostas. Por exemplo, Ele proíbe Paulo de pregar a Palavra na Ásia - Ele não o deixa ir à Bitínia, mas o direciona por meio de uma visão à noite para que ele fosse à Macedônia. "E Paulo teve de noite uma visão, em que se apresentou um homem da Macedônia, e lhe rogou, dizendo: Passa à Macedônia, e ajuda-nos. E, logo depois desta visão, procuramos partir para a Macedônia, concluindo que o Senhor nos chamava para lhes anunciarmos o evangelho. E, navegando de Trôade, fomos correndo em caminho direito para a Samotrácia e, no dia seguinte, para Neápolis; e dali para Filipos, que é a primeira cidade desta parte da Macedônia, e é uma colônia." (Atos 16:9-12)
PAULO LEVA O EVANGELHO PARA A EUROPA
Isto marca uma época distinta na história da igreja, na história de Paulo, e no progresso do cristianismo. Paulo e seus companheiros agora levam o evangelho Europa adentro. E aqui creio que podemos fazer uma pausa, por um momento, para lembrarmos as várias e interessantes associações históricas dos conquistadores e conquistas da Macedônia, e para habitarmos por um momento sobre a planície de Filipos, também famosa na história romana. Aqui a grande luta entre a república e o império tinha terminado. Para comemorar esse evento, Augusto fundou uma colônia em Filipos. Esta foi a primeira cidade na qual Paulo chegou em sua entrada para a Europa. Ela é chamada "a primeira cidade desta parte da Macedônia, e é uma colônia." (Atos 16:12) Uma colônia romana, como nos é relatado, era caracteristicamente uma lembrança em miniatura de Roma; e Filipos era mais apta que qualquer outra cidade no império para ser considerada representativa da Roma Imperial.
Para muitos de nossos jovens e questionadores leitores, esta breve digressão, temos certeza, não será desinteressante. Além disso, um conhecimento sobre tais histórias são úteis ao estudante da profecia, uma vez que se tratam do cumprimento da visão de Daniel, especialmente do capítulo 7. A cidade de Filipos era, por si própria, um monumento ao crescente poder da Grécia, que deveria esmagar o poder em declínio da Pérsia. Alexandre, o Grande, filho de Filipe, foi o conquistador do grande rei Dário; quando o "Leopardo" da Grécia venceu o "Urso" da Pérsia.
Ao olharmos para trás a partir do tempo em que Paulo partiu da Ásia para a Europa, quase quatrocentos anos tinham passado desde que Alexandre partiu da Europa para a Ásia. Mas quão diferentes eram seus motivos e objetivos - seus conflitos e suas vitórias! O entusiasmo de Alexandre foi despertado pela lembrança de seus grandes antepassados, e por sua determinação em derrubar as grandes dinastias do Oriente; mas, embora não intencional e inconscientemente, ele estava cumprindo os propósitos de Deus. Paulo tinha cingido sua armadura para outro propósito, e para ganhar maiores e mais duradouras vitórias. Ele foi enviado pelo Espírito Santo, não apenas para subjugar o Ocidente, mas para trazer o mundo inteiro a cativar pela obediência de Cristo. O cristianismo não é apenas para uma nação ou um povo, mas para o homem universalmente; até mesmo o próprio Paulo expressa isto em Colossenses 1:23: "A toda criatura que há debaixo do céu". Esta é a missão do evangelho, e esta é sua esfera. Lucas, "o médico amado", historiador e evangelista parece ter se unido a Paulo neste momento particular. No versículo 10 ele escreve na primeira pessoa do plural:"Procuramos partir para a Macedônia". Supõe-se que ele era um gentio de nascença e convertido em Antioquia. Ele parece ter permanecido como um fiel companheiro do apóstolo até o fim de seus trabalhos e aflições (2 Timóteo 4:11).
O EFEITO DA PREGAÇÃO DE PAULO EM FILIPOS
A quantidade de judeus em Filipos aparentemente era pequena, já que não havia sinagoga no lugar. Mas o apóstolo, como de costume, vai a eles primeiro, mesmo quando se trata de umas poucas mulheres reunidas à margem do rio (Atos 16). Paulo prega a elas, Lídia é convertida, a porta é aberta, e outras também creem. Foi nesse lugar despretensioso, e àquelas poucas mulheres piedosas, que o evangelho foi pregado pela primeira vez na Europa, e onde a primeira casa foi batizada*. Mas o silencioso início e seus triunfos pacíficos logo foram perturbados pela malícia de Satanás e pela cobiça do homem. O evangelho não avançaria em meio ao paganismo com facilidade e conforto, mas com grande oposição e sofrimento.
 A ação do Espírito quanto à família parece ter sido marcante entre os gentios; entre os judeus, até onde sabemos, não ouvimos falar disso. Encontramos, também, distritos entre os judeus, e também entre os samaritanos, que foram poderosamente impressionados (para dizer o mínimo) pelo evangelho. Mas entre os gentios, famílias parecem ter sido particularmente visitadas pela graça divina, como registrado pelo Espírito. Tome por exemplo Cornélio, o carcereiro e Estéfanas; de fato, encontramos isso vez após vez. Isto é extremamente encorajador.  
Enquanto o apóstolo e seus companheiros iam ao oratório, ou lugar de oração, uma jovem possuída por um espírito maligno os seguia, e clamava, dizendo: "Estes homens, que nos anunciam o caminho da salvação, são servos do Deus Altíssimo."(Atos 16:17). Da primeira vez, Paulo não deu atenção. Ele foi em frente com sua própria bendita obra de pregação de Cristo, e de ganhar almas para Ele. Mas a pobre e obsessiva escrava persistia em segui-los, e em proferir a mesma exclamação. Foi uma tentativa maliciosa do inimigo para impedir a obra de Deus ao prestar um testemunho aos ministros da Palavra. Deve ser observado que ela não presta testemunho a "Jesus", ou ao "Senhor", mas aos Seus "servos", e ao "Deus Altíssimo".Mas Paulo não queria um testemunho para ele mesmo, nem um testemunho vindo de um espírito maligno, e ele, "perturbado, voltou-se e disse ao espírito: Em nome de Jesus Cristo, te mando que saias dela. E na mesma hora saiu." (Atos 16:18)
Como a moça não podia mais praticar suas artes de adivinhação, seus mestres viram-se privados dos ganhos que eles tinham derivado daquela fonte. Enfurecidos pela perda de sua propriedade, e movendo as multidões ao seu favor, prenderam Paulo e Silas e os arrastaram perante os magistrados. Como eles estavam bem conscientes de que não tinham nenhuma acusação verdadeira para trazê-los perante eles,levantaram o velho clamor da "perturbação da paz" - de que eles estavam tentando introduzir práticas judaicas na colônia romana, e ensinar costumes que eram contrários às leis romanas. E, como tem sido muitas vezes, o clamor da multidão foi aceito no lugar da evidência, exame e deliberação. Os magistrados, sem perguntar mais nada, ordenou-lhes que fossem açoitados e lançados na prisão. E assim foi, aqueles benditos servos de Deus, feridos, sangrando e fracos foram entregues a um cruel carcereiro, que aumentou ainda mais o sofrimento deles ao prender-lhes os pés no tronco. Mas Paulo e Silas, em vez de ficarem deprimidos por seus sofrimentos no corpo e pelas sombrias paredes da prisão,alegraram-se por terem sido considerados dignos de sofrer vergonha e dor por causa de Cristo; e em vez do silêncio da meia-noite ser quebrado com os suspiros e gemidos dos prisioneiros, eles "oravam e cantavam hinos a Deus, e os outros presos os escutavam." (Atos 16:25)
Se a Satanás não lhe falta recursos para continuar sua obra ruim, a Deus não Lhe falta recursos para continuar Sua boa obra. Ele agora faz uso de tudo que aconteceu para direcionar o progresso da obra do evangelho, e para cumprir os propósitos do Seu amor. O carcereiro deve ser convertido, a igreja deve ser reunida, e um testemunho criado para o Senhor Jesus Cristo na própria fortaleza do paganismo. À meia-noite, enquanto Paulo e Silas estavam cantando e os prisioneiros estavam ouvindo ao som incomum, ocorre um grande terremoto.
Deus entra em cena em majestade e graça. Ele levanta Sua voz e a terra treme: as paredes da prisão são chacoalhadas, as portas se abrem, e os grilhões de todo homem caem. E agora, o que são cadeias e prisões? O que são legiões romanas? O que é todo o poder do inimigo? A voz de Deus é ouvida na tempestade: mas a violência da tempestade é sucedida pela voz mansa e delicada do evangelho e da paz do Céu.
Logo despertado pelo terremoto, os primeiros pensamentos do carcereiro foram em relação a seus prisioneiros. Alarmado por ver as portas da prisão abertas, e supondo que os presos tinham fugido, ele pega sua espada para se matar. "Mas Paulo clamou com grande voz, dizendo: Não te faças nenhum mal, que todos aqui estamos." (Atos 16:28). Estas palavras de amor quebraram o coração do carcereiro. A calma serenidade de Paulo e Silas - sua recusa em valer-se da oportunidade de escapar - sua carinhosa preocupação para com ele - tudo combinado para fazê-los aparecer aos olhos do espantado carcereiro como seres de uma ordem superior. Ele deixou de lado sua espada, pediu por luz, saltou para dentro da prisão e, tremendo, caiu aos pés do apóstolo. Sua consciência foi, agora, alcançada, seu coração foi quebrantado, e havia algo como a violência de um terremoto agitando toda sua alma. Ele toma o lugar de um pecador perdido, e clama: "Senhores, que é necessário que eu faça para me salvar?" (Atos 16:30). Ele não fala como o doutor da lei em Lucas 10:25: "Mestre, que farei para herdar a vida eterna?" O que estava em questão para o carcereiro não era sobre fazer algo para a vida, mas sobre a salvação para o perdido. O doutor da lei, como muitos outros, não conhecia a si mesmo como um pecador perdido, portanto ele não fala sobre salvação.
Em resposta à mais importante pergunta que os lábios humanos podem fazer, "O que devo fazer para ser salvo?", o apóstolo direciona a mente do carcereiro para Cristo - "Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo, tu e a tua casa." (Atos 16:31). Deus deu a bênção, e toda sua família creu, se alegrou, e foi batizada. E agora tudo está mudado: o carcereiro leva os prisioneiros à sua própria casa - sua crueldade é transformada em amor, simpatia e hospitalidade. Na mesma hora da noite, lavou-lhes os vergões - lhes ofereceu comida - regozijou-se, crendo em Deus com toda sua casa. Que noite agitada! Que mudança em poucas horas! E que manhã alegre clareou sobre aquela feliz casa! O Senhor seja louvado!
Como o rei Dário, os magistrados parecem ter sido perturbados durante a noite. A notícia do terremoto, ou de que Paulo e Silas eram cidadãos romanos, parece tê-los alcançado. Mas assim que amanheceu, mandaram dizer ao carcereiro que "soltassem aqueles homens". Ele, imediatamente, fez conhecer a ordem a Paulo e Silas, e desejou-lhes que partissem em paz. Mas Paulo se recusou a aceitar sua liberdade sem algum reconhecimento público do erro de que haviam sido vítimas. Ele agora também torna conhecido o fato de que ele e Silas eram cidadãos romanos. As famosas palavras de Cícero tinham se tornado um provérbio, e tinham um imenso peso onde quer que fosse: "Acorrentar um cidadão romano é um ultraje, açoitá-lo é um crime". Os magistrados tinham, evidentemente, violado as leis romanas; mas Paulo só exigiu que, como eles tinham sido publicamente tratados como culpados, os magistrados fossem a público e declarassem que eram inocentes. Isto eles fizeram prontamente, vendo o erro que tinham cometido. "E, vindo, lhes dirigiram súplicas; e, tirando-os para fora, lhes pediram que saíssem da cidade.
E, saindo da prisão, entraram em casa de Lídia e, vendo os irmãos, os confortaram, e depois partiram." (Atos 16:39-40)
Antes de deixarmos este memorável capítulo, devemos apenas acrescentar algo que é muito agradável de se encontrar: na Epístola de Paulo aos Filipenses, as provas de um vínculo que os unia, e que continuou desde "o primeiro dia" até mesmo depois do aprisionamento de Paulo em Roma. Sua afeição pelos amados filipenses era maravilhosa. Ele se dirigiu a eles como "meus amados e mui queridos irmãos, minha alegria e coroa, estai assim firmes no Senhor, amados." (Filipenses 4:1). E ele reconhece, sem poder conter a alegria, sua comunhão incansável com eles no evangelho, e as muitas provas práticas do amável cuidado e carinhosa simpatia que eles tinham por ele. Já em sua residência em Tessalônica eles se lembravam das necessidades do apóstolo. "Porque também uma e outra vez me mandastes o necessário a Tessalônica." (Filipenses 4:16)
PAULO EM TESSALÔNICA E BEREIA
Paulo e Silas agora dirigem seu percurso até Tessalônica. Timóteo e Lucas parecem ter ficado para trás em Filipos por um tempo. Tendo passado através de Anfípolis e Apolônia, Paulo e Silas chegam a Tessalônica. Ali eles encontram uma sinagoga. Era uma cidade comercial de grande importância, onde muitos judeus residiam. "Paulo, como tinha por costume, foi ter com eles; e por três sábados disputou com eles sobre as Escrituras." (Atos 17:2). Os corações de muitos foram tocados por suas pregações, e uma grande multidão de devotos gregos e mulheres da alta sociedade creram. Mas o velho inimigo de Paulo aparece novamente. "Os judeus desobedientes, movidos de inveja, tomaram consigo alguns homens perversos, dentre os vadios e, ajuntando o povo, alvoroçaram a cidade, e assaltando a casa de Jasom, procuravam trazê-los para junto do povo. E, não os achando, trouxeram Jasom e alguns irmãos à presença dos magistrados da cidade, clamando: Estes que têm alvoroçado o mundo, chegaram também aqui; os quais Jasom recolheu; e todos estes procedem contra os decretos de César, dizendo que há outro rei, Jesus." (Atos 17:5-7). Estes versículos devem bastar para nos dar uma ideia do caráter universal dos judeus contra o evangelho e contra Paulo, seu principal ministro.
O apóstolo tinha, evidentemente, pregado aos tessalonicenses a verdade a respeito da exaltação de Cristo e Sua vinda na glória: "Dizendo que há outro rei, Jesus." Daí a constante alusão à vinda do Senhor, e ao "dia do Senhor", nas Epístolas de Paulo àquela igreja. Pelo que diz Paulo em sua primeira Epístola, aprendemos que seus trabalhos foram muito abundantes e grandemente reconhecidos e abençoados pelo Senhor para muitas almas. (1 Tessalonicenses 1:9-10; 2:10-11)
O apóstolo agora procede para a Bereia. Ali os judeus eram mais nobres. Eles examinavam o que ouviam pela Palavra de Deus. Houve uma grande bênção ali também. Muitos creram, mas os judeus, como caçadores após sua presa, apressaram-se de Tessalônica para a Bereia, e levantaram um tumulto que forçou Paulo a deixar o lugar quase imediatamente. Acompanhado por alguns dos bereianos convertidos, ele direcionou seu curso para Atenas. Silas e Timóteo ficaram para trás.
A VISITA DE PAULO A ATENAS
A aparição do apóstolo em Atenas é um evento de grande importância em sua história. Atenas era, em certos aspectos, a capital do mundo, e a sede da cultura e filosofia grega; mas era também o ponto central da superstição e idolatria.
É muito interessante observar que o apóstolo não tinha pressa de começar seu trabalho nesse lugar. Ele concedeu tempo à reflexão. Pensamentos profundos, e o pesar de tudo na presença de Deus e à luz da morte e ressurreição de Cristo, encheram sua mente. Sua primeira intenção era esperar pela chegada de Silas e Timóteo. Ele tinha enviado uma mensagem para Bereia para que eles fossem ter com ele o mais rápido possível. Mas quando ele se viu rodeado de templos, e altares, e estátuas, e adoração idólatra, ele não podia mais ficar em silêncio. Como de costume, ele começa com os judeus, mas também disputa diariamente com os filósofos no mercado: cristianismo e paganismo então se confrontam abertamente entre si; e, vale observar, o apóstolo do cristianismo estava sozinho em Atenas, enquanto o lugar fervilhava de apóstolos do paganismo; e tão numerosos eram os objetos de adoração, que um satirista uma vez observou: "É mais fácil encontrar um deus que um homem em Atenas".
Alguns, com desprezo, ridicularizavam o que ouviam, e outros ouviam e desejavam ouvir mais. "E alguns dos filósofos epicureus e estóicos contendiam com ele; e uns diziam: Que quer dizer este paroleiro? E outros: Parece que é pregador de deuses estranhos; porque lhes anunciava a Jesus e a ressurreição." (Atos 17:18). Estas palavras tinham causado grande impressão, e permaneceram claramente em suas mentes. Que novidade, e que bendita realidade para as almas! A Pessoa de Cristo; não uma teoria: o fato da ressurreição; não uma sombria incerteza quanto ao futuro. O ministro de Cristo desnuda aos estudados atenienses a temerosa condição em que se encontravam sob a visão do verdadeiro Deus.
No entanto, eles desejavam uma exposição mais plena e mais deliberada sobre esses misteriosos assuntos, e levaram Paulo ao Areópago.
Desse lugar, o Areópago, é dito que era o mais conveniente e apropriado para um discurso. A mais solene corte da justiça havia sentado desde tempos imemoriais na colina do Areópago. Os juízes se sentavam ao ar livre sobre assentos escavados na rocha. Nesse local, muitas questões solenes tinham sido discutidas, e muitos casos solenes decididos: começando com o lendário julgamento de Marte, o que deu ao lugar o nome de "colina de Marte".
Foi nesse cenário que Paulo dirigiu-se à multidão. Não há um momento sequer na história do apóstolo, ou na história do começo do cristianismo, mais profundamente interessante ou mais conhecido que este. Inspirado por sentimentos para a honra de Deus, e cheio do conhecimento sobre a condição do homem à luz da cruz, o que deve ter ele sentido enquanto estava na colina de Marte? Para onde quer que voltasse os olhos, os sinais da idolatria em suas milhares de formas se levantavam diante dele. Ele poderia ter sido traído, diante das circunstâncias, a falar com exagerada ousadia; mas ele dominou seus sentimentos, e absteve-se de uma linguagem intemperada. Considerando a fervência de seu espírito, e a grandeza de seu zelo pela verdade, foi um notável exemplo de auto-negação e auto-controle. Mas seu Senhor e Mestre estava com ele, embora para o olho humano ele estivesse sozinho diante dos atenienses e dos muitos estrangeiros que se reuniam naquela universidade do mundo.
Pela sabedoria, prudência, raciocínio claro e perfeita habilidade, o discurso de Paulo se destaca nos anais da história da humanidade. Ele não começou atacando seus falsos deuses, ou denunciando a religião deles como uma ilusão satânica e objeto de seu ódio absoluto. O zelo sem conhecimento teria feito assim, e teria ficado satisfeito com sua própria fidelidade. Mas no discurso que temos diante de nós temos um exemplo da melhor maneira de se aproximar das mentes e corações de pessoas ignorantes e preconceituosas de qualquer idade. Que o Senhor possa dar sabedoria a todos Seus servos para seguir este exemplo!
Suas palavras de abertura são, ao mesmo tempo, vencedoras e reprobatórias:"Homens atenienses, em tudo vos vejo um tanto supersticiosos." (Atos 17:22). Ele, então, começa reconhecendo que eles tinham sentimentos religiosos, mas que estavam na direção errada; e então fala de si como sendo um que estava disposto a conduzi-los ao conhecimento do verdadeiro Deus: "Esse, pois, que vós honrais, não o conhecendo, é o que eu vos anuncio." (Atos 17:23). Ele sabiamente seleciona, para seu texto, a inscrição: "AO DEUS DESCONHECIDO" (Atos 17:23). Isto lhe dá a oportunidade de começar do mais baixo degrau da escada da verdade. Ele fala da unicidade de Deus, o Criador, e da relação do homem com Ele. Mas ele logo deixa o argumento contra a idolatria e procede pregando o evangelho. E ainda assim ele tem o cuidado de não introduzir o nome de Jesus em seu discurso público. Ele tinha tinha feito isso totalmente em suas ministrações mais particulares: mas, estando cercado pelos discípulos e admiradores de nomes como Sócrates, Platão, Zeno e Epícuro, ele sagradamente guarda o santo nome de Jesus do risco de uma comparação com tais. Ele bem sabia que o nome do humilde Jesus de Nazaré era"loucura (bobagem) para os gregos" (1 Coríntios 1:23). No entanto, é fácil observar que, próximo ao fim de seu discurso, a atenção de toda a audiência está concentrada no homem Cristo Jesus, embora Seu nome não seja mencionado em todo o discurso. Então ele procede: "Mas Deus, não tendo em conta os tempos da ignorância, anuncia agora a todos os homens, e em todo o lugar, que se arrependam; porquanto tem determinado um dia em que com justiça há de julgar o mundo, por meio do homem que destinou; e disso deu certeza a todos, ressuscitando-o dentre os mortos." (Atos 17:30-31). Aqui a paciência de sua audiência acabou - seu discurso foi interrompido. Mas a última impressão deixada em suas mentes era de eterno peso e importância. O apóstolo inspirado se dirigiu às consciências, e não à curiosidade intelectual dos filósofos. A menção da ressurreição dos mortos e do julgamento do mundo, com tal poder e autoridade, não podia deixar de perturbar aqueles orgulhosos e auto-indulgentes homens. O princípio essencial, ou o maior objetivo, do filósofo epicureu, era satisfazer a si mesmo; o do estoico era uma orgulhosa indiferença ao bem e ao mal, ao prazer e a dor.
Que dúvidas podemos ter de que essa notável assembleia se desfaria em meio ao escárnio desdenhoso de alguns e à gélida indiferença de outros? Mas, apesar de tudo, o cristianismo tinha ganhado sua primeira e nobre vitória sobre a idolatria e, quaisquer que tenham sido os resultados imediatos do discurso de Paulo, sabemos que tem sido de bênção para muitos desde então, e que ainda trará muitos frutos em muitas almas, e continuará a dar frutos para a glória de Deus sempre e sempre.
Paulo agora se afasta do meio deles. Ele não parece ter sido expulso por qualquer tumulto ou perseguição. O bendito Senhor lhe concedeu provar de Sua própria alegria e da alegria dos anjos quando alguns pecadores contritos o buscaram: "entre os quais foi Dionísio, areopagita, uma mulher por nome Dâmaris, e com eles outros." (Atos 17:34). Mas na cidade militar de Filipos, e nas cidades mercantis de Tessalônica e Corinto, o número de conversões parece ter sido muito maior do que na altamente educada e civilizada cidade de Atenas. Isto é profundamente humilhante para o orgulho do homem, e para os vangloriosos poderes da mente humana. Uma Epístola foi escrita aos filipenses, duas aos tessalonicenses, e duas aos coríntios: mas não temos nenhuma carta escrita por Paulo aos atenienses, e não lemos de ter ele outra vez visitado Atenas.
A VISITA DE PAULO A CORINTO
A conexão de Corinto com a história, com os ensinos e com os escritos de nosso apóstolo é quase tão íntima e importante quanto Jerusalém ou Antioquia. Corinto pode ser considerada seu centro na Europa. Aqui Deus teve "muito povo" (Atos 18:10), e aqui Paulo "ficou um ano e seis meses, ensinando entre eles a palavra de Deus." (Atos 18:11). Foi também em Corinto que ele escreveu suas duas primeiras cartas apostólicas - as duas Epístolas aos Tessalonicenses.
Corinto, a capital romana da Grécia, era uma grande cidade mercantil, em conexão imediata com Roma e com o oeste do Mediterrâneo, com Tessalônica e Éfeso no Mar Egeu, e com a Antioquia e Alexandria a leste. Assim, por meio de seus dois notáveis portos, a cidade recebia embarcações tanto dos mares ocidentais quanto dos mares orientais.
Paulo parece ter viajado sozinho a Corinto. Se Timóteo foi ter com ele quando em Atenas (1 Tessalonicenses 3:1), ele foi enviado de volta a Tessalônica, lugar pelo qual, como veremos em breve, Paulo tinha grande afeição no coração. Logo após sua chegada ele inesperadamente encontrou dois amigos e companheiros na obra: Áquila e sua esposa Priscila. Nesta época em particular deveria haver um número maior de judeus em Corinto do que o normal, "pois Cláudio tinha mandado que todos os judeus saíssem de Roma." (Atos 18:2)
O Senhor usou, assim, o banimento de Áquila e Priscila para fornecer um lugar para Seu solitário servo ficar. Eles eram da sua terra (Israel), do seu mesmo ramo de negócio, e do mesmo coração e espírito. "E, como era do mesmo ofício, ficou com eles, e trabalhava; pois tinham por ofício fazer tendas."(Atos 18:3)
Quão graciosos e maravilhosos são os caminhos do Senhor para Seu servo. Em uma cidade de riqueza e comércio cercada de gregos nativos, colonos romanos, e judeus vindos de todos os cantos, ele trabalha silenciosamente em seu próprio comércio de modo a não ser um incômodo para nenhum deles. Aqui temos, de certo modo, um exemplo da mais profunda e elevada espiritualidade combinada com o trabalho diligente nas coisas comuns desta vida. Que exemplo! E que lição! Sua labuta diária não gerava impedimento à sua comunhão com Deus. Nunca ninguém conheceu tão bem, ou sentiu tão profundamente, o valor do evangelho que ele carregava consigo:as questões da vida e da morte estavam ligadas a isso, e mesmo assim ele podia se entregar ao trabalho comum. Mas isto ele fez, assim como a pregação, para o Senhor e para Seus santos. Ele frequentemente se refere a isto em suas Epístolas, e fala disso como um de seus privilégios: "E em tudo me guardei de vos ser pesado, e ainda me guardarei. Como a verdade de Cristo está em mim, esta glória não me será impedida nas regiões da Acaia." (2 Coríntios 11:9,10)
A decisão do apóstolo de não ser pesado aos santos, como aqui tão fortemente expressa, se aplica principalmente, se não exclusivamente, à igreja de Corinto. Um importante princípio estava envolvido, mas foi um princípio de particular aplicação ao caso, e não geral. Ele reconhece as dádivas das outras igrejas da maneira mais grata possível (Filipenses 4) e, ao escrever aos coríntios mais tarde, ele diz: "Outras igrejas despojei eu para vos servir, recebendo delas salário; e quando estava presente convosco, e tinha necessidade, a ninguém fui pesado. Porque os irmãos que vieram da macedônia supriram a minha necessidade" (2 Coríntios 11:8,9). O apóstolo, sem dúvida, tinha a melhor das razões para recusar, dessa maneira, a comunhão com a igreja em Corinto. Sabemos que havia "falsos apóstolos" e muitos inimigos lá, e que muitas perturbações graves e sérias tinham sido permitidas entre eles, as quais ele fortemente repreendeu e procurou corrigir. Sob tais circunstâncias, para que seus motivos não fossem mal interpretados, o apóstolo preferiu trabalhar com suas próprias mãos do que receber apoio da igreja em Corinto. E, "Por quê?", ele pergunta, "Porque não vos amo? Deus o sabe. Mas o que eu faço o farei, para cortar ocasião aos que buscam ocasião, a fim de que, naquilo em que se gloriam, sejam achados assim como nós” (2 Coríntios 11:11-12). }
Há outra coisa relacionada a esta característica do percurso do apóstolo que é de grande interesse. Acredita-se, em geral, que ele tenha escrito suas duas epístolas aos tessalonicenses mais ou menos nessa época, e alguns pensam que também a Epístola aos Gálatas. Estas permanecem diante de nós como verdadeiras testemunhas de sua proximidade com Deus e sua comunhão com Ele, enquanto se mantinha com o trabalho de suas próprias mãos. Mas quando chega o sábado de descanso, a oficina é fechada, e Paulo vai à sinagoga. Este era seu hábito. "E todos os sábados disputava na sinagoga, e convencia a judeus e gregos" (Atos 18:4). Mas enquanto Paulo estava ocupado, tanto nos dias de semana quanto nos sábados, Silas e Timóteo chegaram da Macedônia.
É evidente que eles trouxeram consigo alguma ajuda que iria ajudar a suprir as necessidades do apóstolo naquele tempo, e assim aliviá-lo de tal trabalho constante.
A chegada de Silas e Timóteo parece ter encorajado e fortalecido o apóstolo. Seu zelo e energia no evangelho são evidentemente fortalecidos. Ele "foi impulsionado no espírito, testificando aos judeus que Jesus era o Cristo." (Atos 18:5), mas eles se opuseram à sua doutrina e blasfemaram. Isto levou Paulo a tomar seu curso com grande ousadia e decisão. Ele sacode a roupa, como sinal de estar limpo do sangue deles, e declara que dali em diante passará a tratar com os gentios. Em tudo isto ele foi conduzido por Deus, e agiu de acordo com Sua mente. Enquanto era possível, ele pregava na sinagoga; mas quando ele não mais podia estar lá, foi compelido a usar o lugar mais conveniente que ele podia encontrar. Em Éfeso, ele pregou na escola de um tal de Tirano; em Roma, ele "ficou dois anos inteiros na sua própria habitação que alugara, e recebia todos quantos vinham vê-lo;" (Atos 28:30); e aqui, em Corinto, um prosélito chamado Justo abriu sua casa ao rejeitado apóstolo.
Nessa particular crise na história do apóstolo ele foi favorecido com outra revelação especial do próprio Senhor. "E disse o Senhor em visão a Paulo: Não temas, mas fala, e não te cales; porque eu sou contigo, e ninguém lançará mão de ti para te fazer mal, pois tenho muito povo nesta cidade. E ficou ali um ano e seis meses, ensinando entre eles a palavra de Deus." (Atos 18:9-11). Porém, novamente, seus implacáveis inimigos se enfurecem. O grande sucesso do evangelho entre os pagãos excitou a raiva dos judeus contra Paulo, que procuraram usar a vinda de Gálio, um novo governador, para realizar suas más intenções.
Gálio foi o irmão de Sêneca, o filósofo, e, como tal, era muito bem instruído. Ele era sábio, justo e tolerante como governador, embora desdenhoso em seu tratamento com as coisas sagradas. Mas o Senhor, que estava com Seu servo como Ele mesmo tinha dito, usou a incrédula indiferença de Gálio para derrotar os maliciosos desígnios dos judeus, e para virar suas falsas acusações contra eles mesmos. Como estavam frustrados em seus propósitos malignos, o apóstolo tinha maior liberdade e menos aborrecimento ao levar em frente a obra do evangelho. Seus benditos frutos logo se manifestaram por toda a província da Acaia (1 Tessalonicenses 1:8,9)
A RÁPIDA VISITA DE PAULO A ÉFESO
O momento chegou em que Paulo achou por bem deixar Corinto e revisitar Jerusalém. Ele tinha um grande desejo de estar na próxima festa. Mas antes de partir, recebeu uma solene despedida da jovem assembleia, prometendo (o Senhor permitindo) retornar.
Acompanhado de Áquila e Priscila, ele deixa Corinto em paz. Mas quando no porto, antes da partida, aconteceu uma cerimônia que levantou não pouca discussão. Paulo, estando sob um voto, raspa sua cabeça em Cencreia. Em sua própria mente, e como um que era guiado pelo Espírito, temos certeza de que ele estava muita acima e além de uma religião de festas e votos, mas mesmo assim, inclinou-se, em graça, aos costumes de sua nação. Aos judeus ele se torna um judeu. A constante oposição dos judeus à sua doutrina e a violenta perseguição nunca enfraqueceram as afeições do apóstolo para com seu amado povo: certamente tal proceder vinha de Deus. Enquanto ele procurava, na energia do Espírito, pregar o evangelho aos gentios, ele nunca esquecia, em fidelidade à palavra de Deus, de pregar aos judeus primeiro.
Assim ele é para nós como a viva expressão da graça de Deus para com os gentios, e de suas remanescentes afeições para com os judeus.
A equipe missionária chega a Éfeso. Paulo vai à sinagoga e debate com os judeus. Eles parecem inclinados a ouvi-lo, mas ele tem um forte desejo de subir a Jerusalém e celebrar a festa que se aproxima. Assim ele "se despediu deles, dizendo: É-me de todo preciso celebrar a solenidade que vem em Jerusalém; mas querendo Deus, outra vez voltarei a vós. E partiu de Éfeso." (Atos 18:21)
A QUARTA VISITA DE PAULO A JERUSALÉM
Não nos são fornecidas quaisquer informações, pelos historiadores sagrados, sobre o que ocorreu em Jerusalém naquela ocasião. Apenas nos é dito que Paulo "subiu a Jerusalém e, saudando a igreja, desceu a Antioquia." (Atos 18:22). Mas seu intenso desejo de fazer esta visita pode nos assegurar sua grande importância. Ele pode ter sentido que  tinha chegado a hora quando os judeus cristãos, reunidos na festa, deveriam ouvir um relato completo da recepção do evangelho entre os gentios. Colônias romanas e capitais gregas tinham sido visitadas, e uma grande obra de Deus tinha sido cumprida. Tudo isto teria sido perfeitamente natural e correto, mas desejamos não remover o véu que o Espírito Santo colocou sobre essa visita.
Paulo desce de Jerusalém à Antioquia, visitando todas as assembleias que ele tinha inicialmente formado; e assim, de certo modo, unindo sua obra: Antioquia e Jerusalém. Até onde sabemos, foi a última visita de Paulo à Antioquia. Já vimos como novos centros de vida cristã tinham sido estabelecidos por ele nas cidades gregas do Egeu. O curso do evangelho segue cada vez mais para o Ocidente, e a parte inspirada da biografia do apóstolo, após um curto período de profundo interesse na Judeia, finalmente se centraliza em Roma.
O RETORNO DE PAULO À ANTIOQUIA
Após uma jornada que se estendeu em um espaço de três ou quatro anos, nosso apóstolo retorna à Antioquia. Ele tinha viajado um longo circuito, e disseminado o cristianismo em muitas cidades prósperas e populosas, quase que inteiramente por seus próprios esforços. Se o leitor deseja manter interesse na história de Paulo, deve notar clara e distintamente as grandes épocas na vida de Paulo, e os principais pontos em suas diferentes jornadas. Mas antes de começar com Paulo em sua terceira jornada missionária, pode ser interessante tomar nota de um outro grande pregador do evangelho que aparece exatamente neste momento, e cujo nome, ao lado do apóstolo, é talvez o mais importante na história do início da igreja (N. do T., tirando o nome do próprio Senhor).
Apolo era um judeu de nascença, natural da Alexandria. Ele era um "homem eloquente e poderoso nas Escrituras ... conhecendo somente o batismo de João" (Atos 18:24,25). Ele era devoto, sincero e reto, publicamente confessando e pregando aquilo que conhecia, e o poder do Espírito Santo era manifesto nele. Não parece que ele tenha recebido qualquer designação, ordenação ou sanção de qualquer tipo, nem dos doze nem de Paulo. Mas o Senhor, que está acima de todos, o chamou, e estava agindo nele e por ele. Vemos assim, no caso de Apolo, a manifestação do poder e liberdade do Espírito Santo, sem a intervenção humana. É interessante observar isto. A ideia de um clericalismo exclusivo é a negação prática da liberdade do Espírito em agir por quem Ele quer. Mas embora ardente em zelo e um locutor poderoso, Apolo conhecia apenas o que João (o batista) tinha ensinado a seus discípulos. O Senhor sabia disto, e proveu mestres para ele. Dentre aqueles que ouviam a seus fervorosos apelos, dois dos bem instruídos discípulos de Paulo foram conduzidos a tomar um interesse especial por ele. E embora ela fosse ensinado e eloquente, ele era humilde o bastante para ser instruído por Áquila e Priscila. Eles o convidaram à sua casa e, sem dúvida, em espírito humilde, "lhe declararam mais precisamente o caminho de Deus" (Atos 18:26). Que simples! Que natural! E que belo! Tudo é do Senhor. Ele ordenou que Áquila e Priscila fossem deixados em Éfeso - que Apolo deveria vir e animar o povo em Éfeso antes da chegada de Paulo; e, após ser instruído, que deveria ir a Corinto e ajudar na boa obra naquele lugar, obra esta iniciada por Paulo. Apolo regou o que Paulo tinha plantado, e Deus deu um aumento abundante. Tais são os benditos caminhos do Senhor em Seu pensativo amor e carinhoso cuidado por Seus servos, e por todas as Suas assembleias.
A TERCEIRA VIAGEM MISSIONÁRIA DE PAULO
(POR VOLTA DE 54 D.C.)
Tendo passado "algum tempo" na Antioquia, Paulo deixa o centro gentio e parte para outra viagem missionária. Nada é dito sobre seus companheiros nesta ocasião. Ele" passou sucessivamente pela província da Galácia e da Frígia, confirmando a todos os discípulos" (Atos 18:23), e também dando instruções para a coleta em favor dos santos pobres em Jerusalém (1 Coríntios 16:1,2). Em pouco tempo ele chegou ao centro de sua obra na Ásia.
Éfeso. Nesta época era a maior cidade da Ásia Menor, e a capital da província. Devido à sua posição central, era o ponto de encontro comum de várias personagens e classes de homens. Por esta altura, Apolo tinha partido para Corinto, mas ainda havia outros doze discípulos de João em Éfeso. Paulo fala com eles sobre seu estado e posição. Devemos tomar uma rápida nota do que ocorreu.
O batismo de João requeria o arrependimento, mas não a separação da sinagoga judaica. O evangelho ensina que o cristianismo é fundamentado na morte e ressurreição. O batismo cristão é um símbolo significativo e expressivo dessas verdades. "Sepultados com ele no batismo, nele também ressuscitastes pela fé no poder de Deus, que o ressuscitou dentre os mortos." (Colossenses 2:12) Como esses homens eram inteiramente ignorantes sobre as verdades fundamentais do cristianismo, supomos que eles nunca tinham se misturado com cristãos. O apóstolo, sem dúvida, explicou para eles sobre a eficácia da morte e ressurreição de Cristo, e sobre a descida do Espírito Santo. Eles creram na verdade e receberam o batismo cristão. Então Paulo, por sua capacitação apostólica, impõe suas mãos sobre eles, e eles são selados com o Espírito Santo, "e falavam línguas, e profetizavam" (Atos 19:6).
Imediatamente após a menção desse importante acontecimento, nossa atenção é direcionada às obras do apóstolo na sinagoga. Durante três meses ele pregou a Cristo ousadamente lá, disputando e persuadindo seus ouvintes "acerca do reino de Deus."(Atos 19:8). Os corações de alguns "se endureceram", enquanto outros se arrependeram e creram; mas enquanto muitos dos judeus tomaram o lugar dos adversários, e "falaram mal do Caminho perante a multidão" (Atos 19:9), Paulo age da forma mais definitiva possível. Ele "separou os discípulos" da sinagoga judaica e deles formou uma nova assembleia, se reunindo com eles "diariamente na escola de um certo Tirano" (Atos 19:9).
Este é um ato profundamente interessante e instrutivo por parte do apóstolo, mas ele age conscientemente no poder e na verdade de Deus. A igreja em Éfeso é agora perfeitamente distinta, tanto em relação aos judeus quanto em relação aos gentios. Aqui vemos ao que o apóstolo, em outro lugar, se refere em sua exortação: "Portai-vos de modo que não deis escândalo nem aos judeus, nem aos gregos, nem à igreja de Deus." (1 Coríntios 10:32). Onde esta importante distinção não é vista haverá grande confusão de pensamento tanto quanto à Palavra quanto aos caminhos de Deus.
O apóstolo agora aparece como o instrumento do poder de Deus de forma notável e marcante. Ele comunica o Espírito Santo aos doze discípulos de João, separa os discípulos de Jesus e formalmente funda a igreja em Éfeso. Seu testemunho ao Senhor Jesus é ouvido em toda a Ásia, tanto pelos judeus quanto pelos gregos; milagres extraordinários são operados por suas mãos e enfermidades fugiam de muitos apenas ao tocar a borda de suas vestes. O poder do inimigo desaparece diante do poder que está em Paulo; as consciências dos pagãos são alcançadas, e o domínio do inimigo sobre eles se vai. O medo caiu sobre muitos que "seguiam artes mágicas", e eles mesmos queimaram seus livros de magia que, no total, custariam hoje em dia cerca de R$1.300.000,00. "Assim a palavra do Senhor crescia poderosamente e prevalecia." (Atos 19:20). Assim o poder do Senhor foi demonstrado na pessoa e na missão de Paulo, e seu apostolado estabelecido de forma inquestionável.
O apóstolo havia agora passado cerca de três anos de incessante trabalho em Éfeso. E ele mesmo diz, ao se dirigir aos anciãos em Mileto: "Portanto, vigiai, lembrando-vos de que durante três anos, não cessei, noite e dia, de admoestar com lágrimas a cada um de vós." (Atos 20:31).
É também suposto que, durante este período, ele tenha feito uma rápida visita e tenha escrito a Primeira Epístola aos Coríntios.
O TUMULTO EM ÉFESO
Um grande e abençoado trabalho tinha agora sido cumprido pela poderosa energia do Espírito de Deus, por meio de Seu servo escolhido, Paulo. O evangelho tinha sido pregado na capital da Ásia, e tinha sido espalhado por toda a província. O apóstolo agora sentia que seu trabalho tinha terminado ali, e planeja ir a Roma, a capital do Ocidente e metrópole do mundo. A Grécia e a Macedônia já tinham recebido o evangelho, mas ainda faltava Roma. "E, cumpridas estas coisas, Paulo propôs, em espírito, ir a Jerusalém, passando pela Macedônia e pela Acaia, dizendo: Depois que houver estado ali, importa-me ver também Roma." (Atos 19:21)
Mas enquanto Paulo fazia os arranjos para a próxima viagem, o inimigo planejava um novo ataque. Seus recursos ainda não tinham sido esgotados. Demétrio excita a multidão ignorante contra os cristãos. Um grande tumulto começa, sendo as paixões dos homens despertadas contra os instrumentos do testemunho de Deus. Os oficiais de Demétrio levantaram o clamor de que não somente a profissão deles corria perigo, como também que o templo da grande deusa Diana corria o risco de ser desprezado. Quando a multidão ouviu essas coisas, se encheram de raiva e gritaram, dizendo:"Grande é a Diana dos efésios." (Atos 19:28). A cidade inteira estava agora imersa em confusão, mas Paulo misericordiosamente - pelos seus irmãos, e por alguns dos principais governantes da Ásia que eram seus amigos - se abstém de comparecer ao teatro.
Os judeus evidentemente começaram a temer que a perseguição se voltasse contra eles, pois a maioria das pessoas não sabia com que propósito tinham ali se ajuntado. Eles, então, põem um certo Alexandre diante da multidão, provavelmente com a intenção de transferir a atenção para cima dos cristãos; mas no momento em que os pagãos descobriram que ele era um judeu, a fúria deles aumentou: o grito de guerra foi novamente levantado, e por duas horas inteiras as pessoas gritavam: "Grande é a Diana dos efésios.". Felizmente, para todas as partes, o escrivão da cidade era um homem de grande tato e admirável política. Ele acalmou e dissolveu a aglomeração. Mas, para a fé, era Deus usando a eloquência persuasiva de um oficial pagão para proteger Seus servos e Seus muitos filhos que estavam ali.
O tão afamado templo de Diana foi contado pelos antigos como uma das maravilhas do mundo; o sol, diziam, não via nada em seu curso mais magnífico que o templo de Diana. Era construído com o mais puro mármore, e levou 220 anos para ser terminado. Mas com a disseminação do cristianismo, se afundou em decadência, e quase nada dele agora sobrou para nos mostrar como era. O comércio de Demétrio era a confecção de pequenos modelos em prata do santuário da deusa. Estes eram colocados nas casas, guardados em memoriais e carregados em viagens. Mas como a introdução do cristianismo necessariamente afetou as vendas desses modelos, os artesãos pagãos foram instigados por Demétrio a levantar um clamor popular em favor de Diana contra os cristãos.
A PARTIDA DE PAULO DE ÉFESO PARA A MACEDÔNIA
Atos 20. Após o tumulto ter cessado, o perigo acabado e os manifestantes dispersos, Paulo se despede dos discípulos, os abraça, e parte para a Macedônia. Dois dos irmãos efésios, Tíquico e Trófimo, parecem tê-lo acompanhado, mantendo-se fiéis a ele em meio a todas as suas aflições. Eles são mencionados com frequência, e inclusive aparecem no último capítulo de sua última epístola, em 2 Timóteo 4.
O historiador sagrado é extremamente breve em seu registro sobre o proceder de Paulo neste momento. Toda a informação que ele dá é comprimida nas seguintes palavras: "Saiu para a macedônia. E, havendo andado por aquelas terras, exortando-os com muitas palavras, veio à Grécia. E, passando ali três meses..." (Atos 20:1-3). É geralmente suposto que essas poucas palavras abrangem um período de nove ou dez meses - do começo do verão de 57 d.C. até a primavera de 58 d.C. Mas esta falta de informação é, felizmente, suprida nas cartas do apóstolo. Aquelas que foram escritas durante essa jornada nos suprem com vários detalhes históricos e, o que é melhor, elas nos dão, da sua própria caneta, uma imagem viva dos profundos e dolorosos exercícios da mente e do coração pelas quais ele estava passando.
Parece que Paulo tinha combinado de se encontrar com Tito em Trôade, que lhe traria notícias direto de Corinto sobre o estado das coisas por lá. Mas semana após semana se passou, e Tito não aparecia. Sabemos alguma coisa sobre as obras dessa grande mente e coração nesse tempo pelo que ele mesmo diz: "Ora, quando cheguei a Trôade para pregar o evangelho de Cristo, e abrindo-se-me uma porta no Senhor, não tive descanso no meu espírito, porque não achei ali meu irmão Tito; mas, despedindo-me deles, parti para a macedônia." (2 Coríntios 2:12,13). Sua ansiedade pessoal, no entanto, não o impediu de ir em frente com a grandiosa obra do evangelho. Isto é evidente nos versículos de 14 a 17.
Finalmente o há muito esperado Tito chega à Macedônia, provavelmente em Filipos. E agora a mente de Paulo é aliviada e seu coração confortado. Tito lhe traz melhores notícias de Corinto do que ele esperava ouvir. A reação é manifesta: ele se enche de louvor a Deus: "Grande é a ousadia da minha fala para convosco", diz ele, "grande a minha jactância a respeito de vós; estou cheio de consolação; transbordo de gozo em todas as nossas tribulações. Porque, mesmo quando chegamos à macedônia, a nossa carne não teve repouso algum; antes em tudo fomos atribulados: por fora combates, temores por dentro. Mas Deus, que consola os abatidos, nos consolou com a vinda de Tito." (2 Coríntios 7:4-6)
Logo após isso, Paulo escreve sua Segunda Epístola aos Coríntios, que descobrimos ser dirigida não apenas a eles, mas a todas as igrejas em toda a Acaia. Todas elas podiam ter sido mais ou menos afetadas pela condição das coisas em Corinto. Tito é novamente o servo voluntário do apóstolo, não apenas como portador da segunda carta à igreja em Corinto, mas também tendo um papel especial nas coletas que eles faziam para os pobres. Paulo não apenas dá a Tito estritas instruções sobre as coletas, como também escreve dois capítulos sobre o assunto (capítulos 8 e 9), embora este fosse mais o trabalho de diáconos do que de apóstolos. Mas, como tinha dito ele em resposta à sugestão de Tiago, Cefas e João, de que ele deveria se lembrar dos pobres -"Recomendando-nos somente que nos lembrássemos dos pobres, o que também procurei fazer com diligência." (Gálatas 2:10)
O espaço que o apóstolo dedica aos assuntos relacionados às coletas para os pobres é notável e merece nossa cuidadosa consideração. Pode ser que alguns de nós tenhamos ignorado este fato até agora. Observe, por exemplo, o que ele diz de uma igreja em particular. Temos boas razões para acreditar que os filipenses, desde o começo, se importavam com o apóstolo - eles o pressionaram a aceitar suas contribuições para ajudá-lo, desde sua primeira visita a Tessalônica até seu aprisionamento em Roma, além de sua generosidade para com os outros (2 Coríntios 8:1-4). Mas alguns podem imaginar, a partir disso, que eles eram uma igreja rica. Pelo contrário. Paulo nos diz:"Como em muita prova de tribulação houve abundância do seu gozo, e como a sua profunda pobreza abundou em riquezas da sua generosidade." (2 Coríntios 8:2). Eles doavam com tanta generosidade o que tinham de sua própria pobreza.
O que os filipenses são nas Epístolas, a viúva pobre é nos Evangelhos - duas moedinhas era tudo o que ela tinha. Ela podia ter dado uma e ficado com a outra; mas ela tinha um coração não dividido, e ela deu as duas. Ela, também, deu o que tinha de sua pobreza, e onde quer que o evangelho seja pregado por todo o mundo, essas coisas hão de ser contadas como um memorial da generosidade deles.
Após Paulo ter enviado a Tito e os que estavam com ele com a Epístola, ele permaneceu "naquelas partes" da Grécia fazendo a obra de um evangelista. Sua mente, no entanto, almejava fazer uma visita pessoal aos coríntios. Mas ele concedeu tempo para que sua carta produzisse seus próprios efeitos sob a bênção de Deus. Um dos objetivos do apóstolo era preparar o caminho para seu ministério pessoal entre eles. É comum o pensamento de que foi durante este período que ele pregou plenamente o evangelho de Cristo aos arredores até o Ilírico (Romanos 15:19). É provável que ele tenha alcançado Corinto no inverno, de acordo com sua expressa intensão: "E bem pode ser que fique convosco, e passe também o inverno" (1 Coríntios 16:6). Lá ele ficou por três meses.
Todos estão de acordo, podemos dizer, que foi durante esses meses de inverno que ele escreveu sua grande Epístola aos Romanos. Alguns dizem que ele também escreveu sua Epístola aos Gálatas neste mesmo período. Mas há grande diversidade de opiniões entre os cronologistas sobre este ponto. Pela ausência de nomes e saudações, como temos na Epístola aos Romanos, é difícil determinar sua data. Mas se ela não foi escrita neste tempo em particular, mesmo assim devemos mencioná-la mais cedo, e não mais tarde. O apóstolo ficou surpreso pelo antecipado abandono da verdade."Maravilho-me", diz ele, "de que tão depressa passásseis daquele que vos chamou à graça de Cristo para outro evangelho" (Gálatas 1:6). Seu grande desapontamento é manifesto no calor do espírito no qual escreve essa Epístola.
Mas devemos retornar à história do nosso apóstolo: não nos adentraremos mais a fundo nas sutilezas da cronologia. Mas após compararmos as últimos escritos, relataremos o que acreditamos serem as datas mais confiáveis.
PAULO DEIXA CORINTO
A obra do apóstolo tinha agora sido terminada em Corinto, e ele se prepara para ir embora. Sua mente se inclinava a ir a Roma, mas havia uma missão de caridade em seu coração a qual ele devia acatar primeiro. Somos favorecidos com suas próprias palavras sobre esses diferentes pontos: "Mas agora, que não tenho mais demora nestes sítios, e tendo já há muitos anos grande desejo de ir ter convosco, quando partir para Espanha irei ter convosco; pois espero que de passagem vos verei, e que para lá seja encaminhado por vós, depois de ter gozado um pouco da vossa companhia. Mas agora vou a Jerusalém para ministrar aos santos. Porque pareceu bem à macedônia e à Acaia fazerem uma coleta para os pobres dentre os santos que estão em Jerusalém."
(Romanos 15:23-26). Quanto à sequência de nomes em Atos 20:4 - Sópater, Aristarco, Segundo, Gaio, Tíquico e Trófimo - supõe-se que sejam irmãos que tinham em mãos as coletas que tinham sido feitas nos diferentes lugares mencionados. Em vez de velejar direto para a Síria, ele rodeia a Macedônia, por causa dos judeus que estavam à espreita. Seus companheiros o esperavam em Trôade. Lá ele passou o dia do Senhor (domingo) e uma semana inteira, a fim de ver os irmãos.
Devemos observar brevemente o que aconteceu nesse estágio de sua jornada. Duas coisas, de imensa importância para os cristãos, estão ligadas a isso - o dia do Senhor e a Ceia do Senhor. O historiador, que estava com Paulo nesse tempo, entra com incomum minúcia sobre os detalhes daquele dia.
É evidente, a partir desta incidental observação, que era o estabelecido costume dos primeiros cristãos se reunirem no "primeiro dia da semana" com a compreendida finalidade do "partir o pão". Temos aqui o principal objetivo e o momento normal da reunião deles. "E no primeiro dia da semana, ajuntando-se os discípulos para partir o pão" (Atos 20:7; Veja também 1 Coríntios 16:2,João 20:19, Apocalipse 1:10). Mesmo o discurso do apóstolo, precioso como era, é mencionado como algo secundário. A lembrança do amor do Senhor ao morrer por nós, e tudo aquilo que Ele nos deu ao ressuscitar, era, e continua sendo, o principal. Se houver uma oportunidade também para o ministério da Palavra, assim como para reunir os pensamentos e afeições dos adoradores de Cristo, é bom que haja; mas o partimento do pão deve ser a primeira consideração, e o principal objetivo da assembleia. A celebração da Ceia do Senhor nessa ocasião foi à noite. No início, o partimento do pão também era observado em alguns lugares antes do amanhecer, e em outros, após o pôr do sol. Mas aqui os discípulos não eram obrigados a se reunirem em segredo. "E havia muitas luzes no cenáculo onde estavam juntos."(Atos 20:8). E Paulo continuou sua fala até a meia-noite, pois deveria partir no dia seguinte. Foi uma ocasião extraordinária, e Paulo aproveita a oportunidade de conversar com eles a noite toda. Ainda não havia chegado o tempo, como disse alguém, em que os ternos discursos do coração seriam cronometrados, quando a duração da ardente agonia do pregador pelas almas perdidas seria contada no relógio pela frieza dos meros professos, ou pela descuidada indiferença dos cristãos mundanos. Êutico, um rapaz, caiu no sono e "caiu do terceiro andar... e foi levantado morto." (Atos 20:9). Isto foi visto por alguns como um castigo pela sua falta de atenção, mas foi um milagre; o rapaz foi levantado de um estado de morte pelo poder e bondade de Deus através de Seu servo Paulo, e todos ficaram grandemente reconfortados.
PAULO EM MILETO
O estágio mais importante dessa jornada é Mileto, embora os diferentes lugares em que eles passam sejam cuidadosamente notados pelo historiador sagrado. Paulo, estando cheio do Espírito, dá direções para a viagem. Seus companheiros, de bom grado, lhe obedecem, mas não como a um mestre, mas como a um que dirige na humildade do amor e na sabedoria de Deus. Ele decide não ir a Éfeso, embora fosse um lugar central, pois ele tinha o propósito no coração de ir a Jerusalém no dia de Pentecostes. Mas, como o navio viria a ser detido algum tempo em Mileto, ele envia uma carta aos anciãos da igreja em Éfeso para poderem se encontrar. Dizem que a distância entre os dois lugares é de cerca de 48 quilômetros, de modo que levaria dois ou três dias para ir e voltar. Mesmo assim, tiveram tempo suficiente para se reunirem antes do navio sair. Assim o Senhor pensa em Seus servos e faz com que todas as coisas cooperem para o bem e para Sua própria glória.
O discurso de despedida de Paulo aos anciãos de Éfeso é característico e representativo, exigindo nosso mais cuidadoso estudo. Ele põe diante de nós a profunda e tocante afeição do apóstolo, a posição da igreja naquele tempo, e a obra do evangelho entre as nações. Ele os exorta com incomum seriedade e ternura; ele sentia que estava se dirigindo a eles pela última vez; ele os lembra de seus trabalhos entre eles "servindo ao Senhor com toda a humildade, e com muitas lágrimas"(Atos 20:19). Ele os adverte contra os falsos mestres e heresias - os lobos cruéis que entrariam no meio deles, e os homens amantes de si mesmos que se ergueriam, falando coisas perversas, para atraírem os discípulos após si."E, havendo dito isto, pôs-se de joelhos, e orou com todos eles. E levantou-se um grande pranto entre todos e, lançando-se ao pescoço de Paulo, o beijavam, entristecendo-se muito, principalmente pela palavra que dissera, que não veriam mais o seu rosto. E acompanharam-no até o navio." (Atos 20:36-38)
Como este pensamento sobre Paulo é da mais elevada importância, e marca uma época distinta na história da igreja, além de lançar luz divina sobre todos os sistemas eclesiásticos, podemos citar um pensamento abrangente e compreensivo de outro autor:
"A igreja estava consolidada sobre uma extensa área do território, e em vários lugares tinha tomado a forma de uma instituição comum. Anciãos eram estabelecidos e reconhecidos. O apóstolo podia chamá-los para ter com ele. Sua autoridade era também reconhecida por parte deles. Ele fala de seu ministério como algo passado - solene pensamento!...
Assim, o que o Espírito Santo coloca diante de nós é que, agora, quando os detalhes de sua obra entre os gentios de plantar o evangelho são relatados como um panorama entre judeus e gentios, ele diz adeus ao trabalho. Isto para que pudesse deixar aqueles que ele havia reunido em uma nova posição e, em certo sentido, entregues a si mesmos. É um discurso que marca a cessação de uma fase da igreja - a dos trabalhos apostólicos - e a entrada de uma outra: a responsabilidade da igreja de manter-se firme agora que esses trabalhos tinham cessado; o serviço dos anciãos, a quem 'o Espírito Santo constituiu supervisores (bispos)' (Atos 20:28); e, ao mesmo tempo, os perigos e dificuldades que se seguiriam após o fim dos trabalhos apostólicos, complicando o trabalho dos anciãos, a quem a responsabilidade recairia especialmente.
"A primeira observação que decorre da consideração deste discurso é que a sucessão apostólica é inteiramente negada. Devido à ausência do apóstolo, várias dificuldades surgiriam, e não haveria ninguém em seu lugar para lidar ou prevenir estas dificuldades. Sucessor, portanto, ele não tinha. Em segundo lugar, parece que o fato de que esta energia, que freava o espírito do mal, uma vez que estivesse longe,faria erguer as cabeças dos lobos devoradores vindos de fora, e dos mestres de coisas perversas vindos de dentro, que atacariam a simplicidade e a felicidade da igreja. Esta seria assediada pelos esforços de satanás, uma vez que não possuía mais a energia apostólica para resistir-lhes. Em terceiro lugar, o que de primordial deveria ser feito para o impedimento do mal era alimentar o rebanho, e vigiar, quer sobre si mesmos ou sobre o rebanho, para aquele propósito. Ele então os encomenda - nem a Timóteo nem a algum bispo, mas de um modo que deixa de lado qualquer tipo de recurso oficial - a Deus e à palavra de Sua graça. Nesse ponto ele deixa a igreja. Os trabalhos em liberdade do apóstolo dos gentios estavam terminados. Ele tinha sido o instrumento escolhido de Deus para comunicar ao mundo Seus conselhos a respeito da igreja e para estabelecer na mente do mundo o precioso objeto de Suas afeições, unida a Cristo à Sua mão direita. O que seria dela aqui?"
Atos 21. Com um vento justo, Paulo e sua companhia partiam de Mileto, enquanto os entristecidos anciãos de Éfeso se preparavam para sua viagem de volta. Em um curso reto eles velejaram a Cós, Rodes, e daí até Pátara e Tiro. A partir do que aconteceu lá - tão similar ao que houve em Mileto - é evidente que Paulo logo conquistou o coração dos discípulos. Embora ele tenha ficado apenas uma semana em Tiro, não conhecendo os cristãos dali, ele tinha ganhado suas afeições. "E seguimos nosso caminho, acompanhando-nos todos", diz Lucas, "com suas mulheres e filhos até fora da cidade; e, postos de joelhos na praia, oramos." (Atos 21:5). Parece também que um espírito de profecia foi derramado sobre esses afetuosos cristãos de Tiro, pois eles advertiram o apóstolo para que não fosse a Jerusalém. Após esperar ali por sete dias, foram a Ptolemaida, onde ficaram por um dia.
Em Cesareia, ficaram hospedados na casa de Filipe, o evangelista, que era um dos sete. Ele também já é bem conhecido nosso, mas é interessante encontrá-lo novamente após um intervalo de mais de vinte anos. Agora ele tem quatro filhas virgens que profetizavam. Aqui Ágabo, o profeta, previu o aprisionamento de Paulo, e rogou-lhe que não fosse a Jerusalém. Todos os discípulos disseram o mesmo, e suplicavam-lhe com lágrimas para que não fosse. Mas embora o coração terno e sensível de Paulo deva ter se movido pelas lágrimas e suplicas de seus amigos e de seus próprios filhos na fé, ele decidiu não alterar sua resolução e não deixar de lado seu propósito. Ele se sentiu compelido em espírito a ir, e pronto a deixar todas as consequências à vontade do Senhor.
A QUINTA VISITA DE PAULO A JERUSALÉM
(POR VOLTA DE 58 D.C.)
O apóstolo e seus companheiros foram recebidos com agrado ao chegarem em Jerusalém. "E, logo que chegamos a Jerusalém", observa Lucas, "os irmãos nos receberam de muito boa vontade." (Atos 21:17). No dia seguinte, Paulo e seus companheiros visitaram Tiago, em cuja casa os anciãos estavam presentes. Paulo, como orador principal, declarou particularmente as coisas que Deus fizera entre os gentios por seu ministério. Mas embora estivessem muito interessados, e louvassem ao Senhor pelas boas notícias, eles evidentemente se sentiram desconfortáveis. Eles imediatamente chamaram a atenção de Paulo para o fato de que um grande número de judeus que criam em Jesus como o Messias eram observadores zelosos da lei de Moisés e eram fortemente preconceituosos contra Paulo.
Como satisfazer os preconceitos desses judeus cristãos era agora a importante questão entre Paulo e os anciãos. Eles sabiam que multidões de judeus, convertidos e não convertidos, se ajuntariam quando ouvissem da chegada de Paulo. Por muito tempo eles acreditavam nas mais sérias e pesadas acusações contra ele - "e já acerca de ti foram informados de que ensinas todos os judeus que estão entre os gentios a apartarem-se de Moisés, dizendo que não devem circuncidar seus filhos, nem andar segundo o costume da lei." (Atos 21:21). O que deveria agora ser feito? Os anciãos propuseram que Paulo deveria se mostrar publicamente como alguém que era obediente à lei. Esta foi a mais dolorosa e desconcertante posição do apóstolo dos gentios.
O que ele poderia fazer agora? Será que o mensageiro do evangelho da glória - o ministro do chamado celestial - se inclinaria às regras dos votos nazireus? Foi uma questão séria e solene. Se ele se recusasse a ceder à vontade deles, a suspeita dos judeus seria confirmada; se ele agisse de acordo com o desejo deles, ele deveria se humilhar - colocar seu elevado chamado em segundo plano, e se render à ignorância, preconceito e orgulho dos judaizantes. Mas o que mais podia fazer? Ele estava no centro de um judaísmo fanático, e desejava honestamente conquistar a igreja de Jerusalém para um cristianismo mais puro e mais nobre.
Alguns tomaram muita liberdade em seu criticismo sobre o apóstolo no decorrer desse tempo. Mas embora seja nosso privilégio humildemente examinar tudo o que o historiador sagrado escreveu, tememos que alguns se aventuraram longe demais em dizer coisas duras sobre o apóstolo. Podemos perguntar reverentemente quão longe o desejo e a afeição de Paulo o influenciaram nesta ocasião, além das advertências do Espírito através dos irmãos; mas certamente devemos nos manter entre os limites do que o Próprio Espírito Santo disse pelas Escrituras. Vamos agora cuidadosamente observar os fatos exteriores que conduziram o apóstolo a essa memorável época de sua vida.
Roma tinha estado por muito tempo em sua mente. Ele tinha um grande desejo de pregar o evangelho naquele lugar. Isto estava correto - estava de acordo com Deus - não era algo de si mesmo: ele era o apóstolo dos gentios. Deus vinha trabalhando em Roma de modo abençoado mesmo sem Paulo ou Pedro, pois ainda nenhum apóstolo tinha visitado Roma. Paulo tinha sido privilegiado por escrever uma epístola aos romanos, e nessa carta ele expressa o mais ardente desejo de vê-los, e de trabalhar entre eles. "Porque desejo ver-vos", diz ele, "para vos comunicar algum dom espiritual, a fim de que sejais confortados" (Romanos 1:11). Este era seu estado mental e o objetivo que tinha diante de si, o que também devemos ter em vista quando estudamos esta parte de sua história. Compare Romanos 1:7-15; 15:15-33.

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